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Político x Jurídico

segunda-feira, 21 de março de 2016

Atualizado às 08:11

Pode-se (e é saudável para a democracia) questionar a decisão política da presidente Dilma de nomear Lula ministro. A nós, todavia, interessa a questão jurídica, estritamente. Vamos a ela, a partir da decisão que, na sexta-feira à noite, anulou a nomeação.

Justiça apaixonada

A decisão do ministro Gilmar Mendes não o homenageia como grande constitucionalista que é. Ao contrário. Mas entende-se. A paixão turva a lógica do jurista. Com efeito, poderia ser discutida a competência acerca do novel foro privilegiado, quando este se dá em pleno andamento de investigação. No entanto, questionar a discricionariedade do ato administrativo da nomeação é forçar a barra. De modo que quem se desviou da finalidade, com todas as vênias, foi a decisão, uma vez que o caso era de competência e acabou sendo de desvio de finalidade. Aliás, a parte final do r. decisum deixa claro que a questão era unicamente de competência, pois o ministro ressalta que há "pedido de prisão preventiva e de admissibilidade de ação penal, que necessitam de definição de foro para prosseguimento".

Executivo ad referendum do Judiciário

Se se falasse apenas de competência para as investigações, o ministro Gilmar Mendes, mutatis mutandis, não seria competente para resolver monocraticamente. Com efeito, o caso seria de relatoria do ministro Teori, nas mãos de quem estão concentrados os procedimentos da Lava Jato. Por isso, provavelmente, o ministro tenha optado por anular a nomeação. A decisão, todavia, não resiste a uma assentada. Isso porque não pode o Judiciário, a não ser que queira atravessar a Praça para despachar do lado de lá, se imiscuir numa nomeação política da presidente da República. As coisas, definitivamente, não podem ser assim.

Não é bem assim...

O ministro Gilmar Mendes disse em sua decisão que "a partir do caso Natan Donadon, o STF consolidou jurisprudência no sentido de que a renúncia a cargos públicos que conferem prerrogativa de foro, com o velado objetivo de escapar ao julgamento em iminência, configura desvio de finalidade, inapto a afastar a competência para o julgamento da causa". Pois bem, assim como os ministros conhecem a Constituição de cabo a rabo, e separar este ou aquele trecho para leitura não significa intenção de fraude, também é o caso do acervo de decisões da Corte, de modo que todos sabem que o "consolidou jurisprudência" a que se refere o ministro é apenas um instrumento retórico e não deve ser lido ao pé da letra. De fato, o "consolidou" durou de junho de 2013 a março de 2014. Foi o tempo de uma gestação, apenas 9 meses, para que se parisse outra jurisprudência, diametralmente oposta. De fato, na AP 536, na qual o réu era o tucano Eduardo Azeredo, ele próprio e a maioria da Corte entenderam que a renúncia do então deputado Federal, com evidente intenção de escapar do julgamento no STF, tinha o condão de levar o processo crime para a primeira instância.