Como de conhecimento geral, o CPC/15 transformou a função das Cortes Superiores com intuito de incentivar o debate e aprofundar a deliberação em torno da solução das disputas interpretativas para obtenção de precedentes consistentes/vinculantes.
Oportuno salientar, nesse diapasão, que com as multifacetadas inovações trazidas pelo Codex processual de 2015, os debates estão cada vez mais incertos pois restam muitos pontos que merecem ser ajustados. No entanto, assim como toda noite lembra o que aconteceu de dia, a possibilidade de instauração do IAC deve remeter inexoravelmente para dois fatores sobre a figura dos julgamentos paradigmáticos, a saber:
(i) Percepção de que essas uniformização e abrangência concentradas em um só julgado do órgão competente de composição mais ampla impedem que casos idênticos tenham decisões discrepantes; e,
(ii) O desistimo-lo da recorribilidade a respeito de uma específica questão de direito, criando segurança jurídica.
Isso porque, como lembra parte da doutrina, “assunção de competência é um instituto criado para esta finalidade, qual seja, uniformizar a jurisprudência dos Tribunais, buscando ainda uma solução ligada à organização judiciária e que, ainda por via oblíqua, além de proporcionar uniformidade, também se direciona para propiciar maior celeridade processual em abono ao princípio da razoável duração do processo”2.
Não é possível descurar, por outro lado, que o instituto está de “acordo com as reformulações propostas dentro da órbita do respeito aos precedentes, representando adequadamente a ratio emergente, de simplificar as exigências procedimentais com a preocupação central em resolver problemas e, principalmente, de imprimir maior grau de organicidade do sistema, privilegiando a segurança jurídica e a certeza em torno de relevantes matérias de direito”3.
Até porque, na intelecção da Corte Superior, a uniformização de jurisprudência por meio incidental é um mecanismo de “atuação preventiva”, porquanto, “em lugar de aguardar o julgamento para que, havendo divergência entre órgãos do mesmo Tribunal acerca de questão de direito, solicitar a uniformização da aplicação da lei, a parte ou o próprio julgador podem se antecipar e, antes de julgado o processo, solicitar o pronunciamento do órgão competente para uniformizar a interpretação da matéria controvertida”4.
Justamente por isso que a instauração e o julgamento do IAC, assim como os demais incidentes, devem ser sucedidos da mais ampla e específica divulgação e publicidade, o que tem por objetivo possibilitar, nos termos do art. 983 do novo diploma processual civil, a oitiva de pessoas, órgãos e entidades com interesse na matéria, que poderão requerer a juntada de documentos e a realização de diligências necessárias à elucidação da questão de direito controvertida.
Essa providência processual tem especial incidência aos casos em que determinada questão de direito não é repetitiva e não autoriza a afetação via recurso repetitivo e/ou IRDR, ou seja, sem o IAC, a despeito da potencial relevância da matéria que pode atingir diretamente o cenário político, social ou econômico, permanecer-se-ia a indefinição com intepretações casuísticas, o que não é definitivamente salutar.
Sob esse prisma, não resta dúvida que o supramencionado incidente está na mira certa da prevenção e da composição da divergência jurisprudencial, e como caminho salutar para a emissão de um entendimento definitivo sobre questões de notável relevo jurídico e repercussão social.
Assim, resistindo o Incidente de Assunção de Competência ao lusco-fusco da processualística brasileira, podemos dizer que tonar-se-á um importante método voltado à pacificação da jurisprudência e das expectativas dos jurisdicionados sobre questão de grande reverberação social.
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1 VIVEIROS DE CASTRO, João Pedro Almeida. Análise do Instituto da Assunção de Competência dentro dos escopos da reforma do CPC (Clique aqui).
2 Artigo 555, §1º, do Código de Processo Civil, e artigo 959 do NCPCP). In: Revista Brasileira de Direito Processual: RBDPro, Belo Horizonte, v. 23, n. 89, p. 127-138, jan./mar. 2015, disponível em: Clique aqui, sem destaque no original).
3 ALVIM, Angélica Arruda. (coord.) [et. al.], Comentários ao CPC, São Paulo: Saraiva, 2016, pág. 1.085.
4 REsp 1.071.622/RJ, Terceira Turma, DJe 03/02/2009.
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*Paulo Henrique de Paiva Santos é advogado do Dannemann Siemsen.