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O Mercosul não deve ser esquecido

O Artigo pretende mostrar a importância de acompanhar os trabalhos do Mercosul no caso específico da prorrogação dos regimes especiais. A intenção foi falar desses regimes de maneira técnica. Nos dois primeiros parágrafos, chama-se a atenção do leitor para o Mercosul (pois só se fala em OMC) e situa-se a questão, que está na contra-mão do processo - o que torna o tema ainda mais relevante. Ainda não saiu nada a respeito desse assunto, tão importante para diversos setores econômicos brasileiros, que podem continuar a beneficiar-se desses regimes especiais, e mal os conhecem.

29/3/2006


O Mercosul não deve ser esquecido


Vera Sterman Kanas*


Muito tem-se falado das negociações comerciais no âmbito da Rodada de Doha. Sem desmerecer a relevância da OMC, é preciso atentar para os mais recentes avanços no Mercosul. Sem muito alarde, o Mercosul tem tomado decisões que, muitas vezes, afetam o Brasil de maneira mais direta e rápida do que as negociações multilaterais.


De fato, a reunião do Conselho do Mercado Comum (CMC) do Mercosul, realizada em dezembro, lançou as bases para a adesão da Venezuela como membro do bloco, marcou o início das negociações para uma zona de livre comércio entre Mercosul e Israel, e deu continuidade a negociações no mesmo sentido com República Dominicana, México, União Européia, países africanos, entre outros. Essas decisões não apenas expandem a influência do Mercosul como espaço econômico de trocas, como podem representar oportunidades para aumentar e diversificar a pauta de comércio com outros países e regiões em bases mais favoráveis para a indústria brasileira.


Entretanto, merecem destaque os resultados dessa mesma reunião que seguem justamente o sentido contrário do fortalecimento do Mercosul, mantendo-o na condição de união aduaneira imperfeita. Trata-se da prorrogação dos regimes atuais de importação de bens de capital e de bens de informática e telecomunicações, bem como das exceções individuais à aplicação da Tarifa Externa Comum (TEC). Nos três casos, busca-se preservar a competitividade da indústria nos países membros e proteger setores considerados sensíveis.


No caso dos bens de capital, considera-se que a sua importação deveria poder estar sujeita a tarifas reduzidas por serem essenciais para o crescimento das economias do bloco. Regras regionais sobre a importação desses bens foram definidas em 2003. Entendeu-se, porém, que os países que compõem o Mercosul precisariam de tempo para se adaptarem a um regime comum, durante o qual cada país poderia manter suas próprias alíquotas para bens de capital, suas peças e componentes. O regime para bens de capital deveria entrar em vigor em 1º de janeiro de 2006, prazo este estendido agora por mais 3 anos.


O regime que passará a valer a partir de 1º de janeiro de 2009 prevê um sistema de Lista Comum (aplicável a todos os membros) e Listas Nacionais de Bens de Capital Não Produzidos no Mercosul. A inclusão de um produto na Lista Comum estará sujeita a aprovação regional, e resultará na redução a zero de sua tarifa de importação. Na falta de consenso quanto à inclusão desse produto na Lista Comum, os países interessados poderão incluí-lo nas suas Listas Nacionais, que prevê tarifa de dois por cento. A redução tarifária em ambos os casos é temporária, de 21 a 27 meses, passíveis de prorrogação. A partir de 2011, estarão sujeitos ao benefício da tarifa reduzida apenas bens de capital que constem da Lista Comum, desaparecendo as Listas Nacionais.


O segundo regime especial em questão envolve produtos entendidos como "Bens de Informática e Telecomunicações" (BIT), e foi estabelecido na época de elaboração da TEC para proteger a indústria tecnológica dos membros do Mercosul. "Listas de Convergência para o Setor de BIT" elaboradas por cada país permaneceriam fora da TEC durante alguns anos. Nesse período, os membros poderiam aplicar as tarifas de importação que lhes conviessem, até que a lista finalmente "convergisse" para a TEC. Em 2003, foi conferido mandato para negociar um regime comum de BIT, a ser aprovado até 31 de dezembro de 2005, para substituir o atual. O prazo para a adoção do novo regime foi agora prorrogado por mais 1 ano, durante o qual deverá ser aprovada proposta de revisão da TEC para esses bens, que se aplicará a partir de 1º de janeiro de 2009.


O terceiro regime excepcional do Mercosul, que deveria desaparecer mas será mantido até 31 de dezembro de 2008, diz respeito às Listas de Exceções à TEC, existentes desde a criação do Mercosul. Este sistema permite que cada país membro eleja, no máximo, 100 códigos tarifários (caso do Brasil e da Argentina) para os quais detém o poder para adotar a tarifa que desejar. Estas listas podem ser alteradas unilateralmente, a cada seis meses, no limite de 20% dos itens por modificação. Conforme decidido na última reunião do CMC, Brasil e Argentina poderão manter 100 produtos nas suas Listas de Exceções até 31 de janeiro de 2008, reduzindo seu número para 75 até julho de 2008 e então para 50 até 31 de dezembro de 2008.


É certo que a opção dos membros do Mercosul de permanecerem no controle sobre seus setores-chave para a política industrial e sobre produtos considerados sensíveis demonstra a divergência de interesses na região. Ainda assim, deve-se considerar que o desenvolvimento de regimes comuns e a previsão de aplicação da TEC a todos os produtos nos próximos anos significam o reconhecimento de que a integração é um processo inevitável. Os regimes descritos acima são uma amostra dos movimentos mais recentes do Mercosul que afetam o dia-a-dia das empresas, devendo-se ressaltar a importância de acompanhar de perto seus trabalhos.
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*Advogada do escritório Tozzini, Freire, Teixeira e Silva Advogados









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