O mercado de saúde suplementar vem cada vez mais reconhecendo a relevância dos planos de saúde coletivos empresariais. É notória a redução nos últimos anos dos beneficiários de planos privados de assistência à saúde em decorrência da queda do emprego formal. Aliado à perda de beneficiários de planos coletivos, o setor também tem tido que lidar com a diminuição de beneficiários de planos individuais em razão dos altos custos dos planos de saúde, proporcionalmente inverso à renda do brasileiro, especialmente do aposentado.
Diante da crise do setor, diversas soluções têm sido levantadas como possíveis formas de mitigar a ruína do sistema, o que prejudicaria não apenas os próprios beneficiários, como também as empresas que atuam nessa indústria, desde operadoras até prestadores de serviços. Ademais, esse movimento tão-somente contribuiria para a sobrecarga do Sistema Único de Saúde (SUS).
Esse cenário, aliado a outras medidas legislativas que vem tramitando na Câmara e no Senado, somente reforçam o momento delicado que o sistema de saúde brasileiro vem enfrentando. O governo, por um lado, buscando formas de desafogar as instalações do SUS e desonerar o Estado de sua obrigação de prover a saúde a todos e, o setor de saúde privado, por outro lado, sendo cada vez mais demandado a assumir a obrigação do Estado de prover o direito à saúde, a despeito da insuficiência de recursos disponíveis para tanto.
Um exemplo que demonstra essa nítida intenção de transferência de obrigação é a PEC 451 que, se aprovada, determinará que as empresas são obrigadas a oferecer plano de assistência à saúde aos seus empregados em decorrência de vínculo empregatício. Logo, em tese, o SUS estaria limitado à oferecer assistência à saúde apenas aos trabalhadores do mercado informal.
Conforme levantamento feito pela ANAHP, "só em 2013, as despesas totais do Brasil com saúde foram de quase R$ 450 bilhões, ou 9,2% do PIB. 'Entre as dez maiores economias do mundo, só no Brasil a despesa privada é maior que a pública', observa Francisco Balestrin".
A despeito dessa contextualização, fato é que, seja o Estado, sejam as operadoras, com o aumento progressivo dos custos da saúde e a redução do poder aquisitivo do brasileiro, ambos serão certamente mal sucedidos nessa dura tarefa, uma vez que há um conjunto de medidas que devem ser conciliadas, desde o controle do aumento dos custos da saúde, até a diminuição da ineficiência e desperdício, bem como a melhora constante da qualidade dos serviços prestados pelo SUS e/ou pelas operadoras.
De todo modo, uma das soluções que tem sido bastante discutida desde o ano passado é a criação de um plano de saúde acessível. Para tanto, o Ministério da Saúde instituiu o Grupo de Trabalho para discussão e elaboração do Projeto de Plano de Saúde Acessível. Esse grupo foi composto por representantes do Ministério da Saúde, Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS) e Confederação Nacional das Empresas de Seguros Gerais, Previdência Privada e Vida, Saúde Suplementar e Capitalização (CNSEG).
O projeto de plano de saúde acessível apresentado pelo Ministério da Saúde à ANS propõe alguns norteadores que deverão ser observados como, por exemplo, (i) o incentivo ao cuidado primário com acesso inicial obrigatório via médico da família ou de atenção primária escolhido pelo beneficiário entre os designados pela operadora, (ii) aumento da coparticipação a fim de que o consumidor participe mais ativamente das decisões que envolvem a sua saúde, (sendo necessário, para tanto, a revisão da normativa pela ANS); (iii) a regra de reajuste do plano de saúde acessível individual deve ser diversa dos índices fixados pela ANS para os planos individuais; (iv) obrigatoriedade de segunda opinião médica nos casos de alta complexidade; (v) revisão dos prazos de atendimento; (vi) canal digital de comunicação a fim de reduzir o desperdício com processos administrativos e operacionais, sendo a venda, pagamento e orientação disponível via internet; dentre outros.
Assim, o projeto prevê 3 tipos de planos: (i) plano simplificado; (ii) plano ambulatorial + hospitalar; e (iii) plano em regime misto de pagamento. A diferença entre essas modalidades reside na inclusão ou não de previsão de internação, no atendimento de urgência e emergência e na limitação de abrangência geográfica.
Após o prazo para a finalização dos trabalhos pela ANS, será aberta etapa que permitirá a participação social, sendo convidados os Ministérios Públicos, Secretaria Nacional do Consumidor (SENACOM), Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (IDEC), Proteste, Conselho Nacional de Secretários de Saúde (CONASS), Conselho Nacional de Secretarias Municipais de Saúde (CONASEMS), Associação Brasileira de Saúde Coletiva (ABRASCO), Universidade de São Paulo (USP), Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), Ordem dos Advogados do Brasil (OAB-Brasil), Entidades de Representação das Operadoras - Associação Brasileira de Medicina de Grupo (ABRAMGE), Federação Nacional de Saúde Suplementar (FENASAÚDE), Confederação das Santas Casas de Misericórdia, Hospitais e Entidades Filantrópicas (CMB); Unimed do Brasil, União Nacional das Instituições de Autogestão em Saúde (UNIDAS); Associação Nacional de Administradoras de Benefícios (ANAB); Entidades de Representação dos Prestadores - Associação Médica Brasileira (AMB), Conselho Federal de Medicina (CFM) , Confederação Nacional de Saúde (CNS) , Associação Nacional de Hospitais Privados (ANAHP), Federação Brasileira dos Hospitais (FBH), demais membros da Câmara de Saúde Suplementar (CAMSS), dos servidores da Agência, autorizados por suas respectivas chefias imediatas, sem prejuízo de todas as demais entidades ou Cidadãos que queiram participar.
É evidente que o direito à saúde evoluiu significativamente ao longo dos últimos anos, assegurando, inclusive, a cobertura de inúmeros procedimentos pelas operadoras ante a imprevisibilidade dos eventos de saúde. Contudo, é plausível que esse modelo seja repensado ou remodelado, sob pena de o custo tornar-se cada vez maior. Não é factível imaginar que todos teremos tudo com a melhor qualidade por um preço irrisório. Não é realista esse desejo!
É necessário que seja pensado um modelo que concilie os interesses e desejos do consumidor ao que as operadoras podem oferecer dentro de um modelo sustentável. Para tanto, também é preciso que seja respeitado o contratado pelas partes, sob pena de continuarmos com o aumento crescente da judicialização.
O plano de saúde acessível pode não ser a solução perfeita para o atual momento ante as diversas críticas que sofreu por players do setor, mas é importante que o setor de saúde juntamente com a ANS e o Ministério da Saúde permaneçam refletindo sobre possíveis alternativas e trazendo à discussão para a população.
Para ter acesso à íntegra do projeto de Planos de Saúde Acessíveis, clique aqui.
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*Théra van Swaay De Marchi é sócia do escritório Pinheiro Neto Advogados.
*Luciana Mayumi Sakamoto é associada do escritório Pinheiro Neto Advogados.
* Este artigo foi redigido meramente para fins de informação e debate, não devendo ser considerado uma opinião legal para qualquer operação ou negócio específico.
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