José Edgard Cunha Bueno Filho
O2 na advocacia
Os temas que dominam o debate em nossa comunidade jurídica são ou estão muito chatos? Será que não há algo mais construtivo do que se digladiar sobre (i) listas do quinto constitucional (e todas as fofocas delas decorrentes...); (ii) se quem deve processar juiz malfeitor é este ou aquele órgão do Judiciário (pouco importa quem terá o poder de processar – o debate deve ser sobre como retirar logo da cesta a laranja que não presta); (iii) se o estado democrático de direito está sendo ameaçado por um comentário ou ato de autoridade (aqueles que lutaram para consolidar nossa democracia fizeram um baita trabalho – ela vai muito bem obrigado e não há como regredirmos nesse aspecto); (iv) se as prerrogativas dos advogados estão sendo cumpridas; (v) quem serão os candidatos da OAB (nunca vi ninguém perguntando qual é o projeto deles).
Não retiro a importância desses e outros temas que compõem a pauta de nossa classe. Por isso mesmo eles não são chatos. Eles são muito importantes e devem sempre circundar nossos almoços. Mas, convenhamos: eles estão muito chatos. Eles não são produtivos. Não levam a profissão a lugar algum. Ao contrário, eles se encerram em si mesmos. E, pior, entram num círculo vicioso que alimenta mais debate sobre eles mesmos, não deixando que novos temas ingressem nesse inner circle.
Definitivamente é hora de romper e avançar mais. Temos que inserir temas que projetem a profissão para o futuro. Temas que mostrem qual o caminho que nós profissionais do setor estamos trilhando para as futuras gerações de advogados, que hoje estão sendo jogadas aos borbotões no mercado de trabalho pelas milhares de faculdades de direito do país. Qual o nosso norte? Qual o rumo? Qual o planejamento para se chegar lá? E o mais importante: como fica o cliente nessa história toda (afinal, e ao contrário do que ainda pensam alguns, nossa profissão só existe para, e por causa, deles)?
Embora o vírus da vaidade inoculado em todos nós advogados possa contaminar em maior ou menor escala a oxigenação pretendida, temos que ser otimistas. É possível sim criamos uma agenda positiva e, sobretudo, construtiva.
Queremos que o nosso mercado jurídico seja uma ilha como Cuba é, parada no tempo desde 1959, e não permitir que aporte no Brasil o que há de mais moderno em termos de gestão de escritórios, sistemas, know-how, clientes? Queremos uma reserva de mercado nos moldes do que fizemos com os produtos de informática na década de 80? Temos plenas condições de encontrar formas mais inteligentes e menos passionais de regulamentar a questão da entrada dos escritórios estrangeiros no Brasil.
As faculdades de Direito estão formando os melhores profissionais para enfrentar um mercado cada vez mais competitivo? Alguém está fazendo algo de concreto com o ensino jurídico no país? Como ensinara o professor Paulo Napoleão Nogueira da Silva, "o Direito é uma ciência, advogar é uma arte." Não vemos as faculdades de Direito traduzirem na formação do aluno essa tão simples e valiosa lição (a FGVLaw talvez seja a única exceção).
Só existe corrupção no Judiciário porque há alguns advogados corruptos. Comparado com as manchetes diárias contra os juízes, não vemos a mesma sanha persecutória contra os advogados que são a origem de toda malversação.
Até quando conviveremos com uma lei (Estatuto da Advocacia) totalmente obsoleta e incapaz de regulamentar a profissão inserida no mundo da internet, redes sociais, mega-estruturas de prestação de serviço? A lei foi pensada em cima do advogado tradicional que tem sua banca. E como ficam os mega-escritórios? E os departamentos jurídicos internos das grandes empresas? E o coitado do diretor-jurídico das empresas? Nada disso está pensado ou regulado. Há um vácuo regulatório nesse aspecto.
Por que até agora não há um sistema único de banco de dados em todo o Judiciário? Por que não estabelecermos um controle único de prazos e publicações em todas as esferas? Por que ir ao fórum para protocolar uma simples petição? Na era do face-time, por que insistirmos em audiências presenciais? Imaginem a brutal redução de custos com um sistema único on-line, de onde se protocolam peças, fazem-se audiências e se publicam sentenças...
Faz sentido dizer que um escritório de advocacia moderno não é uma empresa e, portanto, não é uma atividade mercantil? Se somarmos o faturamento dos 10 mais destacados escritórios brasileiros chegamos a cifras de bilhão de reais!!! Se isso não é uma atividade mercantil, será o quê?
Outra questão recorrente. Advogado não pode captar clientela. Será mesmo? Do que vivem os 20.000 escritórios de advocacia registrados no Brasil? Certamente não é da mão divina.
Como regular o regime trabalhista dos advogados empregados? Continuaremos convivendo em dois mundos: o do regime celetista regulado pela lei trabalhista e o do regime de advogado associado da OAB? Qual dos dois prevalece? Qual a segurança jurídica de cada um?
Seguiremos o mesmo movimento do Reino Unido possibilitando a entrada de investidores não advogados nas sociedades de advogados? O quanto isso é benéfico ou não à profissão e/ou aos clientes?
E, finalmente, e talvez o mais importante de tudo – como ficam os clientes em todo esse movimento? É certo fechar um site como o "youlaw.com.br" porque ele pretende apenas criar uma ponte entre o cliente e o advogado?
Eis aí um pouco de oxigênio para o debate e - tenhamos esperança - para os programas e plataformas dos ilustríssimos doutores candidatos à eleição da OAB que se avizinha.
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* José Edgard Cunha Bueno Filho é sócio do escritório J. Bueno e Mandaliti Sociedade de Advogados
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