COLUNAS

  1. Home >
  2. Colunas

Porandubas Políticas

Por dentro da política.

Gaudêncio Torquato
quarta-feira, 5 de outubro de 2022

Porandubas nº 780

É hora de refletir, não de rir. O que deixa este analista de política com uma pulga na orelha. Devo dispensar as historinhas que abrem a coluna? Pensei, pensei e conclui: não. Afinal, tenho de manter a identidade de Porandubas. Vai uma historinha. Apropriada para o momento. Com desculpas se o relato se insere no livro do "politicamente incorreto". Ponho a culpa sobre os ombros do amigo Sebastião Nery. Deu-se o vice-versa Dr. Dantinhas, deputado da Bahia, elo de todo um clã político do Estado (neto do Barão de Geremoabo), foi convidado para padrinho de casamento da filha de um coronel do sertão. No dia de viajar, recebeu telegrama: - Compadre, não precisa vir. Deu-se o vice-versa. Menina morreu. (Deu-se o vice-versa nos resultados do primeiro turno das eleições?) Panorama Descem as cortinas E eis que as cortinas descem, encerrando o primeiro capítulo da peça assistida por milhões de brasileiros de todos os rincões. O espetáculo foi acompanhado, passo a passo, sob as cornetas de institutos que teimavam em apontar: o caminho é aqui, a vereda é ali, a curva é acolá. As multidões, sem darem ouvidos aos tonitruantes ecos que saiam das trombetas e clarins, seguiram seu próprio instinto. E que surpresa... E a surpresa não tardou a se mostrar. As trilhas enveredadas abriram horizontes não imaginados. Trilhas que sinalizaram na direção da direita, estreitando as vias da esquerda, e encorpando os caminhos com os contingentes do conservadorismo. Vamos aos fatos, agora com a linguagem da objetividade. A comunidade política, situada à direita do arco ideológico, deu as caras. As esquerdas, com seus punhos fechados, só conseguiram sair aos trancos do canto do ringue. Pesquisas erraram Os diretores dos Institutos de Pesquisa (Datafolha, IPEC), aturdidos, explicam que houve, nos últimos dias, uma movimentação em direção a Bolsonaro. Não fiquei satisfeito com tal explicação, mesmo que se admita ter faltado apenas 1,57 ponto percentual mais um para Lula liquidar a fatura domingo passado. Uma onda conservadora emergiu no país. O conservadorismo enrustido deveria ter sido flagrado pelas pesquisas bem antes. Houve superestimação da esquerda e subestimação da direita. Essa é a verdade. Quem mais chegou perto dos resultados, urge lembrar, foi o Paraná Pesquisas, dirigido por Murilo Hidalgo. O erro As pesquisas sempre davam Bolsonaro como detentor de 35% a 38% dos votos. Teve 43,2% dos votos válidos. Não é crível que essa avalanche de votos de Bolsonaro tenha ocorrido nos últimos dias de campanha. Será que esses votos saíram do bornal de Ciro e Simone? Mas isso não poderia ter sido previsto? Ora, sinais de mudança deveriam ter sido detectados. O ganho psicológico da campanha bolsonarista pode influenciar o voto no 2º turno. O bumerangue A aceitar a hipótese dos Institutos de Pesquisa, teremos de admitir que a campanha contra os votos úteis, liderada por Ciro Gomes, acabou se voltando contra ele. Ou seja, ele teria deixado o índice de 6% para descer ao patamar dos 3%. Um bumerangue. E em São Paulo, hein? Fernando Haddad (PT-SP) sempre liderou por muitos pontos a campanha paulista, deixado Tarcísio Freitas (Republicanos-SP) longe do pódio. E eis que ocorreu o inverso. Tarcísio chegou na frente por largos passos. Abocanhou a maioria dos votos do maior colégio eleitoral do país. Bolsonarismo robusto A verdade das urnas aparece, nua e crua. O primeiro embate, mesmo vencido por pontos por Luiz Inácio Lula da Silva, deixou ver passos avançados da direita, com a performance de Jair Bolsonaro que, agora, se apresenta como o ator central de uma peça muito aplaudida. A bolha da classe média vazou, permitindo inundar outras bolhas em seu entorno. Bolsonaro ganhou no Estado-líder da Federação, São Paulo, gigante de votos. Mesmo que Lula tenha sido vitorioso na capital. A conquista Bolsonaro ganhou o primeiro turno em SP com 47,71% do eleitorado do Estado. Já Lula venceu na capital paulista, com 47,54% nesse 1º turno. Bolsonaro conquistou boa parte das cidades do interior, inclusive algumas do Vale do Ribeira, região mais pobre do Estado, e onde fica a cidade em que viveu, Eldorado, onde obteve 50,31% dos votos. Lula obteve vitórias em cidades da região metropolitana, como São Bernardo do Campo, com 49,17%, seu reduto eleitoral, e em municípios do Pontal do Paranapanema. Triângulo das Bermudas Este analista, como seus leitores bem sabem, sempre defendeu a hipótese de dois turnos. E mais: sempre apregoou que o resultado das urnas teria um final, que iria depender do resultado no Triângulo das Bermudas, que agrega São Paulo, Minas Gerais (2º maior colégio) e Rio de Janeiro (3º colégio). Lula ganhou em Minas Gerais, mas não se pode esquecer que Romeu Zema, o governador reeleito, acaba de declarar apoio a Bolsonaro. No primeiro, o governador tentou esconder esse apoio. Minas poderá ser decisivo. Nordeste Lula venceu no Nordeste, de ponta a ponta. Os programas assistenciais de Bolsonaro não influenciaram a votação. É possível que até o final do mês, com bateria massiva, os trunfos do governo - Auxílio Brasil, preço dos combustíveis, a partir do Auxílio-Gás e da gasolina - cheguem às margens carentes. Ou seja, com uma campanha de comunicação focada em benefícios, incluindo a dinheirama que o Tesouro vai desembolsar (até antecipação do 13º aos servidores), poderá dar impulso a Bolsonaro na região nordestina. O fato O fato é que uma hipótese se firma: Bolsonaro só ganhará se mudar a intenção de voto de redutos lulistas. E