Já existia um vilarejo na hoje Araraquara, quando o fluminense Pedro José Neto, nascido em 1760, em nossa Senhora da Piedade de Unhomirim, Bispado do Rio de Janeiro, descobriu a cidade.
Antes, em 1780, foi à freguesia da Piedade da Borda do campo (hoje Barbacena/MG), época da áurea mineração. Lá, acumulou algumas economias e aos 24 anos de idade casou-se com D. Inácia Maria, também fluminense. De seu casamento teve dois filhos: José da Silva Neto e Joaquim Ferreira Neto, que faleceram em Araraquara.
Em 1787, Pedro José Neto, com seus dois filhos e esposa, transferiu residência para Itu. Formou uma fazenda de criação de animais e de cultura de cereais. Na mesma Vila tornou se capitão-mor.
No entanto, os problemas estavam apenas por começar. Ocorre que existia um austero capitão chamado de Vicente Taques Goes e Aranha, que governava a Vila de forma autoritária, dura e violenta. Proporcionalmente ao aumento de sua intolerância era o aumento de seus desafetos, entre eles já podia ser incluído Pedro José Neto.
Em 1790, a política local estava muito agitada e Pedro José Neto, em uma discussão, esbofeteou um rival político, sendo, por isto, processado e condenado em Piracicaba (naquele tempo, Vila da Constituição), para onde o enviara o Capitão-Mor Vicente. Pedro José Neto conseguiu fugir e passou a ser tachado como criminoso por ser um foragido da Justiça. Na fuga atravessou o rio de Piracicaba, entrando nas matas que hoje se localiza a cidade de São Carlos até chegar na outra margem do rio. Descobriu os campos do sertão de Araraquara, antes somente povoada pelos índios Guaianás.
Com o tempo Pedro José Neto tornou-se possuidor de muitas terras e tendo impetrado ao governo o perdão de seu crime, foi lhe concedido o indulto em atenção aos seus valiosos serviços prestados no desbravamento no “Sertão de Aracoara”.
Já em 1805, Pedro José Neto, com os dois filhos, havia construído a Capelinha do nascente bairro de Araraquara. Após, fez um requerimento às autoridades eclesiásticas, pedindo que a capela fosse elevada a freguesia, desmembrada da de Piracicaba, no que foi atendido, sendo seu padroeiro São Bento. Foi escolhido esse santo a pedido do Barão de Itu, Bentos Paes de Barros, doador da imagem e amigo íntimo de Pedro José Neto. Este não pode compartilhar da alegria dos habitantes do bairro: vinte dias depois, em 19 de novembro de 1817, falecia vítima de um acidente. Seu corpo, envolto no hábito de São Francisco, foi sepultado na Igreja, que era onde se faziam os enterros naquele tempo. O vigário Manoel Malaquias anotou, à margem do lançamento: Fundador desta Matriz.
O Primeiro Presidente da Câmara Municipal foi Carlos José Botelho.
Em 22 de agosto de 1817 foi criada a Freguesia de São Bento pela Resolução nº 32. Em 30 de outubro de 1817 elevada à categoria de Distrito. Em 10 de julho de 1832 passou à categoria de Município, que foi instalado em 24 de agosto de 1833.
Embora haja saudosistas que defendam o significado do trabalho do cidadão araraquarense, Pio Lourenço Correia – “Monografia da palavra Araraquara” moradas das araras para a palavra Araraquara – um pouco de história e um pouco de Tupi – provou, à saciedade, que a homofonia e homografia do elemento arara, com o nome das policrômicas aves pscitacídeas e sua junção ao substantivo tupi, quara, com a significação de buraco, foram a origem da confusão. No seu entender, o elemento – arara – não é mais que a conjunção de duas vozes tupis: ara e ara, que a prolação defeituosa juntou, sendo seu significado – dia, luz, sol, aurora. Daí buraco do dia que, literária e extensivamente, traduziu-se por – Morada do Sol. No histórico de D. Elisa Sales Marin, vamos encontrar, também, as seguintes afirmativas: o Dr. Francisco José de Lacerda e Almeida, astrônomo português, em 1788, fez uma viagem pelo interior do país, de Vila Bela (hoje Cáceres – Mato Grosso) até a cidade de São Paulo, pela ordinária rota dos rios; em viagem pelo Tietê, diz o Dr. Francisco no seu Diário que, segundo uma senhora idosa de Araritaguava, antigo nome Porto Feliz, conhecedora da língua indígena, esta terra, em tempos idos, chamou-se Aracoara ou Araquara que quer dizer Ara – dia e Coara ou Quara – morada – (morada do dia).
É possível encontrar esta etimologia em John Lucclck (Londres, 1820) que fez parte da comitiva de D. João VI. No Dicionário Geográfico do Império do Brasil de J. C. R. Milliet, encontramos escrito Araquara sendo a ortografia correta. É verdade que com o tempo, os novos habitantes, descendentes de portugueses, alongaram a palavra em vez de abrevia-la, como seria para supor, fazendo de Araquara – Araraquara, o que se explica por ignorarem eles a língua tupi e julgarem, naturalmente, tratar-se de araras.
