Prescrição de medicamentos por farmacêuticos
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O CFF - Conselho Federal de Farmácia fez publicar em 25 de setembro de 2013 a resolução 585/13 pela qual regulamenta as atribuições clínicas do farmacêutico.
Pela Resolução o CFF inclui entre as atribuições clínicas do farmacêutico, a prescrição (receita) de medicamentos que não exijam prescrição médica, ou seja, os conhecidos medicamentos de venda livre.
A atribuição da atividade de prescrição está colocada na Resolução da seguinte forma:
"Artigo 7º (a) inciso XXVI - Prescrever, conforme legislação específica, no âmbito de sua competência profissional; e (b) XXV - Dar suporte ao paciente, aos cuidadores, à família e à comunidade com vistas ao processo de autocuidado, incluindo o manejo de problemas de saúde autolimitados;"
GLOSSÁRIO – ANEXO
"Prescrição farmacêutica: ato pelo qual o farmacêutico seleciona e documenta terapias farmacológicas e não farmacológicas, e outras intervenções relativas ao cuidado à saúde do paciente, visando à promoção, proteção e recuperação da saúde, e à prevenção de doenças e de outros problemas de saúde."
"Problema de saúde autolimitado: enfermidade aguda de baixa gravidade, de breve período de latência, que desencadeia uma reação orgânica a qual tende a cursar sem dano para o paciente e que pode ser tratada de forma eficaz e segura com medicamentos e outros produtos com finalidade terapêutica, cuja dispensação não exija prescrição médica, incluindo medicamentos industrializados e preparações magistrais - alopáticos ou dinamizados -, plantas medicinais, drogas vegetais ou com medidas não farmacológicas."
Entretanto, além da "contradição em termos" de prescrever aquilo que não requer prescrição, a regulamentação acima mencionada encontra óbices legais sérios na sua implementação já que, o Decreto Federal 20.377/31 que aprova a Regulamentação do exercício da profissão farmacêutica no Brasil, citado no preâmbulo da própria Resolução não inclui a atividade da prescrição entre aquelas compreendidas no exercício da profissão farmacêutica. Isto é facilmente compreendido pela simples leitura do artigo 2º do referido Decreto que diz:
Art. 2º O exercício da profissão farmacêutica compreende:
a) a manipulação e o comércio dos medicamentos ou remédios magistrais;
b) a manipulação e o fabrico dos medicamentos galênicos e das especialidades farmacêuticas;
c) o comercio direto com o consumidor de todos os medicamentos oficiais, especialidades farmacêuticas, produtos químicos, galênicos, biológicos, etc., e plantas de aplicações terapêuticas;
d) o fabrico dos produtos biológicos e químicos oficinais;
e) as análises reclamadas pela clinica medica;
f) função de químico bromatologista, biologista e legista.
§ 1º As atribuições das alíneas c a f não são privativas do farmacêutico.
§ 2º O fabrico de produtos biológicos a que se refere a alínea d só será permitido ao medico que não exerça a clinica.
Como se verifica o decreto, em nenhum momento autoriza o profissional farmacêutico a prescrever medicamento algum.
Mais que isso; o decreto 85.878/81 que estabelece normas para execução da lei 3.820/60, que criou o Conselho Federal e os Conselhos Regionais de Farmácia, estabelece os limites de atuação desses Conselhos e o alcance de suas Resoluções, também lista as atribuições privativas e não privativas dos profissionais farmacêuticos em seus artigos 1º e 2º. Em nenhum deles está incluída a atribuição de prescrever medicamento algum, seja lá em que condição for.
O próprio CFF na sua resolução 160/82 reconhece os limites de sua atuação ao dizer em seu artigo 2º:
"Art. 2º - O exercício de atividades farmacêuticas definidas no Decreto nº 85.878, de 07-04.81, só será autorizado mediante prova de habilitação legal, a ser feita pela carteira de identidade profissional."
Ora, como sabemos os Conselhos Federais Profissionais são autarquias que, como definido no decreto-lei 200/67, são, em síntese, serviços autônomos com personalidade jurídica, patrimônio e receita próprios com finalidade de executar atividades típicas da Administração Pública.
Sendo assim e, não se enquadrando, como de fato não se enquadram, dentre aqueles que podem, por previsão constitucional, exercer função legislativa como é o caso do executivo ou do Conselho Nacional de Justiça (para citar alguns), não podem legislar mas apenas regular o que lhes é permitido por lei específica.
A jurisprudência do Tribunal Regional Federal é clara no sentido de que as resoluções, como atos infralegais não se prestam a impor comportamentos não disciplinados por lei e que são ilegais as Resoluções que ultrapassam o poder de regulamentar.1
Não bastasse o acima descrito a lei do ato médico (lei 12.842/13) estabelece que cabe ao médico a prevenção, o diagnóstico e o tratamento de doenças.2
Além do médico, o único profissional habilitado, por lei, ao diagnóstico e tratamento é o Cirurgião Dentista e, mesmo assim, apenas em relação aos conhecimentos adquiridos em curso regular ou de pós-graduação, em Odontologia.3
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1(AC 11608 MG 2007.38.00.011608-5)(REOMS 4079 GO 2006.35.00.004079-0)(AMS 45243 DF 2004.34.00.045249-9)(AMS 2187 GO 2004.35.00.021897-1)
2Artigo 2º, Parágrafo Único inciso II.
3Lei 4.324/64; Lei 5.081/66; e Resolução CFO 185/93
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*Marcos Lobo de Freitas Levy é advogado do escritório A. Lopes Muniz Advogados Associados.