Já não se pode classificar a atual crise econômica como uma simples recessão; o país atravessa uma depressão econômica.
Parece que mergulhamos numa “tempestade perfeita”, com inflação de dois dígitos, com dívida bruta do governo apresentando trajetória explosiva, intensa volatilidade no mercado de capitais, aumento dos juros, contingenciamento expressivo dos investimentos do governo, empreiteiras completamente paralisadas em virtude das investigações da Operação Lava-Jato, indicadores de confiança da indústria, dos consumidores e do comércio nos patamares mais baixos da história, desaceleração da economia chinesa, queda do preço das commodities, emitente elevação dos juros americanos, etc.
Cria-se um ciclo vicioso onde a frustração na obtenção de receitas, por força da crise, prejudica a geração de caixa das empresas, o que aumenta a necessidade de captação de recursos no mercado financeiro. Contudo, neste cenário, os bancos se tornam mais conservadores na concessão de crédito e procuram pulverizar ao máximo seus empréstimos para redução do risco. Assim, as empresas se veem diante de uma crise de liquidez, na qual as mais prejudicadas são as empresas do segmento Middle Market.
A lista de problemas parece interminável. Entretanto, não há razões para desespero. Oportunidades e soluções surgem em tempos de crise, permitindo, muitas vezes, que dela se saia mais forte do que se entrou.
É preciso que as empresas estejam vigilantes e atentas para as alternativas que surgem na captação de recursos, envolvendo principalmente a substituição de empréstimos bancários por emissão de papéis de dívida direta.
Nesse cenário é que se torna importante referir que em 1º de outubro de 2015, entrou em vigor a Instrução 566 da CVM, que dispõe sobre a oferta pública de Notas Promissórias comerciais (Commercial Papers) – títulos de crédito emitidos e ofertados pelas empresas que desejam captar recursos a curto prazo. Esta instrução revoga e consolida as normas contidas na Instrução CVM 134 e demais instruções que regulavam a matéria, e, também traz algumas novidades.
Antes da entrada em vigor da Instrução 566, apenas as sociedades anônimas de capital aberto e de capital fechado poderiam, expressamente, ofertar Notas Promissórias comerciais. Felizmente, a CVM agora regulamentou expressamente a possibilidade de sociedades limitadas e de cooperativas que tenham por atividade a produção, comercialização, beneficiamento ou industrialização de produtos ou insumos agropecuários, ou de máquinas e implementos utilizados na atividade agropecuária, emitirem Notas Promissórias no mercado de capitais.
A oferta pública de distribuição de Nota Promissória deve ser realizada em observância ao disposto na regulamentação específica sobre ofertas públicas de valores mobiliários. Por isso, as sociedades emissoras devem ser auditadas por empresas de auditoria independente devidamente registradas na CVM, além de publicar suas demonstrações financeiras anualmente e divulgar seus fatos relevantes1.
Outra mudança importante reside na possibilidade de as sociedades emitirem Notas Promissórias sem necessidade de estipulação de prazo de vencimento mínimo, podendo as Notas Promissórias ser liquidadas de imediato.
Pelas instruções antigas, as Notas Promissórias apenas podiam ser emitidas pelo prazo máximo de 180 dias, por sociedades anônimas de capital fechado, e pelo prazo máximo de 360 dias, por sociedades anônimas de capital aberto. Com a edição da Instrução CVM nº 566, pode haver a emissão de Notas Promissórias com vencimento superior a 360 dias, desde que, cumulativamente, seja objeto de oferta pública com esforços restritos de distribuição2 e realizada com a presença de um Agente Fiduciário.
Os emissores devem prever a autorização para a emissão de Notas Promissórias em estatuto ou contrato social, que deverá ser levado a registro público, e deverá conter: a) o valor da emissão, e a sua divisão em séries, se for o caso; b) a quantidade e o valor nominal da Nota Promissória; c) as condições de remuneração e de atualização monetária, se houver; d) o prazo de vencimento dos títulos; e) as garantias, se houver; f) o local de pagamento; g) a designação das entidades administradoras de mercado organizado em que serão negociadas, se for o caso; e h) a contratação de prestação de serviços, tais como custódia e liquidação, conforme o caso.
As Notas Promissórias estão dispensadas de registro na Junta Comercial, o que pode ser uma vantagem competitiva no quesito agilidade desse instrumento financeiro em relação às debêntures, por exemplo.
Assim, diante do cenário de incertezas que o Brasil atravessa, com a diminuição das receitas das empresas e a consequente redução da oferta de crédito por instituições financeiras, a oferta pública das Notas Promissórias pode ser um instrumento financeiro bastante eficaz na captação de recursos para as necessidades de giro das empresas.
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1 Instrução CVM nº 358.
2 Destinadas exclusivamente a investidores profissionais, conforme Instrução CVM 476 de 16/01/2009.
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*Fernanda de Souza Leão Pessoa é advogada do escritório da Fonte, Advogados.