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Concessão de rodovias: a retomada do foco no serviço

O Estado da Bahia lançou em consulta pública o edital de concessão do Sistema Rodoviário BA-093, composto por rodovias da Região Metropolitana de Salvador (RMS).

3/2/2010


Concessão de rodovias: a retomada do foco no serviço

Tatiana Matiello Cymbalista*

O Estado da Bahia lançou em consulta pública o edital de concessão do Sistema Rodoviário BA-093, composto por rodovias da Região Metropolitana de Salvador (RMS). Muito mais do que a retomada de concessões no Estado e a importância do Sistema à economia da RMS – já que é por meio dessas rodovias que o Pólo Petroquímico de Camaçari, o Centro Industrial de Aratu, além do parque industrial da região, escoam sua produção e são abastecidos por insumos – a minuta posta à consulta pública reafirma o novo modelo de concessões rodoviárias, inaugurada no 2ª Etapa das Concessões de Rodovias Federais.

Este novo modelo tem o mérito de conceber a concessão com o foco nos serviços prestados pelo concessionário, o que, de fato, nunca deveria ter sido relegado ao segundo plano. A qualidade dos serviços prestados deve reger o contrato, ao passo que os investimentos previstos são aqueles definidos na exata necessidade do cumprimento dos parâmetros de desempenho operacional contratualmente estabelecidos.

A redução de investimentos é essencial à cobrança de tarifas de pedágio reduzidas, desonerando os usuários das rodovias. No caso específico do Sistema Rodoviário BA-093 esta preocupação é ainda mais relevante, já que parte do tráfego é composto por moradores dos municípios da Região Metropolitana de Salvador ou de pessoas que trabalham nesta região, onde a tarifa do pedágio pode afetar negativamente o uso do bem público rodoviário.

A restrição de investimentos não implica em má prestação dos serviços. Pelo contrário. O contrato prevê regras claras e rígidas de cumprimento de parâmetros de desempenho (referentes à recuperação, manutenção, conservação e operação) suficientes para permitir a fluência do tráfego com segurança. Por outro lado, as obrigações de ampliação de capacidade estão atreladas aos níveis de serviço do High Capacity Manual, de modo a obrigar o concessionário a realizar as obras de duplicação e de construção de faixas adicionais sempre que o volume diário médio de veículos alcançar níveis superiores. Esta providência assegura que a realização de investimentos seja feita na exata medida do necessário à fluidez do tráfego, evitando gastos desnecessários que oneram a tarifa de pedágio.

O novo modelo também inova ao estabelecer o desconto de reequilíbrio, essencial ao sucesso do regime de cumprimento de parâmetros de desempenho. É certo que o cumprimento dos parâmetros de desempenho exige investimentos do concessionário, que são contemplados em sua proposta de valor de tarifa. Uma vez contratada a concessão, é de se esperar que o concessionário atenda aos parâmetros de desempenho, o que pressupõe a realização de todos os investimentos previstos em sua proposta. Se estes parâmetros são descumpridos, assume-se que os investimentos não foram feitos conforme previsão contratual, o que gera situação de desequilíbrio que favorece o concessionário, já que continuará a receber o mesmo valor de tarifa de pedágio, estabelecido conforme um volume de investimentos que não ocorreu. É nesta situação que atua o desconto de reequilíbrio, pelo qual o concessionário tem parte da sua receita tarifária contida pelo poder concedente, em compensação à falta de investimentos para os quais se obrigou contratualmente. Da mesma forma que o aumento imprevisto das obrigações (e, por conseguinte, dos investimentos) gera o direito do concessionário à recomposição do equilíbrio econômico-financeiro do contrato, é de se esperar que a redução inesperada dos investimentos, em prejuízo à qualidade dos serviços, também acarrete diminuição da receita, com vista a recompor o equilíbrio.

Outra importante inovação deste modelo é a recomposição do equilíbrio contratual por meio do fluxo de caixa marginal, assim entendido como a projeção da variação no desempenho da conta caixa do concessionário, medindo a influência de alterações das atividades de operações, investimentos e financiamentos decorrentes de um determinado evento sobre o comportamento do caixa da concessionária. Na prática, o fluxo de caixa marginal, ao substituir o tradicional método da recomposição em virtude da taxa interna de retorno - TIR da concessão, permite que o resultado do reequilíbrio seja muito mais condizente com o real impacto do fato que comprometeu a equação contratual.

As inovações do modelo não passaram incólumes e vêm enfrentando ataques desde a concessão de trechos da BR 324/116. A resistência eventualmente manifestada contra a incorporação destes novos institutos é provocada muito mais pelo apego do modelo tradicionalmente adotado, em que o concessionário acaba, por muitas vezes, em posição vantajosa frente ao poder concedente e aos usuários. Nada há, no entanto, que desabone o novo modelo, uma vez que seus elementos estão de acordo com a legislação vigente, além, por óbvio, dos benefícios trazidos à concessão dos serviços públicos.

Fato é que as concessões de serviços públicos, como um todo, compõem um processo permanente de evolução. Cabe à Administração Pública e ao próprio mercado manejar da melhor forma possível a ampla liberdade concedida pela legislação à modelagem de projetos, com vistas a absorver o máximo de vantagens em cada caso. É óbvio que o modelo encampado na concessão do Sistema Rodoviário BA-093 não é definitivo – e pode mesmo não ser o mais adequado em determinadas situações. Contudo, propõe solução eficiente para a concessão que garanta a qualidade da prestação em troca de um valor inferior de tarifa de pedágio.

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*Sócia do escritório Manesco, Ramires, Perez, Azevedo Marques Sociedade de Advogados

 

 

 

 

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