Da vida e da sorte, não se reclama.
O "x" implora, está ávido pela solução, o obstáculo esconde a passagem, as lágrimas são abre-alas para o crescimento interior. Não podemos viver às sombras.
Da vida, hoje desprezado presente divino, não há de se queixar. Há de se agir.
Ainda que o silêncio de meu amado Diretor, que estóico observa meus vôos ao longe, seja contínuo, eu lhe agradeço em pensamentos por esta oportunidade de singrar entre o povo do meu país. Talvez um dia, quando sentarmos para celebrar o fim dessa nobre justa e jornada, ele com seu indefectível scotch, e eu com meu cristalino copo d'água, brindemos o agir.
Saí há pouco de Catanduva. Por isso, este prólogo sobre ação.
E que cidade agradável ! Ruas dispostas com linhas bem traçadas e limpas, o que por si só já merece louvores, dadas as impressões das ruas de algumas cidades do Brasil. Aqui esta limpeza é chamariz; confesso que tornou minha estada muito prazerosa.
E que calor !
Ufa ! Cidade de terra vermelha, que deu origem ao nome da cidade, faz os graus aumentarem seu poder e este pintassilgo por lá bicou em seu cantil em horas alternadas.
Cidade de fundação incerta, de fundadores cujas identidades são conhecidas, mas que dividem entre si a glória do feito de ter erguido a urbe.
Passando pelas linhas antigas e ampulhetas da História de Catanduva, vejo que parte hoje do orgulho de ser catanduvense, deveu-se à ação pertinaz de um homem: Padre Albino Alves da Cunha e Silva.
Português, nascido na aldeia de Codeçoso, foi condenado à prisão e degredo na África após a Revolução de 1910. Passou foragido pela Espanha até chegar, ao Brasil em 1912. Exercendo o sacerdócio, passou por Jaboticabal, Jaú, Barra Bonita e por fim, aportou em Catanduva 1918, onde ficou até seu falecimento em 1973.
Até conquistar os corações catanduvenses, Padre Albino sofreu na pele literalmente a desconfiança, alguns maus-tratos que tudo o que é novo amarga. O povo de Catanduva não recebeu de muito bom grado a saída do antigo pároco, o padre Caputo. Albino então recebeu uma série de insultos, até mesmo do sacristão (!), chegando ao cúmulo de receber até mesmo uma escarrada. Porém, em seu modo reservado, não deixava-se levar pela revolta nem procurava se impor pela arrogância. De acordo com as histórias dos adoradores da terra, o padre suportava tudo calado, sem perder a calma, nem demonstrava indignação.
Não era hora de reclamar. Era hora de agir. Pois ele agiu.
Com muitas dificuldades angariou os donativos necessários para a construção da Matriz e contra todas as adversidades terminou com louvor seu intento, deixando seus desafetos incrédulos. As telas do grande pintor brasileiro Benedito Calixto encontram-se na Matriz até hoje por luta e obra de Albino.
Já com certo apoio e confiança do povo, conseguido com esforço e sem choramingar, inaugurou a Santa Casa de Misericórdia, hoje Hospital Padre Albino. Depois, ergueu a Maternidade, o Lar dos Velhos.
Ele realizou em 1969, o que, de acordo com as histórias dos adoradores da terra, era seu sonho: a inauguração da Faculdade de Medicina. Faculdade esta que liberou ao Brasil uma imensa gama de médicos, que hoje atuam nas mais diversas áreas. Inclusive meu amigo e doutor de minha saúde (que rogo apenas encontrar nos momentos de festa nos próximos anos): aquele abraço, Dr. Ciro!
Depois, o Colégio Comercial Catanduva, a Faculdade de Administração de Empresas e a Faculdade de Educação Física. Outras obras me disseram que foram de sua realização (para que os migalheiros entendam onde esta pássaro que chegar): a Casa da Criança "Sinharinha Netto", Vila São Vicente de Paulo, Lar Ortega-Josué, Ginásio Dom Lafayette, Seminário "César De Bus" e Santuário Nossa Senhora Aparecida.
Ufa ! O que pode-se fazer em uma vida !
Nem mesmo, já doente, deixou de agir. Contam-me os catanduvenses que mesmo internado e amparado por uma bengala, ele ficava na recepção do Hospital para garantir que ninguém ficasse sem atendimento ! Entre risos, dizem os catanduvenses, que embora algumas vezes ele atrapalhasse os funcionários, no fim todos entendiam o motivo da "vigilância".
Seu féretro foi acompanhado por mais de 30 mil pessoas. Do mundo nada se leva, a não ser os bons momentos e as boas ações.
E agora não é hora de choramingar. É hora de ação.
Uma tempestade sem precedentes se abateu sobre Padre Albino: indiferenças e hostilidades gratuitas; porém, em nenhum momento ele cedeu. Seria fácil, ainda mais para um homem de fé, apenas rezar e pedir ao Altíssimo.
Penso que talvez que o tenha feito. Mas também agiu. Com presteza, firmeza.
E fez de Catanduva um orgulho para seu povo.
Catanduva da qual saí agora há pouco, de ruas geometricamente alinhadas, de ruas limpas, de calor intenso: do sol e do povo.
Catanduva, você me ensinou muito.