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Controle prévio de atos de concentração econômica – Gun Jumping à luz da lei 12.529/11 e cases perante o CADE

As particularidades de cada caso concreto devem consideradas pelo CADE, que tende a pautar suas decisões para inibir as partes de reincidência no ato, além de demonstrar ao mercado a gravidade do ilícito.

31/7/2015

A lei 12.529/11 estabelece as regras do SBDC - Sistema Brasileiro de Defesa da Concorrência, normatizando a prevenção e a repressão às infrações contra a ordem econômica, seguindo os princípios constitucionais da livre iniciativa e concorrência, função social da propriedade, defesa dos direitos dos consumidores e repressão ao abuso de poder econômico.

Nos termos da lei, o CADE surge como importantíssima entidade judicante, possuindo jurisdição em todo o território nacional, sendo composto pelo Tribunal Administrativo de Defesa Econômica, Superintendência-Geral e Departamento de Estudos Econômicos.

Nos termos do artigo 88 da lei 12.529/2011 e Portaria Interministerial 994/12, devem ser previamente submetidas ao CADE as operações e atos de concentração econômica, quando:

I - pelo menos um dos grupos envolvidos na operação tenha registrado, no último balanço, faturamento bruto anual ou volume de negócios total no País, no ano anterior à operação, equivalente ou superior a R$ 750 milhões;

II - pelo menos um outro grupo envolvido na operação tenha registrado, no último balanço, faturamento bruto anual ou volume de negócios total no País, no ano anterior à operação, equivalente ou superior a R$ 75 milhões.

Assim, a lei institui o controle prévio dos atos de concentração econômica, que deve ser realizado pelo CADE em até 240 dias contados do protocolo da petição ou sua respectiva emenda.

Ocorre que, em muitos casos, atos de concentração econômica são consumados antes da decisão final da autoridade antitruste, prática ilegal chamada pela doutrina de gun jumping.

O gun jumping é caracterizado, assim, quando as partes envolvidas em uma determinada operação coordenam sua atuação e prática de atos previamente à decisão do CADE, compartilhando informações sensíveis, realizando negócios, unificando suas gestões, antes de tal autorização formal. A sua origem remonta à expressão jumping the gun, que significa “queimar a largada”, iniciando negócios e atos antes do momento legalmente apropriado.

Conforme Manual lançado recentemente pelo CADE, disponível em seu endereço eletrônico1, os atos de gun jumping podem ser caracterizados basicamente em três momentos e situações distintos:

(1) Trocas de informações, com compartilhamento abusivo de informações sensíveis entre as partes, como custos, estratégias de marketing, fornecedores, salários, investimentos e afins;

(2) Cláusulas contratuais, com previsão contratual de ingerência entre as partes no negócio, realização de pagamentos, estabelecimento de cláusula de non compete, entre outras;

(3) Consumação de fato da operação, com a efetiva implementação da operação à margem do CADE.

Neste sentido, o artigo 88, § 3º, da lei 12.529/11, disciplina que os atos de gun jumping serão punidos pelo CADE com imposição de multa pecuniária no valor entre R$ 60 mil e R$ 60 milhões, sem prejuízo da decretação da nulidade dos atos praticados e abertura de processo administrativo para imposição das sanções previstas nos artigos 37 e 382 da referida lei.

Enquanto não for proferida a decisão final do CADE sobre a operação, as condições concorrenciais devem ser preservadas, sendo vedados, via de regra, “os atos de concentração que impliquem eliminação da concorrência em parte substancial de mercado relevante, que possam criar ou reforçar uma posição dominante ou que possam resultar na dominação de mercado relevante de bens ou serviços”.

Por se tratar de instituto relativamente novo no ordenamento jurídico nacional, a jurisprudência do CADE não é farta sobre o assunto, havendo cases pontuais já analisados ou em análise pelo CADE:

(a) OGX

Em meados de 2013, no que tange à aquisição pela OGX de participação acionária da Petrobrás em consórcio para exploração de óleo e gás na bacia de Santos, foi celebrado acordo com reconhecimento de ato de gun jumping, com pagamento de multa de R$ 3 milhões.

(b) Brasfrigo e Goiás Verde

Recentemente, as empresas Brasfrigo S.A., Brasfrigo Ltda. e a Goiás Verde Ltda. foram condenadas pelo CADE ao pagamento de R$ 3 milhões por prática de gun jumping, na aquisição de ativos da Brasfrigo pela Goiás Verde, conforme Ato de Concentração 08700.010394/2014-32.

Conforme informado pelo CADE, as partes celebraram em janeiro de 2015 Acordo de Preservação de Reversibilidade da Operação, em que foi prevista a manutenção do funcionamento da unidade produtiva objeto do contrato, todavia, segundo entendimento do CADE, mesmo que o ato de concentração não tenha gerado efeitos negativos concretos no mercado, “a ausência de notificação alterou prematuramente as condições de concorrência e trouxe benefícios ilícitos às requerentes, especialmente à compradora, que passou a utilizar os ativos da Brasfrigo sem antes submeter o negócio à análise prévia do Cade”, conforme a conselheira relatora Ana Frazão.

