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Aquisição imobiliária por consórcio: ato único, para fins de cobrança de emolumentos, como direito do consumidor

A figura da cobrança por ato único para efeito de emolumentos, contempla a cobrança de um único ato lançado na matrícula do imóvel, via de regra, o de maior valor, ensejando a gratuidade dos demais atos relativos ao mesmo ato jurídico ou negócio jurídico circunscrito pelo legislador.

10/4/2017

A aquisição imobiliária de imóvel rural ou urbano, por intermédio de autofinanciamento por grupo de consórcio, recebeu tratamento diferenciado pelo legislador federal por meio da lei 11.795/08 – Lei do Sistema de Consórcio, por meio de expressiva redução no valor das custas, taxas e emolumentos desembolsado pelo consumidor perante o Cartório de Registro de Imóveis.

Desse modo, os atos de aquisição de imóvel, com recursos advindos de sistema de consórcios, foram considerados como ato único, para efeitos de cálculo de taxas, emolumentos e custas, conforme o artigo 45 da lei federal 11.795/08, in verbis:

“Art. 45. O registro e a averbação referentes à aquisição de imóvel por meio do Sistema de Consórcios serão considerados, para efeito de cálculo de taxas, emolumentos e custas, como um único ato”. (grifo aposto)

A figura da cobrança por ato único para efeito de emolumentos, contempla a cobrança de um único ato lançado na matrícula do imóvel, via de regra, o de maior valor, ensejando a gratuidade dos demais atos (registros e averbações) relativos ao mesmo ato jurídico ou negócio jurídico circunscrito pelo legislador. A cobrança, pois, só se dará em relação ao primeiro ato registral (registro da compra e venda), não vencendo emolumentos nos outros atos lançados na matrícula, que instrumentalizam a aquisição imobiliária, por sistema de consórcio, ainda que ultimados em momento distinto. Tal dinâmica, para melhor compreensão, pode ser sintetizada pela sentença: “um ato pago e os demais gratuitos na aquisição imobiliária por consórcio”.

Nesse passo, a limitação da remuneração do titular do Cartório de Registro de Imóveis, pela cobrança por ato único, para efeito de emolumentos, quando necessários copiosos atos registrais (registros e averbações) relativos ao mesmo ato jurídico ou negócio jurídico, não é novidade no ordenamento jurídico emolumentar, como se observa no art. 237-A, § 1º, da lei federal 6.015/73:

“Art. 237-A. Após o registro do parcelamento do solo ou da incorporação imobiliária, até a emissão da carta de habite-se, as averbações e registros relativos à pessoa do incorporador ou referentes a direitos reais de garantias, cessões ou demais negócios jurídicos que envolvam o empreendimento serão realizados na matrícula de origem do imóvel e em cada uma das matrículas das unidades autônomas eventualmente abertas.

§ 1o Para efeito de cobrança de custas e emolumentos, as averbações e os registros relativos ao mesmo ato jurídico ou negócio jurídico e realizados com base no caput serão considerados como ato de registro único, não importando a quantidade de unidades autônomas envolvidas ou de atos intermediários existentes”. (grifo aposto)

Aliás, em inúmeras oportunidades a Corregedoria Geral de Justiça bandeirante já teve a oportunidade de sedimentar a validade da principiologia da cobrança por ato único, para efeito de emolumentos, em face da legislação estadual emolumentar, como se observa em julgado que determinou que o ato único, para efeito de cobrança de emolumentos, em loteamento e incorporação imobiliária, por força do art. 237-A, § 1º, da lei 6.015/73, ostenta aplicação em todos os atos registrais deflagrados no interregno do registro do empreendimento (inclusive) até a respectiva conclusão, in verbis:

“Por isso, a interpretação adequada há de ser a de que, não só os registros e averbações feitos após o registro do empreendimento até o "habite-se", mas também aqueles feitos concomitantemente ao registro da incorporação e loteamento, devem ser cobrados como ato único, para fim de cálculo de custas e emolumentos. Essa conclusão afasta a tese da inaplicabilidade do art. 237-A aos loteamentos, nos quais o registro da hipoteca dá- se concomitantemente ao do próprio empreendimento, sendo condição indispensável deste”. (Processo CGJ 119225/10, São Paulo/SP, j. 06.06.2011, relator Marcus Vinicius Rios Gonçalves) (grifo aposto)

