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Secondary meaning ou significação secundária

Ao contrário de alguns países como Estados Unidos, França e Alemanha, no Brasil cabe ao judiciário analisar e decidir sobre o reconhecimento de um signo com significação secundária.

31/8/2016

O secondary meaning, que corresponde ao verkehrsgeltung1 germânico, caracteriza-se em relação a uma denominação ou sinal inicialmente genérico que adquire uma eficácia distintiva pelo uso continuado e intenso para um produto ou serviço.

Essa eficácia distintiva não tem uma regra que a determine ou que a preveja; trata-se de um fenômeno semiológico que nasce da perspectiva psicológica do consumidor em relação a um produto e sua marca. Tal fattispecie é percebido, por exemplo, quando a significação secundária de uma marca predomina sobre a originária, de sentido genérico e já dicionarizada num idioma.

A assimilação associativa e inseparável de um produto-marca ou marca-produto vem a ser resultado da manifestação mais sensorial e holística do consumidor, que é estimulada pela justaposição de cores, dizeres e conteúdos de sua embalagem ou mesmo do formato do produto em si.

É possível, por exemplo, que seja facilmente feita a associação de produtos do mesmo gênero a um único produto, por este último ter estimulado ao longo de vários anos a fixação de sua identidade na mente dos consumidores, que passaram a reconhecê-lo como produto referência ou por ter sido o próprio um produto pioneiro no mercado.

Também é perceptível que há situações de reconhecimento imediato sem uma leitura literal da marca. Casos como da embalagem do amido de milho (Maizena), Mc (McDonald’s), etc. Pode-se dizer que todas essas formas de reconhecimento e associação, que remetem instantaneamente um único produto à mente de seu consumidor, é que o torna eficazmente distintivo. Rectius é o atalho mnemónico advindo de elementos simbólicos remissivos que alberga o instituto da aquisição de significação derivada.

A identificação, seja pelo fenômeno da significação secundária (secondary meaning) seja pela distintividade adquirida (acquired distinctiveness), pode perpetuar seu vínculo ao produto original, ou não, como ocorre com a diluição ou generificação2. Tanto um processo de identificação da marca vinculativa ao produto original como o que deixa de sê-lo, tornando-a uma descrição funcional daquele, tem como fator provocativo em comum o fluxo de comunicação que pode ser captado pelo consumidor de maneira espontânea ou por indução, pelo mecanismo estratégico da publicidade.

Enquanto há dois aspectos vinculativos de cognição, há outros dois outros em sentido oposto3. Acquired distinctiveness e secondary meaning, no aspecto vinculativo, que para o consumidor não existe diferença, mas, como exemplificado acima, alcançam diferentes direitos de propriedade, que podem ser não só em relação à marca como no significado secundário, mas, sobre todo o conjunto de um determinado produto (trade dress) que poderá estar relacionado a uma patente, desenho industrial e direito autoral ou, então, a um modelo de negócio.

Deve-se observar que um determinado produto com substancial distintividade de seu conjunto-imagem, advinda do seu reconhecimento por uma proporção considerável de consumidores, e cuja marca relacionada é uma expressão com um significado já existente em seu idioma fará também com que se alcance a significação secundária.

Em suma, ao que parece óbvio, a atribuição do secondary meaning a uma marca só ocorre se aquele vocábulo tomado como marca já possuir um significado em seu idioma. Mas, há outra situação onde o significado tenha relação com o próprio produto ou serviço, o que, portanto, seria irregistrável como marca.

Contudo, levando em conta a necessidade de proteger o consumidor de possíveis enganos, tal expressão por ter sido apropriada já de longa data e cultivado uma tradição de sua aplicação àquele produto ou serviço necessitará da atribuição de seu uso exclusivo como marca para sua fonte de origem. Não sendo, portanto, um significado secundário adquirido sobre outro já existente, mas possivelmente um significado singular e relevante sobre o mercado para manter a distintividade do produto ou serviço tradicionalmente usufruído por grande parte de consumidores e facilmente identificado pela expressão associada. Exemplos disso, temos: Computer Shop, Polvilho Antisséptico, A Casa do Pão de Queijo, American Airlines e China in Box.

Por sinal, no tratado-contrato Acordo TRIPs está prevista a proteção referente. Nesse contexto, pode-se concluir que o fenômeno da significação secundária só se aplica a signos usuais e já providos de um significado original. Expressões genéricas, no entanto, não são beneficiadas por este fenômeno, pois para isso teriam que anular seu significado original, passando este a ser uma propriedade exclusiva4, o que é diferente de ser prevista a possibilidade de seus registros, pelo texto acima do TRIPs.