Lula só ganhará se mantiver incólumes seus redutos, que não mudariam de postura, e mais, puxando parcela dos votos de Simone Tebet e Ciro Gomes. Sabemos que frações irão para os dois lados. Já a abstenção tende a aumentar, principalmente em Estados que já definiram os candidatos ao governo. As contas do dr. Istênio O bom pensador Istênio Pascoal, renomado nefrologista de Brasília, faz as contas e manda para a Coluna: "em relação ao 1º turno de 2018, Bolsonaro perdeu votos no Centro-Oeste, no Sudeste e no Sul, empatando no Norte e do Nordeste. Com 99,9% dos votos apurados, a diferença de Lula para Bolsonaro é de 5,18% votos, ou 6.122.000 votos apurados. Os votos de Simone e de Ciro somam 7,21% ou 8.511.380 votos. Bolsonaro ultrapassará Lula no 2º turno se tiver 7.316.690 dos votos somados de Simone e Ciro." E arremata Istênio: "não é impossível, mas é bem difícil." Dados para todos os gostos A leitura da campanha abre interpretações múltiplas. Há dados para todos os gostos. Por exemplo: Lula retomou 63% dos redutos petistas perdidos (266) em cidades maiores; o PT teve 25,9 milhões de votos a mais do que teve em 2018; a federação liderada pelo PT passou de 68 para 80 representantes. A abstenção Olhem para a abstenção. Olhem para os contingentes que não irão mais às urnas. Ali pode estar a marca da vitória. No Congresso Bolsonaro conseguiu fazer uma grande bancada no Congresso. No Senado, teremos uma gorda bancada bolsonarista. Na Câmara, os partidos que apoiaram Bolsonaro no 1º turno elegeram 185 deputados, enquanto a bancada de apoiadores de Lula elegeu 125. Siglas que não apoiaram nenhum dos dois elegeram 198 parlamentares. Famosos de fora Quadros famosos que desfilavam na passarela mais alta do Parlamento ficaram de fora. Vejam o nome de alguns: - José Serra (PSDB-SP) - candidato a deputado Federal, 88 mil votos; - Eduardo Cunha (PTB-SP), candidato a deputado Federal, 5 mil votos; - José Anibal (PSDB-SP), candidato a deputado Federal, 7.600 votos; - Paulinho da Força (Solidariedade-SP), candidato a deputado Federal, 64.000 votos; - Romero Jucá (MDB-RR), para o Senado, 91.000 votos; - Fernando Collor (PTB-AL), para o Governo, 223.000 votos; - Kátia Abreu (PP-TO), para o Senado, 145.000 votos; - Álvaro Dias (Podemos-PR), para o Senado, 1,3 milhão de votos; - Marconi Perillo (PSDB-GO), para o Senado, 626.000 votos; - Marcio França (PSB-SP), para o Senado, 7,8 milhões de votos; - Arthur Virgílio (PSDB-AM), para o Senado, 179.000 votos; - Roberto Requião (PT-PR), para o governo, 1,5 milhão de votos; - Henrique Alves (PSB-RN), deputado, 11.630 votos - Aldo Rebelo (PDT-SP), para o Senado, 230.000 votos. Tucanos em revoada Os tucanos, famintos por falta de alimentos na floresta, batem em retirada. Irão para onde? Para o refúgio dos que morrem por inanição, melhor dizendo, por falta de votos. Aquela sigla famosa, que sempre ensaiou os passos da terceira via no Brasil, abrindo o ciclo da social-democracia, se esgarça, rompendo os fios que a mantinham sólida. FHC se aposentou da política. Serra amarga uma feia derrota em São Paulo, não conseguindo colher votos suficientes para deputado Federal. Alckmin foi para o PSB. Tucanos de todo o país batem asas. Rodrigo, a esperança que se esvai Rodrigo Garcia, que não conseguiu se reeleger em São Paulo, era a última esperança dos tucanos. Ficou em terceiro lugar na corrida ao governo. Foi trazido ao tucanato pelas mãos do ex-prefeito de São Paulo e ex-governador do Estado, João Doria, que decidiu se retirar da vida pública. Rodrigo faz um bom governo, mas o eleitorado paulista dá sinais de exaustão, de saturação. Quer mudança. Afinal são mais de três décadas de domínio tucano, desde os idos de Franco Montoro. Caciques e índios Afinal, para onde irá o PSDB? Que tem uma história marcada pela insinuação de abrigar muito cacique e pouco índio. E é distante das bases. Qual é, hoje, a mensagem do PSDB? Será que engolfado pela onda conservadora que inunda os países? Ao ser concebida, a socialdemocracia brandia como escopo o estabelecimento do Estado de bem-estar social (baseado na universalização dos direitos sociais e laborais e financiado com políticas fiscais progressistas) e o aumento da capacidade aquisitiva da população. A visão europeia Essa meta tinha como alavanca o aumento dos rendimentos do trabalho e a intervenção do Estado nas frentes de gastos e regulação de atividades-chave para a expansão econômica. Mas a partir dos anos 70 a 80 os partidos socialdemocratas passaram a incorporar princípios neoliberais e estes impregnaram a ideologia dominante da União Europeia. A doutrina socialdemocrata ganhou novos contornos na esteira da globalização. Os partidos de esquerda arquivaram velhos jargões, como Estado burguês, classe dominante, submissão a interesses do capital financeiro. Ausência de discurso Hoje, as teias sociais estão sendo bem costuradas, programas de distribuição de renda passaram a frequentar a mesa de todos os núcleos, a ideia de extinguir a miséria continua acesa, mas a receita do "velho socialismo" aparece de forma esporádica e, mesmo assim, sujeita a apupos. Se o PSDB se ressente da ausência de discurso, é porque seu tradicional menu foi repartido por outros comensais. Tocar corneta sobre os buracos da obra governamental - como tem sido prática de partidos de oposição - não tem a mesma significação que um projeto estruturante para a realidade brasileira. Adeus aos que partem. Sucesso aos que continuarão a seguir o Caminho de São Judas Tadeu, o santo das causas impossíveis. Que o querido padroeiro ajude os voadores tucanos a cruzar os ares.
quarta-feira, 28 de setembro de 2022

