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Precedentes Administrativos e Judiciais no Direito Tributário

Análise de precedentes judiciais e administrativos em matéria tributária.

Fábio Pallaretti Calcini
Comentários ao Acórdão Apelação n. 5009900-93.2017.4.04.7107/RS - Tribunal Regional Federal 4ª Região - TRF 4ª (2ª Turma, Rel. Des. Rômulo Pizzolatti, j. 11/12/2019). Introdução Nestes comentários pretendemos tratar da interpretação dada pelo Tribunal Regional Federal da 4ª região quanto à possibilidade de desconsideração de negócios jurídicos em virtude de planejamento tributário, sobretudo, à luz do art. 170, da Constituição Federal1, bem como arts. 1092, 1103, 116, parágrafo único4 e 149, VII5, do Código Tributário Nacional, a fim de avaliar se, eventual propósito de reduzir sua carga fiscal (elisão) poderia ser objeto de questionamento pelo Fisco Federal. O caso concreto Trata-se de recurso de apelação da União, a qual sustenta que houve a criação de pessoa jurídica meramente formal, desprovida de propósito negocial, a fim de reduzir artificial e ilicitamente a carga tributária quanto aos tributos IRPJ, CSLL, PIS/PASEP e COFINS, além de contribuição previdenciária e Senar sobre a receita bruta O caso concreto diz respeito à reorganização societária onde a empresa autuada (Transpinho Madeiras Ltda) sofreu cisão parcial para a constituição da empresa Saiqui Empreendimentos Imobiliários Ltda. Com referida reorganização, outros imóveis foram revertidos a título de aumento de capital social em nova cisão. Ocorre, porém, que houve alienação posterior de tais imóveis pela empresa constituída em duas datas distintas. Para a União, mediante alegação da fiscalização, as razões que justificavam a desconsideração da reorganização societária seriam: "A justificativa para o proceder do contribuinte seria a sensível redução dos tributos incidentes na venda dos imóveis. Conforme narra o Fisco, os imóveis que, via cisão, saíram do patrimônio da Transpinho para compor o capital social da Saiqui eram indicados na contabilidade da Transpinho como ativo permanente imobilizado, caso em que a alienação ensejaria receita não operacional tributada nas alíquotas normais de IRPJ e CSLL, além da contribuição previdenciária do art. 25 da Lei nº 8.870, de 1994. Já a alienação via Saiqui, com objeto social de venda de imóveis, geraria receita operacional, submetida a tributação na sistemática do lucro presumido, de modo que o IRPJ e a CSLL incidiriam sobre base de cálculo bem menor (alíquotas dos tributos aplicadas sobre a base de cálculo presumida com coeficientes de 8 e 12%), além de mascarar o ganho de capital na alienação dos imóveis (cf. explicação no relatório fiscal do evento 1, out6, fls. 20-25). As evidências da evasão fiscal apuradas pelo Fisco consistem basicamente em que: (I) a Saiqui está domiciliada no mesmo endereço da Transpinho, compartilha materiais e conta apenas com dois funcionários; (II) o valor obtido com a venda dos imóveis foi distribuído como lucro aos sócios, sem reinvestimento na empresa nem reposição de estoque, o que indicaria que os imóveis que integralizaram o capital social não serviram a viabilizar a operação da empresa; (III) desde sua constituição em 2005 até 2010, a Saiqui lançou como receita operacional apenas os valores decorrentes da venda desses imóveis, bem como receitas decorrentes da venda de madeira produzidas nos imóveis ainda não vendido". Por sua vez, em defesa, alega o contribuinte: "(I) a constituição da Saiqui para exercer a atividade de comércio de imóveis se deveu ao intuito de racionalizar a atividade empresarial da Transpinho para centrar-se em sua atividade de produção; (II) foram utilizados instrumentos lícitos na operação, sendo que a constituição de empresas é expressão da autonomia da vontade; (III) a Saiqui continua em atividade e realizou a venda de outros imóveis além dos recebidos nas cisões da Transpinho; (IV) a Saiqui mantém estoque de imóveis, tendo feito aquisições em 2008 e 2011 de imóveis que ainda não foram por si alienados; (V) a economia de tributos foi consequência da operação societária, e não sua finalidade precípua, tanto que da operação poderia ter resultado uma desvantagem tributária, caso em que o Fisco certamente não se importaria em tocar adiante a fiscalização; (VI) não há irregularidade no fato de duas empresas integrantes do mesmo grupo econômico compartilharem a mesma estrutura física". Diante destes fatos, tem-se a avaliação da licitude ou ilicitude da reorganização societária a fim de avaliar se houve um planejamento tributário ou, de fato, caberia ao fisco desconsiderar a operação para tributá-la, sob alegação de suposta simulação. A discussão jurídica em questão Com relação ao precedente em análise temos como principal discussão jurídica: é possível ao fisco desconsiderar operações de reestruturação societária, como forma de planejamento tributário? Quais os limites jurídicos em tais operações? Reduzir carga fiscal, por si só, pode ser considera uma medida ilícita que permita ao fisco desconsiderá-la? Nota-se que o precedente em análise tem como ponto principal os limites do planejamento tributário. Julgamento no TRF. Razões de decidir Em análise do julgamento do recurso de apelação, por votação unânime6, o Desembargador relator Rômulo Pizzolati, em breve síntese, traz como razões de decidir os seguintes argumentos: (i) - "a fraude (simulação) deve, pois, (I) ocorrer no ato ou depois da ocorrência do fato gerador e (II) valer-se de meios ilícitos - o que também é enfatizado pelo tributarista Antônio Roberto Sampaio Dória ("Evasão e Elisão Fiscal" in ATALIBA, Geraldo (Coord.). Elementos de Direito Tributário. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1978, p. 452-53)"; (ii) "no caso ora examinado, a fraude (simulação)/sonegação consistiria na própria instituição, em 2005, da sociedade empresária Saiqui Empreendimentos Imobiliários Ltda., mediante cisão parcial da sociedade empresária Transpinho Madeiras Ltda. Já os fatos geradores - venda de imóveis incorporados à Saiqui pela cisão parcial da Transpinho, com pagamento de tributos a menos do que seria se houvessem sido vendidos pela própria Transpinho, antes da instituição da Saiqui - que teriam sido encobertos por essa fraude (simulação) ocorreram em 2006 e 2008. Bem por isso, salienta o auto de infração que A criação da Saiqui Empreendimentos Imobiliários foi um passo preparatório no caminho de venda desses imóveis. Além dessa inversão temporal - "fraude preparatória" -, observa-se que a criação da Saiqui Empreendimentos Imobiliários não constitui por si ilicitude"; (iii) -"a ideia em voga aponta para uma imediata desconfiança com práticas que visem à economia de tributos, idéia essa introjetada pelos órgãos responsáveis pela arrecadação tributária, que mediante um trabalho de convencimento bem elaborado, suprimiram da discussão a premissa de que parte o seu posicionamento, qual seja, a de que existiria a necessidade de um "propósito negocial" - ou seja, de alguma razão extratributária - nos arranjos e rearranjos societários. Trata-se, contudo, de evidente falácia, uma vez que a premissa é sim discutível, e o ardil foi colocá-la justamente fora de questionamentos"; (iv) -"Diz-se ser esse o ponto nodal para a solução do imbróglio justamente porque os órgãos fiscais, partindo da aparente pouca especificidade que marcaria a normatização do assunto no Direito brasileiro - erro evidenciado pelo apelido dado ao artigo 116, parágrafo único, do CTN: "norma geral