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Polícia: profissão perigo

O cidadão paga impostos e o Estado, através de seus governantes, assume variadas obrigações dentre as quais a prestação de bons serviços, fundamentalmente os essenciais, a exemplo da segurança, atribuição da polícia, da distribuição de justiça, encargo dos magistrados, da preservação da saúde, de competência dos médicos, da educação e cultura, encargo dos professores.

26/8/2010


Polícia: profissão perigo

Antônio Pessoa Cardoso*

O cidadão paga impostos e o Estado, através de seus governantes, assume variadas obrigações dentre as quais a prestação de bons serviços, fundamentalmente os essenciais, a exemplo da segurança, atribuição da polícia, da distribuição de justiça, encargo dos magistrados, da preservação da saúde, de competência dos médicos, da educação e cultura, encargo dos professores. Esses profissionais representam o Estado que deve fornecer toda a estrutura para facilitar a implementação de tais serviços.

Já mostramos, em outras oportunidades, as deficiências dos serviços judiciários; não comporta qualquer questionamento sobre a precariedade dos serviços vinculados à saúde, à segurança e à educação.

A CF/88 (clique aqui), art. 144, estabelece que a segurança pública é exercida para a preservação da ordem pública e a incolumidade das pessoas e do patrimônio, pelas policias federal, rodoviária federal, ferroviária federal, policiais civis, militares e corpos de bombeiros.

As polícias civis dos Estados são dirigidas por delegados de polícia de carreira e são competentes para as "funções de polícia judiciária e a apuração de infrações penais", enquanto às "polícias militares cabem a polícia ostensiva e a preservação da ordem pública." Tanto uma quanto outra são subordinada aos Governadores das unidades federadas.

É complexa a formação do Judiciário brasileiro com a dicotomia de Justiça Federal, ou Especializada, e Justiça Estadual ou Justiça Comum; a unicidade da Justiça foi proclamada por muito tempo, mas cicatrizaram a divisão, impedindo o Judiciário de, como um todo, cuidar da distribuição de justiça. Essa mesma divisão apresenta-se no meio policial, - polícia civil e polícia militar -, quando se sabe que os objetivos de uma e outra se confundem, porque comuns os objetivos; a partição é mantida desde o Império.

O Brasil colonial continuou com os "quadrilheiros", responsáveis pelo policiamento urbano das cidades portuguesas. Com o crescimento da população tornou-se indispensável a ampliação, daí porque a chegada de Dom João VI, em 1.808, importou em imediata criação da Intendência Geral de Polícia da Corte e do Estado do Brasil que se tornou a primeira instituição de polícia judiciária, sob o comando de um Desembargador e Conselheiro do Paço, Paulo Fernandes Viana. O Intendente possuía os mais amplos poderes, pois decidia sobre os crimes, fixava as punições, prendia, julgava, condenava. Nesse mesmo ano, surgiu a Secretaria de Polícia, de onde originou as futuras policiais civis; no ano seguinte, em 1.809, para auxiliar a Intendência, o Príncipe Regente de Portugal e Rei do Brasil, criou a Guarda Militar Real de Polícia do Rio de Janeiro que se tornou antecessora da polícia militar atual.

A promulgação do CPC (clique aqui), em 1830, descentralizou a organização policial e, em 1.842, foi definida a competência da Polícia Administrativa e da Polícia Judiciária, ficando ambas sob a coordenação do Ministro da Justiça; em 1.844, o cargo de Intendente foi substituído pelo Chefe de Polícia que contava com delegados e subdelegados.

O Decreto 3.598 de 1.866 dividiu a polícia em civil, dependente do Chefe de Polícia, e militar, subordinada ao Ministro da Justiça; A lei 2.033/1871 promoveu modificações, algumas das quais prevalecem até hoje, a exemplo da criação do inquérito policial, que consistia em "todas as diligências necessárias para o descobrimento dos fatos criminosos, de suas circunstâncias e de seus autores e cúmplices; e deve ser reduzido a instrumento escrito".

Com a Proclamação da República, os Estados obtiveram autonomia para organizar suas polícias.

A atividade policial é induvidosamente unitária e a segurança do cidadão, por meio da prevenção e da repressão ao delito, constitui objetivo maior, daí porque a unificação das policias civil e militar somente contribuirá para maior controle e maior eficiência da segurança no Brasil. Afinal o delegado ou o oficial são inerentes à atividade de luta contra a criminalidade e a segurança do cidadão.

A polícia civil, destinada às funções de investigação das infrações criminais, e a polícia militar, competente para exercer a polícia ostensiva e a preservação da ordem pública, são instituições centenárias. Exatamente porque esses dois segmentos trabalham distanciados, apesar do objetivo final ser único, tem havido desentendimento e distorção de forças, que não existiriam se houvesse a união e a prestação de serviços conjuntamente.

