Direito à portabilidade numérica
Eduardo Hayden Carvalhaes Neto*
Tal facilidade permite ao usuário de serviço de telecomunicações carregar consigo um "número de telefone" (código de acesso), mesmo que troque de serviço - fixo para móvel ou vice-versa -, mude de área local ou escolha outra operadora. A portabilidade pode ser implementada em três diferentes categorias, combináveis entre si - portabilidade entre serviços, entre operadoras e geográfica. A primeira determina a portabilidade dentro de um só serviço (fixo ou móvel) ou entre diferentes serviços, enquanto a portabilidade entre operadoras permite que o código de acesso do usuário do serviço acompanhe o cliente que migra para a base de outra operadora. Já a portabilidade geográfica faculta ao usuário levar consigo o código de acesso caso migre para outra localização geográfica.
A escolha da categoria de portabilidade adequada ao Brasil é um desafio que precisará ser superado. Em breve, em um cenário de convergência dos serviços de telecomunicações, é provável que a portabilidade total seja até necessária.
O Decreto de Políticas Públicas de Telecomunicações (Decreto Federal n.º 4.733/2003) definiu que a portabilidade deverá ser implementada de maneira "mitigada", ao menos inicialmente: no Serviço Telefônico Fixo Comutado (STFC - telefonia fixa), nos casos de códigos geográficos (números comuns, de terminais fixos), a portabilidade deverá facultar ao usuário manter o número que lhe foi originalmente atribuído quando mudar de operadora de telefonia fixa, dentro de uma mesma área local (o Brasil possui atualmente cerca de 5.300 áreas locais de STFC); já nos casos de códigos geográficos (conhecidos pelos prefixos "0800", "0500"e "0300", que permitem que usuários de qualquer local do país consigam acessá-los sem o uso de Código de Seleção de Prestadora e/ou Código de Área), a portabilidade deverá ser assegurada na mudança de operadora e/ou de Área Local do STFC, dentro do território brasileiro.
A interpretação da Anatel sobre o artigo 7º do Decreto (que assegura, ainda, a diretiva de implementação de portabilidade na telefonia móvel) restringe um pouco o conceito originalmente fixado pela Agência em suas resoluções, pois a área de prestação do serviço será sim um caráter limitador da faculdade de se exercer a portabilidade numérica.
Os novos contratos de concessão de telefonia fixa, assinados pela Anatel com as concessionárias brasileiras de STFC (Telefônica, Telemar, Brasil Telecom e Embratel) em 1º de janeiro deste ano, prevêem a portabilidade de códigos de acesso como direito dos usuários do serviço, sendo o desrespeito a essa faculdade passível de sanção.
No mercado brasileiro de serviços de telecomunicações, o instituto da portabilidade carece de regulamentação implementadora. Dependendo de como o assunto for tratado, não só a criação de um Regulamento de Portabilidade de Códigos de Acesso (previsto com essa nomenclatura nos Contratos de Concessão mencionados) pode ser necessária à implementação dessa "facilidade de rede", mas também uma modificação no Plano de Numeração e nos respectivos Regulamentos de Numeração dos diferentes serviços. Além disso, será necessário mudar a própria metodologia de administração e consignação de recursos de numeração.
A introdução da portabilidade numérica, já promovida em quase 30 países, costuma trazer benefícios ao mercado: aumento da competição, melhoria da qualidade e diminuição dos preços dos serviços de telecomunicações, entre outros, tudo isso culminando no desenvolvimento do mercado de serviços de telecomunicações. Esses argumentos, por si só, já demonstram a necessidade e urgência de se discutir o tema. Tal discussão deve, necessariamente, envolver todos os interessados - órgão regulador, operadoras e usuários -, vislumbrando cenários e metas de curto, médio e longo prazos.
É primordial que o mercado brasileiro de telecomunicações inicie logo as discussões, sob pena de ficar atrasado em relação aos EUA, aos países membros da União Européia e, ainda, de privar o usuário brasileiro de benefícios palpáveis. A implementação da portabilidade deverá ser precedida de consulta pública e de audiências para aprovação do teor da regulamentação.
Se promovida de maneira responsável e adequada, a competição no mercado de telecomunicações brasileiro tem todos os requisitos para tornar o ambiente saudável aos investidores e usuários. Além disso, encontrará na portabilidade numérica uma grande aliada, ao acabar com um forte argumento de fidelização de clientes que não aqueles - qualidade e preço - reconhecidos como legítimos pelo mercado.
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*Advogado do escritório Barretto Ferreira, Kujawski, Brancher e Gonçalves – Sociedade de Advogados
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