Migalhas de Peso

Da contagem diferenciada do ano marítimo (MAR/TERRA) e a possibilidade de cumulação da especialidade do labor da pesca industrial

Meu foco principal neste artigo é a atividade praticada pelos pescadores industriais.

14/3/2019

 

Diante da vivência em uma região de pescadores, tanto artesanais quanto industriais, observei a necessidade em aprofunda-me no estudo dos direitos previdenciários desta atividade, que no meu ponto de vista vive um pouco esquecida.

Meu foco principal neste artigo é a atividade praticada pelos pescadores industriais e com isso gostaria de compartilhar através dos meus estudos o seguinte entendimento:

Incialmente cumpre esclarecer que a matéria previdenciária prevalece o Tempus regit actum, aplicando ao computo do tempo de exercício a legislação vigente a época da atividade exercida.

A atividade de pescador embarcado/Industrial encontra-se enquadrada no item 2.2.3 do anexo do decreto 53.831/64 e no código 2.2.1 do Anexo II do decreto 83.080/79, diante deste enquadramento a atividade de pescador embarcado é reconhecida como atividade especial por presunção prevalecendo por direito o seu reconhecimento até a data de 28.04.1995 (lei 9003/95). Ou seja, é desnecessária a produção de prova para comprovação de especialidade nesta atividade!

Outro assunto relevante é a importância do reconhecimento do ano marítimo dos pescadores embarcados.

Através da comprovação de embarque e desembarque da carteira marítima o pescador industrial ou pescador embarcado como é chamado, faz jus a contagem diferenciada até a data de 16/12/98 ano marítimo, mediante aplicação do fator de conversão de 0,41 (41%), conforme segue abaixo o seguinte julgado.

EMENTA: PREVIDENCIÁRIO. PESCADOR PROFISSIONAL. POSSIBILIDADE DE CUMULAÇÃO DA CONTAGEM DIFERENCIADA DO ANO MARÍTIMO COM O RECONHECIMENTO DA ESPECIALIDADE DO LABOR. APOSENTADORIA ESPECIAL. POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO/SERVIÇO. EPI. IRDR. 1. O tempo de serviço como pescador profissional empregado deve ser computado como especial até 28-04-1995, em razão do enquadramento por categoria profissional. A partir de 29/04/1995 deve existir comprovação da sujeição a agentes nocivos por qualquer meio de prova até 05/03/1997 e, a partir de então, por meio de formulário embasado em laudo técnico, ou por meio de perícia técnica. 2. O ano marítimo existe em razão da jornada de trabalho diferenciada, e o tempo de 25 anos para aposentadoria especial, em razão da insalubridade a que se submetem os marítimos e os trabalhadores das demais categorias consideradas atividades insalubres. Nada impede, assim, que um mesmo período tenha contagem diferenciada em razão da jornada e seja reconhecido como especial. Essa é a interpretação que melhor se harmoniza com o alto significado que as normas de proteção ao trabalhador assumem no Direito brasileiro. Precedentes desta Corte. 3. O fato de serem preenchidos os específicos campos do PPP com a resposta 'S' (sim) não é, por si só, condição suficiente para se reputar que houve uso de EPI eficaz e afastar a aposentadoria especial. 4. Deve ser propiciado ao segurado a possibilidade de discutir o afastamento da especialidade por conta do uso do EPI, como garantia do direito constitucional à participação do contraditório. Quando o LTCAT e o PPP informam não ser eficaz o EPI, não há mais discussão, isso é, há a especialidade do período de atividade. 4. No entanto, quando a situação é inversa, ou seja, a empresa informa no PPP a existência de EPI e sua eficácia, deve se possibilitar que tanto a empresa quanto o segurado, possam questionar - no movimento probatório processual - a prova técnica da eficácia do EPI. O segurado pode realizar o questionamento probatório para afastar a especialidade da eficácia do EPI de diferentes formas: A primeira (e mais difícil via) é a juntada de uma perícia (laudo) particular que demonstre a falta de prova técnica da eficácia do EPI - estudo técnico-científico considerado razoável acerca da existência de dúvida científica sobre a comprovação empírica da proteção material do equipamento de segurança. Outra possibilidade é a juntada de uma prova judicial emprestada, por exemplo, de processo trabalhista onde tal ponto foi questionado. Entende-se que essas duas primeiras vias sejam difíceis para o segurado, pois sobre ele está todo o ônus de apresentar um estudo técnico razoável que aponte a dúvida científica sobre a comprovação empírica da eficácia do EPI. 6. Uma terceira possibilidade será a prova judicial solicitada pelo segurado (após analisar o LTCAT e o PPP apresentados pela empresa ou INSS) e determinada pelo juiz com o objetivo de requisitar elementos probatórios à empresa que comprovem a eficácia do EPI e a efetiva entrega ao segurado. O juízo, se entender necessário, poderá determinar a realização de perícia judicial, a fim de demonstrar a existência de estudo técnico prévio ou contemporâneo encomendado pela empresa ou pelo INSS acerca da inexistência razoável de dúvida científica sobre a eficácia do EPI. Também poderá se socorrer de eventuais perícias existentes nas bases de dados da Justiça Federal e Justiça do Trabalho. 5. Não se pode olvidar que determinada situações fáticas, nos termos do voto, dispensam a realização de perícia, porque presumida a ineficácia dos EPIs. 6. Assim, convém seja anulada a sentença no ponto, com baixa dos autos para que seja reaberta a instrução probatória, devendo o juiz seguir os passos acima delineados, tudo a viabilizar que o INSS ou empresa possam apresentar (ou requer tempo para a sua elaboração e posterior juntada) estudo técnico que aponte a eficácia do EPI contra o agente umidade no período de 17/12/1998 a 2016, sob pena de ser declarada a ineficácia dos mesmos.   (TRF4, AC 5000291-74.2017.4.04.7208, TURMA REGIONAL SUPLEMENTAR DE SC, Relator JORGE ANTONIO MAURIQUE, juntado aos autos em 05/03/2018)1

