Justiça do Trabalho: fonte de renda para o Estado
Rafael Cenamo Junqueira*
Na prática, existe uma questão preocupante e que deve começar a ser observada pelos estudiosos do Direito. O fato é que esta Justiça especializada passou a ser utilizada como uma excelente fonte de renda para o Estado, principalmente no que concerne à arrecadação de contribuições fiscais e previdenciárias.
Há estudos que apontam: cada uma das 90 varas do trabalho do município de São Paulo, apenas com os valores arrecadados com as custas processuais obtidas nos processos em que nela tramitam e sem contabilizar os recolhimentos fiscais e previdenciários, é autossuficiente para custear com folga todos os seus serventuários e demais despesas. São, portanto, superavitárias.
Em 25 de fevereiro de 2011, o Tribunal Regional do Trabalho do Rio Grande do Sul informou que, no ano de 2010, a Justiça Laboral daquele estado foi responsável pela arrecadação de R$ 164,62 milhões ao órgão previdenciário, enquanto as importâncias decorrentes do Imposto de Renda somaram R$ 183,31 milhões. Custas e outros adimplementos atingiram a expressiva quantia de R$ 28,77 milhões.
Ao se traçar um paralelo entre o orçamento destinado pelo Governo Federal em 2010 à Justiça do Trabalho do Rio Grande do Sul e os valores por ela arrecadados, percebe-se que a somatória dos recolhimentos fiscais, previdenciários e custas correspondeu a 41,4% do plano orçamentário.
Apesar de a Justiça do Trabalho ter um cunho eminentemente social e não visar a arrecadação de quaisquer importâncias, percebe-se claramente que ela se tornou uma fonte lucrativa de renda para o Estado.
Em evidente prejuízo ao fim social da Justiça, de seus integrantes, dos operadores do Direito e das partes interessadas na resolução de seus problemas, o Estado simplesmente não repassa integralmente a arrecadação obtida em cada um dos processos. Isso acaba por impedir que a renda seja revertida e, por consequência, utilizada para o fiel cumprimento de sua finalidade.
Ora, se a arrecadação obtida fosse efetiva e integralmente repassada à Justiça, certamente poderia ser aplicada de forma eficaz para o aumento da infraestrutura de trabalho dos serventuários, a realização de um maior número de concursos públicos para o respectivo acréscimo de mão de obra, realização de cursos para capacitação do quadro de funcionários, entre outras iniciativas.
Ademais, se o Estado não fosse tão voraz na busca incessante por aumentar o seu patrimônio ou, reduzir a dívida pública, a Justiça do Trabalho poderia ministrar uma solução mais ágil e atenta aos princípios sociais.
Vale destacar que se a quantia arrecadada pela Justiça fosse acrescida ao orçamento anual repassado pelo Estado, não haveria tantas críticas de empregados e empregadores em relação ao seu funcionamento. Sem falar que os funcionários teriam um ambiente de trabalho mais adequado e estruturado.
Mas não é só. Apesar de a Justiça do Trabalho arrecadar milhões para os cofres públicos a título de contribuições previdenciárias, não é raro o empregado ter uma infeliz surpresa ao requerer sua aposentadoria e não ver computado um eventual lapso de tempo proveniente de uma reclamatória trabalhista.
Para que as contribuições previdenciárias decorrentes de processos oriundos da Justiça do Trabalho passem a contar como tempo para fins de aposentadoria, o empregado tem, necessariamente, que ingressar com uma ação perante a Justiça Federal contra o órgão previdenciário, sob pena de não ter esse período automaticamente contabilizado.
Nesses casos, é bastante frequente o trabalhador simplesmente não buscar seus direitos e deixar para o órgão previdenciário a quantia outrora arrecadada. E o Estado lucra novamente em detrimento do prejuízo alheio.
Diante de tais fatos, a esperança é justamente que haja uma reavaliação política acerca dos procedimentos adotados pelo Estado. O ideal é que a Justiça do Trabalho não seja utilizada principalmente como fonte de renda, de modo a serem observados os valores pregados desde os primórdios de sua criação.
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*Advogado especializado em Direito do Trabalho e associado do escritório Rodrigues Jr. Advogados
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