“Confusão na área” - Contratos de trabalho e direitos de imagem de atletas e artistas
Salvador Ceglia Neto*
Inicialmente, cumpre entender o porquê da assinatura de múltiplos contratos com esses profissionais, decorrente de alguns fatores principais:
a) da onerosidade excessiva dos contratos de trabalho no que tange às obrigações trabalhistas e ao cumprimento das chamadas “leis sociais” (estas, na verdade têm provocado desemprego crescente e que só não se torna devastador pelo ingresso de parte dessa mão de obra na chamada economia informal);
b) da onerosidade fiscal desmedida com a incidência do imposto de renda retido na fonte, que não permite ao trabalhador nenhuma defesa contra a voracidade fiscal;
Nessas condições e para que seja possível, de um lado, maior economia para os clubes e emissoras de televisão com relação às leis sociais, e de outro lado, para permitir que atletas e artistas, usufruam da economia de tributos, normalmente através da constituição de pessoas jurídicas para gerir os direitos de imagem e conexos que lhes propiciem um adequado planejamento fiscal.
A cada ação corresponde uma reação; a cada abuso fiscal corresponde um contra-ataque elisivo dos contribuintes, cujo limite é a criatividade humana, para que não se caia na evasão ou sonegação fiscal.
Aqui no Brasil ocorrem abusos de parte a parte; para escapar dos abusos fiscais e sociais, muitas vezes estabelece-se um valor irrisório para o contrato de trabalho e o grosso da remuneração é pago a título de licença de uso.
Essas necessidades acabam provocando algumas distorções, a par de se tornarem injustas também com o fisco, que, atrás da parte do leão, acaba, no mais das vezes, só tomando o leite do gatinho. Rasga-se o direito, confundindo-se institutos totalmente distintos, à conta desses abusos.
Para evitar isso, na Espanha, por exemplo, há legislação que limita a 15% do total dos rendimentos, a parte relativa ao direito de imagem, na busca de se encontrar algum equilíbrio na relação trabalho x imagem x tributação.
Com o fim do passe dos atletas esse fato passa a ter outros importantes reflexos, uma vez que a Justiça do Trabalho tem considerado o contrato de imagem (de natureza civil), como uma extensão do contrato de trabalho, atribuindo ao atraso no pagamento dele (contrato de imagem) a própria rescisão motivada do contrato de trabalho, com consequências, muitas vezes, milionárias.
Alguns atletas beneficiaram-se enorme e desproporcionalmente de tais descumprimentos ficando antecipadamente livres para firmar novos e milionários contratos com outros clubes, alem de receber metade da remuneração contratada no acordo rescindido, uma vez que a rescisão “motivada” dos contratos de trabalho lhes assegurar tal direito e os desobrigou do pagamento da multa rescisória, que, hoje, em realidade, com o fim do passe, passa a ser o fator motivador do cumprimento do contrato de trabalho. Os clubes, nesses casos, ficaram com o prejuízo do investimento não resgatado.
Em muitos contratos há total desproporção entre o valor do contrato e o da multa rescisória, sendo esta muito superior àquele.
Embora não haja disposição legal específica na legislação trabalhista, a lei civil não permite que a cláusula penal supere o valor do contrato. Aqui, a multiplicidade de contratos pode trazer um novo efeito, agora com a prevalência dos aspectos civis, para estabelecer-se, judicialmente, a limitação do valor da multa rescisória contratada.
A conclusão a que se chega é que abusos geram abusos, e em consequência, insegurança jurídica, havendo muito o que caminhar para que se pacifiquem os procedimentos, sem prejuízo da criatividade jurídica, a que, afinal, como todos os outros, também fazem jus os artistas e atletas, que fazem da criatividade a sua arte maior.
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* Advogado do escritório Ceglia Neto, Advogados
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