Quando nesta segunda-feira começar, na cidade de São Paulo, a XXIII Conferência Nacional da Advocacia Brasileira, um evento realizado desde 1958, estaremos dando início a uma maratona de debates como poucas vezes houve no âmbito do Direito brasileiro. Debates amplos e diversos, que remetem à inclusão social à organização do Estado não como um ente que recai sobre a sociedade, mas como ente que deve servir a ela.
A conferência bem poderia ser focada em uma atividade profissional, o que faria dela meramente um encontro corporativo. Felizmente, pela própria cultura das organizações de advogados, o evento se estende para além de interesses localizados dos advogados. É uma conferência que mira na cidadania e o faz na amplitude das discussões propostas: 40 painéis temáticos e mais de 230 palestrantes estarão pondo em debate temas que interessam a todos. Mesmo a quem não houve: registre-se que muitos dos painéis terão tradução na Língua Brasileira de Sinais (Libras).
Isso somente valoriza a conferência enquanto o maior evento jurídico da América Latina, realizada a cada três anos e que em 2017 deverá reunir dezenas de milhares de advogados de todo o Brasil, parta debater os temas ligados, sim, à classe, mas, como posto, afeito à toda a sociedade brasileira.
É realmente inspirador e encorajador que a advocacia se detenha em debates que coloquem temas como os direitos humanos, a inclusão social, diversidade sexual e gênero, dignidade da pessoa humana estejam na lista dos painéis em discussão na conferência.
O debate é um caminho à cidadania e esta trilha felizmente foi sempre usada pela Ordem dos Advogados do Brasil, que sempre compreendeu que o exercício profissional da advocacia não pode nem deve ser feito com embargo do interesse público. Afinal, como nos ensinou o mestre Evandro Lins e Silva, o advogado é, antes de tudo, um cidadão. Assim, é razoável que a Conferência Nacional da Advocacia seja um evento no qual estejam presentes as ideias poderosas de liberdade civil, cidadania e respeito às diferenças.
Quando se mencionam aqui as ideias poderosas, falam-se daquelas ideias que podem mudar o mundo para melhor, sobretudo se discutidas e aperfeiçoadas no âmbito da lei e de sua aplicação.
Ao citarmos essa possibilidade, não se está aqui fazendo exercício de retórica. Está-se afirmando que a conferência tem a compleição de um encontro de cidadania a partir de sua própria programação, que inclui nos primeiros painéis, temas como a dignidade da pessoa humana, as garantias do direito de defesa, as prerrogativas do advogado como mecanismo garantidor da cidadania, igualdade de gênero no âmbito da advocacia e segurança pública enquanto um direito básico.
A conferência vai ter o I Encontro Nacional da Advocacia Negra, bem mais que uma ação afirmativa pontual: um dedo na ferida do preconceito racial que cuidamos em nos perceber ou ignorar por vontade própria.
A amplitude dos debates e a diversidade dos temas fazem do evento algo muito universal, porque em 40 painéis ao longo de três dias, abre espaços de discussão que podem realmente guiar alterações positivas não somente para os advogados, mas para o conjunto da sociedade.
Tomo por exemplo o painel 22, marcado para a terça-feira, 28 de novembro, que vai debater diversidade sexual e de gênero, tema controverso e que muitas vezes é tratado não à luz do conhecimento, mas do preconceito, que nada mais é algo nascido na falta de um saber sobre algo ou alguém. O afastar do preconceito certamente poderá ser útil para melhor aceitação da igualdade e de ações afirmativas, as quais estarão em pauta no dia 29, no painel 31 da conferência.
Se foca em um tema de grande especificidade como diversidade de gênero sexual, a edição de número 23 da Conferência Nacional da Advocacia Brasileira também trilha caminhos de interesse geral, todos situados nos painéis da quarta-feira, 29 de novembro. Naquele dia, estarão em debate temas mais afeitos a tornar o Estado um fardo menos pesado para a sociedade que o sustenta.
Os painéis do dia 29 discutem transparência pública, ética e orçamento; as causas da corrupção e seu devido combate; reforma administrativa; o desafio da eficiência do poder Judiciário, políticas públicas, infraestrutura e desenvolvimento; reforma previdenciária. Isso significa que, para além de sua própria atuação no mundo forense, deve o advogado ter a acuidade de debater e exigir um país melhor para todos.
É nesse espaço cidadão de debate e intercâmbio de conhecimentos e ideias que estarão representados todos os Estados brasileiros, as mulheres, os advogados negros e organizações da Advocacia, como o Colégio de Presidentes de Institutos de Advogados. Todos imbuídos dos propósitos de construção de uma cidadania verdadeira, por justa, inclusiva e desprovida de preconceitos, certamente como deve ser em uma democracia plena, onde o espaço para a cidadania é grande demais para ser ocupado por mazelas e injustiças de toda natureza.
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*Álvaro Fernando da Rocha Mota é advogado. Ex-Presidente da OAB. Presidente do Instituto dos Advogados Piauienses.