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Pacto por ações concretas

Uma miniconstituinte criará, como em 93, um leque de interesses, que dificultará o consenso e redundará em fracasso, mormente se houver desinteresse da Presidência da República. E quem será o próximo presidente em 2007? Será a favor ou contra?

14/10/2003

Pacto por ações concretas

 

Miguel Reale Jr.*

 

A Assembléia Constituinte foi a passarela pela qual desfilou a sociedade organizada, em defesa de seus interesses, do índio ao magistrado, "da tanga à toga". As corporações como a magistratura, o Ministério Público, as polícias Civil, Militar e Federal, os servidores públicos em geral e as Forças Armadas tiveram atendidos os seus pleitos. A Constituição Federal de 1988 é compromissória, fruto de árdua composição entre idéias e interesses divergentes. Estavam, portanto, os constituintes seguros da não-perenidade de sua obra. Por isso, convocou-se revisão constitucional para 93.

 

Por vários motivos, ela fracassou. Destaco, contudo, dois: o conluio pela inércia, pois todos os setores satisfeitos com o texto constitucional agiam para que nada se alterasse, e o desinteresse da Presidência da República, que move em grande parte o Legislativo.

 

Uma miniconstituinte criará, como em 93, um leque de interesses, que dificultará o consenso e redundará em fracasso, mormente se houver desinteresse da Presidência da República. E quem será o próximo presidente em 2007? Será a favor ou contra?

 

Segundo o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, duas questões, entre outras, justificariam uma miniconstituinte: a reestruturação da Federação e a segurança pública. Quanto à primeira, pode se equacionar uma cooperação entre União, Estados e municípios sem reforma constitucional. Importante é tornar firme o pacto federativo, por meio de agência de controle federal, que fiscalize e avalie a aplicação regional de recursos, em face de planejamento estratégico nacional e regional, para que haja coordenação dos diferentes níveis governamentais, como sugerem estudos da Fundap. Quanto à questão da segurança, propostas de alteração constitucional enfrentarão interesses corporativos bem organizados. E, enquanto se discutem mudanças, paralisam-se ações concretas de integração das polícias e de política criminal.

 

De outro lado, levantamento do IBGE traça o retrato do Brasil, o país das grandes cidades, mais de uma dezena delas com população superior a 1 milhão de habitantes. A desigualdade está nos grandes centros e a omissão do Estado agrava a desorganização social, faltando Justiça, polícia comunitária, lazer, cultura. Sem paz social, que só a presença do Estado em ação com a comunidade pode proporcionar, não há reforma constitucional que enfrente a questão da segurança.

 

Diagnóstico do sistema criminal definiu pontos importantes, que procuramos efetivar no Ministério da Justiça, com programas iniciados e depois abandonados quando da nossa saída.

 

Lembro alguns exemplos.

 

O convênio assinado, no Palácio do Planalto, com a CNI, para a criação de plantões sociais nas delegacias de polícia. A CNI comprometia-se em remunerar estagiários de serviço social e psicologia para atendimento em delegacias da periferia, onde 70% das ocorrências são de cunho social. As casas de mediação, sendo ouvidores pessoas da comunidade, estavam previstas em acordo com os Estados e poderiam produzir efeitos positivos de harmonia social, como em Fortaleza. A criação de centros de atendimento médico-legal e psicológico à mulher vítima de violência, especialmente sexual. Lembro também a ampliação da Defensoria Pública, para orientação e prevenção de conflitos.

 

Promovemos, no Ministério da Justiça, encontro até então inédito entre os ministros da área social, tendo por tema a violência que vitima a juventude -56% dos jovens de 15 a 24 anos que morrem foram vítimas de assassinato. Na outra ponta, estão os jovens que matam. Por sugestão do ministro Paulo Renato, arquitetou-se transformar as escolas de bairros do Rio e de São Paulo em centros comunitários. Cada ministério traria sua colaboração. Logo depois, pedi exoneração e a idéia morreu.

 

Por fim, os CICs (Centros Integrados de Cidadania), que levam a Justiça ao povo, com a presença conjunta do juiz, do promotor, das polícias Civil e Militar, do advogado, do assistente social e do psicólogo, no fundão das periferias das cidades grandes. A reforma do Judiciário não pode se preocupar apenas em acelerar processos, pois nada é pior que a injustiça célere. Reforma do Judiciário revolucionária é levar a Justiça ao povo carente por meio dos CICs, em cooperação com a comunidade.

 

Em outra vertente, a informatização dos dados criminais, como fora conveniado com o IBGE, e o melhor preparo do policial são básicos para o sucesso de investigações.

 

Destarte, há de implementar a modernização da polícia e uma política criminal de cunho social. E, para isso, não é preciso reforma constitucional, mas vontade política.

 

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* Advogado do escritório Reale Advogados Associados, ex-ministro da Justiça e professor titular da Faculdade de Direito da USP.

 

 

 

 

 

 

 

 

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