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A presunção de ilegalidade das cooperativas de trabalho — avanço na jurisprudência trabalhista mineira

Antes de ser abordada a questão que os profissionais do Direito têm enfrentado diante do julgador trabalhista, que presume de forma arbitrária e sem fundamento a ilegalidade das cooperativas de trabalho, desconfiando acerca do instituto e invertendo até mesmo o princípio da presunção de regularidade de seus atos, será elucidada, de forma objetiva, a importância das sociedades cooperativas de trabalho, seus aspectos sociais e seu surgimento no Direito brasileiro, bem como será feita uma breve abordagem sobre a história cooperativista.

7/7/2006

 

A presunção de ilegalidade das cooperativas de trabalho — avanço na jurisprudência trabalhista mineira

 

Alexandre Orsi Guimarães Pio*

 

Antes de ser abordada a questão que os profissionais do Direito têm enfrentado diante do julgador trabalhista, que presume de forma arbitrária e sem fundamento a ilegalidade das cooperativas de trabalho, desconfiando acerca do instituto e invertendo até mesmo o princípio da presunção de regularidade de seus atos, será elucidada, de forma objetiva, a importância das sociedades cooperativas de trabalho, seus aspectos sociais e seu surgimento no Direito brasileiro, bem como será feita uma breve abordagem sobre a história cooperativista.

 

Do latim cooperare, a palavra cooperar denota o sentido de trabalhar simultaneamente, colaborar em trabalhos de equipe, ajudar, auxiliar.

 

Fazendo uma breve análise da história cooperativista, pode-se dizer que as cooperativas de trabalho surgiram em 1844, na Inglaterra, quando, em decorrência da Revolução Industrial, 28 artesãos perderam suas atividades para as primeiras empresas nascidas na época. Tais artesãos tiveram a iniciativa de comercializar uma eventual prestação de serviços com os tomadores daqueles trabalhos, prestação que tinha como principal fundamento a participação de todos, visando sempre a um lucro comum.

 

Posteriormente, com o desenvolvimento do ideal cooperativista, tal instituto tornou-se uma nova forma de organização, cujo objetivo final era prestar os serviços de determinada atividade, possibilitando, assim, o aproveitamento coletivo, surgindo a Lei n° 5.764/71 (clique aqui), a qual previu, definitivamente, as cooperativas de trabalho em nosso ordenamento jurídico.

 

Com o advento da Constituição Federal de <_st13a_metricconverter w:st="on" productid="1988, a">1988, a política nacional cooperativista tornou-se ainda mais efetiva, pois previa que as cooperativas de trabalho poderiam ser criadas, na forma da lei, sem autorização, sendo vedada a interferência estatal em seu funcionamento.

 

A Lei n° 8.949/94 (clique aqui) acrescentando parágrafo único ao art. 442 da CLT, em sua parte final, trouxe mais um avanço no que se refere a essas cooperativas, uma vez que inviabilizou o vínculo de emprego dos associados com estas e com os tomadores de serviços, independentemente do ramo de atividade da sociedade cooperativa.

 

Conforme se observa, o surgimento das cooperativas e a sua previsão na legislação brasileira objetivaram valorizar o trabalho de seus associados, almejando uma melhor remuneração e tornando as condições do trabalhador mais favoráveis. Assim, as cooperativas passaram a exercer um papel diretamente vinculado ao progresso socioeconômico.

 

Diante disso, o estabelecimento das cooperativas, e sua posterior expansão, devem ser considerados um dos fatores importantes ao desenvolvimento econômico, social e cultural, bem como à promoção humana.

 

A constituição das cooperativas gera uma mudança na estrutura da sociedade, colaborando, assim, com um maior desenvolvimento dos trabalhadores, dando oportunidade de trabalho ao setor menos favorecido e, conseqüentemente, valorizando a força produtiva — defrontando com o desemprego e a instabilidade econômica atual, o que, infelizmente, tem sido tratado com certo descaso pelo Poder Judiciário Trabalhista. Há de se ressaltar que a constituição de tais sociedades deverá ser feita de forma transparente, atendendo aos interesses justos e legais, colaborando para um melhor desenvolvimento social dos trabalhadores, sem prejuízo destes.

