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Concentração dos atos na matrícula imobiliária

A legislação em comento está longe de ter conseguido reduzir à análise de um só documento as avaliações recomendáveis para garantir a segurança almejada.

16/11/2016

Quem já negociou algum imóvel no Brasil sabe que, em geral, esse tipo de transação é precedido de uma fase um tanto quanto burocrática: a análise de uma série de documentos e informações sobre o imóvel objeto das tratativas e sobre seu proprietário, com o escopo de se apurar a segurança da operação, a regularidade do bem, o risco de fraude contra credores, de fraude de execução, etc.

No início de 2015, a vinda da lei 13.097, de 19 de janeiro daquele ano, foi comemorada por muitos como um importante passo no sentido de desburocratizar as referidas negociações, já que a intenção de tal lei seria concentrar num só documento – a matrícula imobiliária – as informações necessárias para a avaliação de fraude na alienação do bem imóvel.

Vale dizer que, em lugar de se obter uma série de certidões para se proceder à avaliação imobiliária, bastaria apenas a certidão da matrícula atualizada do bem, que deveria conter os registros ou averbações das situações (ações, execuções, restrições) capazes de comprometer o negócio, se existentes. Isso porque a lei em questão estabelece não ser possível1 opor situações jurídicas não constantes da matrícula2, inclusive para fins de evicção, ao terceiro de boa-fé que adquirir ou receber em garantia direitos reais sobre o imóvel.

De fato, a facilitação de negociações e a redução de custos devem ser sempre buscadas, e a concentração de atos na matrícula é um dos caminhos para tanto, mas a verdade é que a legislação em comento está longe de ter conseguido reduzir à análise de um só documento as avaliações recomendáveis para garantir a segurança almejada.

Em primeiro lugar porque a própria lei 13.097/15 traz exceções expressas em seu texto (por exemplo, as hipóteses dos Artigos 129 e 130 da lei de Falências, que tratam da ineficácia e da revogabilidade de atos com relação à massa falida).

Ademais, porque determinados pontos da lei 13.097/15 estão em conflito com outras normas afetas à matéria, sendo, portanto, recomendável manter uma posição mais conservadora, ou seja, realizar avaliações mais abrangentes (o que implica a obtenção de uma série de documentos), se o objetivo é buscar mais segurança para as negociações.

É o caso, por exemplo, das certidões relativas a feitos e restrições fiscais, já que o CTN estabelece a existência de fraude na alienação a partir da simples inscrição do crédito fiscal em dívida ativa.

Com a entrada em vigor do novo CPC, também se fará presente o conflito entre o que estabelece a lei 13.097/15 e o que prevê o mencionado Código, já que esse último, ao contrário da primeira, estabelece que a simples existência de demanda capaz de reduzir o devedor à insolvência (independentemente, portanto, de registro ou averbação na matrícula do bem) implica fraude (hipótese do Artigo 54, IV da lei 13.097/15 versus a do Artigo 792, IV do novo CPC). Nesse caso, a avaliação imobiliária não poderia prescindir da análise das certidões cíveis, por exemplo.

Aliás, é importante destacar que a própria lei 13.097/15 estabelece que a averbação para os fins do Artigo 54, IV ocorra por determinação judicial, preferencialmente sobre imóveis indicados pelo proprietário, restringindo-se a quantos bastem para garantir o direito objeto da ação, o que, no mínimo, deve ser encarado com cautela se o que está em jogo é a possibilidade de redução do proprietário à insolvência. Isso significa que, mesmo com a aplicabilidade da lei 13.097/15, é possível que a matrícula de um imóvel não traga averbadas determinadas ações cuja existência possa implicar insolvência de seu proprietário caso avaliação dos valores envolvidos não tenha sido corretamente efetivada.

Por fim, é sempre importante lembrar que a análise do negócio vai além da constatação ou não da existência de fraude de execução, de modo que continua sendo altamente recomendável a realização das investigações completas e abrangentes no âmbito das negociações imobiliárias.
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1 O prazo para o ajuste dos registros e averbações de atos anteriores à lei aos seus termos é de até 2 anos contados do início de sua vigência.

2 Observadas as exceções previstas na lei.

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*Rochelle Ricci é advogada do escritório Machado Associados Advogados e Consultores.

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