antielisiva" -, entendeu possuir um salvo-conduto para o estabelecimento de critérios próprios para aferição do que seria um "planejamento tributário abusivo" - como é o caso da tal "ausência de propósito negocial" - residindo a controvérsia exatamente em saber se o Fisco tem ou não competência para agir dessa maneira"; (v) - ao mencionar os arts. 116 e 149, do Código Tributário Nacional, afirma que "Da leitura desses dispositivos, facilmente se percebe inexistir, como vinha sendo admitido sem maiores questionamentos, uma autorização genérica, ampla, inespecífica, para que a fiscalização desconsidere atos, negócios ou operações com base em critérios por ela aleatoriamente introduzidos, como o tal "propósito negocial", expressão aliás tão desprovida de conteúdo que poderia dar azo às mais diversas interpretações, até mesmo à interpretação de que a economia de tributos é em si um propósito negocial. Assim é que, como já referido anteriormente, está o Fisco autorizado a desconsiderar "planejamentos tributários", desde que, para a sua realização, empregue o contribuinte fraude, dolo ou simulação"; (vi) - "O volume de tributos economizado, a ausência de propósitos extratributários, ou qualquer outra circunstância que, a despeito de causar espécie à administração tributária, não seja proibida e, portanto, não reflita um ato ilícito, não pode ser considerada como causa justificadora do lançamento suplementar, impondo-se o respeito à liberdade que tem o contribuinte, no exercício da autonomia privada garantida no artigo 170 da Constituição Federal, de "reestruturar a exploração do seu capital da forma mais eficiente, inclusive sob a perspectiva fiscal" (evento 1 - out7, pág. 199). Diante de operações lícitas que venham sendo utilizadas pelos contribuintes "como substitutas não tributadas, ou ainda menos onerosas", ou bem o legislador edita norma casuística proibindo o emprego desse expediente específico (ou ainda impedindo a economia pretendida), ou bem o Estado se conforma com o montante pago, não sendo aceitável que o Fisco, a pretexto de reparar o que parece uma injustiça fiscal aos seus olhos, desconsidere tal "planejamento", porque é do Poder Legislativo, e não da administração pública (por mais elevados que sejam os seus propósitos), a competência para regular e interferir no exercício das liberdades econômicas e no patrimônio dos indivíduos"; (vii) - "a desconsideração de "planejamentos tributários" pela administração pública somente se legitima quando as operações empregadas forem dolosas, fraudulentas ou simuladas - cabendo ao legislador a edição de normas específicas que impeçam ou neutralizem eventual economia tributária quando o planejamento envolver atos lícitos, como no exemplo dado no trecho acima transcrito - a controvérsia passa a ser acerca da efetiva ocorrência do dolo, da fraude ou da simulação"; (viii) - "Como se pode observar das autuações que tem por base a prática de atos supostamente dolosos, fraudulentos ou simulados, há uma tendência à confusão e ampliação desses conceitos para além do seu significado legal, como se o seu conteúdo pudesse ser moldado de acordo com critérios discricionários eleitos pela fiscalização. Não é demais lembrar que a ausência do tal "propósito negocial" é um dos elementos de que usualmente se vale a Receita Federal para sustentar que os atos praticados pelo contribuinte são mera simulação para suprimir tributos. Mas será que essas circunstâncias tão caras ao Fisco realmente importam para que se caracterize o vício, ou se trata de mais uma dentre tantas outras mistificações envolvidas na praxe tributária?"; (ix) - "Não existindo um conceito constitucional de "simulação", está o legislador tributário autorizado a dar-lhe definição, conteúdo e alcance que lhe pareçam adequados. O fato, no entanto, é que não há, ao menos quanto à definição, lei nesse sentido, de tal maneira que o instituto deve ser empregado conforme os contornos dados pelo direito privado. O tema é tratado pelo artigo 167 do Código Civil"; (x) - "Em conclusão, portanto, a reorganização patrimonial realizada pelo contribuinte, quando levada a efeito por meio de negócios jurídicos e operações verdadeiros, ainda que tenha por resultado a economia de tributos, não autoriza o Fisco a desconsiderá-los, pois não existe - e nem poderia existir, porque ofenderia o artigo 170 da Constituição Federal - uma norma geral que obrigue o administrado a, frente à possibilidade de submeter-se a dois regimes fiscais, optar pelo mais gravoso. Trata-se de verdadeira liberdade econômica, somente restringível - e de maneira casuística - pelo legislador, nunca pela administração pública." Importante, ainda, citar trecho de voto do Desembargador Sebastião Ogê Muniz, onde afirma que, com relação ao art. 116, parágrafo único, do Código Tributário Nacional, "Ainda não editada a lei destinada a regular a norma acima destacada. Logo, não poderia a autoridade fiscal tê-la aplicado". Diante de tais razões de decidir, passaremos aos comentários do acórdão. Análise da decisão Este precedente trata de tema de grande relevância, ou seja, se planejamentos tributários, mesmo que tenham como propósito reduzir carga fiscal, poderiam no atual sistema tributário nacional ser objeto de desconsideração pelo Fisco. A decisão proferida é muito explícita em reconhecer que a realização de negócios jurídicos e/ou reorganizações societárias, desde que realizados de forma anterior aos fatos geradores, seguindo os requisitos legais, em regra, não pode ser objeto de desconsideração pelo Fisco. Isto somente seria possível, no caso concreto, à luz dos arts. 116, parágrafo único e 149, VII, do Código Tributário Nacional, quando houver prova de que a operação ou negócio jurídico se deu mediante simulação. Todavia, simulação há de ser reconhecida, em respeito dos arts. 109 e 110, do Código Tributário Nacional, segundo o dispõe o art. 167, do Código Civil7. Bem por isso, reconhece que o propósito do contribuinte de economizar tributos, desde que seja de forma lícita e sem simulação, não pode ser objeto de desconsideração pelo fisco, a fim de impor carga tributária mais onerosa. Isto nos leva ao entendimento de que a teoria do propósito negocial ou da motivação extratributária não encontra fundamento em nosso sistema jurídico, não sendo requisito a ser imposto para fins de análise de licitude de um planejamento tributário. De fato, este precedente nos parece ter razão. Trata-se da visão de planejamento tributário à luz da noção de elisão e evasão8. Ao se falar na elisão e evasão é possível notar que elas estão vinculadas à noção de liberdade e previsão de lei. Isto porque, a elisão reside na conduta do contribuinte que objetiva reduzir tributos mediante o emprego de negócio permitido ou não vedado por lei. Já a evasão, em contrapartida, enuncia a conduta que reduz a carga tributária mediante a violação da lei. Trata-se, portanto, de averiguar a licitude ou ilicitude dos atos jurídicos. Se lícito, temos elisão; se ilícito, temos evasão fiscal. Vê-se, assim, que há relação com a ideia do princípio da legalidade (art. 5º, inciso II, da CF/88), o qual dispõe que ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer senão em virtude de lei. De tal sorte, se inexiste lei ou vedação legal, é possível ao contribuinte auto-organizar seus negócios da maneira que lhe aprouver, sendo, inclusive, a redução de tributos uma forma importante de gerência de sua atividade empresarial. Equivale dizer: não havendo impedimento legal, a conduta do contribuinte em reduzir tributos