Exame de Ordem: o ensino jurídico em discussão
Manoel Antonio de Oliveira Franco*
Não muito tempo atrás, não mais do que 10 anos, havia uma grande concorrência nos vestibulares de direito. A preocupação dos candidatos era serem aprovados em qualquer um dos cursos existentes, porque todos ofereciam boa qualidade de ensino. Os vestibulares eram disputados. Os candidatos tinham que estar preparados. O certame era classificatório e somente os melhores eram aprovados. Alguns candidatos, durante todo ano anterior, freqüentavam cursos preparatórios para o vestibular, e nem mesmo os mais preparados, porque oriundos de escolas que ofereciam uma melhor formação secundária, o enfrentavam sem dificuldades. As vagas, em qualquer um dos cursos de direito naquela época, eram disputadas e somente os mais preparados as alcançavam. Os alunos, então, freqüentavam bons cursos, com currículos adequados e professores competentes, e quando concluíam estavam aptos para o exercício da profissão.
Hoje, infelizmente, tudo está diferente. A indiscriminada e generalizada criação de cursos jurídicos, que em sua maioria não oferece as menores possibilidades de um ensino minimamente qualificado, tem por conseqüência a formação bacharéis sem preparo para exercer a profissão. Contamos hoje no Brasil e no Paraná, respectivamente, com cerca de 750 e 70 cursos de direito. Nos bons cursos as vagas continuam sendo disputadas em vestibulares concorridos. Em outros, uma grande maioria, o simples requerimento de inscrição para o vestibular, que deveria servir para habilitar o candidato à prova, já o admite no curso de direito, qualquer que seja a sua nota, pois o número de vagas é superior ao número de candidatos. Estima-se, hoje, que cerca de 300 cursos jurídicos no país têm mais vagas que candidatos.
Todos sabem que a competência para criar e fiscalizar os cursos jurídicos é do Ministério da Educação. Não é atribuição da OAB. Pelo que se constata não existe a menor vontade política do Governo Federal de exercer uma fiscalização com zelo e responsabilidade, afastando do sistema os empresários do ensino, os mercantilistas, que priorizam o lucro em detrimento da qualidade. É essa uma das causas do declínio do sistema judiciário do país, como um todo, pois os cursos jurídicos não só formam bacharéis em direito que poderão se transformar em advogados, como também magistrados e membros do Ministério Público.
Não vamos esquecer o fracasso dos bacharéis nos últimos concursos públicos, em especial, no Paraná, o da magistratura que aprovou somente 17 dos 2.421candidatos inscritos em 2004.
O resultado do Exame de Ordem somente tem comprovado a lamentável situação do ensino como um todo, em especial do ensino jurídico, já rotulado, até mesmo por Ministro do Supremo Tribunal Federal como verdadeiro estelionato estudantil.
Desta forma, como é atribuição da Seccional do Paraná - com autonomia - a realização e a organização do Exame de Ordem, por meio da sua Comissão de Estágio e Exame de Ordem, nos termos do inciso VI do Art. 58 da Lei nº 8906/94, os critérios da seriedade, da transparência e do rigor continuarão como seus postulados, sem aceitar qualquer tipo de pressão ou interferência externa, e muito menos discursos e movimentos com o tom de palanque político, que em nada contribuem. A pressão não assusta porque a Ordem exerce e está exercendo sua atribuição legal de defesa das instituições jurídicas, pelo aperfeiçoamento dos cursos jurídicos e luta, como vem lutando, para fazer da advocacia, cada vez mais, uma profissão valorizada.
Vale lembrar que ao conferir ao bacharel a condição de advogado, a OAB está lhe autorizando postular em nome de terceiros para defender direitos pessoais, patrimoniais e de ordem pública. No entanto, a Ordem não é insensível às críticas, desde que construtivas. Tanto que já atrás declarou à imprensa que o baixo índice de aprovação no último exame causou surpresa e preocupação. Porém, antes de buscar espaço na mídia para alardear esse resultado, determinou-se que a Comissão de Exame de Ordem o analisasse e apurasse o motivo para o baixo índice de aprovação, de modo que eventuais falhas ou equívocos fossem sanados e corrigidos, pois que a intransigência e a insensibilidade não são e nem jamais foram ingredientes da Instituição. Tudo, porém, sem pressão, sem alarde, sem manifestações populistas, interferência de bacharéis não aprovados, familiares interessados ou daqueles que pretendem levar vantagem.
A sociedade deve entender que a luta da OAB é pela moralização do ensino como um todo, em defesa da própria sociedade, na medida em que o que se procura é resguarda-la de operadores do direito despreparados, sejam advogados, promotores, juízes, delegados e outros. Ninguém é contra o ensino jurídico. Somos todos contra o mau ensino jurídico.
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*Presidente da Ordem dos Advogados do Brasil, subseção Paraná - OAB/PR
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