Há um conflito entre a prisão dos delinqüentes pela polícia militar e o inquérito policial sem provas suficientes preparado pela polícia civil, principalmente, quando nos processos as vítimas são pessoas simples e sem representação política ou econômica. Em certos casos, não há diligências e quando realizadas mostram-se insuficientes para a punibilidade do delinqüente. Sabe-se, por outro lado, que a corrupção contribui sobremaneira para o crime organizado.

O Estado mostra-se frágil no poder de punir, na medida em que a maioria dos delitos não é esclarecida; as autoridades policiais não dispõem de meios para coletar provas nas primeiras 72 horas após o crime, frustrando assim o momento mais adequado para apuração e punição do criminoso.

O período negro da recente história do Brasil, o golpe de 1964, quando os governantes, no exercício do poder, dispensavam tratamento arbitrário e antidemocrático à sociedade civil provocou imagem distorcida da policia militar como órgão repressor, colidindo assim com a ordem constitucional da instituição. O povo nutre medo, ao invés de respeito, pelo policial militar. As blitz policiais são feitas sem respeito à cidadania e isto provoca o silêncio, como símbolo do distanciamento do cidadão com o órgão policial, impedindo desta forma a colaboração do povo com as investigações policiais. Ademais, o policial é motivado para reprimir o crime; isto é demonstrado na medida em que as regras das policias militares situam-se em premiar as unidades que realizarem maior número de prisões ou apreensões, ao invés de objetivar a redução do índice de criminalidade.

É exigida do policial militar dedicação exclusiva à profissão, exposição de sua própria vida, na realização do seu dia a dia; ao sair de casa, é incerta sua volta, porque atuará em defesa da sociedade.

Por outro lado, o agente de segurança que cumpre sua função, autuando e prendendo quem comete um crime, garantindo assim a efetividade da democracia e o respeito às leis, pode com este ato legal, na esfera individual, criar na comunidade situação desagradável, reforçando a imagem de arbitrário.

Não se deve esquecer sobre os relevantes serviços humanitários prestados pelos policiais militares à comunidade, ainda mais aos necessitados. Isto ocorre, por exemplo, quando as viaturas transformam-se em hospitais e o próprio policial faz o parto, quando soldados conseguem evitar o suicídio de um cidadão em desespero.

Exige-se ainda do policial requisitos que outras profissões não reclamam, a exemplo da força física, do significativo controle emocional, dos conhecimentos jurídicos, do preparo psicológico e intelectual para solucionar rapidamente situações difíceis que se lhe apresentam.

É o que ocorre, por exemplo, numa abordagem; se o agente público não tem conhecimento de que aquela ação praticada pelo cidadão constitui crime como respeitar o direito do outro.

O estresse provocado pelos riscos da atividade é muito grande e o serviço de saúde mostra-se bastante precário para atender às necessidades dos policiais. Falta-lhe assistência social e a situação psicológica se avoluma na medida em que a sociedade não reconhece a luta dos policiais, os baixos salários que recebem e a própria falta de estrutura da instituição que se mostra inadequada para enfrentar os bandidos que cada vez mais se aperfeiçoam em armas e outros recursos para a prática do crime.

A ação do policial militar tem limitações que expõem a fraqueza do combate ao crime. É o que ocorre com a falta ou precariedade de material humana, de viaturas policiais, de armamentos, de equipamentos, de tecnologia.

O policial é treinado para o combate, para o enfrentamento de bandidos mais bem armados e que não devem explicação alguma por eventuais procedimentos desumanos, antiéticos, a qualquer instituição, à sociedade ou às leis do país; enquanto o policial não pode desviar da conduta legal, humana e ética traçada pelas leis e pela Corporação.

A morte está sempre presente na vida desses homens!

A violência combatida pelo policial militar é tamanha que o profissional sai de casa e não sabe se volta; é como se colocasse uma placa nas suas costas: "atire em mim".

A condição econômico-financeira desses homens é tão precária que são forçados a residir em bairros periféricos, em favelas, vizinhos dos próprios criminosos contra os quais enfrentam em batalhas sem fim.

O Estado de São Paulo, 19/1/00, noticiou que no ano de 1999 foram mortos 300 policiais militares em serviço.

Apesar do crescente perigo, a profissão de policial militar cada dia mais arrebanha muitos jovens na competição dos concursos. São duas as opções para quem quer seguir a carreiras: soldado e oficial.

O último concurso para soldado da PM do Paraná realizado no ano de 2005 anunciava a existência de 1.000 vagas e houve habilitação de 21 mil candidatos.

Já dissemos que as leis de uma maneira geral preocupam-se mais com o criminoso do que com a vítima, com o patrimônio do que com o ser humano, beneficiam o estelionatário em detrimento do homem honesto, agradam mais ao bandido, ao infrator do que ao cidadão, a quem lhe presta serviços e cumpre seus deveres cívicos.

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*Desembargador do TJ/BA





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