Ainda, como bem analisa Denis Borges Barbosa5, expressões já de domínio comum que em muitos países são aceitas num registro secundário, no entanto, não podem ser denotativas, mas podem ser conotativas.

Ou seja, o laço conotativo seria a motivação entre o signo e a atividade designada, o que caracterizaria o grau de distintividade entre as marcas sugestivas, marcas consideradas “fracas” até que se comprove que, na verdade, são fortes no mercado justamente pelo fenômeno de sua assimilação pelo consumidor a um determinado produtor ou prestador de serviço.

Deste modo, a análise do direito de exclusividade de uma expressão antes fraca e que vem a consolidar um ganho de distintividade deve se dar independente do padrão legal. Mas sim por uma situação de fato, onde necessariamente há de se constatar o grau de liderança da marca que também resulta justamente da construção de um novo significado. E que, portanto, terá sido desvulgarizado, ou melhor, desvinculado do que antes da intensidade de divulgação e longo uso poderia ser mesmo comum ou genérico.

Neste sentido, incluem-se as expressões estrangeiras, ou seja, ainda que estas em sua tradução sejam genéricas, há de se observar que o artigo 6 quinquies da CUP (outro tratado-contrato) dispõe que a distintividade da marca em idioma estrangeiro será apurada segundo a linguagem corrente e os hábitos leais e constantes do comércio do país em que a proteção é requerida.

Assim se deu no caso envolvendo a marca TROUSSEAU, em que o juízo entendeu que o exame de tal marca constituída por palavra de origem estrangeira deve ser apreciado, prioritariamente, pelo grau de disseminação e conhecimento que a palavra possui no território onde se pleiteia o registro.

Logo, ainda que a palavra TROUSSEAU signifique no idioma francês “enxoval” e tenha sido registrada no Brasil para produção e comércio de tal produto, reconheceu-se a significação secundária e, portanto, a exclusividade de uso pelo seu titular.

“...16. Quando ao mérito das demais alegações, nos ateremos especificamente à argumentação de que o termo TROUSSEAU constitui tradução não explorada, não usual em território brasileiro. Ou seja, nos parece que tanto o consumidor médio quanto o público em geral não têm, de fato, conhecimento dos significados da palavra “TROUSSEAU” em seu idioma original, a saber, o francês – incluindo-se aí a acepção de “ENXOVAL”. O mesmo não se poderia dizer de vocábulos ou expressões francesas como “bonjour”, “abat-jour”, “petit”, “rouge” ou “femme”, fartamente difundidos entre a população brasileira. 17. O exame de marcas constituídas por palavra de origem estrangeira tem caminhado no sentido de que seja apreciado, prioritariamente, o grau de disseminação e conhecimento que a palavra possui no território onde se pleiteia o registro. E, no presente caso, não há nenhuma evidência de que o consumidor brasileiro viria a associar a palavra “TROUSSEAU” com um de seus significados originais – “ENXOVAL” -, assim como com quaisquer produtos manufaturados ou vendidos pela Autora.” (Caso da marca Trousseau - Trecho da Sentença de 1º. Grau. 9ª. Vara Federal/RJ - PROCESSO Nº 0135646-56-2013.4.02.5101)

Ao contrário de alguns países como Estados Unidos, França e Alemanha, no Brasil cabe ao judiciário analisar e decidir sobre o reconhecimento de um signo com significação secundária. Algumas decisões, que trazemos aqui, demonstram seu apoio em provas dos fatos para tal reconhecimento.

“PROPRIEDADE INDUSTRIAL. EMBARGOS INFRINGENTES EM APELAÇÃO CÍVEL. NULIDADE MARCA. POSSIBILIDADE DE CONFUSÃO. SECONDARY MEANING. TEORIA DA DILUIÇÃO.
I –. Apesar dos termos registrados pela autora ("CHINA" e "IN BOX") serem de origem comum e evocativos do produto ("comida chinesa em caixa"), não se pode olvidar que, atualmente, junto ao público consumidor, os signos em comento, utilizados de forma conjunta, estão diretamente associados ao serviço de comida chinesa servida em caixa, oferecido primeiramente pela autora, o que traduz a ocorrência do fenômeno do secondary meaning (Teoria do Significado Secundário).” (caso China in Box vs. Asia in Box - trecho do Acórdão dos Embargos Infringentes. TRF 2ª. Região- Proc. 2008.51.01.5236180)