 

Ocorre, entretanto, que a maioria dos magistrados trabalhistas adota uma presunção de ilegalidade de todas as cooperativas de trabalho, baseando-se naquelas que se constituíram com o intuito de burlar a legislação trabalhista, não se atendo aos aspectos relevantes e extremamente proveitosos para o trabalhador.

 

Diante disso, trava-se uma batalha processual entre as cooperativas e os julgadores, pois tal presunção elide as provas testemunhais produzidas, a iniciativa do trabalhador em tornar-se associado, os benefícios concedidos, bem como os documentos acostados com as defesas, assinados e conferidos pelo cooperado no ato de sua adesão, deixando de examinar os requisitos legais e os atos realmente praticados pela cooperativa regularmente constituída.

 

Cumpre salientar que cabe ao postulante o ônus de provar a suposta fraude, pois esta jamais pode ser presumida, uma vez que as cooperativas estão previstas em preceito constitucional, não podendo o julgador presumir uma ilegalidade de contratação e, muito menos, desconsiderar os documentos assinados pelo cooperado, a prova testemunhal produzida pela cooperativa, entre outros atos legalmente praticados por esta, o que, infelizmente, tem acontecido com freqüência.

 

Ademais, há de ser ressaltado que à relação processual travada em um processo trabalhista — no qual se discute uma relação de emprego proveniente de um contrato celebrada entre cooperado e cooperativa — não se pode aplicar o princípio da hipossuficiência. Isso porque o cooperado não detém esta condição, em face do princípio da dupla qualidade, que consiste na atuação simultânea do cooperado na condição de “patrão” e de prestador dos serviços.

 

 

Não obstante alguns julgadores ainda estarem se valendo da presunção de ilegalidade, a jurisprudência, felizmente, tem avançado e desconsiderado tal entendimento. Em recente decisão do Tribunal Regional da 3ª Região de Minas Gerais, publicada em 18 de maio de 2006 — que, sem divergência, deu provimento ao Recurso Ordinário interposto pelos profissionais do escritório —, o Eminente Juiz Relator Hegel de Brito Bóson teceu considerações de grande valor ético e incensuráveis, as quais tomamos a liberdade de adotar e transcrever pequenos trechos:

“Não se procura perquirir da regularidade da atuação da cooperativa, passando a mesma a sofrer ônus inimagináveis à luz das regras processuais. Devem fazer prova de tudo e por tudo, quando a própria Constituição Federal reconhece a sua existência e se empenha em estimular esta e outras formas de associativismo [...]

 

Nota-se, então, uma dura peleja entre as diretrizes traçadas pelas normas legais e a interpretação dessas mesmas regras de direito pelos tribunais pátrios, havendo até mesmo juízes que entendem ser impossível a existência de cooperativa de trabalhadores, imaginando-as como malogradoras dos princípios tutelares do direito do trabalho.

 

Desse modo, não havendo prova a respeito de eventual fraude, a qual não pode nunca ser presumida, não se vê razão para desnaturar a relação havida entre os Contendentes, devendo a contratualidade ser respeitada, não só por força de lei, como dos documentos que instruem o processo.” (g.n.) (Processo: 01767-2005-024-03-00-2 ROPS — 6ª Turma — TRT da 3ª Região — Minas Gerais)

Conforme se observa, já existe um avanço em nossa jurisprudência, no sentido de considerar os aspectos relevantes das cooperativas de trabalho, não as condenando simplesmente por se tratar de instituto cooperativista. Assim, adota-se uma postura em conformidade com a nossa Lei Maior, bem como se atende ao princípio da regularidade dos atos das cooperativas, afastando a presunção de ilegalidade adotada por alguns julgadores, a qual tem prejudicado diversos trabalhadores e cooperativas, uma vez que estas têm muito o que contribuir com a sociedade, devido a seus aspectos sociais e econômicos.

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*Advogado do escritório Benício Advogados Associados

 

 

 

 

 

 

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