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A atualização e a reunião das hipóteses de "infração grave" cometidas no âmbito do mercado de valores mobiliários

Recentemente, a CVM colocou em audiência pública uma minuta de Instrução que tem como propósito atualizar e reunir as hipóteses de "infração grave" cometidas no âmbito do mercado de valores mobiliários.

14/5/2010


A atualização e a reunião das hipóteses de "infração grave" cometidas no âmbito do mercado de valores mobiliários

Carla Miranda Godoy*

Carlos Alexandre Lobo e Siva**

1. Recentemente, a CVM colocou em audiência pública uma minuta de Instrução que tem como propósito atualizar e reunir as hipóteses de "infração grave" cometidas no âmbito do mercado de valores mobiliários. Para que se entenda o contexto em que essa Instrução está sendo proposta, e para que se possa melhor avaliar os seus impactos, faz-se necessária uma breve explicação preliminar.

2. A lei 6.385/76 (clique aqui) regula o mercado de valores mobiliários, tendo criado a Comissão de Valores Mobiliários – CVM e fixado as suas atribuições. O artigo 11 da referida lei disciplina as penalidades que podem ser aplicadas pela autarquia no caso de infração a uma norma da própria ei 6.385/76, da lei de sociedades por ações, das suas resoluções, ou mesmo de outras normas legais cujo cumprimento lhe incumba fiscalizar.

3. As seguintes possibilidades de penalidade foram previstas: (i) advertência; (ii) multa; (iii) suspensão do exercício do cargo de administrador ou de conselheiro fiscal de companhia aberta, de entidade do sistema de distribuição ou de outras entidades que dependam de autorização ou registro na CVM; (iv) inabilitação temporária, até o máximo de vinte anos, para o exercício dos cargos referidos no inciso anterior; (v) suspensão da autorização ou registro para o exercício das atividades referidas na lei; (vi) cassação de autorização ou registro, para o exercício das atividades referidas na lei; (vii) proibição temporária, até o máximo de vinte anos, de praticar determinadas atividades ou operações, para os integrantes do sistema de distribuição ou de outras entidades que dependam de autorização ou registro na CVM; e (viii) proibição temporária, até o máximo de dez anos, de atuar, direta ou indiretamente, em uma ou mais modalidades de operação no mercado de valores mobiliários.

4. Contudo, nos termos do § 3º do mesmo artigo 11, todas essas penalidades, com exceção da advertência e da multa (que são consideradas mais brandas), só podem ser aplicadas diante da hipótese de uma infração chamada "grave", devendo a CVM definir, por meio de normas próprias, aquilo que deve ser considerado "infração grave". Incumbe, portanto, à própria CVM classificar as infrações segundo a sua gravidade, reservando as penalidades mais severas àquelas que considerar serem "graves".

5. Atualmente as hipóteses de "infração grave" estão previstas nas Instruções CVM 6/79 (clique aqui), 18/81 (clique aqui) e 131/90 (clique aqui). De acordo com as citadas Instruções, são consideradas infrações graves:

a) o descumprimento de determinação feita às companhias abertas no sentido de que republiquem, com as correções ou aditamentos determinados pela CVM, e dentro do prazo por esta fixado, demonstrações financeiras, relatórios ou informações divulgadas;

b) o embaraço à fiscalização da CVM, entendido tal embaraço como a omissão (i) em atender, no prazo estabelecido, a intimação para prestação de informações ou esclarecimentos que houver sido formulada pela CVM; ou (ii) em colocar à disposição da CVM os livros, os registros contábeis e documentos necessários para instruir a sua ação fiscalizadora;

c) o exercício abusivo de poder pelo acionista controlador, como previsto no artigo 117 e seus parágrafos, da lei 6.404/76 (clique aqui) - "lei das sociedades por ações";

d) a prática de atos que caracterizem desvio de poder ou conflito de interesses com a companhia, bem como a violação aos deveres de diligência e de lealdade pelos administradores ou pelos membros do Conselho Fiscal, em violação aos artigos 153, 154 e seus §§ 1º e 2º, 155 e seus §§ 1º e 2º, 156 e seu § 1º e 165, todos da lei das sociedades por ações;

e) a distribuição de dividendos em inobservância ao disposto nos artigos 201, 202 e seu § 5º, e 205 e seu § 3º, todos da lei das sociedades por ações;

f) o favorecimento de sociedade coligada, controladora, ou controlada, pelos administradores, conforme prevê o artigo 245 da lei das sociedades por ações; e

g) a inobservância de orientação geral e de instruções expedidas pelos administradores do grupo, pelos administradores de sociedades filiadas, em desrespeito ao artigo 273 da lei das sociedades por ações.

6. Ressalte-se que a Instrução CVM 131/90 (clique aqui) faz ainda referência à hipótese de violação aos artigos 254 e seus §§ 1º e 2º e 255 e seus §§ 1º e 2º, ambos da lei das sociedades por ações. Todavia a compreensão dessa hipótese de infração grave, que diz respeito à alienação de controle, está hoje prejudicada pela revogação do primeiro dispositivo e pela nova redação dada ao segundo, tudo isso após a lei 9.457/97 (clique aqui).

