Migalhas de Peso

A atuação do compliance na redução dos casos de assédio moral no ambiente de trabalho

O compliance aplicado nas relações de trabalho pode ser a chave de sucesso para que uma empresa reduza de forma drástica seu ônus com demandas trabalhistas.

7/6/2019

No dia 2 de maio foi comemorado o Dia Nacional de Combate ao Assédio Moral, momento em que o TST instaurou uma campanha voltada ao combate ao assédio moral no ambiente de trabalho. O mês de maio foi então escolhido para ressaltar tal assunto, uma vez que, apesar da expressiva notoriedade, ainda não existe controle preventivo e as ações pleiteando indenização por danos morais oriundas de assédio moral ainda são uma das mais ajuizadas no país.

Conforme informações obtidas junto ao Ministério do Trabalho e Emprego e junto ao Tribunal Superior do Trabalho – TST, assédio moral foi a denúncia mais feita no país nos últimos 10 anos. Cerca de 7 em cada 10 empresas possuem casos de assédio moral relatados.

Nos últimos anos, quase 72% das vítimas que denunciaram a prática do assédio moral no Brasil preferiram não se identificar, o que demonstra um receio de tornar o assunto público. Mais da metade das denúncias de assédio moral nas empresas são feitas pela internet (57,13%), enquanto os líderes são os mais denunciados, alcançando o alarmante percentual de 75,4%. Transtornos mentais e comportamentais, por sua vez, já são a terceira maior causa de afastamento nas empresas.

O número de profissionais afastados em decorrência dessa prática cresceu mais de 60% nos últimos 8 anos. Só em 2018 foram ajuizadas 56.160 novas ações alegando assédio moral. Na América Latina, apenas 5% dos profissionais afirma trabalhar em um ambiente que oferece ações que promovam o bem-estar. Na Europa, esse percentual sobe para 23% e nos EUA 52%.

Mas por que no Brasil esse percentual está tão distante dos países de primeiro mundo? É necessário investir na prevenção, através de qualificação dos empregados em cargos de gestão e também no remediar, isto é, nas aplicações de medidas punitivas justas e imediatas.

Para se ter uma ideia da projeção do presente assunto, só no início de 2019, já foram ajuizadas aproximadamente 9.834 ações pleiteando indenização por danos morais.

O TST, em parceria com o Conselho Superior da Justiça do Trabalho – CSJT, lançou a campanha “Pare e repare: por um ambiente de trabalho mais positivo”. Através da iniciativa do presidente de ambos os órgãos, Ministro Brito Pereira, foram criadas cartilhas exemplificando inúmeras ofensas e agressões verbais capazes de caracterizar agressões verticais, horizontais e institucionais. Elas trazem também as causas e consequências da prática, orientando empregado e empregador sobre o que fazer quando se depararem com tais práticas.

Como bem descreve Leandro Karnal, renomado historiador, professor e palestrante: “o assédio moral é um veneno lento que se insere nas relações e faz com que alguém passe a se considerar menosprezado”.

Cabe o apontamento de que para que haja a configuração do assédio moral é necessária conduta reiterada, jamais um fato isolado. Há uma sistemática repetitiva, com direcionalidade a uma pessoa ou a um grupo de pessoas e com uma intenção, seja de desmoralizar, desestabilizar ou mesmo levar a um pedido de demissão ou ainda causar uma demissão por justa causa. Por exemplo, um empregado ser xingado, seja por superior hierárquico ou por algum de seus pares, configura apenas conduta abusiva. Caso essa conduta seja reiterada e direcionada a uma pessoa em específico, pode vir a configurar um caso de assédio moral.

Contudo, sem diminuir a seriedade das alegações e dos transtornos verdadeiros pelos quais muitos cidadãos são acometidos, algumas causas de pedir ligadas ao pleito de assédio moral tendem a não prosperar perante os magistrados da Justiça do Trabalho.

Apesar de ser uma das categorias que mais alega sofrer assédio moral, os bancários geralmente vinculam seus pedidos a cobranças excessivas de metas. É salutar que a cobrança pura de uma meta não vincule a um mau trato, nem a suposto sofrimento, uma vez que a meta é uma “régua” utilizada pelas instituições privadas para movimentar e motivar seus empregados a atingirem resultados factíveis e passíveis de geração de lucro. Trata-se de exercício do poder diretivo do empregador. A meta pode e deve ser cobrada, desde que de forma respeitosa, mesmo que incisiva e reiterada ao longo do período em que deve ser atingida. Tais pedidos de indenização amparados em cobranças excessivas de metas não têm alcançado sucesso diante da Justiça do Trabalho.

Outro pedido bastante conhecido e que geralmente vem vinculado ao assédio moral é a exposição de rankings. No momento em que o empregador expõe de forma coletiva quem atingiu a meta, não mencionando os que ficaram em último lugar, por exemplo, também não há configuração de assédio, uma vez tratar-se de reconhecimento motivacional aos que trabalharam com mais afinco, não deixando lastro algum de macular a honra de qualquer empregado.

Para combater tais alegações de assédio e visando mitigar as ações trabalhistas, as empresas têm adotado a técnica de compliance, buscando transparência para com seus empregados, tornando ainda mais positivos os ambientes de trabalho. Através do compliance há uma transmissão e efetivação de regras claras internas e de atuação ética da empresa, como se essa adotasse a regra de ser “vigiada” de dentro para fora.

Explico. Visando melhorar sua imagem e ambiente interno, as empresas têm sentido maior necessidade de desenvolver sistemas internos de controle de seus dirigentes e funcionários com o intuito de evitar a exposição negativa da empresa.

Mas como o compliance seria capaz de impactar positivamente uma empresa a ponto de reduzir os casos de assédio moral que insistem em ser ajuizados na justiça do trabalho? Adotando o compliance no ambiente de trabalho, cria-se uma auditoria interna permanente para prevenir e apurar violações de direitos trabalhistas na empresa. Consequentemente as atitudes passíveis de reprimenda praticadas de forma reiterada pelos assediadores tendem a se extinguir.

O que muitas empresas têm feito para aplicar o compliance em suas relações de trabalho é a elaboração de regulamento interno, podendo até mesmo designar um departamento específico de compliance, estrutura responsável pela elaboração de códigos de conduta, fiscalização de seu cumprimento e apuração, com consequente aplicação de sanção aos responsáveis.

Ferramentas utilizadas para aplicar o compliance tem sido, por exemplo, a criação de canais seguros para que os empregados possam denunciar condutas ilegais, seja de seus superiores hierárquicos, como de seus pares, visando coibir assédios de todas as naturezas na relação de trabalho.

Como a melhor forma de se liderar alguém é pelo exemplo, cabe ao próprio empregador cumprir a legislação trabalhista, pagando corretamente as verbas devidas a seus empregados, o que reduziria significativamente eventuais ações judiciais. Para isso é necessário que o departamento pessoal também esteja alinhado e capacitado para que os valores sejam repassados de forma correta aos empregados.

Resta claro, portanto, que o combate ao assédio moral deve se iniciar na “segunda casa” do trabalhador, isto é, na empresa em que ele passa a maior parte de seu dia, muitas vezes convivendo mais com seus colegas de trabalho que com seus próprios familiares. Não se trata de técnica impossível, onerosa, tampouco distante de ser aplicada no ambiente de trabalho.

Na verdade, o compliance aplicado nas relações de trabalho pode ser a chave de sucesso para que uma empresa reduza de forma drástica seu ônus com demandas trabalhistas.

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*Cristina Lima Monteiro é advogada da Jacó Coelho Advogados.

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