é considerada lícita, configurando a chamada elisão. Além disso, juntamente com a noção de liberdade, é preciso lembrar que o art. 170, da Constituição Federal enuncia que a ordem econômica no Brasil está pautada pelo princípio da livre iniciativa. A noção de elisão fiscal, pautada pela liberdade de conduta, desde que não vedada por lei, permite ao contribuinte, a seu critério, optar por procedimento em seus negócios que sejam menos onerosos, inclusive, sob o enfoque da economia de tributos, pois, é incisivo Alfredo Augusto Becker que: "todo indivíduo, desde que não viole regra jurídica, tem a indiscutível liberdade de ordenar seus negócios de modo menos oneroso, inclusive tributariamente"9. Isto porque,"seria absurdo que o contribuinte, encontrando vários caminhos legais (portanto, lícitos) para chegar ao mesmo resultado, fosse escolher justamente aquele meio que determinasse pagamento de tributo mais elevado"10. Possível notar que somente se houver lei exigindo do contribuinte a adoção de uma determinada conduta este terá que optar pela via mais onerosa sob o aspecto da tributação11. Entendendo que a conduta elisiva percorre o caminho da licitude, fácil notar que a evasão estará sempre pautada pelo afrontamento, direto ou indireto, da legislação. A noção de licitude e ilicitude, por conseguinte, é o principal critério distintivo entre a evasão e a elisão. Cabe, lembrar, ainda, que não se pode sustentar para configurar a ilicitude e, desta maneira, a evasão fiscal, o simples fato de o contribuinte realizar operação que comporte redução de tributos ou sua desoneração. A evasão e elisão não se distinguem pela economia ou não tributos, mas licitude ou ilicitude da conduta pela qual se busca tal efeito econômico. Portanto, há de se avaliar o comportamento do contribuinte e sua relação com o sistema jurídico. A economia de tributos não é critério jurídico para se distinguir os institutos, de modo que se trata de verdadeiro direito subjetivo do contribuinte, se inexiste lei vedando, praticar procedimentos que melhor protejam seu patrimônio, lembrando que a norma tributária é uma exceção ao direito de propriedade e uma rejeição social. Não é por outra razão que Gilberto Ulhôa Canto afirma que: "Se é certo que o cidadão deve fielmente contribuir para os gastos coletivos segundo as normas legais em vigor, não é menos certo que dele o Fisco não pode esperar pagamento de montante superior ao que a lei lhe impõe, eis que, pelo excesso o que haveria seria mera doação"12. Portanto, não é possível se buscar conduzir à ilicitude (evasão fiscal) os procedimentos do contribuinte, por um discurso meramente ético e econômico, deixando de avaliar as imposições legais existentes, lembrando sempre da lição de Gazton Jéze no sentido de que: "Sempre que as partes usarem de um direito que a lei lhes faculta, não há fraude, ainda que o fisco sofra prejuízo"13. Para existir a elisão, cabe esclarecer que, além de ser uma conduta lícita, é necessário que seja realizada antes da ocorrência do fato jurídico tributário (ou fato gerador), porque, se já houver a incidência tributária e, posteriormente, verificarmos alguma conduta no sentido de fugir à exigência do tributo, teremos a evasão fiscal. É denominado critério cronológico. Ademais, é preciso avaliar em concreto se as operações realizadas, sob a aparência da licitude, não seriam simuladas, à luz do disposto na legislação do direito privado14, mais especificamente, o Código Civil. A simulação, prevista no art. 167, do Código Civil, pode ser considerada, segundo Martinho Garcez, um "ato fictício com o propósito de encobrir ou dissimular a expressão real da vontade"15. Sendo que, segundo o autor, "visando efeito diverso do ostensivamente indicado, a simulação só é vício dos atos jurídicos quando acompanhada de fraude ou má fé"16. Tem-se a simulação quando se encontra a finalidade de enganar terceiro, verificando uma "intencional divergência entre a vontade real e a vontade declarada das partes"17, como enuncia Orlando Gomes. Assim, "com a simulação, visa-se alcançar fim contrário à lei"18, configurando-se vício da causa19, onde o "contrato aparente chama-se contrato simulado; o outro, contrato dissimulado"20. Na simulação, portanto, "podem as partes realizar o negócio para consecução de fins contra legem, mas o fim da simulação não ilícito em si"21. De tal sorte, a simulação pode ser absoluta ou relativa, sendo a primeira quando as partes querem que o contrato não produza efeitos típicos"22, ao passo que a segunda ocorre quando "ao lado do negócio simulado há um contrato dissimulado que disfarça sua verdadeira causa e seu conteúdo"23, existindo, por conseguinte, dois contratos "um aparente e outro real que é escondido do terceiro"24. A simulação, portanto, está relacionada a um vício da vontade (ou para alguns de causa), eis que se pratica um ato com uma determinada aparência externa, ocultando-se (dissimulação) o real ato e finalidade querida. Deste modo, não é vício de vontade ou simulação a simples pretensão do contribuinte de economizar tributos, inexistindo possibilidade de desconsiderar tais atos sob alegação de propósito negocial, tendo em vista a intepretação sistemática do texto constitucional (liberdade, legalidade e livre iniciativa) em conjunto com o Código Tributário Nacional (possibilidade de desconsideração somente no caso de simulação - arts. 116 e 149, CTN) à luz dos conceitos de direito privado de simulação (art. 109 e 110, CTN e 167, do Código Civil). Em tais condições, revela esta decisão do Tribunal Regional Federal que o planejamento tributário é um direito do contribuinte previsto na Constituição Federal, a partir da liberdade e livre iniciativa, sendo possível sua restrição por meio de lei, à luz dos critérios estabelecidos pelo Código Tributário Nacional, o qual somente permite, por exceção, a desconsideração quanto houver a simulação (art. 116 e 149, CTN), assim considerada no caso concreto segundo o disposto na legislação de direito privado, mais especificamente no art. 167, do Código Civil, não cabendo interpretações ampliativas. Logo, tal precedente esclarece que não há previsão legal para se desconsiderar planejamento tributário em virtude de mera economia tributária, valendo-se de institutos como o propósito negocial ou alegações semelhantes. __________ 1 "Art. 170. A ordem econômica, fundada na valorização do trabalho humano e na livre iniciativa, tem por fim assegurar a todos existência digna, conforme os ditames da justiça social, observados os seguintes princípios". 2 "Art. 109. Os princípios gerais de direito privado utilizam-se para pesquisa da definição, do conteúdo e do alcance de seus institutos, conceitos e formas, mas não para definição dos respectivos efeitos tributários". 3 "Art. 110. A lei tributária não pode alterar a definição, o conteúdo e o alcance de institutos, conceitos e formas de direito privado, utilizados, expressa ou implicitamente, pela Constituição Federal, pelas Constituições dos Estados, ou pelas Leis Orgânicas do Distrito Federal ou dos Municípios, para definir ou limitar competências tributárias". 4 - "Parágrafo único. A autoridade administrativa poderá desconsiderar atos ou negócios jurídicos praticados com a finalidade de dissimular a ocorrência do fato gerador do tributo ou a natureza dos elementos constitutivos da obrigação tributária, observados os procedimentos a serem estabelecidos em lei ordinária. (incluído pela Lcp nº 104, de 2001)". 