Dr. Honório Fernandes Monteiro
Nasceu em Araraquara a 25 de junho de 1894. Fez o curso de Humanidades no Ginásio Estadual de Campinas. Em 1915 matriculou-se na Faculdade de Direito de São Paulo, bacharelando-se em 1919. Tornou-se, desde então, um dos advogados mais assíduos do Foro da capital. Em 1902, inscreveu-se no concurso para livre-docente de Direito Comercial. Sendo aprovado e nomeado em novembro do mesmo ano, recebeu simultaneamente o grau de doutor em Direito. Com o falecimento do professor Otávio Mendes, em novembro de 1931, passou a reger a cadeira vaga de Direito Comercial, cargo que exerceu até 1934. Em maio de 1932, foi-lhe atribuída também a cadeira de Direito Comercial, do professor Waldemar Ferreira, então secretário da Justiça e Segurança Pública. Além da regência das duas cadeiras, foi ainda encarregado da disciplina Economia e Legislação Social, do curso de doutorado. Em 1933, inscreveu-se no concurso para a cátedra de Direito Comercial e, aprovado, foi nomeado em 1934 professor catedrático. Em 1943 ocupou o cargo de Diretor da Faculdade de Direito de São Paulo, que deixou em 1945, em razão da sua eleição para deputado à Assembléia Nacional Constituinte, vindo a ocupar a presidência da Câmara dos Deputados; em outubro de 1948, foi nomeado Ministro do Trabalho do Governo Gaspar Dutra. Foi ainda membro do Conselho Estadual de Educação, da Câmara de Ensino Superior e representante da Congregação da Faculdade de Direito no Conselho Universitário, tendo-lhe sido conferido o título de professor emérito. Faleceu a 28 de fevereiro de 1969. Obras Publicadas : Da mulher casada commerciante. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1929. Do crédito bancario confirmado. São Paulo: Saraiva, 1933. Prelecções de direito commercial. São Paulo: Linotechnica, 1937. Fundação publica. Revista de Direito Publico, São Paulo, v.2,1937. p. 122-130.
Dr. Lybio José Martire
Nascido na cidade de Araraquara, estado de São Paulo, em 31 de Maio de 1914. Fez seus primeiros estudos na Liceu Coração de Jesus. Entrou para a Faculdade de Direito em 1933 e bacharelou-se em 1938. Sócio fundador da Associação Acadêmica “ Álvares de Azevedo”. Ex-presidente da “ Ação Nacional Universitária”. Colaborador de todos os jornais e revistas acadêmicos de seu tempo. Colaborador de vários jornais e revistas do país: “O imparcial”, de Araraquara; “Folha do Povo”, de Bauru; “O Duartinense”, de Duartina; “Correio Paulistano” de São Paulo; “Jornal do Brasil”, do Rio de Janeiro. Publicou: “Poetas Acadêmicos” (1938, 1ª edição esgotada. Colaboração com Pero Neto) – “Motivos” (1938, 1ª edição) – tem no prelo: “Amor de Zingala” (Contos e Novelas).
ARARAQUARA
Quisera descrever num poema de ouro,
num poema ideal, excelso, imorredouro,
a divinal poesia e a graça rara,
dessa eterna e gloriosa Araraquara!
Dessa terra repleta de belezas,
que é o berço perenal de mil grandezas,
da formidável pátria brasileira!
Terra esplêndida, quente, feiticeira,
palco de heróis, romances, epopéias...
De morenas gentis e melopéias
deslumbrando nas cenas multicores
de suas praças, vilas e arredores!
Eu te admiro, cidade dos amores,
reino encantado de visões e cores...
Eu te admiro de todo o coração.
E si penso em ti, compreendo a razão,
porque teu povo te chamou um dia,
cheio de orgulho, cheio de ufania:
a morada possante e varonil,
do sol que ilumina a terra do Brasil!
Eu te amo, ó minha Araraquara linda!
E si te vejo, te amo mais ainda.
Pois, si és o reino onde o astro-rei mora,
o és, também, dessa que minh'alma adora;
dessa meiga criança estremecida,
- sol risonho que aclara a minha vida, -
dessa que reúne as minhas alegrias:
- a minha amada, a vida de meus dias! -
Joaquim Lourenço Corrêa
Extremado patriota na Guerra do Paraguai ; ofereceu dois filhos para a lista de voluntários e um deles veio a falecer com apenas 21 anos de idade.
Antonio Lourenço Corrêa
Digno de respeito e admiração, Antonio Lourenço Corrêa foi uma das pessoas de realce de sua época e uma das mais ligadas à história de Araraquara. Nasceu em Araraquara no dia 19 de novembro de 1848. Era filho de Joaquim Lourenço Corrêa e de Francisca Michelina de Morais. Seu pai, o Comendador Joaquim Lourenço Corrêa chegou em Araraquara em 1840, procedente de Porto Feliz. Aqui chegando fundou a fazenda São Lourenço, onde a cultura de cana-de-açúcar foi a sua maior preocupação. Era senhor de fortuna já acima da média para os tempos de então. Antonio Lourenço Corrêa teve mais 12 irmãos, entre os quais Pio Lourenço Corrêa , talentoso escritor e um dos mais completos conhecedores da história de Araraquara, desde os seus primórdios. Antonio Lourenço Corrêa dedicou toda a sua vida à cidade de Araraquara, principalmente na década de 1880, quando mais acentuadas eram as divergências que agitavam a cidade, não só em relação à nova construção da Igreja de São Bento (Matriz), como também a construção da Estrada de Ferro Araraquara (EFA).
