Os extra-terrestres de São Paulo
Barbárie. Absurdo. ‘Guerra Civil’. Vários adjetivos foram empregados pela mídia e pelas autoridades, sempre de forma bombástica, a fim de descrever os episódios de violência em São Paulo. De fato, o que se viu foram cenas de banditismo em alta escala. Algo como a invasão de uma cidade por bandoleiros, um faroeste ampliado à enésima potência. Assustador, sim; mas, principalmente revelador. Revelador do descaso com que uma parcela significativa da população é tratada e, mais que isso, do que esse descaso é capaz de produzir. As imagens, despidas das legendas sensacionalistas, revelam um contingente de jovens que, simplesmente, nada tem o que esperar do futuro. Caíram no crime e nele vão morrer. Por opção. E isso é que deveria nos preocupar, ao invés de causar reações moralistas e de falsa surpresa (das autoridades) e de forçada indignação.
17/5/2006
"Os extra-terrestres de São Paulo"
Ranieri Mazzilli Neto*
Barbárie. Absurdo. ‘Guerra Civil’. Vários adjetivos foram empregados pela mídia e pelas autoridades, sempre de forma bombástica, a fim de descrever os episódios de violência em São Paulo. De fato, o que se viu foram cenas de banditismo em alta escala. Algo como a invasão de uma cidade por bandoleiros, um faroeste ampliado à enésima potência. Assustador, sim; mas, principalmente revelador. Revelador do descaso com que uma parcela significativa da população é tratada e, mais que isso, do que esse descaso é capaz de produzir. As imagens, despidas das legendas sensacionalistas, revelam um contingente de jovens que, simplesmente, nada tem o que esperar do futuro. Caíram no crime e nele vão morrer. Por opção. E isso é que deveria nos preocupar, ao invés de causar reações moralistas e de falsa surpresa (das autoridades) e de forçada indignação.
Quando um número considerável de jovens, uma “molecada” como diria a inspetora Marina Magessi, considera seriamente a opção do crime como meio de vida (e morte), alguma coisa está muito, muito errada. Quando essa juventude se junta numa “super-quadrilha” formada dentro do obsoleto sistema penitenciário (de que São Paulo é o pior exemplo), e aterroriza milhões (eu disse milhões de pessoas), então a situação é crítica.
Mas, até agora, eu não ouvi de ninguém (seja governo, mídia ou sociedade civil) a admissão de que a “molecada” (nas imagens dos rebelados o mais velho tem, no máximo, 25 anos) é fruto da sociedade. Esses “monstros” que ateiam fogo em coletivos não são ETs vindos de outra galáxia, nasceram aqui e são brasileiros.
A questão é se vamos fazer alguma coisa para mudar isso, ou se vamos esperar as coisas se acalmarem (e elas vão se acalmar) e continuar fingindo que não é conosco, enquanto um moleque de 15 anos aceita fazer “um ganho” para descolar um “ troco legal”, ou, quem sabe, ficar de vigia na “boca”.
Com relação a mudar as coisas, a saída está, a meu ver, em atuar, de forma emergencial, na faixa etária de 7 a 14 anos, provendo a periferia de educação em tempo integral. Investimento em professores e acompanhamento pessoal aos garotos em situação de risco. Utopia? Faça a sua sugestão.
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*Advogado, membro da comissão de direitos humanos da OAB/RJ
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