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Improbidade administrativa e indisponibilidade de bens

A lei de improbidade administrativa atingiu sua maioridade. A norma referida, datada de 2/6/92, completou 18 anos de vigência. Porém, o amadurecimento da lei não tem sido obstáculo ao cometimento de alguns abusos sob o empolgante argumento da defesa probidade administrativa.

17/6/2010


Improbidade administrativa e indisponibilidade de bens

Ulisses César Martins de Sousa*

A lei de improbidade administrativa atingiu a sua maioridade. A norma referida, datada de 2 de junho de 1.992 (clique aqui), completou 18 anos de vigência. Porém, o amadurecimento da lei não tem sido obstáculo ao cometimento de alguns abusos sob o empolgante argumento da defesa probidade administrativa. Dentre os abusos costumeiramente praticados encontra-se a generalização – e consequente banalização – das decisões decretando a indisponibilidade de bens dos acusados.

Efetivamente o artigo 7º da lei 8.429/92 (clique aqui) possibilita a decretação da indisponibilidade de bens do acusado de improbidade administrativa, visando assegurar o integral ressarcimento do dano causado ao erário. Ocorre que essa medida não é conseqüência necessária do ajuizamento da ação de improbidade. A decretação da constrição patrimonial exige a presença dos requisitos estabelecidos na lei. Nesses casos incidirá sobre tantos bens quantos forem necessários ao ressarcimento do dano ou acréscimo patrimonial resultante do enriquecimento ilícito, acrescido das multas aplicáveis, podendo recair sobre quaisquer bens do agente acusado, independentemente de terem sido adquiridos antes ou depois do ato supostamente ímprobo.

A decretação da indisponibilidade de bens é medida que causa pesado gravame no patrimônio do acusado. Por essa razão só deve ser decretada em casos extremos, cabendo lembrar que, segundo o entendimento do STJ, "a medida prevista no art. 7º da lei 8.429/92 é atinente ao poder geral de cautela do juiz, prevista no art. 798 do CPC (clique aqui), pelo que seu deferimento exige a presença dos requisitos do fumus boni iuris e periculum in mora" (RESP 731.109/PR, Rel. Ministro JOÃO OTÁVIO DE NORONHA, SEGUNDA TURMA, julgado em 2/2/06, DJ 20/3/06 p. 253).

Não se pode admitir que o patrimônio pessoal do acusado (presumidamente inocente, por força do inciso LVII do artigo 5º da CF/88 - clique aqui) seja tornado indisponível sem que ao menos sejam apontados quais foram os atos supostamente ilícitos praticados por este que deram razão à decretação de tal medida. É necessária a concreta e efetiva demonstração do fumus boni iuri. Não basta a alegação de malversação de dinheiro público, lançada indistintamente contra o réu. A lei exige mais que isso. É necessária a demonstração de todos os elementos necessários para a configuração do ato de improbidade imputado ao acusado. Sem isso, não há o que se falar em fumus boni iuri.

No que toca ao periculum in mora, não basta que seja suscitada a necessidade da medida como forma de garantir o ressarcimento do erário. É necessária a indicação de elementos concretos que permitam concluir que o demandado pretende ocultar ou dilapidar seu patrimônio. Ou seja, não basta o ajuizamento da ação de improbidade, impondo-se a concreta demonstração de que a medida constritiva é necessária.

Ponto é destacar que, em precedentes recentes, a 2ª turma do STJ tem entendido que a decretação da indisponibilidade de bens "não está condicionada à comprovação de que os réus estejam dilapidando seu patrimônio, ou na iminência de fazê-lo, tendo em vista que o periculum in mora está implícito no comando legal" (RESP 1115452/MA, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, julgado em 6/4/10, DJe 20/4/10). Tal entendimento não se harmoniza com o ordenamento jurídico vigente e, muito menos, com os precedentes do próprio STJ sobre o tema. Aliás, o julgado referido diverge de posicionamento anterior da própria 2ª turma, que, ao julgar o RESP 469.366/PR (Rel. Ministra ELIANA CALMON, SEGUNDA TURMA, julgado em 13/5/03, DJ 2/6/03 p. 285), entendeu que "a medida acautelatória de indisponibilidade de bens só tem guarida quando há fumus boni iuris e periculum in mora", isso porque "o só ajuizamento da ação civil por ato de improbidade não é suficiente para a decretação da indisponibilidade dos bens". Na ocasião decidiu a 2ª turma que a indisponibilidade dos bens do indiciado "encontra-se inserida no poder geral de cautela do juiz, de que trata o art. 798 do CPC e, portanto, deve submeter-se aos requisitos do fumus boni iuris (plausibilidade do direito ao ressarcimento do erário) e periculum in mora (fundado receio de que o indiciado pretende dispor do seu patrimônio, de modo a frustrar a futura execução da sentença a ser proferida na ação civil pública)", ou seja, entendeu pela necessidade de demonstração de risco efetivo à pretensão de ressarcimento do erário. Tal entendimento, inegavelmente, é bem mais acertado.

Não se pode tolerar que o só ajuizamento da ação de improbidade leve à automática decretação da indisponibilidade dos bens do acusado, isso seria inaceitável face aos princípios constitucionais da ampla defesa, contraditório, presunção de inocência e razoabilidade. A decretação da indisponibilidade de bens há de ser realizada com cautela e somente nas hipóteses em que restar efetivamente demonstrada a presença dos requisitos legais, inclusive o periculum in mora, cuja existência não pode ser presumida. Não pode ser ordenada com base em meras suposições, devendo fundamentar-se, sempre, em elementos fáticos concretos, que demonstrem a necessidade da medida constritiva.

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*Advogado em São Luís/MA. Conselheiro Federal da OAB e sócio do escritório Ulisses Sousa Advogados Associados










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