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Tempos de IBCCRIM

Editorial do mês de março/2021

segunda-feira, 1 de março de 2021

Atualizado em 21 de outubro de 2022 16:16

Um novo ciclo se inicia no IBCCRIM. Como ocorre a cada biênio, em janeiro o Instituto renovou seu quadro diretivo. Os novos mandatos não são apenas uma mudança de nomes. É a manifestação de que o Instituto permanece vivo, com o envolvimento, a participação e o compromisso de todos os seus associados.

Mais do que simples mudança gerencial, a nova gestão é - deve ser - oportunidade de novos olhares e novas perspectivas sobre o Instituto, sua missão, seus valores, suas prioridades. Partindo do muito que foi feito até aqui, é preciso avançar. Os tempos atuais o exigem especialmente.

O País vive um momento delicado. Junto aos desafios e problemas nacionais - há muito conhecidos, quase nunca enfrentados com a ousadia que merecem -, os tempos atuais representam um claro retrocesso no respeito às liberdades fundamentais. Exemplo disso é a revelação de clara afronta ao equilíbrio das partes e à isenção do juiz em famoso processo - e a reação fraca da sociedade perante tal escândalo.

O Estado Democrático de Direito brasileiro vê-se encoberto novamente por estranhas nuvens autoritárias. O que parecia há muito superado ressurge desavergonhadamente. Em vez de racionalidade e compromisso social, políticas públicas expressam e reproduzem intolerância, ressentimento e brutalidade. Nesse cenário, o sistema penal é alvo fácil de velhos sofismas, como manobra para se oferecer a receita populista de sempre: o endurecimento da lei penal e processual penal. Assim, em vez de procurar aperfeiçoar o sistema penal, reforçam-se e potencializam-se seus piores defeitos.

Além disso, há a pandemia de Covid-19, com suas consequências devastadoras no mundo inteiro - mortes, sofrimento, agravamento das desigualdades sociais, recessão econômica, incertezas em grau inédito. Aqui, para piorar a situação, redobra-se em muitos setores a aposta na irracionalidade, no negacionismo, na manipulação da realidade.

Ou seja, os tempos são desafiadores. Sem nenhuma presunção, pode-se dizer: são tempos de IBCCRIM. Desde sua fundação, o Instituto propôs-se a contribuir efetivamente na transformação da sociedade; de forma muito concreta, do sistema penal brasileiro. Não é uma entidade de objetivos diletantes, tampouco de estudos e debates alheios à realidade concreta.

O Instituto só pode realizar sua missão - sua corajosa missão - se estiver de olhos abertos ao que ocorre no Brasil - em suas muitas e diferentes realidades locais - e no mundo. As ciências criminais têm muito a contribuir nessa tarefa de pensar, debater e propor caminhos alternativos à atual realidade.

Os assuntos criminais vêm ganhando um espaço cada vez maior nas discussões do País. No entanto, é forçoso reconhecer um grande déficit de reflexões consistentes sobre a justiça penal. Quase sempre, o debate é raso e pouco apoiado em evidências. Há muitos discursos e gritos, mas falta diálogo, reflexão e estudo.

E é precisamente este o papel do IBCCRIM: promover uma conscientização crítica acerca da realidade penal do País. E se isso é um dever decorrente de sua missão estatutária, é inegável que os tempos atuais exigem um especial protagonismo do Instituto na arena pública.

Não é mera presença na mídia. Não é mero contraponto aos coros dominantes. O IBCCRIM deve ser capaz de jogar luz sobre as questões públicas, sem medo de trazer perspectivas inovadoras, que certamente serão, em algum momento, impopulares. A missão de ser a consciência crítica do sistema penal - sem arrogância, mas também sem encolhimentos - é tarefa de todos e de cada um dos Associados.

Para tanto, é preciso dar prosseguimento ao aperfeiçoamento interno do IBCCRIM, tanto em termos de gestão e transparência como de qualificação técnico-científica e de comunicação. Só assim o Instituto continuará dispondo da necessária credibilidade, interna e externa, para o cumprimento efetivo de sua missão institucional.

Aspecto relevante desse caminho é o resgate, em todas as suas dimensões, do caráter científico do Instituto. Ciência é uma palavra muito usada nos dias de hoje, mas muito pouco respeitada. A ciência é incômoda. Confronta certezas, refuta dogmas, acolhe novos olhares, testa e debate antes de emitir opiniões. Para cumprir sua missão, o IBCCRIM precisa ser sempre, com todo o rigor do termo, científico.

Assim, com embasamento técnico e racional, a voz do IBCCRIM será cada vez mais ouvida e mais relevante no debate público. Não é exagero dizer. Por força de seus Associados, o Instituto reúne um impressionante e profundo conhecimento científico. É dever de justiça, muito especialmente nos tempos atuais, fazer render esse potencial.

Nessa trajetória, o diálogo e a abertura são fundamentais. Logicamente, não se trata de transigir com violações de direitos. É antes o contrário. Para não sucumbir ao retrocesso, é preciso ouvir posições novas, ideias diferentes, caminhos alternativos. Não há verdadeiro debate científico sem um ambiente arejado da liberdade, da discordância, do pluralismo. O IBCCRIM não nasceu para ficar engessado.

Uma maior diversidade de gênero, de raça, de trajetórias profissionais e de experiências de vida é - trata-se de um compromisso da atual gestão - prioridade do IBCCRIM nos próximos anos. A inclusão é tarefa urgente e deve permear todas as atividades e dimensões do Instituto. Essa verdadeira obsessão por uma mais ampla e real diversidade será também o motor para se exigir, na seara pública, políticas inclusivas.

Não há tempo a perder. O IBCCRIM nasceu para ser um centro de excelência das ciências criminais e, a partir dessa sua específica identidade, contribuir para a promoção de um sistema penal mais justo. A um ano de seu trigésimo aniversário, com uma história ímpar de defesa dos princípios e garantias constitucionais, e ainda com tanto a fazer, o IBCCRIM convida todos os Associados a somar esforços nessa missão de ciência e de justiça - de humanidade.