A Carta Política de 1988 instituiu um Sistema Tributário Nacional que pode ser visto como rígido e extremamente minucioso, abundante de regras que disciplinaram o exercício das competências deferidas aos Entes Tributantes, estabelecendo limitações que viu cabíveis na garantia da cidadania e das pessoas jurídicas.
Complexo, por definição, dada a previsão de um sem número de tributos deferidos a todas as pessoas políticas, a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios.
Sua existência é um dos fatores determinantes do indesejado “Custo Brasil”, conjunto de razões inibidoras de maiores investimentos produtivos, quer externos, quer internos, de parte dos agentes privados, tolhidos pela carga tributária (em especial a dos tributos indiretos) e enredados pela burocracia, quando não a corrupção, no cumprimento de suas obrigações instrumentais.
Injusto por horizontalizar o ônus dos cidadãos, deixando de atingir a efetiva capacidade contributiva de cada um, o que só é possível mediante a tributação direta da renda e do patrimônio, verticalizada progressivamente.
Nosso modelo de organização política deixa pouca perspectiva para alterações radicais nesse quadro, pois uma Federação com três níveis de capacidade tributante é literalmente ingovernável.
Juridicamente inseguro, considerando o pedregoso caminho entre as normas gerais e abstratas (particularmente as constitucionais) e a sua concretização no plano da realidade social.
Sobejam exemplos dessa instabilidade.
É consabido que os Entes titulares da competência para a cobrança do ICMS (e são nada menos que 27), não podem, por disposição da Carta Maior, conceder benefícios fiscais ou financeiros unilateralmente, devendo imperativamente haver consenso unânime entre todas as unidades envolvidas. Isto é regra constitucional, objeto de disciplina clara pela legislação complementar.
A chamada “Guerra Fiscal dos Estados” está há décadas revelando a quase que absoluta ineficácia dos mandamentos maiores do sistema, implicando em total insegurança para quem opera na economia, surpreendendo e desequilibrando os agentes privados em suas decisões de investimento e de operação.
O mesmo sucede até no plano dos Municípios, em relação ao Imposto sobre Serviços de Qualquer Natureza, patamar em que vem sendo solene e impunemente ignorada a disposição constitucional no sentido de que, até a edição de Lei Complementar (e até hoje não existe) o ISS não será objeto de concessão de isenções, incentivos e benefícios fiscais, que resulte, direta ou indiretamente. Na redução da alíquota mínima de 2% (dois por cento).
De outra banda, há, ainda, depois de mais de 25 anos conflitos de competência entre os Estados e o DF (titulares do ICMS) e os Município (donos do ISSQN), quanto à tributabilidade de determinadas operações, como, vg, a industrialização por encomenda intermediária (não destinada diretamente ao encomendante) e determinados serviços tidos pelos Estados e o DF como sendo de comunicação e pelos Município como estando dentro de seu espectro impositivo (caso da exibição de outdoors).
Ainda sobre insegurança: abro hoje site especializado e vejo, estarrecido, uma Solução de Consulta da 7ª Região Fiscal da SRRF apontando no sentido de que estão submetidas, como se receitas fossem, ao PIS e à COFINS as importâncias recebidas pelas empresas a título de indenização pela perda ou sinistro de bens de seus ativos do Permanente ou do Circulante!!!
É digna de Fellini a decisão!
Em suma: não por ser velho operador do Direito, mas consciente da realidade que nos cerca, vislumbro muito distante a necessária reforma de nosso sistema constitucional tributário. Sinceramente, não enxergo clima político e institucional para tanto.
Diminuição e verticalização da carga, para sua melhor distribuição; simplificação dos deveres acessórios; rápida definição pelo Judiciário das pendengas surgidas no entrechoque do Fisco e do Contribuinte.
Sonhos a ser acalentados pelas próximas gerações, que lutarão para inserir o País num cenário socioeconômico global, espancando esse inglório fator de inibição de seu enquadramento entre as nações desenvolvidas, possibilitando seu crescimento saudável e a mais igualitária repartição do produto do labor dos seus cidadãos.
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* Luiz Fernando Mussolini é advogado e professor do programa de L.L.M em Direito Tributário do Insper Instituto de Ensino e Pesquisa.