O Conselho Nacional de Justiça, por sua vez, referendou, em âmbito nacional, a validade da cobrança como ato único, para fins de cálculo de custas e emolumentos, dos atos prescritos no art. 237-A, §1º, da lei 6.015/73, afastando a hipótese de isenção tributária heterônoma em face da legislação emolumentar estadual, in verbis:

PEDIDO DE PROVIDÊNCIAS. AVISO 421/2009 da CGJRJ – INTERPRETAÇÃO DO ART. 237-A DA LEI 6.015/73 – INCLUSÃO PELO ART. 76 DA LEI 11.977/09 – APLICAÇÃO GERAL A TODOS OS PARCELAMENTOS E INCORPORAÇÕES IMOBILIÁRIAS – AFASTAMENTO DA INTERPRETAÇÃO QUE RESTRINGE SUA INCIDÊNCIA AOS IMÓVEIS OBJETO DO PROGRAMA MINHA CASA, MINHA VIDA – PMCMV.

I – Pelo Aviso 421/09, a Corregedoria Geral de Justiça do estado do Rio de Janeiro considerou que o art. 237-A, § 1º, introduzido na lei 6.015/73 pela lei 11.977/09, que dispõe, dentre outros assuntos, sobre o programa Minha Casa, Minha Vida – PMCMV, aplicar-se-ia, exclusivamente, às incorporações imobiliárias objeto do referido programa.

II – Interpretação que não se coaduna com a interpretação histórica, sistemática e teleológica a ser conferida ao novel dispositivo, já que a nova disciplina insere-se na competência privativa da União prevista no art. 22, XXV da CF, não se cuida de isenção tributária heterônoma e visa atenuar os custos da incorporação imobiliária para reduzir o conhecido déficit habitacional brasileiro.

III – O art. 237-A, § 1º da lei 6.015/73 aplica-se a todos os parcelamentos e incorporações imobiliárias, não se encontrando restrito às incorporações objeto do Programa Minha Casa, Minha Vida – PMCMV.

IV – Voto no sentido de anular o Aviso nº 421/2009 da CGJRJ e expedir recomendação para que todos os Tribunais de Justiça apliquem a interpretação conferida por este voto ao art. 237-A, § 1º da lei 6.015/73. (Processo CNJ 0005525-75.2009.2.00.0000, Brasília/DF, j. 12.05.2011, relator Eliana Calmon) (grifo aposto)

Seguindo essa ordem de ideias, o egrégio STJ, em julgado paradigma, reconheceu a necessidade de observância da cobrança, por ato único, para fins de emolumentos, dos inúmeros atos envolvidos na inscrição da incorporação imobiliária no fólio real, com lastro no art. 237-A da lei 6.015/73, in verbis:

“RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DE COBRANÇA. EMOLUMENTOS. ATO NOTARIAL DE AVERBAÇÃO RELATIVO À QUITAÇÃO DA AQUISIÇÃO DE LOTES (DESTINADOS A CONSTRUÇÃO SOB O REGIME DE INCORPORAÇÃO IMOBILIÁRIA), EFETIVADO NA MATRÍCULA DE ORIGEM, BEM COMO NAS MATRÍCULAS DAS UNIDADES IMOBILIÁRIAS ADVINDAS DO EMPREENDIMENTO. ART. 237-A DA LEI DE REGISTROS PÚBLICOS. OBSERVÂNCIA. ATO DE REGISTRO ÚNICO, PARA FINS DE COBRANÇA DE CUSTAS E EMOLUMENTOS. RECURSO ESPECIAL IMPROVIDO. (STJ, Resp 1.522.874.-DF, rel. Min. Marco Aurélio Bellizze, 3a T, DJ 09.06.2015) (grifo aposto)

Destarte, ilustra-se, por exemplo prático, os atos indispensáveis para a aquisição de imóvel, por sistema de consórcio, perante o Cartório de Registro de Imóveis, com indicação das respectivas custas e emolumentos, com base na Tabela de Emolumentos do Estado de São Paulo, para, ao depois, identificar a relevância do desconto decorrente da aplicação do ato único para efeito de cobrança de emolumentos.