Pio Lourenço Corrêa
Nasceu em Araraquara a 12 de maio de 1875 e morreu na mesma cidade a 12 de junho de 1957. Órfão aos 12 anos, teve como tutor seu irmão Antonio Lourenço Corrêa, que o mandou para São Paulo a fim de estudar. Em São Paulo foi morar na casa de seu padrinho, o Dr. Joaquim de Almeida Leite Moraes, que havia sido advogado em Araraquara, de cuja Câmara Municipal foi presidente (que naquele tempo exercia também as funções executivas, hoje atribuídas aos prefeitos). Voltou então para Araraquara e, uma vez estabelecido, casou em 1898 com sua sobrinha Zulmira de Moraes Rocha, com quem não teve filhos. Interrompidos a contragosto os estudos, nem por isso Pio Lourenço deixou os livros ou perdeu a paixão pelo saber. Grande leitor, muito dotado para as línguas e para a observação da natureza, tornou-se com os anos um homem de rara informação, senhor de uma bela biblioteca, na qual se destacavam as obras de zoologia e de estudos lingüísticos, inclusive uma extraordinária coleção de dicionários e enciclopédias. Intelectual desviado dos seus pendores pela necessidade de ganhar a vida, ele foi contudo, em toda a extensão do conceito, um homem de cultura. Em Araraquara foi comerciante e por algum tempo banqueiro, mas sobretudo fazendeiro, dono da Fazenda São Francisco, que administrou com zelo quase científico.
"Macunaíma"
"Macunaíma, o herói sem nenhum caráter" de Mário de Andrade foi escrito na chácara de Pio Lourenço, benfeitor de Araraquara, em uma semana de rede e muito cigarro, de 16 a 23 de dezembro de 1926. Nascido em 1893, Mário na infância juntava-se periodicamente na capital com seus primos araraquarenses, da família de Cândido Lourenço Corrêa da Rocha, marido de sua tia Isabel. O modernista esteve várias vezes na chácara Sapucaia que hoje abriga o Centro Cultural. Em algumas, para se recuperar de crises emocionais, como a perda de seu irmão Renato em 1913, e em outras, para descansar de férias como em 1926, quando redigiu a rapsódia transformada no livro Macunaíma. Ao completar quarenta anos, Mário sofreu séria crise de depressão. Com fases mais brandas ou profundas, a doença o acompanhou até o fim de sua vida. Enfermo, sempre recorreu às temporadas em Sapucaia.
Ignácio de Loyola Lopes Brandão
Nasceu em Araraquara no dia 31 de julho de 1936, dia de Santo Ignácio de Loyola. Inicia seus estudos na escola primária de D. Cristina Machado, em 1944, onde cursa o primeiro ano. No ano seguinte transfere-se para a escola da professora D. Lourdes de Carvalho. Seu pai, que chegou a publicar histórias em jornais locais e que conseguiu formar uma biblioteca com mais de 500 volumes, o incentivou a ler desde que foi alfabetizado. Fascinado por dicionários, chegou a trocar com seus colegas de classe palavras por bolinhas de gude e figurinhas. Mais tarde, esse fato acabou se transformando no conto "O menino que vendia palavras", primeiro a ser publicado pelo autor. Dado o primeiro passo, o precoce escritor passa a escrever reportagens, críticas de cinema e entrevistas em outro diário de Araraquara, O Imparcial. Nele aprende a arte da tipografia, lidando com composição com linotipo, clichê em zinco e paginação em chumbo. Em 1955 inaugura a primeira coluna social da cidade. Ignácio se apaixona pelo cinema e participa, em 1953, das filmagens de "Aurora de uma cidade", semidocumentário dirigido por Wallace Leal. No ano seguinte funda o Clube de Cinema de Araraquara. É autor, juntamente com Rodolpho Telarolli, do livro Addio Bel Campanile - a Saga dos Lupo.
Crônica - 11
"O tempo, a rapidez, a velocidade. Ninguém mais pode perder um segundo, todos correm. Para onde e para que e por quê? Uma vez, com um grupo de amigos, fomos para Araraquara. Era um carnaval, Semana Santa, casamento de alguém. Saímos juntos, cinco carros. Logo, um se distanciou, sumiu. Os outros foram despreocupados. Parando, comendo salgadinhos aqui, pamonha ali, cerveja, um cafezinho. Curtindo a viagem. Quatro horas depois, estávamos todos na cidade. Ao chegarmos, encontramos o amigo que tinha disparado. Sentado na varanda da casa, sozinho, olhando para o ar. Não tinha nem paisagem para contemplar. Nos gozou:
— Puxa. Como demoraram! Vieram de tartaruga? Sabem que já faz mais de quarenta minutos que cheguei? Ganhei tempo, gente!
— Ah, é? E o que fez nestes quarenta minutos?
— O que fiz? Como o que fiz?
— Nós paramos, conversamos, bebemos, nos divertimos. E você fez o quê?
— Ora, fiz o quê? Sentei e fiquei esperando vocês chegarem, suas lesmas.
Entendem o que digo? Para quê?
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Dr. Francisco Scalamandré Sobrinho
Nascido em Araraquara em 1902, Farmacêutico formado pela Faculdade de Farmácia e Odontologia. Foi Secretário de Saúde do estado de São Paulo e Deputado Estadual.
Dr. Leonardo Barbieri
Nascido em 6 de maio de 1922 foi Deputado Federal.
Pio Corrêa da Rocha
Fez parte do 7º Batalhão de Voluntários Paulista e uniu-se ao exercito em operações contra o Paraguai, morreu na batalha de 18 de julho de 1866.
