dr. Pintassilgo

Ibitinga

É o fim do fim de semana !

Aproveitei, como talvez todos, para descansar. Saindo da angélica Miguelópolis, na sexta-feira, voei rápido com destino à Redação de Migalhas.

Queria, o quanto antes, rever os amigos. Ah! E como é bom. A amizade é um dos bálsamos que torna nossa estadia neste mundo mais feliz.

Abracei todos e fui, rapidamente, prestar contas a nosso amantíssimo líder.

Depois de fazer algumas breves advertências, coisa de duas horas apenas, o Diretor deste vibrante matutino desejou-me sucesso nas próximas comarcas. Revigorado e com o desiderato de poder ser útil ao mundo do Direito, parti na madrugada desta manhã de segunda-feira do alto do suntuoso prédio de Migalhas com destino certo.

Ainda havia estrelas no firmamento e uma Lua quase cheia, como um balde de leite no horizonte. Com o passar das chuvas, parece que tudo está mais limpo. Torço para que a Justiça, mesmo vendada, possa também, pelos olhos da alma, sentir essa magia.

Seguindo os rios vou chegar a meu destino. A princípio, para um desavisado, pode parecer estranho, mas, do alto, são os rios que conduzem o curso de minha vida. É por eles que traço o caminho a seguir. E outro não foi o caminho seguido primeiro pelo homem. E, posso até me enganar, mas nessa toada, depredando a natureza, será a ele que todos irão um dia buscar.

Deixando as delongas que me fazem passar o tempo de vôo, pouso numa cidade na margem direita do rio Tietê. Não, aqui não há aquela poluição que tanto mal afamou o rio, e com razão.

O mesmo Tietê, no qual os paulistanos nadavam nos anos vinte do século passado, hoje é o exemplo da estultice humana. Tudo, tudo, tudo de pior vai para lá. E justo no rio que passa dentro da maior cidade da América Latina ! E justo no rio que segue ao contrário, do mar para o interior ! Quando pensamos que há centenas de anos os romanos já construíam esgotos para longe de seu Tevere, ficamos a imaginar quem teria sido tão imprudente.

Mas aqui não há tal dissabor.

Estou em Ibitinga, a Terra do Bordado.

Vejo no comércio os pontos de venda de tão apreciável arte. Essa arte de tecer é antiga e ainda fascinante. Pontos e ponto e temos a beleza e utilidade nas mãos. Dias atrás comemoramos o Dia da Mulher e agora as vendo tecer com mãos faceiras as cores no tecido, percebo que o Criador estava feliz quando as delineou : beleza e formosura, que somente elas têm a graça de realizar.

E deixando meus elogios de lado (sinceros, porém devem ser contidos), vou me aventurar nesta colcha de retalhos, sem bordados, que é o Direito pátrio.

Registro um magistrado, ímpar, confessar sem medo que a população provavelmente não está satisfeita com a prestação jurisdicional. E como tem razão esse nobre juiz, que consegue se colocar no lugar do povo, ou, melhor ainda, que enxerga sua condição de distribuidor da Justiça, mas que tem os mesmos anseios e sentimentos de todos. E, caso fosse diferente deles, nem poderia distribuir a Justiça entre os homens. Nem teria os apanágios necessários para ser um juiz humano, um juiz verdadeiro.

Com efeito, como um bordado de Penélope, a pacata Ibitinga tem os mesmos problemas e percalços que as grandes cidades.

Devo reproduzi-los ? Decerto que não. O que me traz uma teia de bordados de preocupações é o estado do povo...

Como foi desde o início. Incautos apregoarão que este pássaro tem fome de maus agouros. Não ! Essa missão inglória, e quiçá de saneamento, deixo para meus primos abutres.

Eu vôo na busca da Verdade e Beleza; substantivos tão femininos e sublimes, assim como os harmônicos traços que diviso nos bordados de Ibitinga.

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