Até a entrada em vigor do novo Código Civil, em 12 de janeiro de 2003, a matéria relativa aos condomínios edilícios era integralmente regida pela lei 4.591/64. Com o advento do novo diploma, parte da mencionada lei foi derrogada e, com isso, surgiu a necessidade de os condomínios constituídos sob a égide da legislação anterior adaptarem os seus atos constitutivos às alterações por ele trazidas.
Em que pese se tratar de uma legislação com mais de 15 anos de vigência, na prática, percebe-se que muitos condomínios ainda mantêm convenção e regimento interno defasados. Mesmo não sendo obrigatória a alteração dos atos formalizados antes do Código Civil, a não adequação às novas normas, sem dúvidas, pode ensejar uma série de problemas na administração do condomínio e nas relações entre os diversos proprietários.
Dentre as principais mudanças trazidas pelo Código Civil, podem ser citadas as seguintes: a) a redução da multa por inadimplemento da taxa condominial de 20% (vinte por cento) para 2% (dois por cento); b) a alteração do quórum para destituição do síndico, de 2/3 (dois terços) dos condôminos presentes em assembleia, para maioria absoluta; c) a indicação dos deveres do condômino cujo descumprimento ensejará a aplicação de multa, que será limitada a cinco vezes o valor da contribuição mensal (art. 1.336); e d) a criação de multa por conduta antissocial, correspondente a até dez vezes o valor da contribuição para as despesas condominiais.
É importante destacar que o Código Civil, propositadamente, tratou do condomínio edilício de forma bastante genérica, de modo que, diante das lacunas deixadas, cada condomínio pudesse estipular as regras mais adequadas e convenientes à sua realidade. Sendo assim, além de tratar sobre aspectos objetivos que envolvem as relações condominiais, o fato é que a convenção e o regimento interno, em razão de seu caráter estatutário, devem se preocupar em dispor, também (e especialmente), sobre questões a respeito das quais legislação de regência é omissa. A título de exemplo, tem-se os seguintes tópicos:
a) Aluguel de vagas: o aluguel de vagas de garagem a pessoa estranha ao condomínio deve ser expressamente autorizado pela convenção, a teor do que dispõe o art. 1.338, §1º, do Código Civil;
b) Remuneração do síndico: a definição da remuneração do síndico deve constar da convenção do condomínio, inclusive eventual limitação a ela;
c) Eleição de síndico que não seja proprietário: apesar de o Código Civil prever essa possibilidade, a convenção do condomínio poderá vedar a eleição de síndico que não seja proprietário;
d) Limitação ao número de reeleições do síndico: como nem o Código Civil e nem a lei 4.591/64 preveem quantas vezes o síndico pode se reeleger, cabe à convenção estipular o número de vezes de reeleição;
e) Voto por procuração: a despeito de o Código Civil permitir a outorga de mandato para que o condômino seja representado por terceiro em assembleia, eventual restrição ao número de procurações outorgadas a uma única pessoa, bem como a proibição de o síndico de portar procurações de outros condôminos, devem estar expressas na convenção;
f) Responsabilidade do condomínio por furtos, roubos e danos a bens dos condôminos: caberá à convenção prever expressamente a exclusão ou não de responsabilidade do condomínio por eventuais dados ou desparecimento de pertences dos condôminos em áreas comuns ou em suas unidades. É importante destacar que, nos casos em que o condomínio adota esquema de vigilância, como, por exemplo, câmeras e controle de entrada e saída de veículos, a jurisprudência tem afastado a cláusula de exclusão de responsabilidade, por entender que, ao assim proceder, assume para si o dever de guarda e vigilância da propriedade dos seus condôminos;
g) No caso de condomínios residenciais, é recomendável, ainda, que a convenção seja expressa quanto à vedação (ou não) da locação de unidades através de plataformas eletrônicas como o Airbnb. O tema é bastante polêmico e vem sendo constantemente tratado pelos tribunais pátrios. Isso porque, de um lado, tem-se o interesse da coletividade de condôminos, para a qual tal conduta implicaria em alteração da destinação do edifício, e, de outro, o livre exercício do direito constitucional de propriedade pelo dono do imóvel; e
h) Cláusula compromissória arbitral: é admitida a inclusão de cláusula na convenção que estabeleça que os litígios condominiais serão resolvidos no âmbito da arbitragem. Inclusive, recentemente, o STJ entendeu que, diante da força coercitiva da convenção condominial, qualquer condômino que ingressar no agrupamento condominial estará sujeito à clausula arbitral, ainda que não a tenha expressamente pactuado (RESP 1.733.370/GO, Relator para acórdão: ministro Moura Ribeiro, 3ª Turma, DJe 31/8/18.
Por sua vez, o regimento interno, parte integrante da convenção, tem por função disciplinar as normas básicas de convivência dentro do condomínio, regulando questões do cotidiano. Para tanto, é imprescindível que conste do regimento interno, dentre outros:
a) Regras para o uso das áreas comuns e sanções pelo seu descumprimento;
b) Regras de uso da garagem;
c) Regras, dias e horários para a realização de mudanças e obras; e
d) Indicação detalhada dos padrões estéticos a serem respeitados pelos condôminos, de modo que seja mantida a unidade da fachada do prédio, corredores e demais áreas comuns.
Vê-se, portanto, que a adequação e atualização da convenção e do regimento interno do condomínio é providência indispensável à manutenção de sua plena legalidade, validade e eficácia, mas especialmente à prevenção e solução de litígios. Para tanto, é importante que tais instrumentos reflitam as necessidades de cada condomínio, com base na sua realidade e características específicas, após participativo debate dos condôminos, disciplinando de forma clara as regras que devem ser observadas por todos aqueles que o compõem, bem como terceiros que com ele se relacionam.
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