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Família êh! Família ah! Família

Mostra-se evidente que a consagração do conceito moderno de família, baseado no vínculo de afeto, no direito brasileiro, é fundamental, visto que permite o pluralismo e o desenvolvimento de diversas formas de entidades familiares ao dispensar a realização do matrimônio.

29/7/2019

Antes de fazer breves considerações sobre como o tema ‘família’ é tratado em nossa legislação, convido o leitor a fazer uma reflexão: qual o principal sentimento que aflora em sua mente – ou coração - quando pensa em ‘família’? Quem e quais são os indivíduos que a compõem?

Há algumas décadas, a resposta para a segunda pergunta certamente seria uníssona: a família é composta por genitor, genitora e filhos. Prova disso são as fotografias, muitas delas ainda em preto e branco, que trazem um casal sentado ao centro, rodeado de filhos, todos com o semblante extremamente sério.

Hoje, contudo, as fotos das famílias não possuem uma carga tão sóbria. Os retratos ganharam leveza e passaram a registrar momentos de afeto, descontração e felicidade.

Evidentemente, não foram apenas as fotografias que sofreram alteração; a composição e, consequentemente, o conceito de família também. A formatação da família deixou de decorrer exclusivamente do matrimônio e da conotação de ordem sexual de seus integrantes. Desse modo, a ideia de família patriarcal, indissolúvel e verticalizada, tão presente em nosso ordenamento jurídico, foi cedendo espaço a outros paradigmas.

Atenta à realidade social, a Constituição Federal passou a reconhecer a existência de outras entidades familiares, assegurando especial proteção à união estável e à comunidade composta por qualquer um dos pais com sua prole, a chamada família monoparental.

A Carta Magna, desse modo, legitimou um novo conceito de família, amplo e inclusivo, que consagra a existência de famílias – eis que plurais - e não apenas de um só modelo de entidade familiar.

Além da Constituição Federal, uma norma infraconstitucional, a Lei Maria da Penha (lei 11.340/06) contribuiu para a expansão do conceito de família. Isto porque valeu-se do conceito moderno, definindo-a como relação de afeto. Desse modo, representou verdadeiro marco legislativo.

Ainda que o diploma legal tenha como principal objetivo prevenir e punir a violência doméstica e familiar, a lei delineou os contornos da abrangência dos arranjos familiares.

Ao proclamar que o conceito de família abrange aqueles que se consideram aparentados por vontade expressa ou por relação de afeto e, ainda, afirmar que as relações concebidas no dispositivo da lei, que traz esse conceito, independem de orientação sexual, reconheceu o status jurídico-familiar das uniões homoafetivas, na concepção de renomados estudiosos. Mas, mais do que isso, reconheceu o status jurídico-familiar das uniões decorrentes do afeto.

A música do “Titãs”, que dá título a esse texto, em uma breve passagem, faz referência ao tradicional conceito de família, destacando a importância da ‘filha de família’ se casar e a contribuição financeira oferecida pelos pais.

No entanto, como visto, o conceito de família tornou-se plural, de modo que o matrimônio deixou de ser fundamental para a configuração de um arranjo familiar.

Conforme bem ensina Maria Berenice Dias, jurista e notável estudiosa de Direito de Família, devem ser abrangidos pela proteção constitucional os demais relacionamentos cujo vínculo afetivo “une as pessoas com identidade de projetos de vida e propósitos comuns, gerando comprometimento mútuo” e forma uma família.

A união estável, a família monoparental (formada por um dos genitores e sua prole), a família mosaico (formada por um dos genitores com seus filhos e o outro companheiro), entre tantas outras, foram protegidas pela legislação; assim como a união homoafetiva, que foi inserida no conceito de entidade familiar, e obteve os mesmos direitos assegurados às demais famílias, inclusive o de adoção.

A partir do exposto, mostra-se evidente que a consagração do conceito moderno de família, baseado no vínculo de afeto, no direito brasileiro, é fundamental, visto que permite o pluralismo e o desenvolvimento de diversas formas de entidades familiares ao dispensar a realização do matrimônio.

Ademais, permite que o indivíduo decida, livremente e a partir de suas convicções íntimas, com quem deseja partilhar sua vida e viver suas relações de afeto.

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DIAS, Maria Berenice. Manual de Direito das Família – 8. ed. rev. e atual. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2011, p. 42.

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*Isabela Almeida de Medeiros é advogada da Advocacia Hamilton de Oliveira.

 

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