A Economia do Estado e o Direito do Contribuinte
Rodrigo Cesar Caldas de Sá*
Para facilitar e atrair investimentos o Estado concede benefícios fiscais esporádicos, que na maior parte das vezes alivia a parte mais evidente desse peso – o valor do tributo a ser pago. Essa variável está longe de ser o único fator de atração de investimentos em termos fiscais. Se o custo do tributo é razoavelmente diminuído, mas o sistema fiscal continua complexo, o custo do contribuinte para conhecer e cumprir as normas continua alto. Sem falar no risco de cometer equívocos que levam ao pagamento de multas ou mesmo perda de benefícios.
Da mesma maneira, a aplicação da legislação tributária também pode se revelar um peso para o contribuinte, não importa qual seja o valor do tributo. Fiscalizações intermináveis, pedidos desnecessários de documentos e perícias, multas visivelmente incabíveis, interdições arbitrárias, enfim, a prática de abusos por parte de agentes do Fisco também acarreta custos para o contribuinte. E isso não se resolve com benefício fiscal nem economia.
Enquanto estiver batalhando somente no campo o econômico, o contribuinte discute com o Estado sob perspectiva que pouco conhece ou controla. Não é difícil cair na armadilha de buscar a redução da carga, acreditando que se trata tão somente do valor direto do tributo. O Estado estará sempre mais bem preparado para argumentar e agir nesse cenário. Não gostaria de passar uma impressão maniqueísta de que o Estado é mau e os contribuintes são bons. Não é isso. Nós todos sabemos que o Estado é mau e alguns contribuintes também. O que se coloca é que o conflito de interesses tem sempre sido discutido sob uma perspectiva econômica na qual o contribuinte é claramente hipossuficiente.
A redução no valor dos tributos pouco facilitará a vida do contribuinte se não vier acompanhada de segurança jurídica. Segurança jurídica é manutenção de uma mínima estabilidade no sistema tributário, em âmbito legislativo, executivo e judicial. Em outras palavras, a organização da teia normativa fiscal, a racionalização da aplicação da legislação tributária, a consecução de uma justiça fiscal estável.
Pioneiro na área fiscal, como em tantas outras, o Estado do Paraná lançou, por meio da Lei Complementar nº 107, de 11.1.2005, o seu Código de Defesa do Contribuinte. É certo que os resultados dessa legislação deverão aguardar a devida aplicação. Mas os avanços contidos na Lei, com relação aos direitos dos contribuintes, poderão se mostrar um poderoso instrumento moderador da atividade do Estado e regulador das relações com os contribuintes, de maneira mais equilibrada.
A Lei traz algumas normas de cunho econômico, como a determinação, no artigo 2º, de que a instituição ou majoração de tributos deverá atender a princípios de eficiência econômica e simplicidade administrativa, dentre outros. A perspectiva econômica continua, como não poderia deixar de ser, forte, mas transformada em princípios agora jurídicos que vinculam a atividade do Estado.
Em termos de racionalização da teia normativa, o texto é também inovador. O artigo 9º determina que as leis, regulamentos e demais normas que modifiquem matéria tributária indicarão claramente as que estiverem sendo revogadas ou alteradas, identificando, com clareza, o assunto, a alteração e o motivo desta. A cada dois anos o Poder Executivo Estadual expedirá, por decreto, a legislação vigente consolidada. Essas medidas trarão economia efetiva aos contribuintes, reduzindo sem dúvida a carga tributária direta e indiretamente.
Com relação aos direitos, digamos, individuais, percebe-se um reequiíbrio na relação com o Fisco. No artigo 15, estão citados direitos como o de identificar o servidor de repartição fazendária, conhecendo-lhe a função; prestar informações apenas por escrito, em prazo não inferior a cinco dias; não ser obrigado a exibir documento que já se encontre em poder da administração pública. Determina-se ainda a reciprocidade de tratamento entre a administração fazendária e o contribuinte no que diz respeito a pagamentos, reemebolsos, juros e atualização monetária Quem lida diariamente com essas dificuldades bem sabe o valor de transformar o óbvio em norma jurídica positiva.
Há algum tempo já, setores da sociedade civil resolveram agir, por meio de movimentos organizados, para tratar de assuntos pontuais ou gerais, regional ou nacionalmente. É o caso, por exemplo, das ações do Centro de Estudos de Sociedades de Advogados de São Paulo (CESA), do Instituto Brasileiro de Planejamento Tributário (IBPT) e da Câmara Americana de Comércio de São Paulo (AMCHAM / SP), apenas para citar alguns. Recentemente, tem sido grande a movimentação em torno da Medida Provisória nº 232, que aumenta a carga tributária em quase todos os sentidos – aumento de base de cálculo, alíquota e complexidade do sistema, além das violações à reciprocidade de tratamento com os contribuintes.
É importante ter em mente, como têm tido essas instituições, que o peso da carga tributária tem muito mais elementos que o valor direto dos tributos. O contribuinte precisa estar melhor aparelhado, juridicamente, para opor à necessidades econômicas do Estado a força dos seus direitos. Para o próprio Estado, a existência de direitos dos contribuintes é até mais saudável que a mera concessão de benefícios fiscais. Afinal, para os investidores, o valor do tributo é um custo que pode ser compensado com outros fatores econômicos. Segurança jurídica não se pode compensar, e apenas com sua presença é possível estabelecer relações minimamente estáveis e duradouras. Fundamental para um desenvolvimento verdadeiro.
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*Advogado do escritório Trigueiro Fontes Advogados
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