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Arbitragem, processo e prescrição: Uma abordagem prática.

Para garantir a tranqüilidade da ordem jurídica, preservando a estabilidade e a segurança das relações sociais, o titular de um direito deve exercê-lo em certo lapso temporal.

18/10/2005


Arbitragem, processo e prescrição: Uma abordagem prática.


Fábio Possídio Egashira*


Para garantir a tranqüilidade da ordem jurídica, preservando a estabilidade e a segurança das relações sociais, o titular de um direito deve exercê-lo em certo lapso temporal.


A Lei nº 9.307/96 não estabelece prazo prescricional para a pretensão de instituição da arbitragem. Em regra, o direito de provocar a instalação do Juízo Arbitral pode ser exercido a qualquer tempo.


A questão que se aduz é saber se a inércia pode ser punida em sede arbitral. Se existe a possibilidade de alguém, que travou uma relação contratual e estipulou cláusula compromissória, possuir tempo indefinido para discussão de qualquer controvérsia na arbitragem.


Nesse contexto é que a prescrição da pretensão e sua interrupção influenciam diretamente no comportamento adotado pelas partes, tanto no pólo ativo como no pólo passivo das discussões.


Não raras vezes, as partes elegem a arbitragem como o local apropriado para a resolução das controvérsias e não a utilizam, talvez por medo e receio de encará-la. E mais, quando há algum descumprimento contratual, é freqüente uma delas ingressar perante o Poder Judiciário, ainda que consciente da estipulação de cláusula compromissória.


A opção de quem propõe a ação na via judicial para discutir a sua pretensão, mesmo desrespeitando a estipulação da cláusula compromissória, pode interromper o prazo prescricional. Isso porque a interrupção da prescrição ocorre por despacho do juiz que determinar a citação, ainda que incompetente, se promovido o ato citatório no prazo e na forma da Lei Processual1.


Observe-se que o Código Civil protege a iniciativa da parte em discutir o seu direito, por isso garante a interrupção da prescrição mesmo que ajuizada a ação perante Juiz incompetente. O autor da pretensão deve apenas ser cuidadoso no sentido de cumprir a citação do adverso sem contaminação.


Já em relação à empresa que estipula cláusula compromissória em um contrato, porém é surpreendida figurando no pólo passivo para responder a uma ação na Justiça, o reflexo da interrupção da prescrição não é o mesmo. Nessa hipótese, não é incomum a parte acionada contestar a ação e suscitar corretamente a preliminar de convenção de arbitragem2 , solicitando a extinção do processo sem julgamento de mérito3 . Ocorre que essa postura é meramente defensiva e não interrompe a prescrição de eventual pretensão indenizatória contra o adverso.


A bem da verdade, a interrupção da prescrição poderia ser alcançada com a apresentação de reconvenção simultaneamente à referida defesa. Mas tal reconvenção perante o Poder Judiciário soaria incongruente com a preliminar de convenção de arbitragem argüida na peça de contrariedade.Também poderia soar como renúncia à arbitragem uma reconvenção eventualmente apresentada no Judiciário para discutir a indenização decorrente do contrato.


Se existem motivos suficientes à postura da parte de não reconvir, e mais, se o processo prolongar-se de modo a que a preliminar de convenção de arbitragem argüida na defesa demore a ser apreciada pelo Poder Judiciário, entendemos que a atitude mais prudente de quem não apresentou a reconvenção seja instalar a arbitragem com o pleito de reparação civil por descumprimento contratual. A iniciativa de ingressar na arbitragem por certo provocará a interrupção do prazo prescricional da pretensão, mesmo que haja o risco de suspensão da instância arbitral pelo fato de haver uma discussão judicial antecedente sobre idêntico contrato.


Aqui cabe uma explicação: a prescrição é instituto de ordem pública, sendo correto afirmar que as causas de sua interrupção somente podem ser criadas e amparadas por Lei. A pergunta que se faz é: a interrupção da prescrição estampada no inciso I do artigo 202 do Código Civil, "por despacho do Juiz", aplica-se também à arbitragem?


Parece-nos que sim. Como ao intérprete é dado sistematizar, entendemos que a aplicação decorre do fato de a Lei de Arbitragem haver ressaltado que a atividade do árbitro é idêntica à do Juiz togado, conhecendo o fato e aplicando o direito, cuja decisão produz a mesma eficácia da decisão estatal. Por isso que a Lei de Arbitragem4 estabelece que o árbitro é juiz de fato e de direito e a Lei Processual5 reconhece a sentença arbitral como título executivo judicial.


Como a finalidade da interrupção da prescrição é preservar o autor diligente no que diz respeito aos seus direitos, consideramos que o inciso I do artigo 202 do Código Civil pode ser aplicado com a instalação da arbitragem.


Somente no que pertine à parte final de aludido dispositivo legal, em relação ao ato citatório, frisamos o aspecto peculiar da autonomia da vontade na arbitragem, cuja forma e prazo são definidos pelas partes. Daí porque se atentar para a liberdade de as partes adotarem a forma e o prazo da Lei Processual, do Regulamento da Câmara Arbitral escolhida ou a própria vontade quanto ao procedimento, sem ferir evidentemente a ordem pública, os bons costumes e os princípios constitucionais.


São posturas aparentemente simples como essas que precisam ser bem analisadas para não comprometerem o futuro das discussões na arbitragem. Se houver a prescrição da pretensão, seja ela qual for, pode e deve haver o reconhecimento do instituto no próprio Juízo Arbitral.


A lição que se extrai dessa rápida análise é a de que a inércia em ingressar no Tribunal Arbitral poderá fulminar a arbitragem. Isso torna bem relativa a idéia de que o Juízo Arbitral pode ser instalado a qualquer tempo.
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1

Vide art. 202, I, do Código Civil; e arts. 215 a 219 do Código de Processo Civil.

2Art. 301, inciso IX, do Código de Processo Civil.

3Art. 267, inciso VII, do Código de Processo Civil. Para alguns doutrinadores, como Washington de Barros Monteiro e Silvio de Salvo Venosa, somente há interrupção da prescrição quando ocorrer o julgamento do mérito da causa. Silvio Rodrigues defende a interrupção mesmo que o processo seja extinto sem julgamento de mérito.

Não obstante a divergência doutrinária, concordamos com o posicionamento de Silvio Rodrigues, entretanto ressalvamos a situação em que o processo se extingue sem julgamento do mérito porque o autor desistiu da ação antes da triangularização do vínculo processual. Nesse caso, não se pode atribuir eficácia à interrupção do lapso prescricional. Causaria a impressão de um privilégio à astúcia das partes.

4Art. 18 da Lei nº 9.307/96.
5Inciso VI do artigo 584 do Código de Processo Civil.
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*Advogado do escritório Trigueiro Fontes Advogados









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