5 - "Art. 149. O lançamento é efetuado e revisto de ofício pela autoridade administrativa nos seguintes casos:(...) VII - quando se comprove que o sujeito passivo, ou terceiro em benefício daquele, agiu com dolo, fraude ou simulação". 6 "AÇÃO ANULATÓRIA. LANÇAMENTO DE OFÍCIO. PLANEJAMENTO TRIBUTÁRIO. DESCONSIDERAÇÃO DE OPERAÇÕES SOCIETÁRIAS. AUSÊNCIA DE SIMULAÇÃO. PROTEÇÃO À LIVRE INICIATIVA. HONORÁRIOS DE SUCUMBÊNCIA". 7 "É nulo o negócio jurídico simulado, mas subsistirá o que se dissimulou, se válido for na substância e na forma. § 1º Haverá simulação nos negócios jurídicos quando: I - aparentarem conferir ou transmitir direitos a pessoas diversas daquelas às quais realmente se conferem, ou transmitem; II - contiverem declaração, confissão, condição ou cláusula não verdadeira; III - os instrumentos particulares forem antedatados, ou pós-datados". 8 CALCINI, Fábio Pallaretti. Parecer. Planejamento Tributário. Transformação de filial em pessoa jurídica. Vantagens Fiscais. Possibilidade. Revista Tributaria e de Finanças Públicas, v. 92, p. 289-330, 2010.; CALCINI, Fábio Pallaretti. JURISPRUDÊNCIA COMENTADA - CARF - PLANEJAMENTO TRIBUTÁRIO - CISÃO - EMPRESAS. REVISTA TRIBUTÁRIA E DE FINANÇAS PÚBLICAS, v. 134, p. 415-452, 2017. 9 - BECKER, Alfredo Augusto. Teoria geral do Direito Tributário. 3. ed. São Paulo: Lejus, 1998. p. 136. 10 - BECKER, Alfredo Augusto. Teoria geral do Direito Tributário. 3. ed. São Paulo: Lejus, 1998. p. 136. 11 - BECKER, Alfredo Augusto. Teoria geral do Direito Tributário. 3. ed. São Paulo: Lejus, 1998. p. 136. 12 - CANTO, Gilberto Ulhôa. Elisão e Evasão "in" Cadernos de Pesquisas Tributárias. São Paulo: Resenha Tributária/CEU, 1988. p. 28. vol. 13. 13 - JÉZE, Gastón. Corus de Finances Publiques. Paris, 1938. p. 130 "apud" CANTO, Gilberto Ulhôa. Elisão e Evasão "in" Cadernos de Pesquisas Tributárias. São Paulo: Resenha Tributária/CEU, 1988. p. 32.vol. 13. 14 - Arts. 109 e 110, do Código Tributário Nacional. 15 - GARCEZ, Martinho. Das nulidades dos atos jurídicos. 5. ed. Anotada por Martinho Garcez Neto. Rio de Janeiro: Renovar, 1997. p. 183. 16 - GARCEZ, Martinho. Das nulidades dos atos jurídicos. 5. ed. Anotada por Martinho Garcez Neto. Rio de Janeiro: Renovar, 1997. p. 183. Segundo Silvio Rodrigues: "Negócio simulado, portanto, é aquele que oferece uma aparência diversa do efetivo querer das partes. Estas fingem um negócio que na realidade não desejam". (RODRIGUES, Silvio. Direito Civil. 26. ed. São Paulo: Saraiva, 1996. p. 220. v. 1.) 17 - GOMES, Orlando. Introdução ao Direito Civil. 12. ed. Atualizado por Humberto Theodoro Junior. Rio de Janeiro: Forense, 1997. p. 427. 18 - GOMES, Orlando. Introdução ao Direito Civil. 12. ed. Atualizado por Humberto Theodoro Junior. Rio de Janeiro: Forense, 1997. p. 427. 19 - Segundo Orlando Gomes: "A causa simulandi é o fim visado pelas partes disfarçado na simulação". GOMES, Orlando. Introdução ao Direito Civil. 12. ed. Atualizado por Humberto Theodoro Junior. Rio de Janeiro: Forense, 1997. p. 428.). 20 - GOMES, Orlando. Introdução ao Direito Civil. 12. ed. Atualizado por Humberto Theodoro Junior. Rio de Janeiro: Forense, 1997. p. 428. 21 - GOMES, Orlando. Introdução ao Direito Civil. 12. ed. Atualizado por Humberto Theodoro Junior. Rio de Janeiro: Forense, 1997. p. 428. 22 - GOMES, Orlando. Introdução ao Direito Civil. 12. ed. Atualizado por Humberto Theodoro Junior. Rio de Janeiro: Forense, 1997. p. 428. 23 - GOMES, Orlando. Introdução ao Direito Civil. 12. ed. Atualizado por Humberto Theodoro Junior. Rio de Janeiro: Forense, 1997. p. 428. 24 - GOMES, Orlando. Introdução ao Direito Civil. 12. ed. Atualizado por Humberto Theodoro Junior. Rio de Janeiro: Forense, 1997. p. 428.
Comentários aos acórdãos ADI 4.735/DF e RE 759.244/SP - RG do Supremo Tribunal Federal - STF (Pleno, Rel. Min. Alexandre de Moraes e Edson Fachin, j. 12/02/2020). Introdução Nestes comentários pretendemos tratar da interpretação dada pelo Supremo Tribunal Federal quanto ao art. 149, § 2º, I, da Constituição1, que trata da imunidade das receitas decorrentes de exportação, quando do julgamento da Ação Direta de Inconstitucionalidade n. 4.735/DF e Recurso Extraordinário n. 759.244/SP-RG, 12 de fevereiro deste ano, ao reconhecer a impossibilidade de tributação pelo Funrural e Rat2 nas operações destinadas ao exterior de modo indireto por meio de Tradings ou empresas comerciais exportadoras - ECE -.  O caso concreto Nos Autos da Ação Direta de Inconstitucionalidade a discussão envolve, em abstrato, a violação dos arts. 5º, LV, 145, § 1º, 149, § 2º, I, 150, I e II, e 170, IV, da Constituição Federal pelo art. 170, §§ 1º e 2º, da Instrução Normativa n. 971/2009, que enuncia: "Da Exportação de Produtos Art. 170. Não incidem as contribuições sociais de que trata este Capítulo sobre as receitas decorrentes de exportação de produtos, cuja comercialização ocorra a partir de 12 de dezembro de 2001, por força do disposto no inciso I do § 2º do art. 149 da Constituição Federal, alterado pela Emenda Constitucional nº 33, de 11 de dezembro de 2001. § 1º Aplica-se o disposto neste artigo exclusivamente quando a produção é comercializada diretamente com adquirente domiciliado no exterior. § 2º A receita decorrente de comercialização com empresa constituída e em funcionamento no País é considerada receita proveniente do comércio interno e não de exportação, independentemente da destinação que esta dará ao produto." Por sua vez, perante o Recurso Extraordinário, temos discussão semelhante, onde uma agroindústria, sujeita à tributação do Funrural e Rat prevista no art. 22-A, da lei 8.212/91, propôs medida judicial visando a aplicação da imunidade prevista no art. 149, § 2º, I, da Constituição Federal, dada a violação pelo art. 246, §§ 1º e 2º, da Instrução Normativa MPS/SRF 02/2005, a qual restringia a não incidência nas operações de exportação indireta via trading. Houve decisão do Tribunal Regional Federal da 3ª Região desfavorável ao contribuinte3, o qual interpôs recurso extraordinário diante da violação art. 149, § 2º, I, do texto constitucional. A discussão jurídica em questão Com relação aos precedentes em análise temos como principal discussão jurídica: é possível restringir a imunidade prevista no art. 149, § 2º, I, da Constituição Federal somente às operações de exportação direta, ou também resguarda àquelas realizadas de forma indireta, como no caso de tradings e empresas comerciais exportadoras? Vê-se, portanto, que a discussão jurídica envolve a extensão da aplicação da imunidade tributária em relação às contribuições sociais, como o Funrural e Rart, quanto às "receitas de decorrentes de exportação", nos termos do dispositivo constitucional citado. Julgamento no STF. Razões de decidir Em análise da Ação Direta de Inconstitucionalidade, ao julgar procedente o pedido, por votação unânime, o Ministro Alexandre de Moraes, em breve síntese, traz como razões de decidir os seguintes argumentos: (i) - "... deve ser aplicada, em prestígio à garantia da máxima efetividade, o que passo a explicar"; (ii) - "...não incidir a disposição prevista no artigo 111, II, do CTN, no sentido de interpretar-se literalmente a legislação tributária que disponha sobre outorga de isenção, já que desta não se trata"; (iii) - "... uma hermenêutica constitucional ampla, admitindo-se a utilização de todos os métodos interpretativos, inclusive o teleológico ou finalístico"; (iv) - "... desoneração da carga tributária sobre transações comerciais que (v) envolvam a venda para o exterior, evitando-se a indesejada exportação de tributos, de modo a tornar mais competitivos os produtos