dr. Pintassilgo

Cajuru

O mundo é um lugar engraçado.

Ele cria normas de tempos em tempos, que em algum momento parecem certezas definitivas, quase como "cláusulas pétreas". Depois, esses mesmos dogmas caem por terra, vítimas dos vendavais das mudanças.

Digo isso porque li nos informativos que recebo da pomba amiga (o gosto pelas letras do amado Diretor - um devorador de bibliotecas - é difundido entre seus colaboradores), que numa cidadezinha da Itália os seus habitantes estão organizando um movimento de preservação da cultura local, contra o monstro voraz e uniformizador da globalização.

Dizem eles que aceitam as inovações e traquinarias do mundo e as matizes culturais de outros povos, mas desde que a cultura local esteja lá, firme como um poste.

Entre tantos "conflitos" de nosso tempo (Norte versus Sul, Davos contra Porto Alegre, Ocidentais e Orientais, etc.) este de interno versus externo, é apenas mais um. O pequeno tentando se manter respeitado.

Eis que chego onde queria, para falar da pacata e serena cidade de Cajuru.

Representante digna e fiel da idéia que temos de cidade do interior, ela gostosamente mantém esses traços.

E Cajuru tenta se manter assim, mas também ser respeitada como deveria ser : se os juízes se fixassem aqui por mais tempo ; que tudo se modernizasse para atender a população, que pelo visto, já está em maioria satisfeita. Mas, alguns reclames estão corretos : por que não melhorar o que já está bom ? Sempre cabe mais um espaço para um ajustezinho aqui e acolá.

Às vezes, tenho a impressão e assim fico remoendo, que as cidades menores e mais pacatas são vistas de soslaio, como se nelas nada ocorresse que merecesse menção ou atenção: por que se preocupar com um "roubo de galinhas", devem pensar alguns, abusando de um exemplo bem pobre, me perdoem.

Como se esse "roubo de galinhas" fosse algo mais digno. Agora, escalonam-se as vidas das pessoas. Um dos quesitos básicos no estudo de qualquer sociedade é o respeito às suas particularidades.

O que o povoado italiano já entendeu e está pondo em prática. Aqui, em nossa ânsia desastrada de entrarmos na modernidade, trocamos as bolas, invertermos signos, fazemos escárnio de nossa identidade nacional. Será que existe uma ?

Creio ser mais fácil achar a semente de uma identidade nacional aqui em Cajuru do que nos néons e outdoors vaidosos de São Paulo, que quase nos agridem de tanto querer aparecer.

Vejo uma identidade nacional em cada rosto que vi no Fórum daqui. Que fala sinceramente, sem aquela preocupação de ajeitar o cabelo, a atitude mais demonstrativa de falta de... personalidade.

Neste mundo onde tudo se mistura, até mesmo valores, personalidade é rara e quando achada, grita-se: "ouro ! ouro! ".

E Cajuru mantém sua personalidade : pacata, quietinha, desejando sim entrar na modernidade, mas como disseram alguns da cidade, sem perder a paz.

E assim somos nós, migalheiros, que jamais abriremos mão de nossa personalidade, ainda que nos acusem de sonhadores ou mesmo poetas cujas armas são o coração de braços abertos.

Precisamos de mais pessoas com esses apanágios, para que não fiquemos no meio de numa névoa que cega e para que os pequenos também possam ser respeitados.

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