Porandubas nº 779

Abro a coluna com o papo sobre a burrice e a engenharia. Da burrice e da engenharia Era uma vez... Viajando pelo interior de Minas, o arquiteto Marcos Vasconcelos encontrou um grupo de trabalhadores abrindo uma estrada: - Esta estrada vai até onde? - Muito longe, muito longe, doutor. Atravessa o vale, retorce na beirada da serra, quebra pela esquerda, retoma pela direita, desemboca em frente, e vai indo, vai indo, até chegar a Ponte Nova, passando pelos baixios e cabeceiras. - Vocês têm engenheiro, arquiteto, teodolito, instrumentos de medição? - Num tem não, doutor. Nós tem um burro, que nós manda ir andando, andando. Por onde ele for, aí é o melhor caminho. Nós vai picando, picando. - E quando não tem burro? - Aí não tem jeito, doutor; nós chama um engenheiro mesmo.  O arquiteto seguiu adiante filosofando sobre as artes da burrice e da engenharia. Panorama Haja desconfiança... Está chegando a hora de conferir resultados. A observação é o propósito da desconfiança que grassa na comunidade polarizada. Este consultor não tem dúvidas. As pesquisas indicam, a esta altura, os vencedores do pleito presidencial, havendo pequena possibilidade de reviravolta no ranking de vitoriosos. Se isso ocorresse, seria o maior desastre no campo das pesquisas eleitorais. Um furo gigantesco. Por não acreditar neste furo, o analista de política aqui se faz presente para traçar cenários do amanhã. Se o furo acontecer, só resta concluir que, em política, o impossível acontece. Sob as asas do Imponderável. Lula crescendo Nos últimos dias, a sensação é a de que Lula oscila para cima e Bolsonaro para baixo. O elemento que poderia ainda provocar mudanças nesse final de campanha é o debate amanhã, quinta, na TV Globo. Pode, ainda, alterar situações, mas não a ponto de reverter por completo a posição dos protagonistas. Lula passou a focar no voto útil. Ciro continuou a bater nele e em Bolsonaro. Já este tenta destruir a imagem do ex-presidente. Simone age com ponderação e Soraya usa bem a visibilidade, criando memes com a "vara curta" de Bolsonaro. Questionamentos Se a margem entre Lula e Bolsonaro for larga, haverá poucas chances de questionamento. Se os índices forem iguais ou menores que 5 pontos, o presidente ensaiará ampla mobilização de suas bases, com questionamentos e chamada geral para ocupação de ruas. Não aceitará os resultados. Os observadores internacionais, que acompanharão as eleições, serão testemunhas importantes do processo. O mundo dará repercussão a eventuais aglomerações. Este analista não aposta nessa hipótese. 30 por cento A extrema direita, embalada pelo bolsonarismo, terá protagonismo na esfera política. Tende a manter-se mobilizada, disposta a ganhar papel mais ativo na mobilização social, com voz firme na condução de bandeiras conservadoras. Afinal, os 30% ocupados pelo bolsonarismo constituem um espaço importante a ser ocupado. Bolsonaro, se quiser continuar na arena política, tem condições de liderar sua ala e acompanhar com atenção a frente interpartidária formada no entorno de Lula. Será difícil, porém, manter todos os direitistas sob um único partido. Ficarão dispersos. PT não será o mesmo Não se espere do PT a mesma reza da cartilha que guiou seus passos desde a fundação. Para adquirir governabilidade, Lula, como comandante do país, deverá se inclinar de maneira forte em direção ao centro do arco ideológico, única alternativa para evitar a bolha em que se refugiou o PT em todo o seu percurso. O PT aprendeu com seus erros. Deve substituir o "nós e eles" por "todos nós, do centro democrático". Os quadros históricos do partido serão contemplados, até para se preservar consonância, mas novos perfis entrarão em cena. O papel de Alckmin Geraldo Alckmin, no papel de vice, não será figura decorativa. Lula passou a ter nele um quadro de confiança e apoio. Principalmente junto a setores do empresariado. Geraldo, se quiser, pode ser até ministro em pasta de importância estratégica, por exemplo, ministério da Defesa, só ultimamente ocupado por militares. Mas sua inserção na articulação política deverá dar o tom de sua atuação. O papel de Gleisi Gleisi Hoffmann, a presidente do PT, cumpriu religiosamente o papel que dela se esperava, sendo considerada um polo de aglutinação de interesses. Evitou dissensos e construiu unidade. Tem condição de voltar a compor a equipe ministerial, até para dar vez ao grupo de mulheres petistas na frente governativa. Mercadante e Zé Dirceu Aloisio Mercadante, ex-senador e ex-ministro, carro-chefe do programa do governo Lula, este que acabou não sendo mostrado até o momento, também deverá ser contemplado. Exerce boas relações no front da política, mas não é provável que seja inserido na área econômica. Já José Dirceu, que já foi o quadro mais poderoso do PT, abaixo apenas de Lula, para não causar polêmica, deve ser mantido a certa distância, o que não significa alheamento do governo. Dirceu é um experiente leitor de cenários e deverá manter acesos os dois olhos e alimentar o núcleo governativo com ideias. Presidência das cúpulas As cúpulas côncava e convexa do Congresso Nacional serão ocupadas por quadros contrários ao novo governo? Rodrigo Pacheco e Arthur Lira teriam condições de pleitear a continuidade nos mandos do Senado e da Câmara dos Deputados? Difícil. Mais provável é a eleição de nomes afinados aos novos governantes, sendo pouco provável que venham a ser lideranças de índole oposicionista. A força de um novo governante, para dar provas de sua efetividade, se revela inclusive na eleição de novos presidentes das casas congressuais. A composição partidária Em 2023 veremos uma recomposição partidária a partir dos agrupamentos hoje existentes: esquerda, bolsonaristas e Centrão. A Câmara deve diminuir sua fragmentação. A diminuição da fragmentação virá da extinção de partidos pequenos ou pela sua integração em federações. A extinção de partidos leva à pura e simples diminuição daqueles em atividade. A união em federação, desde que ela atinja a cláusula de barreira, faz com que os partidos continuem existindo, e assim mantenham sigla, identidade e estatutos. Federações Contudo, a federação deve durar no mínimo quatro anos e atuar sempre unida - ao contrário das coligações eleitorais, que em regra se dissolviam logo após os pleitos. As federações devem gerar assim, na prática, uma diminuição do número de agremiações dentro do Congresso. As federações hoje inscritas no TSE são: PT, PCdoB e PV; PSOL e Rede; PSDB e Cidadania. Vê-se que a esquerda tradicional preocupou-se em manter sua identidade, pois partidos que deveriam ter problemas com a cláusula associaram-se. Já PSDB e Cidadania definem uma federação de centro-direita. A miríade de partidos da direita, por sua vez, provavelmente vai assistir a extinção de siglas e a migração de deputados "órfãos" para as agremiações restantes. Para onde vai o PSDB? Criado de uma costela do velho MDB, o PSDB ainda não sabe que caminhos trilhará. Carece de completa reconstrução, a partir de um claro receituário. Social-democracia? Liberal-democracia social? Que arranjos devem compor sua identidade? A direita se expande aqui e ali. A esquerda ganha uma e perde duas. Qual o figurino que ainda embala a social-democracia mundial? Fernando Henrique, o maior ícone do partido, com a palavra. SP, o santuário dos vivos Quem é esperto tem um olho aberto sobre o Estado de São Paulo, que chamo de santuário dos vivos. A densidade eleitoral de São Paulo é tamanha, que acaba despertando a cobiça de oportunistas e aventureiros. Tem 36 milhões de votos. Tarcísio de Freitas, do Republicanos, não soube dizer em que seção eleitoral votava em São José dos Campos. É candidato ao governo do Estado. Rosângela Moro, senhora Sergio Moro, é candidata a deputada Federal por SP. Moro, juiz, é candidato a senador pelo Paraná. Cristiane Brasil, filha de Roberto Jefferson, é candidata a deputada Federal também por SP. Ela mora no Rio. E Eduardo Bolsonaro, o mais votado do Brasil, continuará sendo eleito por SP. Um carioca-paulista. Perguntem a eles onde fica o Tatuapé. Chegarão lá montados num tatu. O tirano Maquiavel conta no Livro III dos Discursos sobre os primeiros dez livros de Tito Lívio a história de um rico romano que deu comida aos pobres durante uma epidemia de fome e que foi por isso executado por seus concidadãos. Argumentaram que ele pretendia fazer seguidores para tornar-se um tirano. Essa reação ilustra a tensão entre moral e política. Mostra que os romanos se preocupavam mais com a liberdade do que com o bem-estar social. Fecho a coluna com Esopo. Jumento que transportava sal Um jumento carregado de sal atravessava um rio. A certa altura escorregou e caiu na água. Então o sal derreteu-se e o jumento, levantando-se mais leve, ficou encantado com o acontecido. Tempos depois, chegando à beira de um rio com um carregamento de esponjas, o jumento pensou que, se ele se deixasse cair outra vez, logo se levantaria mais ligeiro; por isso resvalou de propósito e caiu dentro do rio. Todavia ocorreu que, tendo-se as esponjas embebidas de água, ele não pôde levantar-se, e morreu afogado ali mesmo. Assim também certos indivíduos não percebem que, por causa das suas próprias astúcias, eles mesmos se precipitam na infelicidade. (Esopo)
quarta-feira, 21 de setembro de 2022