(c) Abílio Diniz

Segundo tem sido publicado na mídia nacional, um caso que pode ser grande paradigma na jurisprudência do CADE e demonstração de sua competência legal para avaliação prévia de atos de concentração econômica, é a apuração de prática de gun jumping e ato de concentração na aquisição por Abílio Diniz, através da Península Participações, de 12% do Grupo Carrefour e ocupação de assentos em seu Conselho de Administração.

No referido caso, segundo informações veiculadas na imprensa, o CADE avaliará a aquisição do Carrefour, considerando ainda que Abílio Diniz é acionista e presidente do Conselho de Administração da BR Foods e proprietário de dezenas de lojas locadas ao Pão de Açúcar, avaliando possibilidade de lesão aos consumidores e ao mercado envolvido.

Efetivamente, as particularidades de cada caso concreto devem consideradas pelo CADE, que tende a pautar suas decisões para inibir as partes de reincidência no ato, além de demonstrar ao mercado a gravidade do ilícito.

Concluímos, destarte, que a análise prévia de atos de concentração econômica pelo CADE é medida exigida pela Lei 12.529/2011 para proteção do Sistema Brasileiro de Defesa de Concorrência, cabendo ao referido órgão avaliar a prática de atos de gun jumping e aplicar as sanções previstas em lei, mediante apuração e procedimento próprio, observando os princípios do contraditório e do devido processo legal.

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1 Guia para análise da consumação prévia de atos de concentração econômica

2 Art. 37. A prática de infração da ordem econômica sujeita os responsáveis às seguintes penas:

I - no caso de empresa, multa de 0,1% (um décimo por cento) a 20% (vinte por cento) do valor do faturamento bruto da empresa, grupo ou conglomerado obtido, no último exercício anterior à instauração do processo administrativo, no ramo de atividade empresarial em que ocorreu a infração, a qual nunca será inferior à vantagem auferida, quando for possível sua estimação;

II - no caso das demais pessoas físicas ou jurídicas de direito público ou privado, bem como quaisquer associações de entidades ou pessoas constituídas de fato ou de direito, ainda que temporariamente, com ou sem personalidade jurídica, que não exerçam atividade empresarial, não sendo possível utilizar-se o critério do valor do faturamento bruto, a multa será entre R$ 50.000,00 (cinquenta mil reais) e R$ 2.000.000.000,00 (dois bilhões de reais);

III - no caso de administrador, direta ou indiretamente responsável pela infração cometida, quando comprovada a sua culpa ou dolo, multa de 1% (um por cento) a 20% (vinte por cento) daquela aplicada à empresa, no caso previsto no inciso I do caput deste artigo, ou às pessoas jurídicas ou entidades, nos casos previstos no inciso II do caput deste artigo.

§ 1º Em caso de reincidência, as multas cominadas serão aplicadas em dobro.

§ 2º No cálculo do valor da multa de que trata o inciso I do caput deste artigo, o Cade poderá considerar o faturamento total da empresa ou grupo de empresas, quando não dispuser do valor do faturamento no ramo de atividade empresarial em que ocorreu a infração, definido pelo Cade, ou quando este for apresentado de forma incompleta e/ou não demonstrado de forma inequívoca e idônea.

Art. 38. Sem prejuízo das penas cominadas no art. 37 desta Lei, quando assim exigir a gravidade dos fatos ou o interesse público geral, poderão ser impostas as seguintes penas, isolada ou cumulativamente:

I - a publicação, em meia página e a expensas do infrator, em jornal indicado na decisão, de extrato da decisão condenatória, por 2 (dois) dias seguidos, de 1 (uma) a 3 (três) semanas consecutivas;

II - a proibição de contratar com instituições financeiras oficiais e participar de licitação tendo por objeto aquisições, alienações, realização de obras e serviços, concessão de serviços públicos, na administração pública federal, estadual, municipal e do Distrito Federal, bem como em entidades da administração indireta, por prazo não inferior a 5 (cinco) anos;

III - a inscrição do infrator no Cadastro Nacional de Defesa do Consumidor;

IV - a recomendação aos órgãos públicos competentes para que:

a) seja concedida licença compulsória de direito de propriedade intelectual de titularidade do infrator, quando a infração estiver relacionada ao uso desse direito;

b) não seja concedido ao infrator parcelamento de tributos federais por ele devidos ou para que sejam cancelados, no todo ou em parte, incentivos fiscais ou subsídios públicos;

V - a cisão de sociedade, transferência de controle societário, venda de ativos ou cessação parcial de atividade;

VI - a proibição de exercer o comércio em nome próprio ou como representante de pessoa jurídica, pelo prazo de até 5 (cinco) anos; e

VII - qualquer outro ato ou providência necessários para a eliminação dos efeitos nocivos à ordem econômica.

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*Pedro Gomes Miranda e Moreira, advogado, pós-graduado em Direito Tributário pelo IBET, especialização em Tributação Internacional pela FGV – GV LAW, certificado em Inglês pela Universidade de Cambridge (FCE), tendo se graduado pela Universidade Estadual Paulista (UNESP - Campus em Franca), sócio da Celso Cordeiro & Marco Aurélio de Carvalho Advogados.

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