Migalhas de Peso

Contribuições ao Estudo sobre Estruturação de Concessões e PPPs elaborado pelo BNDES e IFC

O causídico acrescenta ao debate importantes questões como os interesses subjacentes ao comissionamento do Estudo e o conceito de independência das "estruturas independentes".

7/3/2016

1. Introdução

Recentemente foi publicado o estudo “Estruturação de Projetos de PPP e Concessão no Brasil: Diagnóstico do modelo brasileiro e propostas de aperfeiçoamento” (referido daqui em diante como “Estudo”), financiado pelo Programa de Fomento à Participação Privada (“PFPP”), que é uma parceria entre o International Finance Corporation - IFC, o BNDESPAR e o BID – Banco Interamericano de Desenvolvimento. O Estudo está disponível para download aqui.

O Estudo tem por objetivo “propor recomendações para a melhoria dos mecanismos atualmente existentes para a preparação de concessões comuns e parcerias público-privadas/PPPs”2, a partir da análise de um conjunto de projetos estruturados nos últimos anos por meio de Procedimentos de Manifestação de Interesse (PMIs). Em conclusão, o Estudo propõe medidas de regulação assimétrica que fortalecem o papel do que denomina “estruturadoras independentes”, a partir de uma série de apontamentos críticos às PMIs conduzidas por agentes interessados em participar da licitação da respectiva concessão ou PPP, em especial relativos à presença de problemas de agência, assimetria informacional3 e conflitos de interesse4.

O Estudo merece elogios por trazer à tona tema da mais alta relevância e buscar inspiração nas experiências internacionais para debatê-lo e por reunido especialistas respeitáveis para fazer isso. Ele acerta ao apontar a falta de planejamento público no fluxo de projetos e a baixa capacitação dos gestores como problemas latentes na organização da infraestrutura no país e ao discutir a necessidade de avanços regulatórios que possam melhorar o ambiente institucional das PMIs. Contudo, falha ao não revelar os interesses subjacentes ao comissionamento do Estudo e às propostas apresentadas, ao se satisfazer com o uso de dados insuficientes e com a realização de omissões relevantes para a discussão imparcial do tema, deixando de discutir questões de suma importância, como o conceito de independência das “estruturadoras independentes”.

O presente artigo pretende acrescentar ao debate sobre o tema jogando luz nas questões apontadas acima. Como tive relacionamento profissional com diversas das instituições e empresas citadas no Estudo e sobre as quais comentarei no presente artigo, acho importante informar ao leitor do presente artigo sobre essas relações. Sou advogado na área de infraestrutura, e fui responsável pela estruturação jurídica de diversos projetos de infraestrutura no âmbito de PMIs, nos últimos anos, na grande maioria deles como consultor contratado por empresas interessadas em participar da respectiva licitação. Em relação à EBP – Estruturadora Brasileira de Projetos – empresa controlada pelo BNDES e outros bancos para desenvolvimento de estudos no setor de infraestrutura e que é várias vezes mencionada no Estudo – estive envolvido nas discussões da ideia de criação de uma empresa similar à EBP, quando Demian Fiocca era Presidente do BNDES em 2006/7, e participei também das discussões para a definição dos contornos práticos da EBP e dos primeiros passos para a sua criação que ocorreram em 2007-8, já na gestão de Luciano Coutinho, como Presidente do BNDES. Fui membro do Conselho de Administração da EBP, até 2008, quando estavam em curso ainda os esforços para torna-la operacional. Posteriormente, em 2012 e 2013 fui contratado pela EBP como consultor e prestei alguns serviços de natureza jurídica para ela. Em relação ao IFC e a PFPP (parceria entre IFC, BNDES e BID, que financiou o Estudo junto com o BNDES) fui funcionário do IFC de 2008 a 2011 responsável pela consultoria a Governos no Brasil para a estruturação de concessões e PPPs. Durante o período que fui funcionário do IFC, fui responsável pela gestão do PFPP.

____________________

1 Eu gostaria de agradecer a Gabriela Engler pela discussão do tema do artigo e pelas diversas provações, que me ajudaram na sua elaboração. Queria agradecer também a Marcelo Lennertz por comentários pertinentes em diversos aspectos desse artigo, que contribuíram para o seu aperfeiçoamento. Eventuais erros e omissões são exclusivamente de minha responsabilidade.
2 Cf.: pp. 14, do Estudo.
3 Cf.: entre outras, pp. 160, do Estudo.
4 Cf.: entre outras, pp. 19, do Estudo.

____________________

*Mauricio Portugal Ribeiro é sócio do escritório Portugal Ribeiro Advogados. Especialista na estruturação e regulação de concessões e PPPs. Mestre em Direito pela Harvard Law School.

Veja mais no portal
cadastre-se, comente, saiba mais

Artigos Mais Lidos

Coisa julgada, obiter dictum e boa-fé: Um diálogo indispensável

23/12/2024

Macunaíma, ministro do Brasil

23/12/2024

Inteligência artificial e direitos autorais: O que diz o PL 2.338/23 aprovado pelo Senado?

23/12/2024

"Se não têm pão, que comam brioche!"

23/12/2024

“Salve o Corinthians”

24/12/2024