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Recentes alterações na alienação fiduciária de imóveis

Conversões em leis das MPs 651/14 e 656/14 trouxeram novidades no instituto da alienação fiduciária de imóveis.

19/2/2015

As recentes conversões em leis das MPs 651/14 e 656/14, respectivamente, através da lei 13.043, de 13.11.2014, e da lei 13.097, de 19.1.2015, trouxeram importantes novidades sobre o instituto da alienação fiduciária de imóveis, sobre as quais passamos a discorrer abaixo.

Criação de garantias sobre imóveis em faixa de fronteira

Em primeiro lugar, vale destacar a alteração imposta pela lei 13.097/15 na lei 6.634/79, a qual determinava a necessidade de obtenção do assentimento prévio do Conselho de Defesa Nacional ("CDN") para quaisquer transações com imóveis rurais, que implicassem a obtenção, por estrangeiro, do domínio, da posse ou de qualquer direito real sobre os imóveis localizados em faixa de fronteira (faixa de 150km de largura paralela à linha da fronteira terrestre do território nacional), incluindo a constituição de alienação fiduciária.

Com o advento da lei 13.097/15, passa a ser permitida a constituição de direitos reais de garantia (hipoteca e alienação fiduciária) na faixa de fronteira em favor de instituições financeiras com capital estrangeiro, independentemente do assentimento prévio do CDN.

Ressalta-se, porém, que as instituições financeiras continuam obrigadas a alienar os imóveis recebidos por força de liquidação de empréstimos (inclusive em decorrência de excussão de garantia fiduciária) no prazo de até um ano a contar do recebimento, prorrogável até duas vezes, a critério do Banco Central, conforme determina a lei 4.595/64.

Com esta alteração, equipara-se a situação de bancos brasileiros e estrangeiros no que diz respeito à concessão de crédito rural, modalidade que é usualmente garantida por hipoteca ou alienação fiduciária de imóvel. Do lado do produtor rural, também há uma melhora em termos de oferta de crédito, na medida em que mais bancos poderão atuar no segmento.

Alienação fiduciária de imóveis rurais em favor de credores estrangeiros

Além desta importante alteração legislativa, ainda com impactos diretos no instituto da alienação fiduciária, recentemente foi publicada a lei 13.043/14, que alterou de forma relevante o artigo 1.367 do CC/02, passando a vigorar com a seguinte redação:

"A propriedade fiduciária em garantia de bens móveis ou imóveis sujeita-se às disposições do Capítulo I do Título X do Livro III da Parte Especial deste Código e, no que for específico, à legislação especial pertinente, não se equiparando, para quaisquer efeitos, à propriedade plena de que trata o art. 1.231." (grifo nosso)

Apesar de ter sido feito dentro do capítulo do Código Civil que regulava essencialmente as disposições aplicáveis à alienação fiduciária de bens móveis (infungíveis), esta alteração ao artigo 1.367 acabou por trazer reflexos para a alienação fiduciária de imóveis.

Tal como visto acima, o legislador criou uma distinção mais forte entre os conceitos de "propriedade fiduciária" e "propriedade plena". Nessa esteira, apesar de a distinção não objetivar alterar as restrições aplicáveis à aquisição de imóveis rurais por estrangeiros (conforme reguladas pela lei 5.709/71), o novo dispositivo poderá fortalecer os argumentos em favor da constituição de alienação fiduciária de imóvel em favor de credores estrangeiros.

Além disso, esta distinção, em conjunto com a alteração trazida pela lei 13.097/15 mencionada acima, pode ser entendida como uma tendência do Legislativo de separar mais claramente as situações em que estrangeiros pretendem comprar terras no país, com a finalidade de desenvolver projetos agrícolas ou pecuários, daquelas outras em que os credores, instituições financeiras ou não, buscam meramente obter uma garantia apropriada de créditos concedidos.

Se esta separação vier a ser confirmada, poderemos caminhar no sentido do entendimento de que as restrições previstas no parecer da AGU de 2010 somente se aplicariam à efetiva aquisição da propriedade plena e ao arrendamento de imóveis rurais por estrangeiros, estando, desta forma, excluída a propriedade fiduciária, obtida através da constituição da alienação fiduciária de imóveis.

