O abacaxi da web semântica na publicidade online
Gustavo Schor*
Com o advento da internet, os zeros e uns da informática puderam ser involucrados sob a embalagem da comunicação de massa, proporcionando além da codificação e replicação de dados, a possibilidade de armazenar e cruzar informações. Com ela é possível guardar e confrontar diferentes signos, gerar novas significações, extrair tendências e criar cenários. E voilà: eis a web semântica, ferramenta informacional que promete revolucionar a capacidade de entendimento sobre os desejos do consumidor.
O dispositivo, idealizado em 2001 pelo inglês Tim Berners-Lee, abre inúmeras possibilidades de interação com o público, já que se dispõe a ler e interpretar hábitos de navegação, relevância de termos pesquisados em sistemas de busca e até mesmo linhas de interesse de acordo com palavras-chave presentes em emails, chats ou perfis dos usuários. No caso da publicidade online, a web semântica pode funcionar como um verdadeiro anabolizante do modelo, pois permite colimar o alvo a ser atingido de maneira bastante minuciosa.
Essa leitura de comportamento é realizada por sistemas de informações programados para colher dados e recombiná-los. São algoritmos que atribuem valores para os signos identificados, que podem ser números, letras, palavras e mesmo expressões complexas.
Existem vantagens, claro, mas também limitações. Se, por um lado, uma pessoa é incapaz de selecionar milhões de palavras e expressões, quantificá-las e calcular em fração de segundos a propensão de um internauta preferir o item A ao B, por outro, um computador, por mais avançado que seja, ainda não conseguiu captar as nuances da comunicação humana. A linguagem é recheada de sutilezas complexas, que determinam, por exemplo, significados distintos para a mesma palavra quando usada <_st13a_personname w:st="on" productid="em contextos diferentes. Também">em contextos diferentes. Também não inventaram ainda um sistema que leia os traços emocionais dispostos na fibra da comunicação. Isso favorece a incorreção da máquina na hora de precisar quando e como ofertar um produto ou serviço.
Entre os exemplos positivos de uso da web semântica em investidas publicitárias online, podemos citar a abordagem da Amazon, que consegue identificar, no emaranhado de suas milhões de páginas, aquelas em que cada consumidor permanece por mais tempo, quantos cliques fez até finalizar uma compra, quais os departamentos preferidos e resgatar o histórico individual de pedidos anteriores. Isso tudo permite à loja oferecer um cardápio preciso a seus clientes com produtos que certamente estão incluídos no hábito particular de consumo daquelas pessoas. Esse processo é especialmente interessante para empresas de venda direta ao consumidor como a gigantesca Amazon, que condensa itens das mais diversas categorias. Tal serviço ajuda o comprador e poupa a ele um tempo muitas vezes precioso.
No Brasil, o Grupo Folha aplica uma estratégia interessante. Ao associar as matérias da Folha Online com os produtos oferecidos pela Livraria da Folha, sua loja de itens editoriais na web, toma o interesse do consumidor pelos assuntos abordados nas reportagens como indexador semântico. Dessa forma, relaciona, por exemplo, as matérias de política do jornal <_st13a_personname w:st="on" productid="com os livros">com os livros que tratam desse assunto, fazendo o mesmo com outras editorias e volumes sobre temas respectivamente correlatos.
Serviços triviais, como o email pessoal, também não estão livres da ofensiva publicitária apropriada da web semântica. O Gmail, do Google, foi pioneiro nesta prática e há algum tempo posiciona links patrocinados no quadrante lateral direito da caixa de mensagem. O formato reproduz a mecânica já usada pelo Google em sua página de busca, discriminando os links patrocinados de acordo com a palavra procurada pelo internauta.
O Gmail, no entanto, dispõe os links patrocinados levando em consideração não os termos buscados, mas as expressões mais comuns utilizadas pelo usuário da conta em seu fluxo de emails. Ou seja, se você escrever a um contato falando sobre "abacaxi", e esta pessoa responder tratando do mesmo assunto, ao abrir a caixa com o histórico dos emails, encontrará ao lado URLs que dizem respeito a esse tema, como as de homepages de redes de supermercados ou marcas de sucos naturais.
Se, por outro lado, você e seu amigo estiverem usando o termo "abacaxi" como sinônimo de "problema", "dificuldade", "situação constrangedora", certamente os links que aparecerão não farão qualquer sentido.
Por conta de inconsistências como essa, ainda é cedo para afirmar que a capacidade interpretativa da máquina poderá em breve se igualar à do ser humano. Mesmo os cientistas que desenvolvem tais ferramentas tecnológicas e os estudiosos do assunto concordam. No projeto Imagining the Internet (Imaginando a Internet), desenvolvido pelas instituições norte-americanas Pew Research Center’s Internet & American Life Project e Elon University, 895 especialistas foram questionados sobre como achavam que seria a capacidade interpretativa semântica na web no ano de 2020. Metade deles entendeu que está correto dizer que "a web semântica vislumbrada por Berners-Lee não será tão efetiva quanto seu criador gostaria e os usuários comuns não terão notado muita diferença". Os outros 50 por cento ficaram divididos entre aqueles que consideravam que a web semântica seria realmente efetiva em 10 anos e os que não tinham uma ideia formada.
Para alívio dos marketeiros, a ponderação humana não enfrenta concorrentes à altura. Nossos colegas, mestres na arte da criação, ainda podem dormir tranquilos. Se hoje já temos a "inteligência artificial", por outro lado, estamos um tanto distantes da "criatividade artificial". A web semântica está evoluindo, mas, o dom da linguagem, no sentido semiótico, ainda é exclusivo dos humanos. Pelo menos por enquanto.
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*Gerente de Comunicação do escritório Machado, Meyer, Sendacz e Opice Advogados
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