“O conjunto probatório produzido nos autos revela que a empresa autora adquiriu ampla notoriedade com a prestação de serviços de beleza bastante específicos. Segundo informação constante em seu site, a empresa é especialista em “soluções para cabelos crespos e ondulados, com serviços e produtos de qualidade e preços acessíveis”. Quanto ao tempo de uso, a autora teve o registro para sua marca depositado em 14/07/1997 e concedido em 21/09/1999 (fl.23), fazendo uso da mesma, portanto, há mais de quinze anos; o segundo meio de prova pode ser demonstrado pelos documentos de fls.25/27 (balanço patrimonial da empresa), fls.29/35 (catálogo publicitário), e fls.36/67 e 80/82 (diversas publicações de jornais e revistas acerca da marca, bem como premiações); com relação às evidências diretas, a autora trouxe aos autos inúmeras declarações de clientes (fls.289/440), que consubstanciam um testemunho direto do consumidor e corroboram o fato de que o termo é amplamente reconhecido e ligado à imagem da autora.” (Caso Beleza Natural vs. BELEZA NATURAL ZICA & EQUIPE - trecho da sentença. TRF 2ª. Região – Proc. Processo: 0009502-37.2013.4.02.5101 (2013.51.01.009502-4)

Uma vez que a discussão a respeito de existir ou não a significação secundária de determinada marca se dá sobre uma expressão de significado primário genérico, entende-se como válido subsidiar os critérios de convencimento do juízo também através de testes que contribuam para uma análise mais objetiva possível, servindo de reforço às demais provas legais.

Assim, a exemplo mesmo do caso Beleza Natural, na decisão de mérito foram citados diversos parâmetros6 como subsídio para uma situação de fato ali discutida e a ser comprovar para o reconhecimento da significação secundária. A inclusão de requisitos como subsídio a decisões sobre tal fenômeno, na verdade, é comumente adotada pelos tribunais norte-americanos.

Como possível contribuição neste sentido, em estudo acadêmico7 sobre Semiologia e Propriedade Intelectual, apresentam-se duas grades de testes. Uma para o Ganho de Distintividade e outra para Erosão de Distintividade. Esta última como proposta para casos onde há, por parte da concorrência, uso de mesma expressão adotada pelo concorrente líder a pretexto de o significado primário ser genérico e que, contudo, venha a alcançar o reconhecimento de sua significação secundária, por provas de fato e respostas positivas ao primeiro teste de Ganho de Distintividade.

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1 § 4 Markengesetz - Entstehung des Markenschutzes - Der Markenschutz entsteht: Nr. 2 durch die Benutzung eines Zeichens im geschäftlichen Verkehr, soweit das Zeichen innerhalb beteiligter Verkehrskreise als Marke Verkehrsgeltung erworben hat.

2 Generificação = conversão em domínio público da marca que se torna uma descrição funcional ou característico de um produto (ex. isopor, fórmica, xerox, gilette entre outras)

3 Como já informamos em nosso último informativo sobre diluição de marcas. (https://www.nbb.com.br/informativo7.doc)

4 OLIVEIRA, Maurício Lopes de. Direito de Marcas. Rio de Janeiro, Edit. Lúmen Júris 2004

5 Domínio comum e marcas fracas: Reservadas em muitos países a um registro secundário, certas marcas sem maior distintividade são aceitas, embora tenham relação com o produto ou serviço a ser designado. Tal relação não pode ser direta (denotativa), por exemplo, “impressora” para impressoras, mas indireta ou conotativa, como por exemplo, as que evoquem o elemento marcado.
7. A jurisprudência tem sido bastante variada neste contexto, tanto aqui como no exterior, e quase qualquer resultado pode ser obtido numa discussão nesta área.

6 Na referida decisão judicial foram mencionados os parâmetros enumerados por Viviane Beyruth em sua obra “Quando a Marca Fraca se Torna Forte – Secondary meaning, Lumen Juris, Rio de Janeiro, 2011.

7 Estudo de autoria de Elaine Ribeiro do Prado apresentado no curso de mestrado da ACADEMIA DE PROPRIEDADE INTELECTUAL E INOVAÇÃO TECNOLÓGICA do INPI, agosto/2008.

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*Parte do texto acima consta citado na obra A Proteção das Marcas – uma perspectiva semiológica, de Denis Borges Barbosa, 2007, Ed. Lumen Juris, como contribuição desta autora.

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*Elaine Ribeiro do Prado é sócia do escritório Denis Borges Barbosa Advogados.

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