EMENTA: PREVIDENCIÁRIO. PESCADOR ARTESANAL. TRABALHADOR MARÍTIMO. ANO MARÍTIMO. POSSIBILIDADE DE CUMULAÇÃO EM RELAÇÃO A UM MESMO PERÍODO DA CONTAGEM DIFERENCIADA COM O RECONHECIMENTO DA ESPECIALIDADE. TEMPO DE SERVIÇO ESPECIAL. CATEGORIA PROFISSIONAL. PESCADOR. APOSENTADORIA POR TEMPO DE SERVIÇO/CONTRIBUIÇÃO. 1. É devido o reconhecimento do tempo de serviço como pescador artesanal, em regime de economia familiar, quando comprovado mediante início de prova material corroborado por testemunhas. Hipótese em que não há início de prova material ou prova testemunhal hábil ao reconhecimento pretendido. 2. O ano marítimo, de 255 dias, foi implantado pelo Decreto 22.872/33, que criou o Instituto de Aposentadoria e Pensões dos Marítimos (IAPM), com o intuito de compensar os trabalhadores marítimos pelo confinamento em embarcações de longo curso e o regime especial do marítimo embarcado encontra-se regulamentado no art. 54, § 1º, do Decreto 83.080/79 e art. 57, parágrafo único, dos Decretos 611/1992 e 2.172/97, sendo admitido e regulado pelo INSS na Instrução Normativa INSS/PRES n.º 45/2010, arts. 111 a 113. 3. Além do cálculo diferenciado do ano marítimo, o trabalhador faz jus ao reconhecimento do tempo especial laborado em tais atividades. 4. O ano marítimo existe em razão do confinamento e da jornada de trabalho diferenciada, e o tempo de 25 anos para aposentadoria especial, ou para a conversão do tempo especial em comum, em razão da insalubridade a que se submetem os marítimos, e os trabalhadores de construção e reparos navais, consideradas atividades insalubres. A interpretação que melhor se harmoniza com o alto significado das normas de proteção ao trabalhador no Direito brasileiro é a de que é possível que um mesmo período como marítimo tenha contagem diferenciada em razão da jornada e seja reconhecido como especial. Precedentes do STJ e desta Corte Regional. 5. Não se aplicam ao trabalhador marítimo, para fins do cômputo do ano marítimo, as disposições da Lei n.º 9.032, de 29/04/95, que extinguiu o enquadramento por categoria profissional. Essa contagem diferenciada é possível até a edição da EC 20, de 15/12/1998, que impôs a observância do art. 40, § 10, da CF/88, o qual veda o tempo de contribuição fictício. 6. Para a classificação das atividades como especiais, porém, incidem as disposições da Lei 9.032 de 28-04-1995, sendo admissível o reconhecimento da especialidade por categoria profissional ou por sujeição a agentes nocivos, admitindo-se qualquer meio de prova (exceto para ruído e calor); a partir de 29-04-1995 não mais é possível o enquadramento por categoria profissional, sendo necessária a comprovação da exposição do segurado a agentes nocivos por qualquer meio de prova até 05-03-1997 e, a partir de então, através de formulário embasado em laudo técnico, ou por meio de perícia técnica. 7. A atividade de pescador exercida até 28-04-1995 deve ser reconhecida como especial em decorrência do enquadramento por categoria profissional previsto à época da realização do labor. 8. Preenchidos os requisitos legais para aposentadoria em mais de um regime jurídico, tem o segurado direito de optar pelo benefício com renda mensal mais vantajosa.   (TRF4, AC 5006977-53.2010.4.04.7200, QUINTA TURMA, Relatora TAÍS SCHILLING FERRAZ, juntado aos autos em 19/08/2014)2

Conforme entendimentos jurisprudenciais acima citados, diante do reconhecimento destes direitos existe a possibilidade de cumulação em relação a um mesmo período da contagem diferenciada com o reconhecimento da especialidade, aumentando o tempo de contribuição e alcançando a tão sonhada aposentadoria rapidamente.

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1 TRF4, AC 5000291-74.2017.4.04.7208, TURMA REGIONAL SUPLEMENTAR DE SC, Relator JORGE ANTONIO MAURIQUE, 05/03/2018

2 TRF4, AC 5006977-53.2010.4.04.7200, QUINTA TURMA, Relatora TAÍS SCHILLING FERRAZ, juntado aos autos em 19/08/2014

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*Janine Silvana Vicente é pós-graduanda em Direito e Processo Previdenciário pela Damásio Educacional.

 

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