No dia 7 de abril de 2017, o Conselho Nacional de Política Fazendária – CONFAZ celebrou o convênio ICMS 52/17 consolidando as regras para o pagamento do ICMS recolhido pela sistemática da substituição tributação. Em síntese, dentre as suas trinta e seis cláusulas, o convênio dispôs sobre: (i) definições de contribuintes e responsáveis do Imposto; (ii) forma de cálculo do ICMS-ST; (iii) forma de pagamento e ressarcimento do ICMS-ST; e (iv) novas obrigações acessórias.
A inovação mais significativa do convênio, avo deste artigo, encontra-se presente na seção III, que dispõe sobre o cálculo do Imposto retido pelo substituto tributário. Em outras palavras, a referida seção trata sobre a base de cálculo do ICMS-ST.
A base de cálculo do ICMS-ST encontra-se bem definida pelo art. 8° da LC 87/96, sendo ela:
(i) quando a substituição tributária for "pra trás", "o valor da operação ou prestação praticado pelo contribuinte substituído"; e
(ii) quando a substituição tributária for "pra frente", em regra, derivada do somatório das seguintes parcelas: a) valor próprio das operações ou prestação; b) valor do seguro, frete e outros encargos; e, por fim, c) a margem de valor agregado (MVA)1;
Consoante dispõe a cláusula décima terceira (corroborada pela cláusula décima quarta) do convênio 52/17, o ICMS-ST integrará a sua própria base de cálculo base de cálculo, inclusive na hipótese de recolhimento de imposto relativo à diferença entre a alíquota interna da unidade federada de destino e alíquota interestadual (DIFAL). Transcreve-se a sua redação:
"O imposto devido por substituição tributária integra a correspondente base de cálculo, inclusive na hipótese de recolhimento do imposto correspondente à diferença entre a alíquota interna da unidade federada de destino e a alíquota interestadual"
Desse modo, como visto, diversamente do que dispõe o art. 8° da LC 87/96, o ICMS-ST passou a integrar a sua própria base de cálculo. Logo, está-se diante de uma nítida majoração tributária.
Sem adentrar no mérito das demais Cláusulas do convênio 52/2017, que também possuem suas constitucionalidades questionáveis, a Cláusula treze do referido convênio, pois, possui a constitucionalidade duvidosa. Explica-se:
(i) Consoante disposto no art. 146, III, "a", da CF/882, cabe a Lei Complementar tratar sobre base de cálculo de Impostos. Logo, não poderia convênio 52/17 ir além do disposto no art. 8° da LC 87/96 (antes transcrito) para incluir, por sua vez, o ICMS-ST em sua própria base de cálculo, onerando o contribuinte pela majoração deste Imposto.
(ii) Ademais, nos termos do artigo 150, I, da CF/88 (princípio da legalidade tributária), a majoração de tributos deve ocorrer mediante edição de lei. No caso em questão, ainda que fosse desconsiderado o argumento anterior, seria imprescindível a edição de, ao menos, Lei Ordinária, porquanto a inclusão do ICMS-ST na sua própria base de cálculo representa uma majoração de tributo.
Embora vigente desde 28 de abril de 2017 (publicação no DOU), a maioria das cláusulas o convênio 52/17 passaram a surtir efeitos da partir de 1º de janeiro de 2018. Pouco tempo antes desta data, iniciaram-se calorosas discussões sobre a constitucionalidade de diversas cláusulas do Convênio 52/2017.
Após vários questionamentos das entidades representativas de contribuintes do ICMS acerca da aplicação da cláusula 13 do referido convênio, o CONFAZ, em nota publicada no Diário Oficial da União, no dia 15 de dezembro de 2017, afirmou, que “o objetivo da cláusula décima terceira é dispor de forma conceitual o que já está previsto no comando constitucional (alínea 'i' do inciso XII do § 2º do art. 155 da CF/88) e na Lei Complementar 87/96 (inciso I do § 1º do art. 13), pelos quais o ICMS integra a sua própria base de cálculo”.
Contudo, tal defesa não possui qualquer fundamento, uma vez que a base de cálculo do ICMS, para fins de substituição tributária, não se encontra prevista no art. 13 da LC 87/96, que trata da base de cálculo do ICMS (normal) e que, de fato, prevê a inclusão deste na própria base de cálculo. A previsão da base de cálculo do IMCS-ST encontra-se no já mencionado art. 8º da referida lei, que, repise-se, não prevê a inclusão do ICMS-ST em sua própria base de cálculo.
Duas são as Ações Diretas de Inconstitucionalidades (ADIn’s). A primeira, proposta no dia 14 de dezembro de 2017 pela Associação Brasileira de Supermercados (ABRAS), tombada sob o número 5858, já extinta pela falta de pertinência temática (passível de interposição de recursos). A segunda, proposta no dia 18 de dezembro de 2017, pela Confederação Nacional de Industrias, tombada sob o número 5866.
Embora a ADIn 5866, igualmente à ADIn 5858, seja da relatoria do ministro Alexandre de Moraes, o pedido liminar de suspensão das cláusulas 3º, 8º, 10º, 11º, 12º, 13º, 14º, 16º, 24º, 26º e 27º do convênio do CONFAZ foi analisado pela ministra presidente do STF, Carmen Lúcia, acolhendo, acertadamente, a suspensão, dentre as Cláusulas destacadas, da malfalada Cláusula décima terceira.
Em cumprimento à decisão interlocutória proferida pela Ilustríssima ministra, o CONFAZ publicou no Diário Oficial da União desta terça-feira (9 de janeiro de 2018) o Despacho 2/18, que suspendeu os efeitos das cláusulas do convênio até "novo exame a ser levado a efeito na forma definida pelo insigne relator, o ministro Alexandre de Moraes".
No referido despacho, o CONFAZ deixou claro que irá interpor recurso em face da referida liminar. Tendo a esta decisão sido proferida por ministra diversa do relator, há chances, ainda que em juízo de retratação, de revisão da liminar deferida na ADIn 5866. Desse modo a suspensão concedida, por ora em benefício dos contribuintes, não representa uma garantia definitiva de que não haverá a elevação da base de cálculo do ICMS-ST.
Para resguardar os direitos individuais diante da possibilidade de cobrança do ICMS-ST majorado de maneira inconstitucional, afigura-se essencial a propositura de ações individuais, ainda que seja para resguardar as empresas, a fim de afastar o disposto na cláusula 13 do convênio ICMS 52/17.
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1 A MVA é compreendida, nos termos do §4° do art. 8° da LC 87/96, pelos "preços usualmente praticados no mercado considerado, obtidos por levantamento, ainda que por amostragem ou através de informações e outros elementos fornecidos por entidades representativas dos respectivos setores, adotando-se a média ponderada dos preços coletados, devendo os critérios para sua fixação ser previstos em lei"
2 Art. 146, III, "a", da CF/88, "cabe a Lei Complementar (...) estabelecer normas gerais em matéria de legislação tributária, especialmente sobre (...) definição de tributos e de suas espécies, bem como, em relação aos impostos discriminados nesta Constituição, a dos respectivos fatos geradores, bases de cálculo e contribuintes".
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*Pedro Cavalcanti Amarante é advogado tributarista, sócio do escritório Almeida e Barros.
*Victor Lúcio Cavalcanti Poroca é colaborador do escritório Almeida e Barros.