A Comissão de Constituição e Justiça e de Cidadania tem o papel relevante no controle preventivo de constitucionalidade, cuja função precípua é analisar a compatibilidade de proposições legislativas com o texto da Constituição Federal.
A referência a um órgão técnico, na história da Câmara dos Deputados, voltado para a análise de constitucionalidade das proposições, remonta ao Regimento vigente em 1823, que fazia menção a uma "Comissão da Constituição". (Cascelli, 2001, p.38).
Nos anos subsequentes, o Regimento da Câmara dos Deputados chegou a fazer referências a uma "Comissão da Guarda da Constituição", "Comissão de Constituição e Poderes", "Comissão de Constituição, Legislação e Justiça" e "Comissão, Legislação e de Justiça".
Apenas em 1920, porém, houve previsão das atribuições da Comissão de Constituição e Justiça: "Art. 68. À Commissão de Constituição e Justiça compete manifestar-se sobre todos os assmptos quanto ao seu aspecto jurídico, legal ou constitucional". (Cascelli, 2001).
Segundo Cascelli (2001), em 1949 ampliou-se a competência, tornando explícita a atribuição para análise, por um lado, do controle jurídico formal de todas as proposições e, por outro lado, para apreciação de matérias de interesse da Comissão, ou seja, cujo mérito o Regimento lhe deferisse exclusividade.
O texto regimental de 1972 introduziu o efeito terminativo das decisões da Comissão: se dois terços de qualquer Turma ou se a maioria absoluta da composição total julgasse inconstitucional uma determinada proposição ou parte relevante dela, a matéria seria imediatamente remetida ao Plenário da Casa para discussão prévia. Se o Plenário confirmasse a decisão da Comissão ocorreria o arquivamento. Caso contrário, a matéria voltaria a tramitar normalmente (Cascelli, 2001, p. 41).
Anos depois o texto foi aperfeiçoado e até estabeleceu que da decisão de inconstitucionalidade, a proposição seria automaticamente arquivada pelo presidente da Casa. Outra novidade foi a possibilidade de recurso do autor da proposição ou de um Líder partidário em até quinze sessões, com o intuito de haver apreciação pelo Plenário, do parecer da Comissão. Nesta esteira, caso fosse mantido o parecer, a matéria estaria automaticamente arquivada. Caso contrário, voltaria a tramitar.
O primeiro aspecto importante em relação à Comissão de Constituição e Justiça e de Cidadania é o chamado parecer terminativo, previsto no art. 54 do Regimento Interno. Um parecer pode ser considerado terminativo quanto à constitucionalidade ou juridicidade da proposição.
A análise de constitucionalidade na Comissão é realizada dentro de uma perspectiva técnica, com o objetivo de verificar se as proposições estão de acordo com os preceitos estabelecidos na Constituição. No que se refere à juridicidade, a análise é da adequação de princípios maiores que formam o ordenamento jurídico, à Constituição.
A injuridicidade de uma proposição pode ser apurada a partir da percepção de um conflito com os princípios consagrados no ordenamento jurídico, que estão explicitamente positivados. Para esse efeito, a proposição há que conter elementos ilógicos, não razoáveis, que, mesmo em uma observação mais aprofundada, podem ser detectados, porque afrontam o bom senso. (Cascelli, 2001).
Além da constitucionalidade e da juridicidade, não se pode ignorar o aspecto político empregado na análise de proposições da Comissão de Constituição e Justiça e de Cidadania. Segundo muito bem definido por Cascelli (2001) a expressão "política" traz acepções diversas, e há uma tendência a privilegiar, quando se fala de política no âmbito do parlamento, uma significação estritamente partidária, que lhe é indissociável. E é exatamente neste contexto político que surgem as interferências dos grupos de pressão, também indissociáveis das deliberações realizadas na Comissão.
Atualmente, em qualquer caso, a CCJC apresenta o chamado parecer terminativo, que, caso seja negativo (pela inconstitucionalidade ou injuridicidade ou ambos), aniquila a proposição, remetendo-a ao arquivo, salvo se apresentado recurso. A apresentação de recurso motiva a apreciação preliminar em Plenário, nos moldes previstos no art. 144 e seguintes do Regimento Interno.
