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Tribunal: comarcas desérticas!

Cabe ao Ministério Público fiscalizar e apurar essas ocorrências no interior, porquanto há evidente desvio de finalidade, principalmente porque, nesse quadro de desrespeito aos jovens aprovados, vê-se os funcionários das prefeituras, os comissionados e os estagiários exercendo o munus do concursado.

16/10/2017

O Tribunal de Justiça da Bahia está em choque com a política de transparência que se busca no Brasil. Reclama-se do número de nomeações livres nos poderes Executivo e Legislativo; o Ministério Público fiscaliza as contratações sem concurso, o governo federal transforma cargos de livre provimento para prestigiar os concursados; insurge-se contra os prefeitos que fazem contratações sem concurso, mas o Tribunal de Justiça da Bahia resiste em nomear quem foi aprovado no último certame, realizado em 2015, para servidor do Estado, e que expirará no próximo ano, depois de já ter sido prorrogado por dois anos.

O Ministro do Planejamento, na época do movimento de opção pelo concurso, como regra para nomeação no serviço público, disse: "Ao fazer essa transformação, nós reduzimos o espaço para a nomeação de não concursados em cargos comissionados. Ao termos mais servidores de carreira, estamos criando uma cultura de valorização do servidor público".

O Tribunal derrete-se em designar comissionados para as mais variadas funções; nesses últimos dois anos, já foram indicados quase 300 comissionados com salários que, em alguns casos, ultrapassam a R$ 30 mil, onerando os cofres púbicos com a verba mensal de quase R$ 3 milhões. O desalinho do Tribunal atinge os prefeitos que se sentem obrigados a sacrificar verbas municipais para colocar à disposição dos fóruns do interior mais de 800 funcionários, a maioria dos quais sem nenhum convênio. Soma-se a essa irreverência, o desvio da atividade dos estagiários que são, quase sempre, designados para exercer trabalho nos cartórios.

Cabe ao Ministério Público fiscalizar e apurar essas ocorrências no interior, porquanto há evidente desvio de finalidade, principalmente porque, nesse quadro de desrespeito aos jovens aprovados, vê-se os funcionários das prefeituras, os comissionados e os estagiários exercendo o munus do concursado.

Diante desse quadro, não subsiste o pretexto de falta de recursos orçamentários, subterfúgio usado desde o longínquo ano de 2010.

O limite prudencial atravessou cenários mais debulosos; no primeiro quadrimestre de 2015, alcançou o indice de 5,69% do permitido 5,7% e, no mês de maio de 2017, o percentual situava-se em 5,04%, portanto com folga que permite valorizar e aproveitar os aprovados em 2015, depois de 9 anos sem concurso.

O Projeto de Lei de Organização Judiciária, em discussão no Tribunal, estabelece que os assessores dos juízes devem ser retirados do quadro de servidores, ampliando, dessa forma ainda mais, a desertificação nos cartórios. Junte-se a isso as aposentadorias de servidores, que ultrapassaram a 1.000 servidores, os pedidos de exonerações que tem crescido, sem substituição alguma nos cargos vagos nos cartórios.

O CNJ já obrigou o Tribunal de Justiça de Mato Grosso do Sul a exonerar comissionados e realizar concurso público para os cargos vagos. O Superior Tribunal de Justiça, no Piauí, obrigou a Secretaria de Educação a nomear professor aprovado em concurso, mesmo fora do número de vagas estabelecida no edital, diante da preterição com a nomeação de terceirizado na função que seria de concursado. O ministro Fux homologou acordo do Ministério Público com a estatal Furnas para desligar terceirizados e nomear aprovados em concurso público.

São louváveis tais procedimentos, porque impõe-se respeito à Constituição, no sentido de que a ocupação de cargos públicos exige concurso.

No último certame, realizado em 2015, foram inscritos mais de 135 mil candidatos, número nunca anotado nessa competição. Desse total, foram aprovados pouco mais de 2.000, mas o Tribunal não nomeou mais que 20%. A realidade da Bahia não se situa na inexistência de vagas no quadro de servidores, porquanto o próprio CNJ e a Lei de Organização Judiciária reconhecem a necessidade de um mínimo de 10 servidores em cada cartório; no total, a Bahia ressente a falta de 10 mil servidores; as Comarcas e Varas trabalham com dois, três servidores para cada cartório, quando não têm apenas um, que acumula a função que seria de três ou de cinco servidores.

Que dizer de uma Comarca que não tem nenhum oficial de justiça! Pois, na Bahia, isso é frequente. A Comarca de Encruzilhada, fronteira com Minas Gerais, com área territorial correspondente a mais de 2 (duas) vezes a extensão do município de Feira de Santana e não tem nenhum Oficial de Justiça. A Comarca de Cansanção é a "comarca do um": um escrevente, como escrivão nos processos do cível, um escrevente, como escrivão nos processo criminais, um administrador, um oficial de justiça, um oficial do Registro Civil, um Tabelião de Notas, um oficial de Registro de Imóveis. A Comarca de Cândido Sales tem um oficial que acumula a função de escrivão, cuidando dos cartórios cível e criminal.

Nem se acredita na possibilidade de novo concurso para servidor, deixando os 2.000 aprovados ao léu; se isso ocorrer haverá escândalo inominável e inaceitável, considerando o fato de 2.000 aprovados sobrar, no cenário enganoso traçado pelo Tribunal, que acomoda os funcionários das prefeituras, prioriza os comissionados, os terceirizados, os estagiários, o 2º grau, com perversidade contra os habilitados às nomeações. A Corte deve encontrar a saída para aproveitar esses jovens que deixaram empregos, usaram todo o tempo possível para os estudos, causando-lhes estresse e ansiedade, refletido em seus familiares. A obtenção do êxito, depois de todo esse sacríficio, não pode ser em vão e desmantelar o sonho de tanta gente.

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*Antonio Pessoa Cardoso é advogado no escritório Pessoa Cardoso Advogados.

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