Rômulo Lupo
Nasceu em 1º de fevereiro de 1902, em Araraquara, filho de Henrique Lupo e de Dona Judith Bonini Lupo. De família numerosa, o primogênito Rômulo teve os seguintes irmãos: Rolando, Maria Renata, Edda, Henriqueta, Aldo, Ione, Elvio, Wilton e a caçula Nereide. Quando Rômulo nasceu, a família residia na rua 9 de Julho (Rua 2), próximo ao largo da Santa Cruz. Nessa época, seu pai Henrique possuia a relojoaria *A Pêndula da Perfeição*, localizada na rua 9 de Julho, nº 66. Tendo feito o curso secundário no Liceu Coração de Jesus, em São Paulo; já que o primário o fez em Araraquara, Rômulo muito cedo mergulhou no aprendizado prático dos negócios, ao lado do pai. Desde os tempos da relojoaria e do comércio dos produtos dentários, abandonados no momento em que a fábrica de meias se firmou, ele começou a viajar. Assim que estava com a carta de motorista em mãos, expedida em 4 de setembro de 1922, Rômulo passou a percorrer a freguesia no seu carro Ford. Meticuloso, mesmo que o céu estivesse limpo, ele achava bom levar as correntes para as rodas, pneus sobressalentes, espátula e cola para remendar câmaras. Conferia-se o arsenal típico de caixeiros-viajantes. A diferença é que a maioria usava trens e jardineiras. Na década de 1920, à medida que a fábrica crescia e a marca ganhava prestígio, as distâncias e durações das viagens aumentaram na mesma proporção. O mercado local conquistado, as meias avançaram pela região, espalharam-se pelo País, ocupando espaço. Rômulo foi um pioneiro nessas viagens, atravessando o Brasil inteiro, antes de assumir juntamente com a família a parte diretiva da fábrica. Em 10 de julho de 1939, casou-se em primeiras núpcias com a senhorita Luiza Adélia Eberle Lupo. Desse matrimônio nasceu a filha Judith Elisa Lupo. Permaneceu por apenas dois anos casado, ficando viúvo em julho de 1941, época em que sua filha Judith tinha apenas 14 meses de vida. Ao contrário de seu irmão Aldo, o qual foi deputado estadual e federal, Rômulo preferiu se restringir ao âmbito local na política. Foi convidado a ser candidato a deputado estadual e recusou; também outros convites lhe foram feitos e também recusados. A verdade é que depois da breve passagem pela Câmara Municipal, em 1936, Rômulo só voltou a atuar na política em 1955. Sempre foi voz corrente, no entanto, que dentro de uma facção que aspirava a mudanças na administração da cidade, nada se passava sem o aval de Rômulo. No início de 1955 sugiram rumores sobre a candidatura, concretizados no dia 8 de agosto, quando ele oficializou a candidatura através da Rádio Cultura. Acentuou que seu programa de governo era municipalista e que pretendia *zelar pelos interesses do município, executando tudo o que pudesse ser feito e que as condições financeiras permitissem*. Ele podia agora se dedicar intensamente ao cargo, uma vez que a fábrica, com quase 35 anos, estava com a estrutura montada, azeitada e bem conduzida pelos irmãos mais jovens Elvio e Wilton. Sempre com Henrique e Rolando por perto. As eleições foram realizadas no dia 3 de outubro de 1955. Abertos os envelopes, Rômulo obteve 6.947 votos contra 6.441 de seu oponente Vicente Micelli. Tomada a posse, Rômulo passou a administrar a cidade usando os mesmos princípios utilizados na sua empresa. A partir dessa data grandes modificações aconteceram em Araraquara. Ao terminar seu mandato, 31 de dezembro de 1959, uma de suas últimas declarações foi: “Sei que não pude contentar a todos, mas é impossível administrar uma cidade sem descontentar alguém, ou, quem sabe, descontentar muitos.... Mas procurei cumprir da melhor forma que esteve ao meu alcance, o meu dever”. Rômulo quase não participou da campanha que o elegeu prefeito, novamente, em 6 de outubro de 1963. Fez antes, uma viagem a Europa e chegou às vésperas das eleições. Em 27 de novembro de 1962, um ano e pouco antes de assumir o segundo mandato, Rômulo se casou em segundas núpcias com a professora Clarice Venusso, de família de Ribeirão Bonito, filha dos italianos Caetano Venusso e Theresa N. Venusso. E desse matrimônio nasceu a filha Cristiana Adélia Lupo, a qual lhe deu o seu único neto Rômulo Lupo de Almeida. Ao final do segundo mandato, prevaleceu na cidade a opinião de que Rômulo não reeditou a administração do primeiro. Por outro lado, não havia como reeditar o que fora feito na década de 1950. As demandas eram diferentes e os grandes problemas estavam resolvidos. A cidade saíra do marasmo. Mas mesmo assim grandes obras foram executadas. Rômulo foi um personalista que marcou sua passagem fortemente. Austero, calado, introspectivo, reservado, só falava quando necessário. Porém, falou muito pela rádio, dando contas do que fazia, como e por que fazia, no programa chamado “Você pergunta e o prefeito responde”. Taxado de sovina, nem todos sabiam que seus salários eram encaminhados para organizações beneficentes, como o Asilo de Mendicidade, o Orfanato Nossa Senhora das Mercês, a Liga de Assistência Cristo Rei e outras. Certa vez, num encontro de seis prefeitos do interior com o governador do Estado, esse brincou dizendo que tinha prazer de conhecer o prefeito mais sovina do Estado. Prontamente, ouviu: “pena que eu seja só do Estado e não de todo o Brasil”. Assim se expressou seu sobrinho Ricardo Lupo sobre seu tio Rômulo: “Em termos de inteligência (QI), velocidade de raciocínio, memória, visão, capacidade de planejamento e organização, foi um privilegiado, ou seja, era um gênio. E soube usar esses atributos com muita propriedade nos campos afetivos, morais, empresariais e políticos. Rômulo Lupo foi um marco na história de Araraquara”. Rômulo Lupo faleceu aos 74 anos de idade no dia 24 de abril de 1976, na Santa Casa de Misericórdia, estando sepultado no jazigo da família no Cemitério São Bento. Seu nome está na rua através do Decreto nº 3825, de 18 de junho de 1976, editado pelo prefeito Clodoaldo Medina, que denomina Avenida Rômulo Lupo a via pública já por esse mesmo nome conhecida e que, tendo início no córrego das Cruzes em continuação da Avenida Bandeirantes, termina na Rua 21 do Jardim Universal. Em homenagem à sua memória, no governo do prefeito Waldemar De Santi, foi esculpida uma estátua a qual está localizada na confluência da Avenida Bento de Abreu com a rua Nove de Julho.
