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A dignidade humana exige um nível mínimo de qualidade no atendimento dos planos de saúde

A ANS precisa estabelecer um nível mínimo de qualidade para todas as operadoras de planos de serviço, como forma de garantir o respeito à dignidade humana no atendimento à saúde.

23/9/2011

Ariadne Maués Trindade

Euclides Di Dário

A dignidade humana exige um nível mínimo de qualidade no atendimento dos planos de saúde

De acordo com o artigo 196 da Constituição Federal (clique aqui) a saúde é direito de todos e dever do Estado. O artigo 2º da lei 10.241/99 (clique aqui) estabelece os direitos dos usuários dos serviços de saúde: atendimento digno, atencioso e respeitoso, segredo sobre seus dados pessoais, informações claras e compreensíveis, local digno e adequado para atendimento, entre outros.

No Brasil existem ao redor de 60 milhões de usuários de planos de saúde médica e odontológica. Essas pessoas buscam um atendimento melhor que aquele fornecido pelos serviços públicos, ou seja, querem se privar de longas filas, internação em condições precárias, hospitais e clínicas sem os equipamentos e medicamentos necessários. Contudo, o que ocorre, muitas vezes, é uma prestação de serviço com qualidade inferior àquela do serviço público.

O serviço público é, normalmente, criticado em função do atendimento ruim que presta à população, enquanto as operadoras de planos particulares veiculam anúncios procurando convencer os usuários que seus serviços têm uma alta qualidade, o que nem sempre é verdade.

Muita insatisfação

Dados do Conselho Federal de Medicina, em pesquisa encomendada ao Instituto Data Folha, revelam que 60% dos usuários de planos de saúde estão insatisfeitos. Os planos de saúde ocupam o topo da lista de reclamações no PROCON e no IDEC. A ANS recebeu, em 2010, dezenas de milhares de denúncias de infrações das operadoras de planos de saúde. As razões para a insatisfação estão relacionadas ao atendimento administrativo ruim; longa espera para atendimento médico; dificuldade para agendar consultas médicas; exames, tratamentos e remédios sem cobertura; recusa de atendimento; médicos mal remunerados; mensalidades reajustadas acima da inflação; mensalidades excessivamente altas para os idosos, etc.

Exames, tratamentos e remédios sem cobertura

Um fato que gera muita insatisfação é a descoberta, por parte dos usuários, de que determinados exames ou medicamentos não estão cobertos pelo plano de saúde. Não faz sentido que haja itens não cobertos pelo plano de saúde, uma vez que esse serviço é contratado, justamente, para que as pessoas não precisem desembolsar grandes quantias em dinheiro quando adoecerem. Imagine, então, a angústia do segurado ou de sua família que são obrigados a recorrer à Justiça para serem atendidos ou para terem suas despesas médico-hospitalares ou ambulatórias reembolsadas.

O SUS não recusa atendimento

É fato que a rede privada é necessária e sem ela a rede pública não teria como atender a população. Sabe-se que os serviços públicos têm limitação de recursos, contudo, é preciso ressaltar que eles não recusam atendimento, principalmente nos casos de urgência, nos tratamentos de alta complexidade ou medicamentos caros. Sob esse ponto de vista é mais vantajoso utilizar os serviços públicos.

Médicos mal remunerados

As operadoras de planos de saúde remuneram os médicos com valores baixos. Em média o valor pago por uma consulta é de R$ 29,00. O valor pago por um parto gira em torno de R$ 200,00. O profissional vê-se, então, obrigado a atender um número maior de pessoas, o que provoca reclamações por parte dos pacientes. As associações dos médicos lutam contra os abusos cometidos pelas operadoras, como a falta de reajustes de honorários ou a interferência na autonomia dos profissionais.

Mensalidade acima de inflação e desrespeito aos idosos

Segundo dados do IDEC as mensalidades dos planos de saúde têm sido reajustadas acima dos índices de inflação. Além disso, a tabela de preço dos planos de saúde desrespeita os idosos ao estabelecer valores extremamente elevados para quem tem mais de 65 anos. Naturalmente os idosos são acometidos por um número maior de doenças do que o são os jovens, mas é justamente na velhice que as pessoas têm mais dificuldades de custear o plano de saúde e, sendo assim, deveria haver um rateio das despesas considerando todos os segurados, para não sobrecarregar os idosos. Essa situação força o idoso a abandonar o Plano de Saúde justamente quando ele mais precisa de assistência médica.

Função social e normatização da ANS

Como ocorre com os demais tipos de contratos e, principalmente no caso da saúde, os contratos para prestação de serviços têm uma função social. Não se trata de buscar o lucro a qualquer custo. É necessário que haja comprometimento com o interesse público.

A ANS precisa estabelecer um nível mínimo de qualidade para todas as operadoras de planos de serviço, como forma de garantir o respeito à dignidade humana no atendimento à saúde. É desejável que a diferenciação de preços dos Planos de Saúde seja estabelecida em correspondência à prestação de serviços adicionais e opcionais.

Restabelecimento dos direitos dos usuários

De acordo com o art. 51 do Código de Defesa do Consumidor (clique aqui), as cláusulas abusivas, desproporcionais e lesivas aos consumidores são nulas. A jurisprudência é farta com decisões que restabelecem os direitos dos usuários e reparam danos materiais e morais em assuntos tais como: carência, reembolso das despesas médico-hospitalares e laboratoriais, recusa de atendimento de doença congênita e outras.

A dignidade humana é fundamento do estado brasileiro e o poder Judiciário deve ser acionado para inibir atos, movidos pela ganância, que objetivem somente resultados financeiros em prejuízo dos valores humanos.

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*Ariadne Maués Trindade e Euclides Di Dário são advogados do escritório Maués Trindade Advogados

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