7. Traçado o contexto atual, é necessário verificar o que mudaria, se aprovada a proposta de Instrução ora submetida à audiência pública. Inicialmente, essa proposta de Instrução tem apenas dois artigos. No primeiro deles, foram elencadas as hipóteses de infração grave que ensejariam a aplicação das penalidades propostas nos incisos III a VIII, do artigo 11, da lei 6.385/76, ou seja, todas as penalidades, com exceção da advertência e da multa. No segundo, foram revogadas as três Instruções anteriores que tratavam das hipóteses de infração grave, quais sejam, as Instruções CVM 6/79, 18/81 e 131/90.

8. No que diz respeito às hipóteses de infração grave, pode-se perceber que não haveria alteração significativa do panorama anterior, resultante da compilação das três Instruções que se pretende revogar. Contudo, algumas pequenas mudanças podem ser sintetizadas nos itens abaixo:

(i) A hipótese de descumprimento de determinação de republicação feita às companhias abertas, tratada no item (a) acima, seria ampliada para incluir o descumprimento de qualquer outra determinação da CVM, feita nos termos do artigo 9º, da lei 6.385/76. Todavia, as únicas determinações adicionais previstas naquele dispositivo consistem na prestação de informações e esclarecimentos e no fornecimento de documentos à CVM, cujo descumprimento já era contemplado no item (b) acima, o qual foi repetido na proposta de Instrução.

(ii) No que se refere ao dever de lealdade dos administradores, tratado no item (d) acima, seria acrescentada a hipótese de descumprimento do artigo 155, § 4º, da lei das sociedades por ações (incluído pela lei 10.303/01 - clique aqui), o qual prevê o insider trading - utilização de informação relevante ainda não divulgada, com a finalidade de auferir vantagem no mercado de valores mobiliários.

(iii) No que diz respeito aos deveres dos conselheiros fiscais, também tratados no item (d) acima, seria introduzida a referência à hipótese de descumprimento dos §§ 1º e 2º, do artigo 165, da lei das sociedades por ações (também incluídos pela lei 10.303/01), que tratam, respectivamente, do exercício abusivo da função e da responsabilidade pessoal dos membros do conselho fiscal. Tais possibilidades parecem representar mera atualização formal, visto que já poderiam ser inferidas da referência ao caput do artigo.

(iv) Quanto ao pagamento de dividendos, referido no item (e) acima, seria acrescentada a referência à hipótese de descumprimento do § 6º, do artigo 202, da lei das sociedades por ações (igualmente incluído pela lei 10.303/01), segundo o qual os lucros não destinados às reservas, tampouco retidos por determinação da assembléia geral, nos termos dos artigos 193 a 197, devem ser distribuídos como dividendos.

(v) Seria introduzida, ainda, uma nova hipótese de infração grave, que diz respeito aos casos de incorporação, fusão e cisão. Nos termos da proposta de Instrução, passaria a constituir infração grave o descumprimento do artigo 223, §3º, da lei das sociedades por ações (incluído pela lei 9.457/97), segundo o qual as operações de incorporação, fusão e cisão que envolverem companhia aberta devem dar origem também a companhias abertas, devendo-se obter o respectivo registro e, se for o caso, promover a admissão de negociação das novas ações no mercado secundário, no prazo máximo de cento e vinte dias, contados da data da assembléia-geral que aprovou a operação.

(vi) Finalmente, a referência à violação aos artigos 254 e 255 da Lei das sociedades por ações, que haviam sido, respectivamente, revogado e alterado pela lei 9.457/97, seria substituída pela referência à violação ao artigo 254-A, caput, este último incluído pela lei 10.303/01. Nesse sentido, seria ser considerada infração grave a não realização de oferta pública de aquisição de ações, após a alienação, direta ou indireta, do controle de companhia aberta, oferta pública que deve englobar todas as ações com direito a voto, assegurando aos seus detentores o pagamento mínimo de 80% do valor pago pelas ações integrantes do bloco de controle. Como o artigo revogado também previa a realização de oferta pública seguida da alienação de controle, não se pode considerar que houve propriamente uma inovação, mas, sim, a regularização de uma referência que havia perdido o seu sentido, em razão de alterações promovidas na legislação societária.

9. Com as alterações indicadas acima, permaneceriam as hipóteses atuais de infração grave. Tais hipóteses, que seriam organizadas e atualizadas, identificam as condutas que podem implicar na aplicação das penalidades mais severas pela CVM.

10. Por fim, vale destacar que qualquer sugestão ou comentário referente à proposta de Instrução deve ser encaminhado à Superintendência de Desenvolvimento de Mercado da CVM até o dia 14/5/10.

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*Associada do escritório Pinheiro Neto Advogados

**Sócio do escritório Pinheiro Neto Advogados

* Este artigo foi redigido meramente para fins de informação e debate, não devendo ser considerado uma opinião legal para qualquer operação ou negócio específico.

© 2010. Direitos Autorais reservados a PINHEIRO NETO ADVOGADOS












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