nacionais, contribuindo para geração de divisas e o desenvolvimento nacional"; (vi) - "No caso, levando em consideração a finalidade da norma constitucional imunizante, não há como simplesmente cindir as negociações realizadas no âmbito das exportações indiretas, de modo a tributar as operações realizadas no mercado interno e imunizar exclusivamente a posterior remessa ao exterior". (vii) - Ora, a imunidade foi prevista na Constituição de forma genérica sobre as "receitas de exportação", sem nenhuma diferenciação entre exportações diretas ou indiretas, devendo incidir também na comercialização entre o produtor/vendedor e as empresas comerciais com finalidade específica de exportação; (viii) - "No horizonte das exportações indiretas, as aquisições domésticas não podem ser entendidas como um fim em si mesmas, mas como (ix) operações-meio - conditio sine qua non - que alimentam fisiologicamente as vendas ao mercado externo, integrando, em sua essência, a própria exportação. Assim, para fins de incidência da imunidade tributária, a transação deve ser vista como uma só, que se inicia com a aquisição em solo nacional e finda com a remessa do produto ao exterior. É esse conjunto preordenado de transações que formaliza a exportação; (x) - "Não há duvida de que, ao se tributar uma parte do todo, ou seja, a (xi) operação interna, onera-se, em verdade, a exportação inteira, pois o tributo, inicialmente suportado pelo produtor/vendedor, será repassado e, fatalmente, exportado pelas empresas comerciais especializadas, contrariando nitidamente as finalidades perseguidas pela regra constitucional". Importante, ainda, citar trecho de voto do Ministro Enrique Lewandowski, no sentido de que: "Não me parece isonômico, ou mesmo razoável, excluir da abrangência dessa norma imunizante as operações que possuem o fim específico de exportação, como é o caso das vendas realizadas a empresas comerciais exportadoras, cujo destino das mercadorias comercializadas seja unicamente o exterior". Por sua vez, ponderação do Ministro Marco Aurélio de que "A teor do que está na Constituição Federal, como ressaltou a ministra Rosa Weber, é objetiva. Pouco importa a figura do contribuinte. Diz respeito à receita, gênero, decorrente de exportação". O Ministro Dias Toffoli, enfim, afirma em seu voto, ao acompanhar o relator: "... verifica-se que as operações entre empresas incrustadas no território nacional que buscam o mercado externo e empresas comerciais exportadoras não se resumem em si mesmas. Isso porque essas operações visam propriamente à exportação. Dito de outro modo, não se pretende que os bens objetos dessas operações fiquem no território nacional, mas sim que rompam fronteiras. Nesse sentido, embora as receitas auferidas por aquelas empresas em razão de tais operações não sejam "receitas de exportação", configuram elas verdadeiras "receitas decorrentes de exportação", tal como previsto no dispositivo constitucional em comento". Da mesma forma, o Ministro Edson Fachin, ao relatar o recurso extraordinário, cujo julgamento se deu em conjunto com a Ação Direta de Inconstitucionalidade, afirma que: (i) - "a regra no comércio internacional em casos de tributação sobre o consumo é a aplicação do princípio do destino, segundo o qual o Estado destinatário, é dizer, em que se dará o consumo do produto que sofreu industrialização na territorialidade de outro ente soberano, deve recolher o tributo sobre a manifestação de riqueza. Em suma, a finalidade é desonerar, em termos tributários, as exportações e onerar as importações, favorecendo a balança comercial do país."; (ii) - "(...) visando à neutralidade fiscal no fluxo internacional de bens e serviços, compreendo que prevalece o princípio do destino em função da mercadoria/produto destinada ao exterior nas imunidades tributárias versadas no art. 149, §2º, I, do Texto Constitucional."; (iii) - "... a desoneração dos tributos que influa no preço de bens e serviços deve estruturar-se, a princípio, em formato direcionado à garantia do objeto, e não do sujeito passivo tributário, de modo que restrições à fruição do regime de imunidade tributária em decorrência da interposição de terceiros cujo objetivo único na cadeia é o agenciamento de mercadorias a adquirentes internacional fora do âmbito territorial do Brasil deve ser contemporizado em relação à finalidade das exonerações constitucionais e ao esforço exportador (export-drive) do potencial contribuinte."; (iv) - "Por evidente, isso em nada impede o estabelecimento de obrigações acessórias para realizar o desiderato constitucional da exportação, devendo qualquer desvio de finalidade essencial implicar em saída da condição fiscal mais benéfica"; (v) - "... finalidade de estímulo às exportações e de inserção da cadeia produtiva brasileira no fluxo internacional de bens e serviços".; (vi) - "desoneração dos tributos que influa no preço de bens e serviços deve estruturar-se em formato direcionado à garantia do objeto, de modo que restrições à fruição do regime de imunidade tributária são relativizáveis em relação à finalidade das exonerações constitucionais e ao esforço exportador do potencial contribuinte.". Diante de tais razões de decidir, passaremos aos comentários do acórdão. Análise da decisão Estes precedentes revelam uma clara opção hermenêutica pelo Supremo Tribunal Federal de que a imunidade há de ser interpretada de forma finalística e ampliativa, visando sua máxima eficácia, impedindo-se interpretações literais e restritivas advindas de determinações legais como temos para as isenções em virtude do art. 111 do Código Tributário Nacional. Relevam as imunidades, assim, limitações ao poder de tributar garantidas pelo texto constitucional, impedindo o exercício pelo Estado, por meio das competências tributárias, a fim de onerar o cidadão com tributos, os quais, por essência, são formas de restrição aos direitos fundamentais da liberdade e propriedade. Já, mais especificamente, quanto ao disposto pelo art. 149, § 2º, I, da Constituição Federal, que trata da expressa menção à impossibilidade de se tributar a título de contribuições sociais e de intervenção no domínio econômico as receitas decorrentes de exportação, nota-se claramente em referidas decisões que se reconheceu, a partir de uma interpretação finalística, de que o constituinte buscou, a partir do princípio do destino, impedir que custos tributários vinculados ao produto onerasse o preço deste para fins de competição no mercado internacional. Tem-se, portanto, como premissa principal, diante do princípio do destino, a busca por não "exportar tributos". Esta seria a finalidade do texto constitucional, estimulando a economia e as exportações, como forma, inclusive, de favorecimento à balança comercial e geração de renda em nosso país. Deste modo, o fato de existir na cadeia do processo de exportação, a intermediação para que se viabilize o envio dos produtos ao exterior, não desqualifica a operação como tal, razão pela qual a receita daquela pessoa física ou jurídica em decorrência da venda no mercado interno, mas com a finalidade de exportar, está complemente resguardada pela imunidade, pois é decorrente do que se exportou. Ora, se o objetivo final é a exportação, independentemente de intermediários, a receita decorrente daquela, aplicando-se a imunidade tributária do art. 149, § 2º, I, da Constituição Federal. Conforme decisão, o que se busca proteger não é o sujeito, mas o objeto (produto nacional + receita), não sendo fator relevante a circunstância de a exportação ser, de