No campo político, a cena foi dominada pelo poder dos coronéis, cuja força perdurou até a Revolução de 1930. Foi nos quadros do coronelismo, capitaneado pelos proprietários de cafezais, que Araraquara foi sacudida pelos trágicos acontecimentos como o episódio dos Britos, em 1897.
Merecendo ainda um estudo mais aguçado, um caso ocorrido em 1897 balançou a história do Brasil. Fazendo um ensaio sobre jurisprudência eleitoral, especialmente, sobre a posição política adotada pela justiça paulista diante dos conflitos eleitorais e o grau de comprometimento dos juizes com as regras da política oligárquica dominante, a pesquisadora Marília Schneider fala do tema.
Uma briga entre republicanos e monarquistas, quando já se tinha quase uma década da proclamação daquela, foi algo surpreendente. E o fato chocou mais ainda, por ter ganho contornos bairristas. Os Britos foram executados, retirados da cadeia e linchados em praça pública. Como eram sergipanos, todos os conterrâneos das cidades vizinhas e do Estado natal, clamavam por Justiça. Ouçamos a pesquisadora :
“A partir de 1896, a ampliação do corpo de magistrados resultou, conforme dito, no fortalecimento da posição segundo a qual o Tribunal de Justiça não deveria intervir nos processos de representação política nos municípios. Embora a saída do presidente Carlos Augusto de Souza Lima, em 1897, não esteja ligada a problemas de ordem eleitoral, trataremos de sua exoneração no contexto das intervenções do Executivo estadual.
Souza Lima foi o primeiro “chefe do poder Judiciário” paulista. Sua trajetória profissional foi narrada por um contemporâneo, autor de homenagens aos primeiros membros do Tribunal. Dedicado propagandista da causa republicana, a “brilhante carreira pública” do magistrado foi “interrompida” por acontecimentos que, aparentemente, não deveriam redundar em seu afastamento do Tribunal.
Em janeiro de 1897, o homicídio de um chefe político levou à prisão dois homens aos quais se atribuía o crime. Os familiares do político morto, entre os quais um “cidadão de grande prestígio político”, tramaram a retirada dos presos da cadeia para vingar a perda do patriarca. A despeito da publicidade que o intento alcançou, os presos, sem qualquer resistência das autoridades policiais, foram retirados da prisão e mortos barbaramente em praça pública. A narrativa desse episódio é concluída da seguinte maneira:
“Por força desses acontecimentos, que comoveram profundamente a opinião pública e levaram o promotor da comarca a abandonar o cargo e o juiz de direito a demitir-se, houve uma conferência, em palácio, entre os presidentes do Estado e o do Tribunal de Justiça. Ignoro o que teria ocorrido entre as duas altas autoridades, mas o fato é que o segundo, dr. Souza Lima, imediatamente depois dela se demitiu não só do cargo de presidente, como do de ministro do Tribunal.” (Faria, 1942:70)
Embora essas memórias tenham sido publicadas quarenta e cinco anos depois daqueles acontecimentos, o autor não menciona quais autoridades públicas estiveram envolvidas com eles. Todavia, o nome de Souza Lima foi lembrado em outras homenagens que, tornando-se públicas na década de 1970, não omitiram os nomes de algumas personagens envolvidas nesse episódio policial e judiciário.
Um outro autor, mais distanciado dos acontecimentos, também prestou homenagem ao magistrado cuja carreira “foi bruscamente interrompida”, em virtude dos fatos ocorridos na cidade de Araraquara em fevereiro de 1897. Narrando a mesma seqüência de assassinatos acima referidos, acrescenta que, “pelos requintes de crueldade”, foi determinada a exoneração do juiz da comarca, Joaquim Martins Fontes da Silva. Acrescenta que o governador Campos Salles foi responsabilizado pelo “doloroso acontecimento” e que o jornal Comércio de São Paulo abriu violenta campanha contra o governo. O então chefe de polícia, ministro Xavier de Toledo, tomou providências para apurar os fatos, e Eliseu Guilherme Cristiano, na época juiz de direito, foi designado para presidir o inquérito instaurado. Desempenhando-se “cabalmente da tarefa”, veio a ser ministro do Tribunal anos depois. Todavia, verificou-se a demissão do chefe do poder Judiciário, na época, Augusto de Souza Lima:
“Inexplicável o gesto do Dr. Souza Lima. Amigo de Campos Salles, desde as lides republicanas de Campinas, não era admissível se desentendessem de forma a determinar a estranha resolução. Ademais, nenhuma responsabilidade poderia ser atribuída ao presidente do Tribunal, nos fatos verificados na então longínqua cidade de Araraquara.” (Azevedo, 1974: 37)
O drama social que demandaria apenas uma investigação policial e um julgamento perante o Tribunal do Júri da cidade de Araraquara desencadeou um conflito entre as principais autoridades do Judiciário e Executivo estaduais.
