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Cotitularidade de marcas no Brasil - Uma evolução mais que necessária

Atualmente não é possível a divisão de marcas e, para piorar, não é possível nem mesmo o reconhecimento pelo INPI dos acordos de coexistência ou de convivência, quando se trata de marcas graficamente idênticas para assinalar produtos idênticos ou semelhantes.

16/12/2019

Como escritório especializado em propriedade intelectual e direito empresarial nos deparamos rotineiramente com demandas em que a possibilidade de cotitularidade de marcas seria a solução!

Não foram poucas as vezes que fomos consultados ao longo de mais de duas décadas de dedicação à matéria. A pergunta clássica: “mas não dá para dividir a marca”?

O questionamento acima muitas vezes surge quando sócios desejam dissolver uma parceria ou até mesmo promover uma espécie diferenciada de “licenciamento” à terceiros.

Atualmente não é possível a divisão de marcas e, para piorar, na última década, não é possível nem mesmo o reconhecimento pelo Instituto Nacional da Propriedade Industrial - INPI dos acordos de coexistência ou de convivência, quando se trata de marcas graficamente idênticas para assinalar produtos idênticos ou semelhantes.

A justificativa do instituto para a restrição de acordos é a possibilidade de confusão do consumidor. Será mesmo que se confunde? E se confundir? Qual seria o prejuízo ao consumidor? Perguntas para um outro estudo.

O fato é que não ser possível homologar acordos no INPI, e muito menos dividir uma marca com um ou mais entes que não possuam relação societária, até hoje acarretou a necessidade de se desenvolver soluções e contratos muitas vezes mirabolantes, que requerem contratos de coexistência com cláusulas complexas e que devem ser revisitadas a cada alteração de uma marca ou o desenvolvimento de novas soluções, sempre gerando certa insegurança jurídica para as partes.

Se há sérias discussões envolvendo as soluções para garantir a proteção do ativo intangível quando envolvem terceiros sem relação societária, quando se trata de uma solução para acomodar a dissolução de uma sociedade a discussão acaba se tornando ainda mais complexa e desafiadora.

No desenrolar das negociações que visam solucionar conflitos em dissoluções societárias as partes são obrigadas a assinar acordos complexos a fim de regular o direito de uso e exploração de marcas que ambos continuam tendo interesse em desenvolver.

Somos consultados com frequência para auxiliar empresas e empresários sobre formatos adequados para garantir a exploração de marcas por sócios que estão dissolvendo sua relação societária.

Aqui entra a dificuldade da relação, uma vez que não é possível promover o registro da cotitularidade de marca e as partes deverão celebrar contratos mirabolantes a fim de garantir o direito de uso individual do ativo.

Importante ressaltar que este é um ponto bastante sensível e não raramente grandes conflitos são gerados, pois, perante o INPI apenas uma parte será reconhecida como o titular do ativo a outra parte, por sua vez, será “apenas” uma espécie de “licenciada” da respectiva marca. Tal situação muitas vezes acarreta o entendimento de que um dos cotitulares tem maior poder sobre o ativo intangível do que o outro, gerando o conflito.

A partir de 09 de março de 2020 esse pesadelo acaba! Nesse dia tão esperado o INPI finalmente passará a permitir cotitularidade de marcas, assim como já funciona para patentes, desenhos industriais e programas de computador.

Vale ressaltar que a cotitularidade foi permitida em razão da adesão do Brasil ao Protocolo de Madri, sistema internacional de registro de marcas que é gerido pela Organização Mundial da Propriedade Intelectual - OMPI.

A cotitularidade, ao lado da possibilidade de registros multiclasses e da necessidade de exames céleres de pedidos de registro de marca é um dos requisitos para que um país possa ser aceito neste acordo internacional.

Desse modo, abriu caminho para mais uma avanço e então teremos uma alternativa mais adequada para promover a resolução daqueles conflitos que aparentemente nunca teriam um fim porque não havia uma solução viável.

Será importante também para adequação daqueles contratos de licença perpétua de uso de marca assinados na pressão, como única alternativa, entre ex-sócios porque não poderiam figurar como cotitulares da marca que desenvolveram. Agora é a hora de buscar uma revisão destes acordos!

Não temos dúvidas que com este novo instrumento muitas portas para o desenvolvimento vão se abrir. Muitos indeferimentos de pedidos de registro de marca serão poupados ou revertidos. Acordos de coexistências rejeitados, entre sócio pessoa física e pessoa jurídica agora têm solução!

Mas nem tudo são flores. Ter um contrato adequado para reger esta nova realidade também é essencial, pois, desta nova situação, novos conflitos podem surgir. As partes devem estar atentas aos limites de uso e ao tipo de acordo assinado de modo que conflitos possam ser evitados e ou solucionados de forma eficaz.

Caberá aos nossos especialistas em propriedade intelectual e em direito empresarial conduzir estes acordos e instrumentos oferecendo, quando adequado, esta nova solução, visto que se trata de um bem intangível a ser compartilhado e que possui uma relação exclusiva de pertencimento aos seus desenvolvedores.

E novas indagações começam a surgir. Como ficam questões como insolvência e penhora de parte deste bem? E o risco de um terceiro desconhecido se tornar cotitular do ativo? E no caso de sucessão, como ficam os direitos dos herdeiros?

Uma coisa é certa: estamos em uma fase embrionária no que se refere à cotitularidade. O campo é fértil e as perspectivas são de que, com as necessidades peculiares e represadas ao longo das décadas vamos poder desenvolver estratégias para aplicar esta nova condição que nos é ofertada em prol do desenvolvimento de produtos, de serviços e da criatividade da nossa economia.

Quem será o primeiro a requerer um pedido de cotitularidade ou uma inclusão de titular a um registro de marca? Logo saberemos!

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*Mariana Chacur é advogada, especialista em propriedade intelectual pela FGVLAW SP.

*Mayara Mattar é advogada, especialista em direito empresarial e civil pela Academia Brasileira de Direito Constitucional – ABDCONST.

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