forma indireta, por meio de intermediadores, como as tradings e comerciais exportadoras. Lembram, ainda, os votos o fato de não ter o texto constitucional neste aspecto ter estabelecido qualquer diferenciação ou restrição, o que impõe a observância, bem por isso, do princípio da igualdade. Isto não significa que inexistem limites, o que, fica evidente ao asseverar em seu voto o Ministro Edson Fachin, de que "em nada impede o estabelecimento de obrigações acessórias para realizar o desiderato constitucional da exportação, devendo qualquer desvio de finalidade essencial implicar em saída da condição fiscal mais benéfica". Vê-se, com isso, que a imunidade, embora não seja aplicável somente às exportações diretas, dada a finalidade de exoneração ampla das receitas destinadas ao exterior (princípio do destino), é preciso, por meio de controles (obrigações acessórias), evidenciar que a comercialização no mercado interno tinha como propósito e destino, desde o início, o mercado exterior, ou seja, a exportação. Logo, tais precedentes, certamente, confirmam a importância e proteção dada pelo texto constitucional aos direitos dos contribuintes por meio das imunidades, o que, no caso em análise, ocorreu a partir da interpretação do art. 149, § 2º, I, que impede a tributação das receitas decorrentes de exportação. niciaremos nossa análise do acórdão pela matéria ligada à tributação pelo PIS e COFINS dos ingressos dos valores pagos por fornecedores quanto à verba de propaganda e publicidade cooperada - VPC -. Naturalmente, esta questão envolve dois aspectos, sendo um de natureza meramente jurídica-tributária e outro relacionado à situação concreta e provas produzidas. Isto próprio produto elaborado e destinado à comercialização a fim de gerar receita bruta. __________ 1 "§ 2º As contribuições sociais e de intervenção no domínio econômico de que trata o caput deste artigo: I - não incidirão sobre as receitas decorrentes de exportação;". 2 Entre as contribuições sociais que denominamos Funrural e também o Rat voltadas à discussão em referidos precedentes temos: (i) - art. 25, da lei 8.212/91- pessoa física produtora rural: "Art. 25. A contribuição do empregador rural pessoa física, em substituição à contribuição de que tratam os incisos I e II do art. 22, e a do segurado especial, referidos, respectivamente, na alínea a do inciso V e no inciso VII do art. 12 desta Lei, destinada à Seguridade Social, é de: I - 1,2% (um inteiro e dois décimos por cento) da receita bruta proveniente da comercialização da sua produção; II - 0,1% da receita bruta proveniente da comercialização da sua produção para financiamento das prestações por acidente do trabalho"; (ii) - art. 22-A, da Lei n. 8.212/91 - agroindústria: "Art. 22A. A contribuição devida pela agroindústria, definida, para os efeitos desta Lei, como sendo o produtor rural pessoa jurídica cuja atividade econômica seja a industrialização de produção própria ou de produção própria e adquirida de terceiros, incidente sobre o valor da receita bruta proveniente da comercialização da produção, em substituição às previstas nos incisos I e II do art. 22 desta Lei, é de: I - dois vírgula cinco por cento destinados à Seguridade Social; II - zero vírgula um por cento para o financiamento do benefício previsto nos arts. 57 e 58 da Lei no 8.213, de 24 de julho de 1991, e daqueles concedidos em razão do grau de incidência de incapacidade para o trabalho decorrente dos riscos ambientais da atividade"; (iii) - art. 25, da Lei n. 8.870/94 - produtor rural pessoa jurídica: "Art. 25. A contribuição devida à seguridade social pelo empregador, pessoa jurídica, que se dedique à produção rural, em substituição à prevista nos incisos I e II do art. 22 da Lei nº 8.212, de 24 de julho de 1991, passa a ser a seguinte: I - 1,7% (um inteiro e sete décimos por cento) da receita bruta proveniente da comercialização da sua produção; II - um décimo por cento da receita bruta proveniente da comercialização de sua produção, para o financiamento da complementação das prestações por acidente de trabalho." 3 "CONSTITUCIONAL - TRIBUTÁRIO - MANDADO DE SEGURANÇA - IMUNIDADE DE CONTRIBUIÇÃO SOCIAL (INCISO I, DO § 2°, DO ART. 149, CF) SOBRE EXPORTAÇÃO INDIRETA - INADMISSIBILIDADE - IMPROCEDÊNCIA AO PEDIDO."
Comentários ao acórdão n. 3302-008.120 do CARF (3ª seção - 3ª Câmara - 2ª Turma Ordinária, Rel. Cons. Corintho Oliveira Machado, j. 9/1/2020). 1. Introdução Nestes comentários pretendemos tratar da tributação quanto às contribuições sociais do PIS/PASEP e COFINS, no regime não cumulativo, conforme art. 195, § 12, da Constituição Federal e Leis n. 10.637/2002 e 10.833/2003, notadamente, com relação às verbas de propaganda cooperada e eventual dedutibilidade de bens e serviços utilizados como insumo (art. 3º, das respectivas leis citadas)1. 2. O caso concreto Trata-se de lançamento de ofício em face de uma pessoa jurídica comerciante, a qual foi acusada em relatório fiscal de omissão de receita quanto aos ingressos de fornecedores no tocante à verba de propaganda e publicidade cooperada - VPC -. Segundo a fiscalização, o contribuinte: "realiza ações de marketing em seu nome destacando as mercadorias adquiridas nos veículos de comunicações e panfletos, cobra dos seus fornecedores uma remuneração pré-ajustada, sendo remunerada pelo serviço de marketing que realiza. E não uma recuperação de custos, pois o gerenciamento das ações de propaganda não são partilhados com os seus fornecedores". Por conseguinte, "tem-se configurada a remuneração, devido ao serviço de publicidade e propaganda, da INSINUANTE realizados por seus fornecedores", tratando de "uma prestação de serviços, que devem está contida na receita operacional da fiscalizada". Mais do que isso, temos ainda o não acolhimento dos créditos tomados quanto às despesas de publicidade e propaganda, reconhecidos como insumos, uma vez que, conforme relatório da fiscalização: "A fiscalizada tomou créditos do PIS e COFINS sobre aquisição/despesas de serviços de propaganda sem que haja legislação que dê amparo legal ..., pois ... exerce de forma preponderante a atividade comercial de vendas de mercadorias no atacado e no varejo. Tanto a lei 10.637/2002 (PIS) quanto a Lei nº 10.833/2003 (COFINS) estabelecem quais as atividades são sujeitas a créditos, bem como as ... IN SRF nº 358/03 e 404/04. ... estabelecem que não será possível a geração de créditos oriundos de serviços contratados de terceiros, mesmo de pessoa jurídica, se destinem a atividade-meio do contratante. Assim, são excluídas do conceito de insumo, isto é, essas despesas de propaganda/publicidade não foram aplicados ou consumidos na produção de bens ou prestação de serviços ... ... consideram-se descontados indevidamente os créditos referentes a despesas de propaganda/publicidade abaixo listadas, cabendo ... desconsiderar/excluir de oficio esses descontos realizados indevidamente. .. ..." Por sua vez, o contribuinte, em sua defesa, alegou: (i) - a verba de publicidade e propaganda cooperada não configuraria faturamento e/ou receita, uma vez que configuraria um reembolso de valores utilizados para propaganda em favor de fornecedores e seus produtos, não existindo prestação de serviço; (ii) - poder-se-ia aplicar, por analogia, a exclusão da base de cálculo, nos termos do art. 13, da Lei n. 10.925/2004, bem com art. 53 da lei 7.450/85; (iii) - com relação às despesas de propaganda e publicidade, tratar-se-ia de insumo, uma vez que são essenciais a sua atividade econômica. Houve julgamento perante a Delegacia de Julgamento, a qual, julgou parcialmente procedente a impugnação apresentada: "ASSUNTO: CONTRIBUIÇÃO PARA O FINANCIAMENTO DA SEGURIDADE SOCIAL - COFINS Ano-calendário: 2012, 2013, 2014 VERBA DE PROPAGANDA COOPERADA. DEDUÇÃO DA BASE DE CÁLCULO. IMPOSSIBILIDADE. As Verbas de Propaganda Cooperada, que são valores destinados a ações de marketing que promovam os produtos do fabricante comercializados nos estabelecimentos da varejista, caracterizam-se como receitas destes últimos e, como tais, estão sujeitas às incidências das contribuições para o PIS/Pasep e da Cofins, devendo compor sua base de cálculo. INCIDÊNCIA NÃO-CUMULATIVA. CRÉDITOS DA PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS DE PUBLICIDADE E PROPAGANDA. POSSIBILIDADE. Compondo a receita de publicidade e propaganda a base de cálculo do PIS/Pasep e da Cofins, devem ser considerados os créditos da não cumulatividade relativos a essa prestação de serviço, mesmo que tal atividade não seja aquela preponderante do sujeito passivo." Tem-se, assim, recurso de ofício e voluntário do contribuinte. 