“Os Sucessos de Araraquara” – título da matéria que, no jornal O Comércio de São Paulo, noticiou a evolução do caso no ano de 1897 – envolveram três assassinatos: de um “republicano histórico”, presidente do diretório local do Partido Republicano, morto, durante uma discussão, pelo jovem sergipano da “facção política contrária”, Rosendo de Souza Brito; do jovem e de um tio seu, preso como cúmplice, que foram tirados da cadeia e mortos; destes dois últimos assassinatos foram acusados os filhos, parentes e agregados do “coronel” republicano, dentre os quais um genro, Teodoro Dias de Carvalho Júnior, que fora chefe de polícia e secretário da Agricultura, no governo de Bernardino de Campos. Entre fevereiro e julho de 1897, quando foram julgados e absolvidos os principais acusados das mortes dos réus, a imprensa noticiou amplamente a questão (Telarolli, 1977).
Esses crimes envolvendo pessoas de prestígio social e político foram analisados no contexto do “coronelismo”, explicitando que o caso foi exemplar da troca de favores entre as autoridades públicas e reconhecidos colaboradores políticos. O caso alcançou publicidade porque a mãe e uma irmã dos réus assassinados também gozavam de posição e reconhecimento social. Dispunham de recursos que lhes permitiram contratar excelentes advogados, prerrogativa que certamente dificultou, mas não impediu, que os apaniguados do poder levassem vantagem no inquérito policial e no processo judicial. Fica assim demonstrado como as autoridades políticas intervieram no sentido de favorecer os linchadores: transferiram o julgamento para o fórum de outra comarca, onde os jurados foram hospedados na casa de um fazendeiro, amigo do “coronel” assassinado.
Esses acontecimentos são também exemplares da extensão e do alcance do poder coronelístico e oligárquico, além de caracterizar o sentido da submissão de um poder a outro. Nesse caso, a demissão do presidente do Tribunal de Justiça ilustra a intervenção expressa doExecutivo sobre a conduta do Judiciário. O despotismo do governador do Estado foi apontado por um jornalista da época:
“[...] a causa de seu pedido de demissão foi a prepotência e a arbitrariedade do dr. Campos Salles, dentro daquele princípio de submissão do Judiciário. O dr. Souza Lima ter-se-ia interessado em ver o inquérito a que se procedera e o presidente do Estado tê-lo-ia impedido, “porque está sendo feito em segredo de justiça”, para estupefação de Souza Lima, que não entendia poder haver “segredo de Justiça” para o chefe da magistratura no Estado.” (Apud Fabrício Pierrot. In: O Commercio de São Paulo, 20.6.1897)
Representando o poder em suas respectivas esferas, o confronto, ao que parece, não chegou a esboçar uma crise institucional. Não obstante, a demissão de Souza Lima, que nada teve de “inexplicável”, assinala um embate entre poderes que nem mesmo a antiga solidariedade partidária pôde arrefecer.
No caso da aposentadoria de Ferreira Alves muito antes da idade legal, foi ele o único membro do poder Judiciário que defendeu os políticos monarquistas. Enquanto todos os demais membros do Tribunal decidiram que as atividades políticas dos monarquistas eram ilícitas, Ferreira Alves bateu-se pelas garantias constitucionais, por ocasião do julgamento de um pedido de habeas-copus.
O pedido de eminentes membros do Partido Monarquista deu ensejo a uma das decisões mais complexas em matéria de habeas-corpus. Conforme estabelecia o processo da época, o Tribunal, para decidir sobre um recurso impetrado, analisava as informações das autoridades policiais e dos juizes de direito envolvidos no caso. Neste caso específico, publicou-se também os argumentos do procurador-geral do Estado, presidente do Tribunal e de alguns ministros.
Na sessão ordinária de 16 de janeiro de 1897, o Tribunal de Justiça julgou o pedido de habeas-corpus formulado pelo advogado dos seguintes “pacientes”: Eduardo da Silva Prado, José Vieira Couto de Magalhães, José Maria Correa de Sá e Benevides, Francisco Antonio de Souza Queiroz, Antonio Ferreira de Castilho, Antonio Ferreira dos Santos, coronel José Ferreira de Figueiredo e Augusto de Souza Queiroz. Consideradas “pessoas tão distintas, tão conhecedoras das leis e dos movimentos políticos”, conforme as palavras do procurador em seu parecer, procuraram garantias junto ao Tribunal de Justiça, pois tinham sido vítimas de abuso da autoridade policial. Apesar de correligionários do regime decaído, o prestígio social que ainda desfrutavam garantiu-lhes uma cuidadosa e consistente resposta do Tribunal: o caso foi longamente debatido e mereceu a elaboração de pareceres do procurador e do presidente do Tribunal. Suas argumentações justificaram acórdão inédito, representando a posição do Judiciário paulista quanto às atividades políticas dos adeptos da Monarquia.
