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Sarahah: o novo Secret?

O Secret pode ter ido embora, mas certamente não levou consigo a atratividade do anonimato, que permaneceu vivo, aguardando outra ferramenta que o decidisse explorar. Eis que esse novo aplicativo aparece. É o Sarahah (se ainda não sabe do que se trata, pergunte a algum adolescente).

7/8/2017

Presumo que todos se lembram do aplicativo Secret, que abalou a internet brasileira em 2014.

Tal aplicativo permitia aos usuários a postagem de mensagens anônimas a serem exibidas para seus amigos. Em seus termos de uso, o aplicativo prometia total anonimato, apresentando-se como uma poderosa ferramenta para que as pessoas pudessem tirar do peito algumas difíceis confissões (intenções suicidas e homossexualidade, por exemplo), ante os julgamentos que normalmente ocorrem nas redes sociais.

Contudo, como era de se imaginar, alguns usuários resolveram desvirtuar o propósito da plataforma, utilizando-a como um palco para expressar seus discursos de ódio e distribuir ofensas, fazendo emergir o lado negro do anonimato, que causa sensação de incapacidade ao prejudicado que não encontra quem responsabilizar.

Para piorar, a empresa que gerenciava o aplicativo não tinha sede no Brasil e se mostrou incapaz de responder às solicitações de retirada de conteúdo e identificação de usuários, o que culminou na determinação judicial de que o aplicativo fosse removido das lojas virtuais da Google e da Apple, pouco antes de seu fundador anunciar, de vez, o encerramento das atividades.

Pois bem. O Secret pode ter ido embora, mas certamente não levou consigo a atratividade do anonimato, que permaneceu vivo, aguardando outra ferramenta que o decidisse explorar.

Eis que esse novo aplicativo aparece. É o Sarahah (se ainda não sabe do que se trata, pergunte a algum adolescente).

O Sarahah é um pouco diferente do Secret. Será, então, que ele conseguirá evitar problemas jurídicos e escapar do destino fatídico do seu precursor? Vejamos.

Funcionamento

O Sarahah é muito simples.

Após o cadastro, o usuário pode procurar por outros usuários. Encontrada a pessoa desejada, o usuário só tem uma possibilidade: enviar uma mensagem. Essa mensagem aparece apenas ao usuário destinatário, sem que ele saiba quem enviou. Além disso, quem recebe não consegue responder ou interagir de volta com o remetente.

É só.

Anonimato

A princípio, cabe pontuar que o anonimato, ao nosso ver, não é impraticável no Brasil. Muito embora a Constituição, em seu art. 5º, I, diga ser "livre a manifestação do pensamento, sendo vedado o anonimato", na verdade o que não se admite é a impossibilidade de identificação do autor de uma postagem. Logo, nada obsta que a princípio uma mensagem apareça como anônima, desde que a ferramenta tecnológica garanta os meios para que o ofendido consiga perseguir a identificação do usuário autor do conteúdo, caso pretendida a reparação de danos.

O Sarahah, em seus termos de uso, já adianta que não irá revelar a identidade dos remetentes a qualquer usuário, a não ser que o remetente consinta com essa revelação.

Nesse contexto, resta saber se o Sarahah se mostrará capaz de responder a contento a demandas judiciais para identificação de seus usuários, de forma diferente do que fez o Secret.

Exposição das Postagens

Nesse quesito o Sarahah difere do Secret. Neste, as postagens do usuário apareciam indiscriminadamente a toda sua base de amigos. Já no Sarahah, as mensagens são privadas, destinadas a um único usuário. Isso, evidentemente, significa uma menor repercussão de um conteúdo ofensivo, pois ele fica aparente apenas para o destinatário. Claro que isso não exclui a possibilidade de o ofendido buscar a reparação; o dano, no entanto, é potencialmente menor do que no Secret.

Resta lembrar que o usuário do Sarahah pode se valer de uma função que desativa os comentários anônimos na plataforma ou, ainda, optar por não ser encontrado por meio da busca, o que minimiza o risco de ofensas.

Insta Stories e Snapchat

Ainda tratando do nível de exposição das mensagens enviadas no Sarahah, nota-se que seus usuários têm se valido de uma prática interessante: ao receberem as mensagens privadas e sendo eles incapazes de responder e interagir de volta com o remetente, os usuários tem tirado print das mensagens e postado no Instagram, por meio da ferramenta Insta Stories, ou no Snapchat, de maneira que conseguem escrever por cima do print a resposta que gostariam de dar. Assim, basta que o remetente siga a conta de Instagram/Snapchat do destinatário que se obtém a desejada interação, o que potencializa a funcionalidade do Sarahah e, logo, o interesse de seus usuários.

Assim sendo (e como tudo que serve ao bem serve também ao mal), percebe-se que o potencial ofensivo de uma mensagem enviada via Sarahah cresce, na medida em que esta pode ser replicada a uma base inteira de amigos de um usuário do Instagram/Snapchat. Nesse caso, obviamente, o usuário que replica a mensagem em seu Instagram/Snapchat se vê responsável pelo conteúdo original recebido no Sarahah, o que requer atenção de quem recebe uma mensagem desse cunho.

Sede da Empresa Desenvolvedora

Como vimos, um dos empecilhos para a continuidade do Secret no Brasil foi a ausência de presença em território brasileiro, de modo a responder e cumprir determinações judiciais em nosso país.

Nesse ponto, o Sarahah não é diferente. Sua empresa desenvolvedora (Indielabs) tem sede na Arábia Saudita e não se tem notícia de que haja qualquer representante em solo brasileiro.

Logo, é de se imaginar que, caso continue assim, o Sarahah corre sério risco de acabar tendo o mesmo destino do Secret.

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*Paulo Vidigal é advogado e sócio do escritório Mauricio Vidigal Advogados Associados.

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