3. A discussão jurídica em questão Com relação ao caso precedente em análise temos as seguintes discussões: (i) - o fato de o contribuinte receber valores de terceiros com objetivo de destinar à divulgação de seus respectivos produtos facilitando as vendas, seria receita tributável ou reembolso de despesas?; (ii) - as despesas com propaganda e publicidade configuram insumo? 4. Julgamento no CARF. Razões de decidir Em análise do recurso de ofício e voluntário, tem-se a manutenção do primeiro e negativa de provimento do segundo. Quanto à tributação das verbas de marketing, ao negar provimento ao recurso e reconhecer a natureza de receita bruta, afirma: "As chamadas Verbas de Propaganda Cooperada são, de fato, valores destinados a ações de marketing e propaganda que promovam os produtos do fabricante comercializados nos estabelecimentos da interessada. Conforme contratos comerciais juntados às fls. 347/610, as Verbas de Propaganda Cooperada são pré-estabelecidas em uma porcentagem sobre o faturamento das vendas das mercadorias adquiridas junto ao fornecedor. Dessarte, não procede a alegação da interessada de que "os valores relacionados à VPC constituem meros ingressos de numerários no caixa da Impugnante visando a restituição de gastos/despesas conjuntas e, portanto, não poderiam integrar a base de cálculo do PIS e da COFINS." Por fim, mantem a decisão da DRJ quanto ao direito de crédito, como insumo, para as despesas de marketing, adotando como razões de decidir a fundamentação de piso: "Com efeito, a fiscalização considerou que a receita da prestação de serviço de publicidade e propaganda "está contida na receita operacional da fiscalizada", devendo compor a base de cálculo do PIS/Cofins. Mantido esse entendimento, conforme corroborado acima, devem ser considerados os créditos da não cumulatividade relativos a essa receita, ainda que a prestação de serviços de propaganda e publicidade seja um objetivo social secundário da interessada. Uma vez considerada a receita da prestação de serviços de propaganda e publicidade na composição da base de cálculo das contribuições, é irrelevante, para a apuração dos respectivos créditos, o fato, apontado pela fiscalização, de que a atividade preponderante da interessada é o comércio de vendas de mercadorias no atacado e no varejo." Diante de tais razões de decidir, passaremos aos comentários do acórdão. 5. Análise da decisão Iniciaremos nossa análise do acórdão pela matéria ligada à tributação pelo PIS e COFINS dos ingressos dos valores pagos por fornecedores quanto à verba de propaganda e publicidade cooperada - VPC -. Naturalmente, esta questão envolve dois aspectos, sendo um de natureza meramente jurídica-tributária e outro relacionado à situação concreta e provas produzidas. Isto porque, em nossa visão, sob o ponto de vista jurídico, entendemos que a receita bruta tributável deve partir do art. 195, I, "b", do texto constitucional, de modo que esta em nossa visão o ingresso ou entrada financeira primária e definitiva, não sujeita à condições, decorrente da atividade empresarial principal do contribuinte, que leve ao incremento patrimonial positivo, ou melhor dizendo, agrega um elemento positivo ao patrimônio2. Deste modo, nem toda entrada ou ingresso financeiro configurará hipótese de incidência ou fato jurídico tributário de tais contribuições3. A verba de publicidade, desde que firmada em um contrato de cooperação e rateio, onde aquele que recebe a verba, de fato, aplica efetivamente para a publicidade e propaganda dos produtos de seu fornecedor, mantendo um controle entre os valores recebidos e utilizados para tal fim, não configura receita tributável. Ora, o contribuinte neste caso estará somente intermediando, por questões de praticabilidade, sendo um elo entre o fornecedor e o interesse daquele em anunciar seus produtos, a fim de que as vendas no final da cadeia ocorram. De nada valeria uma indústria fazer um marketing para que os comerciantes adquiram seus produtos se, posteriormente, quando estão nas prateleiras (físicas ou virtuais), não há consumo ou venda. Por isso, este elo entre o fornecedor e o comerciante, atuando em conjunto, para a divulgação dos produtos a fim de incentivas as vendas, é algo essencial. Daí porque, o que se constata é um mero ingresso, onde fornecedor realiza pagamentos destinados ao anuncio de seus produtos, sendo o comerciante um mero instrumento para que isto ocorra da melhor forma, conforme a realidade de seu público e região. Com isso, os valores não podem ser considerados receita bruta, pois, não são valores que ingressam de forma definitiva e incondicional no patrimônio da pessoa jurídica, muito menos em razão do exercício de sua atividade empresarial. Quanto ao caso concreto, em sua fundamentação, o relator entende que a tributação de tais valores se dá, de forma pré-estabelecida em uma percentagem sobre o faturamento das vendas. Ora, o fato de se realizar pagamentos vinculados ao faturamento, por si só, não justifica a tributação, desde que o contribuinte demonstre a destinação de tais valores, mediante prova de anúncios voltados aos produtos de seu fornecedor, bem como um controle financeiro e contábil, onde fique apontada a correlação entre o montante recebido e utilizado para tal fim. Daí não há contraprestação onerosa pelo comerciante, já que somente faz uma intermediação, por questões de praticabilidade, da destinação da verba de terceiro para que a divulgação de seus produtos, naquela localidade, seja aplicada da melhor forma possível. Deste modo, o que, por hipótese, poderia ser tributado é o excesso pago durante um período, mas não o simples ingresso de todos os valores. Já com relação ao tema dos créditos e a possibilidade de reconhecimento como insumo para as despesas de marketing, vejamos as ponderações. Como é de conhecimento, em interpretação do art. 3º, II, das leis 10.637/2002 e 10.833/20034, o Superior Tribunal de Justiça, por meio do resp. n. Resp. 1.221.170/PR, em sede de repetitivo, firmou entendimento no sentido de que "o conceito de insumo deve ser aferido à luz dos critérios da essencialidade ou relevância, vale dizer, considerando-se a imprescindibilidade ou a importância de determinado item - bem ou serviço - para o desenvolvimento da atividade econômica desempenhada pelo contribuinte". Deste modo: (i) - a noção da expressão insumo e o direito ao crédito decorrente de bens e serviços utilizados como tal não se restringe aos critérios do IPI, tendo