O presidente procurou distinguir os conceitos de “liberdade pessoal” e “direitos individuais”, procurando rechaçar uma interpretação abrangente, como defendia Rui Barbosa, referindo-se ao preceito da Constituição republicana.
O ministro Ferreira Alves foi o único que votou a favor da ordem de apresentação dos pacientes para que fossem interrogados. Alegou também que o chefe de polícia do Estado deveria ser ouvido “sobre os motivos que o levaram a dar tão enérgicas ordens cerceadoras do exercício dos direitos de livre manifestação do pensamento, de associação e reunião e de inviolabilidade de domicilio”. Fazendo alusões aos dispositivos constitucionais, obsta que, sem maiores esclarecimentos, isto é, sem o depoimento dos pacientes e das autoridades envolvidas, o Tribunal não possuía elementos para decidir se aquele era um caso de restabelecimento da ordem pública. Além do mais, afirmava que era de notoriedade publica que os pacientes tinham sofrido constrangimento ilegal:
“Taes ordens contra a reunião pacifica de alguns cidadãos que, desarmados, discutiam sobre os negocios publicos e se apparelhavam para exercitar o direito eleitoral garantido a todas as opiniões políticas, constituem abusos de poder e perseguições por motivo político”.
Para Ferreira Alves, o habeas-corpus tinha sido ampliado pela legislação de 1871 e sobretudo pelas Constituições da União e do Estado, sendo “remedio productor da liberdade civil ou política contra todas as oppressões do poder”. O ministro refutou, argumento por argumento, o parecer do presidente do Tribunal, não vendo qualquer desarmonia entre as diferentes redações dos textos legais. Não concordava também com a hipótese da dispersão como medida legal, pois aquele caso não envolvia a reunião de uma sociedade secreta conforme dispunha o código penal. Nenhum dos pacientes tinha sofrido processo por conspiração, sedição ou ajuntamento ilícito, sequer tinham atentado “por factos e meios violentos a Constituição Política da Republica ou forma do governo estabelecido.”
Assim como Souza Lima, Ferreira Alves também tocou na questão primordial levantada pelo grupo de monarquistas, referente à rejeição à forma de governo republicana e à defesa do retorno da Monarquia. Assim, argumentava que, embora a Constituição vetasse ao Congresso “projectos de revisão tendentes a abolir a forma republicana federativa”, não proibia “a organização de um partido monarchista que só pela revolução pode mudar a forma do governo: pois as leis não incriminam os meios de propaganda pacífica.” O ministro enfrentou os colegas do Tribunal ao defender a propaganda monarquista, não vendo ilegalidade no exercício da liberdade de pensar, escrever e comunicar idéias, mesmo que fosse para
“obter, sem meios criminosos, a reforma da Constituição em harmonia com o progresso social ou convencer os cidadãos da sua necessidade. Prohiba embora a Constituição a mudança da forma de governo, a Constituição de um paiz é essencialmente variavel, o tempo, circunstancias a vontade nacional podem modifical-a a despeito do processo constitucional”
Estava completamente convencido de que a polícia cometera ilegalidade e que a demora na concessão do habeas-corpus acentuava ainda mais o abuso de poder.
É importante lembrar que os monarquistas representavam um grupo de expressiva oposição política, quando o mito de que a República era um consenso nacional obscurecia os conflitos travados entre os grupos políticos e sociais. Embora consagrado, esse mito foi desfeito, e, sabe-se, que os monarquistas representaram uma ameaça constante ao regime republicano (Janotti, 1986).
Embora a Revista Mensal tenha registrado apenas o acórdão mencionado, firmou-se jurisprudência pela qual as atividades políticas dos monarquistas tornavam-se ilícitas, apesar das garantias constitucionais. A voz discordante, representada pelo ministro Ferreira Alves, calouse com sua aposentadoria em 1898, aos 55 anos de idade.
Como dissemos acima, dos nove membros que compuseram o Tribunal na República, sete mantiveram-se em seus cargos sem que algum atrito ou incompatibilidade política os indispusesse com a maioria ou com o Executivo estadual, como Souza Lima. Além da relativa estabilidade que desfrutou, é significativo também que a composição do Tribunal tivesse sido alterada de nove para doze lugares, em 1896. Embora a demanda de feitos pudesse justificar a ampliação, concordamos que “aumentar o número de juizes seria meio de intervirem os outros poderes na vida da Justiça, formando maiorias e modificando a jurisprudência” (Guimarães, 1958: 186). É possível, portanto, que a nomeação dos novos membros viesse a reforçar a orientação política hegemônica do Tribunal de Justiça, quando Ferreira Alves já estava isolado da maioria, segundo o depoimento de um magistrado contemporâneo seu:
“Talvez fosse o temperamento do dr. Ferreira Alves o mais resistente ao influxo espiritual das inclinações coletivas da Casa; isto, porém, embora lhe criasse muitas vezes situação singular, de modo algum quebrava o respeito que lhe dispensavam os colegas, os advogados ou o público, salvo pequena restrição quanto à forma exterior do voto. Ainda tenho presente na lembrança a figura inconfundível desse juiz, sempre austero no porte, na indumentária e nas maneiras. Não sabia transigir, e, formada qualquer convicção em seu espírito, sustentava-a com bravura, alheio a considerações objetivas que muitas vezes podiam justificar declinações na linha do julgamento. [...] Infelizmente, a ênfase de que às vezes se lhe ressentiam os votos, não o tornava muito simpático aos companheiros, embora estes de modo algum procurassem empanar a admiração que lhe tributavam.” (Faria, 1942: 167-173)
De temperamento intransigente e com convicções políticas independentes, o juiz enfrentou a hostilidade da corporação e acabou requisitando sua aposentadoria. Ainda que essencialmente laudatório, o testemunho de caráter memorialístico sugere algo a respeito das inclinações coletivas do Tribunal: havia uma orientação política predominante, e, apesar do “espírito” corporativista da magistratura, uma postura destoante poderia levar a deserções.