Dentre as comissões permanentes, é a CCJC a única regimentalmente competente para o exame de constitucionalidade das proposições. Mesmo quando a matéria vai a Plenário da Casa, não havendo tempo para apreciação na Comissão, por razão de necessidades políticas, ainda assim, deve ser nomeado um de seus membros para a elaboração de parecer sobre constitucionalidade, juridicidade e técnica legislativa, em substituição ao colegiado respectivo.
Além disso, as reiteradas decisões da CCJC foram paulatinamente sedimentando o entendimento da Comissão sobre determinados assuntos, e por fim, à utilização do dispositivo regimental (art. 62, IX), que prevê a organização da súmula de entendimentos. Assim, a Comissão pode oferecer subsídios técnicos ao Presidente da Câmara para minorar, inclusive, o seu constrangimento político ao devolver as proposições apresentadas flagrantemente inconstitucionais.
Como afirmado anteriormente, na prática, o caráter político, ao ser apreciada uma determinada matéria, pode prevalecer sob os aspectos constitucionais. As súmulas são apenas um referencial para os trabalhos da Casa. Portanto, este controle de constitucionalidade fica mitigado, já que as decisões emanadas da Comissão não ficam atreladas às súmulas, o que fragiliza o processo legislativo. Se elas existem e foram criadas devem ser levadas em consideração no momento da deliberação e votação.
Não obstante a existência de orientações quanto a aspectos de constitucionalidade e juridicidade, a presença de grupos de pressão gera interferências nas decisões. Na verdade, o problema não é a existência desses grupos, considerando que com a Constituição de 1988 a uma nova perspectiva veio à tona, quando trouxe em seu texto ampla participação popular nas tomadas de decisões. Além disso, no bojo da Constituição há elementos que legitimam a atividade, como prática lícita de luta de interesses no âmbito da criação de leis.
O que devemos atentar é que grupos de interesse são representações não-oficiais, que adotam postura direta de influência e pressão sobre autoridades públicas, principalmente na esfera do Executivo e Legislativo. O problema é a maneira pela qual se dá essas interferências.
Portanto, em muitos momentos o controle de constitucionalidade preventivo que deve ser exercido pela Comissão de Constituição e Justiça e de Cidadania é relativo, já que a questão política acaba por preponderar sobre as questões constitucionais.
A impossibilidade de haver recurso para pareceres favoráveis proferidas pela Comissão de Constituição e Justiça e de Cidadania, ou seja, que reconheçam a constitucionalidade e juridicidade de uma proposição fragiliza o controle de constitucionalidade.
Quando a CCJC aprova um parecer pela inconstitucionalidade ou injuridicidade da matéria apreciada, esta só não será arquivada se for objeto de recurso, o que fará com que ela seja submetida ao Plenário em apreciação preliminar.
A apreciação preliminar só ocorre se o parecer da CCJC for desfavorável. Esta é a práxis e vem sendo a interpretação majoritária da Casa. Deveria haver a possibilidade de apresentação de recurso contra o parecer terminativo da CCJC, seja ele favorável ou não.
Concluindo a CCJC pela constitucionalidade, hoje não haveria possibilidade da matéria ser levada a Plenário, terminando-se então a apreciação pela Casa. A abertura de recurso nessa fase é de primordial importância para se resguardar o controle de constitucionalidade. Somente um recurso é capaz de levar a matéria para que se sujeite ao crivo dos demais parlamentares, no Plenário. E, assim, solidificar um sistema democrático e mais eficiente de controle de constitucionalidade na criação das leis e esgotamento da esfera legislativa.
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AZEVEDO, Luiz H. Cascelli de. O Controle Legislativo de Constitucionalidade. 1ª ed. Porto Alegre: Sergio Antonio Fabris Editor, 2001.
BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil. 31ª ed.São Paulo.Saraiva, 2009.
BRASIL. Congresso. Câmara dos Deputados. Regimento Interno da Câmara dos Deputados. [recurso eletrônico]: aprovado pela Resolução no 17, de 1989, e alterado até a Resolução no 20, de 2016. – 18. ed. – Brasília: Câmara dos Deputados, Edições Câmara, 2017.
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