Apesar de mostrar-se como uma tendência positiva, especialmente para os credores e instituições financeiras em geral, devemos alertar que esta interpretação ainda pode ter dificuldades práticas, seja em decorrência de interpretações adotadas pelas autoridades competentes (assim entendidos os tabeliães e registradores de imóveis, por exemplo), seja em decorrência do próprio processo de excussão da garantia fiduciária previsto na lei 9.514/97, que obriga o credor fiduciário a consolidar a propriedade "plena" do imóvel em seu nome antes da realização dos leilões, estipulando, ainda, a extinção da dívida e manutenção do imóvel sob a titularidade do credor, caso o imóvel não seja vendido por meio do segundo leilão.

De qualquer forma, fica claro que as alterações introduzidas conjuntamente pelas Leis 13.043/14 e 13.097/15 representam um importante avanço em relação a determinados aspectos da alienação fiduciária de imóveis e indicam uma tendência de flexibilização e modernização das restrições aplicáveis às transações com imóveis rurais por estrangeiros.

A possibilidade de cobrança de saldo devedor

O mesmo artigo 1.367 do CC/02, conforme alterado pela lei 13.043/14, incluiu a alienação fiduciária de bens imóveis no rol das garantias reais sujeitas (i) às disposições gerais previstas no Capítulo I do Título X do Livro III da Parte Especial do Código Civil (que inclui penhor, hipoteca e anticrese), bem como (ii) "no que for específico, à legislação especial pertinente".

As tais disposições gerais, agora aplicáveis à alienação fiduciária, preveem, dentre outros, a faculdade do credor de, caso o produto obtido com a venda não seja suficiente para quitar a dívida, continuar cobrando o saldo da dívida:

"Art. 1.430. Quando, excutido o penhor, ou executada a hipoteca, o produto não bastar para pagamento da dívida e despesas judiciais, continuará o devedor obrigado pessoalmente pelo restante".

Embora esta alteração pareça indicar a possibilidade de cobrança do saldo para as alienações fiduciárias de imóveis, a situação não foi efetivamente esclarecida porque este artigo acaba conflitando com o conceito da quitação recíproca, tal como previsto na lei 9.514/97 (artigo 27), de acordo com o qual a dívida extingue-se após a realização do segundo leilão, seja com a venda do imóvel (parágrafo 4º), seja com o insucesso do leilão e a consequente transferência do imóvel ao credor (parágrafo 5º).

Pela análise da alteração trazida pela lei 13.043/14 ao artigo 1.367 do CC/02 e tendo em vista que a alienação fiduciária de imóvel é um instituto regulado por "legislação especial pertinente", qual seja, a lei 9.514/97, é necessário alertar para o fato de que, conforme estipulado pelo próprio artigo, esta alteração não teria o condão de se sobrepor às regras previstas pela legislação específica.

De qualquer forma, esta alteração reforça o argumento dos que defendem ser possível a cobrança de saldo devedor na alienação fiduciária de imóveis, mas não podemos deixar de alertar que a lei 13.043/14 não modificou diretamente o mecanismo de quitação recíproca previsto na lei 9.514/97, que portanto poderá continuar a ser aplicado para as excussões de alienações fiduciárias de imóvel. Certamente valerá a pena acompanhar a evolução deste tema na doutrina e nos casos práticos.

Nesse sentido, será importante também atentar ao PL 6.525, atualmente em tramitação no Congresso Nacional. Se este projeto vier a ser convertido em lei, aí então poderemos ter uma determinação mais clara no sentido de permitir a cobrança do saldo devedor em casos de alienação fiduciária para operações realizadas fora do âmbito do Sistema de Financiamento Imobiliário ("SFI").

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*Luciano Garcia Rossi é sócio da área empresarial do escritório Pinheiro Neto Advogados.

*Flavio Coelho de Almeida e Martina Zajakoff são associados da área empresarial do escritório Pinheiro Neto Advogados.













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*Este artigo foi redigido meramente para fins de informação e debate, não devendo ser considerado uma opinião legal para qualquer operação ou negócio específico.

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