Porandubas nº 778

Abro com uma deliciosa historinha de Leonardo Mota. I.N.R.I. - Iesus Nazarenus Rex Iudaeorum Conta Leonardo Mota que o mestre Henrique era reputado marceneiro nos sertões de Sergipe. Sua especialidade estava nas camas francesas à Luís Quinze. Quando o freguês achava que o leito era baixo, recebia a explicação de que a cama era francesa, mas era à Luís Quatorze; casos se queixasse da excessiva altura, ficava sabendo que aquilo era cama francesa à Luís Dezesseis... O mestre Henrique pôs toda a sua ciência no Cruzeiro do patamar da igreja de Aquidabã. No topo do sagrado madeiro, o vigário da freguesia fizera o mestre Henrique colocar uma tabuinha com as letras I.N.R.I., iniciais de Jesus Nazareno Rei dos Judeus, a irônica inscrição latina de que a ruindade de Pilatos se lembrara na ignominiosa sentença de morte do filho de Deus. Decorrido algum tempo, um sertanejo sergipano, intrigado com a significação daquelas quatro letras, perguntou a um seu conhecido: - Que é que quererá dizer aquele negócio de INRI, que tem escrito em riba do Cruzeiro? - Você não sabe, não? Ali falta é o Q-U-E. Esse QUE não cabeu na tabuinha: aquilo é a assinatura de quem fez, que foi o mestre INRIque... Panorama Nuvens plúmbeas São as nuvens mais pesadas que pairam sobre nossas cabeças a uma semana e meia da eleição. A mais nervosa desses tempos de turbulência. Pois estamos ante ameaça do atual dirigente do país: "se eu não ganhar no primeiro turno, algo deverá ter acontecido no TSE". Ou seja, o TSE continua sendo acusado de interferir no processo eleitoral. Grave. Credibilidade As pesquisas, todas as que merecem credibilidade, colocam Lula na frente de Bolsonaro, que garante só acreditar no instituto que designa de "datapovo", que é responsável pelas multidões que vão às ruas aplaudi-lo. Ora, os institutos estão apostando em sua credibilidade. Não vão inventar resultados. O Datafolha tem longa tradição de seriedade. Multidão não é maioria Urge ponderar: multidão não é significado de maioria. Trata-se de um fenômeno de aglomeração, que tem a sua importância no fluxo de comunicação das campanhas, mexendo com o animus animandi das plateias. Mas não significa que ali, naquele amplo espaço de pessoas aglomeradas, tenhamos a maioria do povo brasileiro. Agora, vejamos a hipótese: e se Lula ganhar no 1º turno? Golpismo Para que haja um golpe, são necessárias certas condições: aplausos da população, engajamento das Forças Armadas, predisposição política do corpo parlamentar, apoio internacional, estado de espírito do povo. Todos esses componentes agem e interagem. Sem um deles, fracassa qualquer iniciativa golpista. A começar com as Forças Armadas, que, em sua maioria, têm compromisso com a democracia. E agirão profissionalmente. Tumulto Não queremos garantir paz e harmonia social. Apenas estamos alertando sobre a falta de elementos condicionantes do golpe. Bolsonaro deve ter seu termômetro. E este mede o estado febril da sociedade. Ele não tem a maioria do povo ao seu lado. E suas últimas incursões na frente eleitoral depõem contra sua imagem. Perdido por um, perdido por mil. Pode ser que este seja o lema de Bolsonaro para arremeter seu avião com certo grau de turbulência. 2º turno? As pesquisas últimas sinalizam eventual vitória de Lula no 1º turno, chegando a 52% dos votos válidos. Este analista continua distinguindo um voto seguro em Ciro e em Simone. O que jogaria a eleição para o final de outubro. Há uma grande interrogação no ar. A certeza é que, salvo um milagre, Bolsonaro não deve ganhar no primeiro turno. O Imponderável costuma nos visitar. Mas escolhe caminhos nem sempre tortuosos. O Sudeste Continuo vendo o Sudeste como o pêndulo das eleições. O voto vencedor nesta região elegerá o futuro presidente. O Nordeste poderá não dar as respostas que os bolsonaristas apregoam. O Auxílio Brasil Começou a ser pago ontem. Os assistidos continuam achando que o patrono desta causa é Lula, por conta do Bolsa Família. E o Minha Casa, Minha Vida também tem mais força que a Casa Verde Amarela. Questão de imagem do passado, que continua forte com o lulismo. O Centrão A Lei de Lavoisier é e será inspiração para o Centrão. Nada se perde, nada se cria, tudo se transforma. O Centrão começa a se dissolver em pequenas células, marcando para os meados do próximo ano seus passos em direção ao governante do país. Seja quem for. Vai apoiar com todo o seu peso a caminhada do governante. O marketing capenga Um bom marketing ajuda a eleger, mas é o candidato quem se elege. Marketing mal feito, ao contrário, ajuda um candidato a perder as eleições. Não adianta um bom marketing se o candidato é um boneco sem alma. Candidato não é sabonete. Tem vida, sentimentos, emoção, choro e alegria. Portanto, muita coisa depende dele, de sua alma, de seu calor interno, de sua identidade. Marketing há de absorver essas condições para evitar transformar pessoas em produtos de gôndolas de supermercado. Em um primeiro momento, a inserção publicitária na TV até pode exibir o candidato de forma mais genérica, por falta de tempo para expor conteúdo. Mas o eleitor não se conformará com meros apelos emotivos e chavões-antigos, como os usados para embalar perfis saturados (candidatos beijando crianças e velhinhos, tomadas em câmera lenta mostrando o candidato no meio do povo, etc.). O velho Brasil Um sujeito comprou uma geladeira nova e para se livrar da velha, colocou-a em frente a casa com o aviso: "De graça. Se quiser, pode levar". A geladeira ficou três dias sem receber um olhar dos passantes. Ele chegou à conclusão: ninguém acredita na oferta. Parecia bom demais pra ser verdade. Mudou o aviso: "Geladeira à venda por R$ 50,00". No dia seguinte, a geladeira foi roubada! Secos & molhados - A foto de Lula com oito ex-presidenciáveis tem apenas valor simbólico. Não agrega votos. Faltaram FHC, José Serra e Dilma. - Disputa acirrada no PT, caso Lula seja o vencedor do pleito: quem comandará a economia? Mercadante? Geraldo Alckmin? Meirelles? - Pesquisas do RN dão como certa a vitória de Fátima Bezerra (PT) no primeiro turno. Mas é bom seguir o conselho: eleição e mineração, só depois da apuração. - Ronaldo Caiado poderá se eleger no 1º turno em Goiás. - Quem tem também boas chances de ganhar no 1º turno é Romeu Zema, em MG. - Em São Paulo, a luta acirrada é pelo 2º lugar. Quem disputará com Fernando Haddad, do PT? Tarcísio, candidato de Bolsonaro, ou Rodrigo Garcia, o atual governador tucano? - Esperemos pelo alardear de denúncias contra o TSE. Serão inevitáveis. - Bolsonaro, como se esperava, fez na ONU um discurso para suas bases. - Disse que acabou com a corrupção, vacinou a população e protegeu a renda das famílias. "Somos uma nação com 210 milhões de habitantes e já temos mais de 80% da população vacinada contra a covid-19. Todos foram vacinados de forma voluntária, respeitando a liberdade individual de cada um." - Sem seguir a liturgia, Bolsonaro cumprimentou Charles III com um amplo sorriso e a mão no ombro do monarca. Parecia íntimo, que não pode ser tocado. Fecho a coluna com a família do Plural. Arandú, em São Paulo, começou sua história como pequeno povoado, no bairro do Barreiro, no município de Avaré. Em 1898, um pedaço de uma fazenda leiteira da região foi doado para a construção de uma capela. Elevado a distrito de Avaré/SP, em 1944, recebeu na ocasião a atual denominação. Em 1964, conquistou a emancipação política. No primeiro comício, os candidatos a prefeito exibiam seus verbos. Dentre eles, José Ferezin. Subiu ao palanque e mandou brasa: - "Povo de Arandu, vô botá agua encanada, asfaltá as rua, iluminá as praça, dá mantimento nas escola..." Ao lado, um assessor cochichou: - "Zé, emprega o plural." O palanqueiro emendou: - "Vô dá emprego pro prural, pro pai do prural e pra mãe do prural, pois no meu governo não terá desemprego." (Historinha enviada por Marcio Assis)
quarta-feira, 14 de setembro de 2022