Evidentemente, os desentendimentos poderiam dificultar a agilidade do Tribunal não só diante de decisões que envolviam temas tão políticos, como o habeas-corpus, mas também aqueles de ordem eleitoral ou relativa ainda aos limites das autonomias das Câmaras Municipais e mesmo aos de caráter tributário. Entretanto, se os adeptos da Monarquia ainda representavam uma ameaça para o novo regime, como poderia uma autoridade judiciária se colocar ao lado de oposicionistas? A opinião do ministro constituía uma afronta para o governo e pôde perfeitamente ter justificado sua aposentadoria poucos meses depois das discussões sobre os direitos políticos dos defensores do regime decaído.
Para ocupar as vagas de Souza Lima e Ferreira Alves, foram nomeados José Custódio da Cunha Canto, em março de 1897, e Francisco da Silva Saldanha, em julho de 1898. Os novos membros também vinham exercendo a magistratura desde a época do Império24.
A saída de Souza Lima, que poderia ter representado um acontecimento traumático para o Judiciário, não foi sequer comentada pelos magistrados, pois nenhuma uma demonstração de solidariedade ao colega foi consignada no órgão oficial do Tribunal."
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Cultura
Marcos da cultura de época em Araraquara, o Teatro Municipal foi inaugurado em 1914, O Hotel Municipal, em 1916, e o Palacete Araraquarense (Sede do Clube Araraquarense), em 1925. Atualmente, o prédio do clube funciona para reuniões informais e sala de jogos. Em frente ao mesmo está o busto de Antonio Correa da Silva, fundador do Jornal “O Imparcial”. No final do século XIX o clube foi visitado por D. Pedro II que deixou sua assinatura no livro de visitas do clube. Livro este que se encontra hoje depositado no Museu Histórico Pedagógico Voluntários da Pátria. A Esplanada das Rosas, o Clube Araraquarense, o Hotel Municipal, a Casa da Cultura e a Câmara Municipal estão tombados pelo Condephaat desde abril de 1998 e formam o chamado Centro Histórico de Araraquara.
A Igreja Matriz de São Bento também é outro marco da cidade. Foi através dela, e por ordem régia de D. João VI datada de 22/8/1817, que a Freguesia de São Bento de Araraquara se desmembrou da Freguesia de Piracicaba. Desde 1805 foram construídos seis templos no mesmo local.
O primeiro registro da presença de instalação da lavoura canavieira na região de Araraquara data de 1825, com a montagem de um engenho na sesmaria do Ouro para produzir açúcar e aguardente. A atividade canavieira, que se intensificou a partir de 1850, acarretou, por sua vez, uma série de transformações no quadro local: vinda de fazendeiros de Piracicaba, Itu, Porto Feliz, valorização da terra, intensificação dos conflitos entre os agricultores e escassez de mão-de-obra e, conseqüentemente, aumento do preço dos escravos. Segundo registros da época, existiam em 1862 trinta “fábricas de açúcar” na região.
O crescimento demográfico e comercial da cidade, a circulação de capitais, como ocorrera em outros centros urbanos de São Paulo, criaram, no final do século XIX e início do século XX, as condições propícias à diversificação das atividades econômicas, incluindo a produção manufatureira em pequenas oficinas domésticas, comandadas por imigrantes europeus. Esse contexto possibilitou que em 1910 já existissem em Araraquara 141 pequenos estabelecimentos industriais.
A estação foi instalada em 1885, quando os trilhos da Cia. Paulista de Estradas de Ferro alcançaram Araraquara. Por ela chegou D.Pedro II, quando de sua visita a Araraquara em 06/11/1886. A Companhia Estrada de Ferro Araraquara foi fundada em 1895 e inaugurada em 1898. Em 1919 foi adquirida pelo Estado, passando a chamar-se Estrada de Ferro Araraquara – EFA. No século XX seus trilhos alcançaram Mato Grosso.Com a ferrovia a cidade cresceu surgindo investimentos diversos: construção da Vila Ferroviária; fundação da Associação Ferroviária de Esportes (AFE); criação do Horto Florestal e o Armazém de Abastecimento para as famílias dos ferroviários.Em 1971, criou-se a Fepasa (Ferrovia Paulista S/A) com a fusão de 5 ferrovias do Estado de São Paulo .Em janeiro de 1999, com a sua privatização, passou a pertencer à FERROBAN – Ferrovia Bandeirante.Os trens são usados hoje, aqui na região, somente para o transporte de cargas, sendo que o último trem de passageiros, que ia até Itirapina, foi extinto em Abril de 2001.
Foi no espaço das fazendas mistas que se iniciou o cultivo do café nos “Campos de Araraquara”. Primeiro como planta de pomar para consumo doméstico. Em 1852 já existiam 2 fazendas de café em Araraquara, mas a exploração comercial do produto só se intensificou no final da década de 1860, sendo marcante a presença de fazendeiros originários de Minas, Piracicaba e Porto Feliz. A economia cafeeira, como principal fonte de riqueza da região e do próprio país, avança até o início do século XX.