Algumas disposições gerais sobre o regime de bens entre os cônjuges no novo Código Civil
Daniela Vasconcelos Lemos de Melo Borges*
Inúmeras alterações foram trazidas pelo novo ordenamento jurídico, especialmente no Direito de Família, dentre elas, o sistema de regime de bens que, além de ter introduzido uma nova espécie de regime, possibilita a sua mudança durante o curso do casamento, o que antes era expressamente vedado.
Observe-se que tal alteração não poderá ser feita de qualquer forma, eis que há a necessidade do pedido ser motivado e assinado por ambos os cônjuges e de autorização judicial para tanto, devendo ser ressalvados os direitos de terceiros, até mesmo porque essa alteração poderá ser utilizada como uma forma de fraudar os direitos de credores.
A discussão que surge dessa nova disposição legal é saber se os casamentos contraídos até 10 de janeiro de 2003, poderão também se valer da mudança de regime, haja vista que nesse ordenamento tal previsão não existia. E esta discussão se impõe na medida em que a disposição final e transitória do novo Código Civil prevê, em seu artigo 2.039, que “O regime de bens nos casamentos celebrados na vigência do Código Civil anterior, lei nº 3.071, de 1º de janeiro de 1916, é o por ele estabelecido”; e a impossibilidade dos casais que tiverem contraído matrimônio na vigência do Código Civil anterior alterar o seu regime de bens poderá ferir o princípio constitucional da igualdade.
Dessa forma, entendemos que por se tratar de norma de ordem pública de aplicação imediata e ser o casamento uma relação continuada, à semelhança da Lei do Divórcio, deverá esse novo dispositivo ser aplicado a todos os casamentos existentes. Ademais, o novo Código Civil revogou o anterior, não havendo, por conseguinte, que se falar em vedação à alteração de regime outrora existente.
Além dos regimes de bens já conhecidos, como a comunhão universal, a comunhão parcial e a separação total de bens, nos quais o legislador não trouxe alterações muito significativas, foi introduzido o sistema de participação final nos aquestos, segundo o qual “cada cônjuge possui patrimônio próprio, e lhe cabe, à época da dissolução da sociedade conjugal, direito à metade dos bens adquiridos pelo casal, a título oneroso, na constância do casamento” (definição trazida pelo artigo 1.672 do novo Código Civil).
Com relação a esta última espécie, os bens que cada cônjuge possuir ao casar e aqueles que adquirir na constância do casamento, a qualquer título, integrará o patrimônio próprio, cabendo-lhe exclusivamente a sua administração, inclusive com a alienação dos bens móveis. Apenas quando houver dissolução da sociedade conjugal é que os aquestos serão partilhados, hipótese em que cada cônjuge permanecerá com os bens adquiridos anteriormente ao casamento e os que em seu lugar se sub-rogarem, os que sobrevieram por sucessão ou liberalidade e as dívidas relativas a esses bens.
De qualquer forma, permanece a comunhão parcial de bens como o regime legal aplicável caso não exista convenção (pacto antenupcial) dispondo de forma contrária, ou caso não seja esta considerada nula ou ineficaz, hipóteses ocorrentes caso o pacto antenupcial não seja feito por escritura pública ou não lhe seguir o casamento. Da mesma forma, permanece obrigatória a separação de bens nas hipóteses de casamento de pessoas maiores de sessenta anos, independentemente de se tratar de homem ou mulher, daqueles que necessitarem de suprimento judicial para casar e, ainda, no caso de não serem observadas pelos contraentes as causas suspensivas da celebração do casamento.
Qualquer que seja o regime de bens escolhido, tanto o marido como a mulher poderão livremente praticar todos os atos de disposição e de administração necessários ao desempenho de sua profissão, exceto alienar ou gravar com ônus real bem imóvel, administrar os bens próprios, desobrigar ou reivindicar os imóveis que tenham sido gravados ou alienados sem o seu consentimento ou suprimento judicial, demandar rescisão de contratos de fiança e doação ou invalidação do aval realizados pelo outro cônjuge ao concubino se provar que não foram adquiridos pelo esforço comum deles, se o casal estiver separado de fato por mais de cinco anos.
Não depende de autorização do outro cônjuge a compra das coisas necessárias à economia doméstica, ainda que seja feita a crédito, e a obtenção de empréstimo que a aquisição dessas coisas exija. Para o pagamento dessas dívidas, os cônjuges serão solidariamente responsáveis.
Excetuada a hipótese de casamento realizado sob o regime de separação absoluta de bens, não poderão os cônjuges, sem a autorização do outro, alienar ou gravar com ônus real imóvel, conforme mencionado anteriormente, e também demandar em juízo sobre esses bens ou direitos, prestar fiança ou aval, fazer doação de bens comuns. As doações feitas aos filhos quando casarem ou estabelecerem economia separada são consideradas válidas.
A falta de autorização de um dos cônjuges, sem motivo justo, poderá ser suprida judicialmente e, nesse caso, o ato será anulável até dois anos após o fim da sociedade conjugal. A aprovação posterior poderá validar esse ato, desde que feita por instrumento público ou particular autenticado. Além disso, a decretação da nulidade do ato só poderá ser pleiteada pelo cônjuge, a quem cabia autorizar, ou por seus herdeiros.
Assim, caberá ao interessado melhor analisar as novas disposições gerais conjuntamente com os regramentos específicos de cada regime, para que possa escolher aquele que melhor se adequa às suas necessidades pessoais.
_________________
* Advogada do escritório Ceglia Neto, Advogados
___________________