Porandubas nº 777

Abro com Pernambuco hilário. "Só expectorante" Reunião de vereadores com o chefe político da região numa pequena cidade de Pernambuco. Cada um tinha de falar sobre os problemas do município, reivindicações, sugestões, etc. Todos falaram alguma coisa, com exceção de um deles, meio acabrunhado no canto da sala. O chefe político cobrou dele a palavra: - E você, amigo, não tem nada a dizer? O vereador, tonto com a provocação, não teve saída. Respondeu: - Não, doutor, estou apenas expectorante. Abriu a gargalhada dos companheiros espectadores. ("Causo" lembrado pelo saudoso Marco Maciel e relato de Geraldo Alckmin.) Panorama Tentar projetar cenários, já disse isso nessas nem sempre comportadas linhas, é um exercício de ponderação, que deve levar em consideração fatores como satisfação/insatisfação social, esperança/desesperança, harmonia/conflitos de rua, bolso cheio/bolso vazio, carências/demandas atendidas, enfim, o produto nacional bruto da felicidade, o PNBF. Não se trata, portanto, de mero achismo, inserção de pontos de vista do analista preso às galeras da torcida analisada. Dito isto, a 20 dias das eleições, arrisco-me ao exercício: I - Cenários 1. Cenário vermelho claro - Vitória inquestionável de Lula. Urnas lhe conferem razoável índice de distância para Bolsonaro. Poucos gritos de protesto, com tendência à aceitação de resultados. Base petista vai às ruas. Clima de pré-campanha se dissipa. 2. Cenário vermelho escuro - Vitória apertada de Lula, com questionamentos gerais, a partir de falas tumultuadas das esferas da política e do estamento militar. Sociedade civil, por meio de suas organizações, ocupam as ruas. Estado de alerta e atenção. Conflitos e baderna. 3. Cenário amarelo - Vitória de Jair Bolsonaro, com índices de maioria em São Paulo e no Rio de Janeiro. Ruas tomadas pela base bolsonarista. TSE endossa resultados e protestos despontam aqui e ali. 4. Cenário amarelo queimado - Vitória de Bolsonaro por pequena margem, com ruas tomadas pelas bases dos dois principais protagonistas. Conflitos se arrastando por dias. Tendência de calmaria após uma semana. 5. Cenário azul de brigadeiro - Vitória de Lula, com margem entre 5% e 8% de maioria. Aceitação dos resultados gerais. Querelas isoladas não abalam segurança nacional. 6. Cenário verde claro - Segundo turno envolvendo Ciro Gomes e Bolsonaro. Derrota do atual presidente e vitória retumbante dos grupos alinhados ao "nem-nem". Surpresa geral e comemorações festivas. 7. Cenário verde escuro - Segundo turno envolvendo Ciro Gomes e Lula, com vitória do ex-ministro e derrota do ex-presidente. Cenário distante do horizonte. 8. Cenário vermelho e preto - Vitória de Simone Tebet sobre Lula ou Bolsonaro no segundo turno. Cenário pálido no horizonte. 9. Cenário SDS (Só Deus Sabe) - Visita do Senhor Imponderável. Acidente/incidente envolvendo candidatos e mudança repentina do eleitorado. II - Barreiras O Governo do PT Ontem, Luiz Inácio foi entrevistado por William Waack, na CNN. O jornalista fez perguntas contundentes, não ficou levantando bola para o petista chutar. Respondeu a todas as perguntas. Driblou algumas respostas, por exemplo, sobre corrupção. Mas saiu-se bem. A melhor performance de Lula na campanha. Agora, é difícil desamarrar a árvore petista. Em certos momentos, Lula insiste: o governo do PT, o governo do PT, o governo do PT. Igreja E assim, confirma-se a identidade do petismo. Ele, ele e ele, sempre em primeiro lugar. Com 10 partidos formando uma aliança, Lula esquece que um eventual governo comandado por ele deveria ganhar o pronome "nosso governo de centro" ou de "centro-esquerda". O PT é uma seita. Evangélicos Da mesma forma, o bolsonarismo tenta se apropriar do espaço evangélico no país, firmando, assim, uma divisão nas religiões. Evangélicos, de um lado, católicos, de outro, e assim por diante. População armada Não há pesquisa que aprove a existência de uma população armada. Pensar que o apelo às armas seja um laço para segurar o eleitor, é um erro. A violência se expande. Aborto O tema do aborto tem forte apelo nas classes médias. Urge conhecer as fronteiras do conservadorismo no Brasil. Rede assistencial O pacote assistencialista do governo tem forte apelo nas margens sociais. Auxílio Brasil, Vale Alimentação, Vale Gás (preço do gás de cozinha) e dos combustíveis (classe média), orçamento de campanha fazem diferença, sim. Quatro regiões eleitorais densas Zona Leste, Zona Norte, Zona Sul e Zona Oeste da capital paulista. Eis aí uma dica para visitas intensas de candidatos. Essas zonas somam muito mais que outras regiões. Só na Zona Leste são mais de 3 milhões de eleitores. Corram prá lá, candidatas(os). Números Tenho visto os candidatos desfilarem com seus nomes nos programas eleitorais. Alguns são hilários. Poucos capricham nos números, que são os signos gravados pelo eleitor. BO+BA+CO+CA A quem me pergunta, lembro. Trabalhem com a equação na cabeça: Bolso Cheio, Barriga Satisfeita, Coração Agradecido, Cabeça vota a favor. Bo+Ba+Co+Ca. Simples. Militares Estarão no centro do debate político nos próximos tempos. Pastores Uma enxurrada de pastores se aproxima do Congresso Nacional. Bancada religiosa vai crescer muito. Agronegócio Da mesma forma, a bancada do agronegócio. Uma das mais densas do Congresso Nacional. O Brasil como celeiro do mundo. Aqui: 33 milhões de necessitados. Covid-19 Foi embora? Não vi dados das aglomerações no Rock & Rio. Houve expansão? Ou sob controle? A violência disparou no Brasil Fecho a coluna com um "causo" na Paraíba. Silêncio geral Flávio Ribeiro, presidente da Assembleia (depois foi governador da Paraíba), estava irritado com as galerias, que aplaudiram e vaiavam durante um debate entre o deputado comunista Santa Cruz e o udenista Praxedes Pitanga. De repente, tocou a campainha, pediu silêncio e avisou, grave: - Se as galerias continuarem a se manifestar, eu evacuo. Felizmente, as galerias se calaram.
quinta-feira, 8 de setembro de 2022