maior amplitude; (ii) - as Instruções Normativas 247/2004 e 404/2005 são ilegais por restringirem esta amplitude; (iii) - seriam insumos aqueles bens e serviços que, direta ou indiretamente, por aspectos de essencialidade e/ou relevância participam do processo produtivo (atividade empresarial); (iv) - não há de se aplicar ao referido dispositivo o art. 111, do Código Tributário Nacional. Vale lembrar, ainda, que a interpretação há de ser realizada à luz do art. 195, § 12, da Constituição Federal5, a qual estabelece a não cumulatividade, que, por estar relacionada ao PIS e COFINS, impõe uma visão do direito ao crédito em função da receita bruta. Portanto, a visão do crédito em tal circunstância não pode ser restritiva, mas, em verdade, finalística, dando predominância à visão de neutralidade fiscal nas operações, bem como a relação entre receita tributada e despesa dedicada a atingir esta pretensão (não cumulatividade em função da receita)6. Deste modo, tratando das despesas de publicidade e propaganda, segundo voto do relator, adotando as razões apontadas pela DRJ, configuraria insumo, pois haveria uma prestação de serviço secundário estando os valores contidos com receita operacional desta. Tem-se, então, dentro de certa coerência, a interpretação de que, se a empresa ao receber tais valores a título de verbas para propaganda contrata serviços e/ou adquire bens para poder cumprir esta finalidade que levou à tributação como receita operacional, haveria uma correlação e essencialidade entre custos e receita, de tal sorte que permitiria o crédito como insumo, até porque, não inexiste vedação ou mesmo pretensão do legislador de somente permitir a tomado de crédito de insumo sobre a atividade principal. Ademais, o fato de as despesas serem atividade-meio ou fim não influencia na tomada do crédito, já que há de avaliar toda a cadeia da atividade empresarial ou processo produtivo, como se dá por exemplo, na agroindústria, onde os insumos para a atividade-meio (atividade rural) não implica na impossibilidade do crédito. É preciso, por conseguinte, avaliar se, em outras hipóteses, os gastos com publicidade e propaganda - poderiam, por exemplo, na cadeia da etapa industrial também levar ao creditamento. Em nossa visão, de fato, referido precedente diante de suas razões de decidir não permitiria o crédito, por exemplo, no caso de uma indústria que promove a publicidade de um produto que fabrica, ou mesmo de um prestador de serviço que busca promover a sua atividade, pois, a premissa principal no acórdão foi da correlação entre o pagamento recebido e sua utilização para se "prestar um serviços" (contraprestação), de modo que os gastos com terceiros para viabilizar a propaganda, levaria ao reconhecimento como insumo. Não obstante esta intepretação, convém esclarecer que, a partir de uma intepretação do texto constitucional, sobretudo, art. 195, I, "b", § 12, em conjunto com art. 3º, II, das leis 10.637/2002 e 10.833/2003, é possível sustentar a viabilidade do crédito no regime não cumulativo no tocante às aquisições de pessoas jurídicas de serviços marketing relacionados aos produtos elaborados e destinados à venda (comercialização). A prestação do serviço de marketing sendo realizada por pessoa jurídica domiciliada no país, contribuinte das contribuições para o PIS e COFINS, desde que voltada para a divulgação de produtos elaborados pelo contribuinte (ou seja, industrialização que faz parte do processo produtivo - indústria) e destinados à comercialização (venda = faturamento), permite o entendimento de que haveria um gasto que envolve o próprio processo de produção por completo e com finalidade de gerar receita (não cumulatividade em função da receita). É inerente à sua atividade empresarial a elaboração de produtos destinados à venda. Equivale dizer: as despesas de marketing por meio da contratação de pessoas jurídicas prestadoras de serviço estão totalmente voltadas para objetos (produtos) fabricados pela pessoa jurídica, que fazem parte de sua principal e efetiva atividade empresarial (industrialização e comercio), tem-se a conclusão de que seriam serviços voltados totalmente aos produtos elaborados por esta, possuindo, assim, total vinculação com sua atividade e mercadorias a serem comercializadas. Como já dito, há de levar em consideração toda a cadeia ou etapa da atividade da pessoa jurídica, sob pena de ficar restrita à etapa da industrialização - IPI -, nada evoluindo na interpretação de que, para PIS e COFINS, a noção de não cumulatividade e insumo são em função da receita, e, por conseguinte, mais ampla. Em tais condições, acreditamos que as despesas de propaganda e publicidade não de ser somente reconhecida como insumo no regime não cumulativo de PIS e CCOFINS, quando existe, mesmo que indiretamente, uma prestação de serviço com tal finalidade, mas, a depender do caso concreto e considerações apontadas, também quando há gastos voltados ao próprio produto elaborado e destinado à comercialização a fim de gerar receita bruta. __________ 1 Não trataremos neste trabalho da questão do cartão de crédito. 2 - CALCINI, Fabio Pallaretti. PARECER. PIS.COFINS. FATURAMENTO. RECEITA. INGRESSOS OBTIDOS DE FORNECEDORES. Revista Dialética de Direito Tributário, v. 213, p. 163-179, 2013. CALCINI, Fabio Pallaretti. PIS/PASEP E COFINS. TRIBUTAÇÃO DAS RECEITAS FINANCEIRAS. CONGRESSO IBET. 3 - "O conceito de receita, acolhido pelo art. 195, I, "b", da Constituição Federal, não se confunde com o conceito contábil. Entendimento, aliás, expresso nas Leis 10.637/02 (art. 1º) e Lei 10.833/03 (art. 1º), que determinam a incidência da contribuição ao PIS/PASEP e da COFINS não cumulativas sobre o total das receitas, "independentemente de sua denominação ou classificação contábil". Ainda que a contabilidade elaborada para fins de informação ao mercado, gestão e planejamento das empresas possa ser tomada pela lei como ponto de partida para a determinação das bases de cálculo de diversos tributos, de modo algum subordina a tributação. A contabilidade constitui ferramenta utilizada também para fins tributários, mas moldada nesta seara pelos princípios e regras próprios do Direito Tributário. Sob o específico prisma constitucional, receita bruta pode ser definida como o ingresso financeiro que se integra no patrimônio na condição de elemento novo e positivo, sem reservas ou condições" (STF, RE 606107, Relator(a): Min. ROSA WEBER, Tribunal Pleno, julgado em 22/05/2013, ACÓRDÃO ELETRÔNICO REPERCUSSÃO GERAL - MÉRITO DJe-231 DIVULG 22-11-2013 PUBLIC 25-11-2013). 4 "II - bens e serviços, utilizados como insumo na prestação de serviços e na produção ou fabricação de bens ou produtos destinados à venda, inclusive combustíveis e lubrificantes, exceto em relação ao pagamento de que trata o art. 2o da Lei no 10.485, de 3 de julho de 2002, devido pelo fabricante ou importador, ao concessionário, pela intermediação ou entrega dos veículos classificados nas posições 87.03 e 87.04 da Tipi". 5 "§ 12. A lei definirá os setores de atividade econômica para os quais as contribuições incidentes na forma dos incisos I, b; e IV do capu t, serão não-cumulativas". 6 - CALCINI, Fábio Pallaretti. Pis e Cofins. Algumas ponderações acerca da não-cumulatividade. Revista Dialética de Direito Tributário, v. 176, p. 41-64, 2010. CALCINI, Fábio Pallaretti. PIS/COFINS. NAO CUMULATIVIDADE E INSUMO. ASPECTOS CONSTITUCIONAIS E LEGAIS. In: VALDIR DE OLIVEIRA ROCHA. (Org.). GRANDES QUESTÕES ATUAIS DO DIREITO TRIBUTÁRIO. 1ed.SÃO PAULO: DIALETICA, 2015, v. 19, p. 30-59.