Crise , Nação , Estado e Governo
Ricardo A. Malheiros Fiuza*
Lembrando-nos dos mestres Amílcar de Castro e Raul Machado Horta, que tanto defendiam a taxinomia, ou seja, a precisão no uso das palavras em assuntos jurídicos, definimos os três termos da seguinte maneira:
- NAÇÃO é consciência coletiva; é o "plebiscito de todos os dias", como queria Renan; é um "Estado em potência", como afirma Miguel Reale. Nação é espírito. Nação é alma que alenta um povo e dá força ao Estado, para criá-lo, mantê-lo vivo e recriá-lo, se preciso for. A gente a encontra, portanto, na mente e no coração, no pensamento e na vontade dos indivíduos somados (e não massificados) no grupo humano que se constitui em povo, primeiro e originário elemento de um possível Estado e titular de seu Poder.
- ESTADO é um estágio posterior, formado, certamente, pela idéia nacional. Estágio em que se juntam os três elementos constitutivos: o elemento humano, que prefiro abrangentemente chamar de "população" , dentro da qual está a sua parcela politicamente ativa, o "povo", conjunto de cidadãos; o segundo elemento é o "território" , que Kelsen, sucinta e completamente, chama de "base física e geográfica do Estado"; e o terceiro elemento, formal e mais complexo, é o "poder" , originário do elemento humano e capaz de organizar política e juridicamente o Estado.
- GOVERNO, por sua vez, não é sinônimo de poder. O poder é uma função da soberania nacional, entendida esta como a força geradora do terceiro elemento constitutivo do Estado. Já o Governo é uma delegação da soberania nacional. Delegação que se faz através da escolha, direta ou indireta, pelo povo, aquela parcela ativa da população do Estado. O Governo será o órgão que exerce o Poder Público, o poder institucional (e não pessoal!), que dará as ordens, que "governará", sempre conforme as competências que lhe foram estabelecidas pela legítima força geradora e cujas linhas-mestras deverão estar na Constituição (legítima e não outorgada).
Conceituadas as três expressões - NAÇÃO, ESTADO e GOVERNO - perguntamos, então, onde está a crise brasileira atual que tanto nos preocupa e, até, nos envergonha?
- Na nossa sofrida nação não é, por certo, pois o sentimento geral do povo, em cuja alma está a nação, não é de culpa e, sim, de perplexidade, de vergonha. A nação condena essa triste crise que está avassaladoramente anunciada na mídia.
- No Estado, conforme o definimos anteriormente, não está a crise, por enquanto... O Estado brasileiro, tão complexo em sua forma federativa, ainda está firme nos diversos planos da administração e sem que sua soberania esteja ameaçada no campo internacional.
- A crise está, sem dúvida, no Governo, notadamente no plano federal, começando pelo Presidente da República (que se diz inocente e ameaçado pelas elites!?...), passando pela equipe ministerial (reformada às pressas) e, infelizmente, enxovalhando as duas Casas do Congresso, além de macular injustamente uma instituição, os Correios, sempre respeitada no Brasil, e de ofender uma classe admirável e criativa da qual muito depende o progresso econômico: os publicitários (que andam sendo confundidos com lobistas).
O perigo de tudo isso é que a Nação, cansada de toda essa vergonha e em defesa do Estado, clame por uma reformulação total do Governo.
Por muito menos, num regime de governo semipresidencialista, que seria o ideal, haveria queda do Chefe de Governo e dissolução do Parlamento, com novas eleições imediatas!
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*Advogado e membro do IAMG - Instituto dos Advogados de Minas Gerais
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