Porandubas nº 776

Nesses tempos de questionamento das urnas eletrônicas, essa historinha explica muita coisa. Coronelismo O coronel Lucas Pinto, que comandava a UDN no Vale do Apodi/RN, não dormia em serviço. Quando o Tribunal Eleitoral exigiu que os títulos eleitorais fossem documentados com a foto do eleitor, mandou um fotógrafo "tirar a chapa" do seu rebanho, aliás, do seu eleitorado. Numa fazenda, um eleitor tirava o leite da vaca quando foi orientado a posar para a foto. Não teve dúvida: escolheu a vaca como companheira do flagrante. Mas o fotógrafo, por descuido, deixou-o fora. O coronel Lucas Pinto não teve dúvida. Ao entregar as fotos aos eleitores, deparando-se com a vaca, não perdeu tempo e ordenou ao eleitor: "prega a foto aí, vote assim mesmo, na próxima eleição, nós arrumamos a situação". Noutra feita, o coronel levou as urnas de Apodi para o juiz, em Mossoró, quase 15 dias após as eleições. Tomou uma bronca. - Coronel, isso não se faz. As eleições ocorreram há 15 dias. - Pode deixar, seu juiz. Na próxima, vou trazer mais cedo. Não deu outra. Na eleição seguinte, três dias antes do pleito, o velho Lucas Pinto chegava com um comboio de burros carregando as urnas. Chegando ao cartório, surpreendeu o juiz: - Taqui, seu juiz, as urnas de Apodi. - Mas coronel, as eleições serão daqui a três dias. - Ah, seu juiz, não quero levar mais bronca. Tá tudo direitinho. Todos os eleitores votaram. Trouxe antes para não ter problema. Idos das décadas de 50/60. Não havia grandes empreiteiras financiando campanhas. E não tinha governante denunciando fraude nas urnas. A empreitada ficava mesmo a cargo dos coronéis. Panorama Hoje, quinta-feira, o Brasil reagiu bem aos atos eleitorais em comemoração ao bicentenário da Independência. O país rachado ao meio viu os comícios do presidente em Brasília e no RJ. Pequena dose de preocupação com o que pode ocorrer com a fala do presidente de que a história pode se repetir. Comparação Bolsonaro teve um foco em suas falas: deixar claro que ele é o bem e o Lula é o mal. Mais uma vez, acenou com a possibilidade de usar a força, lembrando o passado, quando o Brasil usou as curvas do golpe e da ditadura. Nunca se viu um governante fazer comparação de primeiras-damas. E se autoproclamar "imbrochável". Coisa de entes da barbárie civilizatória. Com todo respeito à senhora Michelle. As mulheres A presença de Michelle Bolsonaro sinaliza o protagonismo das mulheres na cena eleitoral. As mulheres dos candidatos, a partir de Michelle, Janja, casada com Lula, e Lu, esposa de Alckmin, mostram o empoderamento feminino. A política, doravante, terá um tom mais forte da orquestra das mulheres. A inação do governo Afinal, qual foi o ato comemorativo do Bicentenário da Independência promovido pelo governo? O desfile militar de Brasília? Os atos espetaculares da Marinha, Exército e Aeronáutica no Rio? O Museu do Ipiranga, restaurado, graças ao governo de João Doria em São Paulo, se apresenta como o evento mais forte. O governo Federal foi inerte nessa tarefa. Ganhos O governo Bolsonaro pode ter se apropriado do simbolismo do bicentenário da independência. Mas a vinda do coração de Pedro I não rendeu a Bolsonaro os ganhos que esperava. O coração conservado em formol não foi propriamente um empreendimento de alto impacto. O Brasil, porém, pouco tem a comemorar nesse momento em que se comemora os 200 anos de sua independência. Nossa democracia está em débito com seus compromissos. Quais? Compromissos básicos A democracia padece, aqui e alhures, de uma crise crônica. Crise que se fundamenta em desvios de seu ideário e em promessas não cumpridas pelos sistemas democráticos. Norberto Bobbio dizia que ela tem deixado de cumprir certos compromissos básicos: a defesa de uma sociedade pluralista, o fim das oligarquias, a ampliação dos direitos dos cidadãos, a eliminação do poder invisível (os arcana imperii - o Estado informal dentro do Estado formal), a realização da meta de educação para a cidadania, combatendo o estado de apatia social. Vetores da crise Que vetores formam a argamassa da crise? Eis alguns: Arrefecimento doutrinário - As doutrinas, como flores velhas, passam a murchar, fazendo fenecer as utopias, estiolando as vontades cívicas e maltratando valores fundamentais do Humanismo. As antigas clivagens ganharam novos paradigmas. A antiga luta de classes perdeu lugar no novo cenário da sociedade de consumo. Nessa moldura, decresce a densidade ideológica da competição política e se expande a tecnoburocracia; os grupos sociais aproximam suas convergências; os problemas de natureza técnica se sobrepõem às contundentes questões sociais; e os aparelhos do Estado burocrático monopolizam as informações. Arrefecimento partidário - No campo partidário, as consequências são concretas e visíveis, a partir do estiolamento doutrinário, arrefecimento ideológico e consequente declínio dos partidos políticos. Os partidos de massas, que nasceram sob o signo das lutas operárias, mudam seus paradigmas, alterando processos, moderando atitudes, ajustando-se aos contextos econômicos, integrando-se à expansão econômica, atenuando seu fogo ideológico. Declínio dos Parlamentos - No campo parlamentar, a crise solapou as arenas dos Parlamentos, com sensível redução das funções da representação política. Parcela de sua força