O aborto de crianças em gestação, indesejadas pelos seus pais, é um fenômeno recente, segundo nos ensina João Araujo em sua obra "Juntos pela Vida". (Editorial Verbo – Lisboa, Portugal)
Até meados do século XVIII eram poucos os abortos provocados, porque os artifícios, então conhecidos, para lograr essa intenção – o de interromper o processo de formação da vida - colocavam em risco a mãe. Durante vários séculos, quando o nascimento de uma criança era indesejado, seus pais davam preferência a pratica do infanticídio – procedimento mais seguro para a mulher grávida, embora um tanto cruel, mesmo para os preceitos da época.
A solução da intervenção mecânica, do aborto provocado, só veio a ser utilizado em grande escala depois da segunda metade daquele século XVIII, com a descoberta de novos métodos de interrupção induzidos da gravidez, quando, por fim, descobriram produtos capazes de matar o feto, sem necessariamente afetar a mãe. Foi um expressivo progresso no campo da medicina, para aqueles que almejavam livrar-se dos filhos indesejados.
Portanto, durante muitos séculos prevaleceu, mesmo entre os povos que se consideravam civilizados, a prática do infanticídio – certamente em menor escala do que a prática do aborto, nos dias atuais - como forma de eliminar-se filhos não planejados.
A Igreja Católica, não obstante essa técnica ser comum entre os povos, sempre combateu o infanticídio. Ele aparece condenado pela primeira vez no Didaké, um texto religioso do século I. Quanto ao aborto, o agravamento de sua prática, segundo o entendimento da época, variava conforme o nível de desenvolvimento do feto. E as leis civis seguiram por muitos séculos, as leis canônicas.
Aos poucos, contudo, na Europa passou-se a entender a brutalidade do exercício do infanticídio; no Oriente, porém, a técnica de se matar filhos recém-nascidos, que os pais não desejavam criar, continuava. É o que se verifica nos registros de navegadores, com o desenvolvimento do comércio marítimo para o Japão e para a China, e a troca de experiências e conhecimentos entre asiáticos e europeus.
A percepção dos navegantes em viagem ao Oriente, da crueldade desse método, amplamente divulgado durante muitos séculos, e o espanto registrado, até mesmo entre os comuns, nos seus apontamentos de viagem, demonstram sem equívoco, que a civilização ocidental, ao contrário da civilização oriental, começou mais cedo a entender o contra-senso daquilo que nossos antepassados denominavam de controle de natalidade.
No século XIX – portanto, muito recentemente, pois apenas no ano 1827 - o cientista alemão Karl Enst von Boar descreveu pela 1ª vez a fertilização de um óvulo. Revelado o momento da concepção, o universo acadêmico de modo geral, e os círculos intelectuais passaram a se convencer que a vida, contrariamente ao que se pensava, tem inicio no instante da fecundação. O que se presumia ser um argumento da Igreja – a vida humana se inicia no momento da concepção – é, na verdade, uma constatação científica.
É nítido, portanto, que a condenação do aborto é produto da observação pelo homem, do significado daquele gesto tão violento contra um ser pequeno e indefeso; que a condenação do aborto é fruto da conquista das civilizações; que interromper uma gestação nada mais é do que a evolução da prática do infanticídio; e que o aborto – tal qual o infanticídio - equivale a um verdadeiro holocausto infantil.
Originou-se nos Estados Unidos - hoje, contrariamente ao que era de se esperar, país que tem uma parcela expressiva de sua sociedade militando a favor do aborto - por intermédio da American Medical Association, o primeiro texto (século XIX) condenando a interrupção voluntária da gravidez. Essa tomada de posição, pela comunidade médica norte-americana, que exercia grande influência sobre seus pares no Velho Continente, fez com que se passasse a legislar a proibição do aborto no Mundo.
Fica claro, desse modo, que a condenação do abortamento decorre não apenas da religião, mas também e principalmente da percepção dos pais, dos legisladores, da comunidade científica, da sociedade de modo geral, de que assim como o infanticídio, a interrupção da gravidez é inaceitável do ponto de vista humano, do ponto de vista da evolução da espécie, e do ponto de vista do relacionamento da sociedade moderna, contemporânea – enfim, da sociedade que se diz civilizada.
Por isso, conforme ocorreu em relação ao infanticídio, o aborto também deve ser condenado pelos homens e pelas mulheres de bem, que não aceitam qualquer tipo de violência; o aborto é incompatível com a postura do homem e da mulher civilizados, pois inconciliável com seus objetivos de construir em termos globais, uma sociedade fraternal.
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