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Ausência de abuso de direito - estabilidade gestacional

Apesar de pacificado, sem qualquer dúvida, se trata de um assunto bastante polêmico.

11/3/2019

A oitava Turma do Tribunal Superior do Trabalho reforçou entendimento pacificado pela Corte, por meio da orientação jurisprudencial 399, entendendo não se configurar abuso de direito o fato de trabalhadora ingressar com ação trabalhista, pleiteando indenização decorrente do período de estabilidade gestacional, após o seu término.

O Tribunal Regional do Trabalho da 18º Região havia julgado improcedente o pedido de pagamento de todo o período, por entender que a trabalhadora havia ingressado com a ação após o período de estabilidade, o que inviabilizaria sua reintegração, configurando assim abuso de direito de ação.

Contudo, para a maioria dos membros do Tribunal Superior do Trabalho, o fato não se configura abuso de direito, devendo ser observado apenas o prazo prescricional de 2 anos contados do término do contrato de trabalho. Apesar de pacificado, sem qualquer dúvida, se trata de um assunto bastante polêmico.

Não raras as vezes a trabalhadora gestante não tem conhecimento do seu estado gravídico quando da rescisão contratual, o que, à primeira vista, demonstra a ausência de abuso pelo empregador na rescisão contratual, bem como da empregada.

Avaliando o termo sob o prisma da boa-fé contratual, seria obrigação da colaboradora comunicar imediatamente a empresa, tão logo tomasse  conhecimento de sua gestação, garantindo a possibilidade desse proceder com a imediata reintegração.

De uma forma geral, toda estabilidade é definida como uma forma de garantir o direito ao trabalho para o trabalhador, por um período pré-determinado, após uma situação de vulnerabilidade frente ao seu empregador.

Tomemos como exemplo a estabilidade acidentária, prevista na lei 8.213/91, onde o empregado acometido por um acidente decorrente do trabalho ou equiparado e que tenha se afastado por mais de 15 dias do trabalho, tem direito de permanecer no trabalho por no mínimo 12 (doze) meses após retornar as atividades.

Em uma eventual reclamação trabalhista decorrente de dispensa arbitrária, compete ao empregador/reclamante requerer preliminarmente sua reintegração ao emprego ou justificar a impossibilidade de fazê-lo. Não o fazendo, corre o risco de ver indeferido o direito ao recebimento da indenização decorrente do período de estabilidade.

Isso se deve ao fato de que a intensão do legislador com a criação da norma, seria a garantia na manutenção do trabalho ao colaborador e não ao recebimento do salário puro e simples.

No caso da estabilidade gestacional a garantia de emprego é tida também como um direito fundamental do nascituro, indo muito além da vontade de permanecer ou não no emprego.

Tanto é assim, que mesmo que a concepção ocorra na vigência do aviso prévio indenizado, é garantida a estabilidade prevista no artigo 10, inciso II, alínea ‘b’ do Ato de Disposição Constitucionais Transitórias. Esse dispositivo prevê a estabilidade no emprego desde a confirmação da gravidez até cinco meses após o parto.

O aviso prévio para rescisão contratual é proporcional ao tempo trabalhado, sendo um mínimo de 30 dias, devendo ser somados mais 3 dias por cada ano trabalhado, limitado a 90 dias.

Dessa forma, poderia ocorrer de uma empresa desligar uma colaboradora e no transcurso de 60 dias após a rescisão contratual, a mesma vir a engravidar. Nesse caso, o empregador não teria a menor possibilidade de tomar conhecimento da situação, tendo inclusive contratado outro empregado para ocupar a vaga deixada e mesmo assim seria obrigado a proceder com a reintegração.

Do ponto de vista organizacional, não é uma situação muito simples aos empregadores, especialmente para empresas de pequeno porte, que contam com um baixo orçamento e um quadro de pessoal extremamente reduzindo.

Nesses casos, nos parece mais sensato estabelecer-se a obrigatoriedade de comunicação imediata da gestação ao empregador, garantindo a possibilidade de redução de custos a esses empresários.

Ante uma situação dessas, a empresa pode, por exemplo, proceder com a imediata reintegração da empregada, permitindo que o período de 120 dias posterior ao nascimento da criança seja pago pela previdência social.

Uma situação passível de minimizar essas situações seria incluir o teste de gravidez no exame demissional, onde seria possível ter a certeza de que no momento da rescisão não haveria qualquer estabilidade em curso. Evitaria assim o mal estar resultante da reintegração.

Contudo, esse é um tema fora de questão para os tribunais trabalhistas, na medida em que violaria o direito constitucional a intimidade da mulher, que poderia se sentir constrangida com tal exigência.

Não nos parece a decisão mais acertada não reconhecer abuso de direito a uma empregada que, sem qualquer justificativa legal ou moral, busca o direito a indenização decorrente da estabilidade gestacional apenas após o seu fim.

É certo que a Constituição Federal estabelece um prazo prescricional de dois anos, após o fim do contrato de trabalho, para a busca judicial de reparação de direitos violados, tendo o Tribunal Superior do Trabalho reafirmado seu posicionamento de que tal fato basta para caracterização ou não de eventuais abusos.

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*Ernane de Oliveira Nardelli é sócio da Jacó Coelho Advogados.

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