foi transferida para as tecnoestruturas do Poder Executivo. A redução do papel do Estado - Grandes mudanças ocorrem nas máquinas governativas. O Estado tende a reduzir seu papel como fonte de direitos e como arena de participação. Serve apenas como instrumento de controle e regulação econômica. A força do mercado - O liberalismo insiste na importância do mercado como mecanismo autorregulador da vida econômica e social, e, por consequência, no próprio papel tecnocrático do Estado. O cidadão encarna o perfil do consumidor intensamente preocupado com questões materiais e insensível a sentimentos cívicos. Este 7 de setembro desperta sentimentos de ódio e revanche. A ascensão da micropolítica - Em decorrência de uma reversão de expectativas, comunidades passam a se inspirar pela moeda sonante do pragmatismo, ou seja, a satisfação de demandas imediatas e reprimidas. A macropolítica é substituída pela micropolítica, a política das pequenas coisas, das necessidades próximas aos conjuntos sociais: a iluminação do bairro, a escola próxima de casa, o alimento barato, o transporte rápido e acessível a todos. A organicidade social - Um dos fenômenos mais interessantes da contemporaneidade, com reflexos sobre a moldura institucional, é a organicidade social. Em todas as esferas sociais e em todos os quadrantes, formam-se grupos em torno de entidades que passam a intermediar interesses e a fazer pressão. São novos polos de poder. A personalização do poder - Atores e atrizes, dândis, estrambóticos e figurantes de todos os espaços do Estado-Espetáculo povoam os meios de comunicação. Na moldura de glorificação, abre-se imenso espaço para a personalização do poder, que se concentra nos indivíduos. Na sociedade de massa, o poder escapole das estruturas clássicas de autoridade e converge para pessoas e grupos. Veja-se essa campanha eleitoral. São as pessoas, não os partidos que dão o tom. A personalização do poder abre a esfera do fulanismo/beltranismo. Os partidos se dividem em domínios de A, B e C. Acesso à Justiça - A maior parcela da população continua com as portas da Justiça fechadas. O direito à Justiça é um sagrado preceito de nossa Constituição. Previsto no inciso XXXV do artigo 5º da CF de 1988. Responsabilidade do Estado. Direito que já era sinalizado pelo Código de Hamurabi, conhecido pela lei do Talião: "olho por olho, dente por dente". Os poderosos usam todo tempo esse direito. O caos O que explica a propensão de nossos homens públicos a assumirem o papel de atores de peças vis, cerimônias vergonhosas e, ainda, abusarem de linguagem chula, incongruente com a posição que ocupam? A resposta pode ser esta: a despolitização e a desideologização. Os mecanismos tradicionais da democracia liberal estão degradados. Outra resposta aponta para o paradigma do "puro caos", que o professor Samuel Huntington identifica como fenômeno contemporâneo e que se ancora na quebra no mundo inteiro da lei e da ordem, em ondas de violência, no declínio da confiança na política e na solidariedade. Secos & molhados O panorama sob o galpão de secos e molhados. 1. Bolsonaro espera empatar com Lula nas proximidades de 25 de setembro. Os discursos de ontem mostram um candidato em luta para chegar mais perto de Lula. 2. 2º Turno - Deixa de ser uma hipótese para entrar no campo das certezas. 3. Lula - A voz ocupa o canto das altas prioridades. É seu grande anzol. 4. Cresce o rumor de que Geraldo Alckmin seria o comandante da área de economia, se Lula vier a ganhar. 5. Cresce o rumor de que, em caso de vitória de Bolsonaro, os militares terão papel mais ativo na administração. 6. Ciro Gomes tem um deadline: 20 de setembro. Se até esta data não crescer mais uns pontinhos, na margem dos 15%, fará articulações junto ao lulopetismo. 7. Simone Tebet espera que as próximas pesquisas mostrem uma ultrapassagem por Ciro. 8. Os eventos de hoje servem como choque de entusiasmo para laçar os rebanhos bolsonaristas. 9. O fato é que Bolsonaro apropriou-se do "civismo" do ódio e da revanche, o que foi confirmado nas falas de ontem. 10. Apesar do esforço das alas que brigam e urram, a campanha está fria. Com exceção para eventos programados. Mas as ruas são um deserto descolorido. Não se veem bandeiras, cores e outras ferramentas de atração e laço de eleitores. 11. As motociatas estão presentes, também, nos eventos eleitorais de Donald Trump, que já ocorrem nos EUA visando os pleitos para o Legislativo. 12. Os militares fizeram do 7 de setembro um ato de espetacularização em Copacabana. 13. Nunca se mobilizou tanta tropa para a segurança dos atos "cívicos". 14. Ante uma sociedade muito organizada, o golpe vai para longe, muito longe. 15. O Auxílio Brasil, de Bolsonaro, é entendido nas margens carentes como o Bolsa Família de Lula. Fecho com linguagens para os nossos tempos. Linguagens para 2022 1. A linguagem da afirmação. 2. A linguagem da factibilidade/credibilidade. 3. A linguagem das pequenas coisas. 4. A linguagem da participação - o NÓS versus o EU. 5. A linguagem da verificação - exemplificação - como fazer. 6. A linguagem da coerência. 7. A linguagem da transparência. 8. A linguagem da simplificação. 9. A linguagem das causas sociais - os mapas cognitivos do eleitorado. 10. A linguagem da tempestividade - proximidade.
quarta-feira, 31 de agosto de 2022