Para tanto, considerar-se-á que o consorciado foi contemplado, com crédito de R$ 200.000,00, utilizado para aquisição de apartamento, que foi dado em garantia de alienação fiduciária para assegurar o cumprimento da obrigação pecuniária, no valor de R$ 170.000,00, do contemplado perante o grupo de consórcio, resultando, até a aquisição plena da propriedade, nos seguintes atos registrais e respetivos emolumentos:

R-1. Registro da Compra e Venda. (Emol. R$ 1.798,84);
R-2. Registro da Alienação Fiduciária em garantia (Emol. R$ 1.662,64);
Av-3. Averbação do teor do §7º do artigo 5º da Lei nº 11.795/08 (Emol. R$ 26,13);
Av-4. Averbação do Cancelamento da Alienação Fiduciária (Emol. R$ 433,68) ”

Em decorrência, se não houvesse a cobrança por ato único, o consumidor desembolsaria o expressivo valor de R$ 3.921,29 perante o Cartório de Registro para pagar todos os atos necessários à aquisição do imóvel por meio do sistema de consórcio. Aqui também foi considerado o cancelamento da garantia de alienação fiduciária, eis que é ato referente à aquisição do imóvel, pois se não houver o respectivo cancelamento, a propriedade fiduciária (resolúvel) continuará em propriedade do grupo de consórcio, ou seja, só com tal cancelamento o consorciado alcançará a propriedade plena do imóvel, na esteira do art. 22 da lei 9.514/97.

com a aplicação da cobrança por ato único, para fins de emolumentos, o consumidor pagará tão somente o valor de R$ 1.798,84, correspondente ao valor do registro da compra e venda (R-1), restando os demais atos (R-2, Av-3 e Av-4) gratuitos referentes à aquisição imobiliária. Isso porque o legislador, no art. 45 da lei 11.795/08, considerou englobadas, na designação genérica de “o registro” e de “a averbação”, todos os atos de registro e de averbação, respectivamente, necessários à aquisição da propriedade imobiliária pelo consumidor, com recursos de grupo de consórcio.

Cuidou-se, desse modo, de fixar limite para a despesa do consorciado perante o Cartório de Registro de Imóveis, mediante a cobrança de emolumentos dos registros e das averbações, embora digam respeito a atos diversos, como ato único, ou seja, o registro da compra e venda, o registro da garantia (alienação fiduciária ou hipoteca), a averbação do art. 5º, § 7º, da lei aludida, e a averbação de cancelamento, são considerados ato único para efeito de cobrança de emolumentos.

Vale lembrar aqui a exortação de Carlos Maximiliano aos aplicadores da lei, em Hermenêutica e Aplicação do Direito (Forense, 14ª Ed., Rio de Janeiro, 1994, pg. 247):

"Quando o texto dispõe de modo amplo, sem limitações evidentes, é dever do intérprete aplicá-lo a todos os casos particulares que se possam enquadrar na hipótese geral prevista explicitamente; não tente distinguir entre as circunstâncias da questão e as outras; cumpra a norma tal qual é, sem acrescentar condições novas, nem dispensar nenhuma das expressas".

Em contraponto, as eméritas entidades da classe registral paulistas se posicionaram pelo entendimento de que a aplicação do art. 45 da lei aludida revela-se só pela gratuidade da averbação do §7º do artigo 5º da lei 11.795/08, ou seja, no exemplo prefalado, implica só no desconto simbólico de R$ 26,13 (Av-3) e na cobrança integral dos demais atos de registro e averbação (R-1, R-2, Av-4) do consumidor.

Com efeito, sob a ótica das entidades cartorárias, a cobrança por ato único ficou sintetizada como “um ato gratuito e os demais pagos”, em substituição a essência preconizada pelo artigo 45 da lei aludida, capitaneada pelo adágio “um ato pago e os demais gratuitos”. Para que o direito à redução dos emolumentos não venha a se tornar uma miragem, de bom alvitre que o consumidor ou suas entidades representativas intercedam junto às Corregedorias de Justiça, nos Estados, ou ao Conselho Nacional de Justiça, para que se uniformize a aplicação da cobrança, por ato único, trazida pelo art. 45 da lei 11.795/08.

Em suma, a interpretação sistemática e teleológica do artigo art. 45 da lei 11.795/08 autoriza a conclusão no sentido de que todos os atos necessários à aquisição imobiliária, por consórcio, embora de natureza distinta (registro e averbação), são considerados como ato único para fins de emolumentos, restringindo-se à cobrança, exclusivamente, ao registro da compra e venda, com os demais atos gratuitos.

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*Jeferson Luciano Canova é oficial de registro de imóveis, títulos e documentos, e civil de pessoas jurídicas da comarca de Mirandópolis-SP.


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