Porandubas nº 775

Abro a coluna com uma historinha da Paraíba. O caso ocorreu na encenação da Paixão de Cristo numa cidadezinha da Paraíba. O dono do circo, em passagem pela cidade, resolveu encenar a Paixão de Cristo na sexta-feira santa. Elenco escolhido dentre os moradores e no papel de Cristo, o "gatão" da cidade. Ensaios de vento em popa. Às vésperas do evento, o dono do circo soube que 'Jesus' estava de caso com sua mulher. Furioso, deu-se conta que não podia fazer escândalo sob pena de perder o investimento. Bolou uma maneira. Comunicou ao elenco que iria participar fazendo o papel do 'centurião'. - Como? - reclamaram - O senhor não ensaiou! - Não é preciso ensaiar porque centurião não fala! O elenco teve que aceitar. Dono é dono. Chegou o grande dia. Cidade em peso compareceu. No momento mais solene, a plateia chorosa em profundo silêncio. Jesus carregando a cruz ... e o 'centurião' começa a dar-lhe chicotadas. - Oxente, cabra, tá machucando! Reclamou Jesus em voz baixa. - É pra dar mais verdade à cena, devolveu o centurião. E tome mais chicotada. Chicote comendo solto no lombo do infeliz. Até que Jesus enfureceu-se, largou a cruz no chão, puxou uma peixeira e partiu pra cima do centurião: - Vem, desgraçado! Vem cá que eu vou te ensinar a não bater num indefeso! O centurião correndo, Jesus com a peixeira correndo atrás, e a plateia em delírio gritando: - É isso aí! Fura ele, Jesus! Fura ele, Jesus, aqui é a Paraíba, não é Jerusalém, não! Parte I - Panorama O debate da Band Uma surpresinha: quem esperava um duelo de vida e morte entre Lula e Bolsonaro, no primeiro debate da televisão aberta, viu golpes e estocadas vindas das laterais, desferidas por duas mulheres. A senadora Simone Tebet, com o apoio da colega, senadora Soraya Thronicke, ambas do Mato Grosso do Sul, ganhou o troféu da primeira batalha. Saiu da TV Bandeirantes como a candidata à presidente da República que melhor aproveitou os rounds da luta. Indecisos e... Parcela dos indecisos olha para o desempenho dos (a) candidatos (a) no debate e toma posição. Adere ao vitorioso. As bases de cada candidato são imutáveis. Consolidam suas decisões. E, como temos um eleitor mais racional este ano, diferente do eleitor de campanhas passadas, é razoável apostar na possibilidade de mudança de voto de certo núcleo que já havia escolhido seu candidato (a). Simone Tebet Teve ótimo desempenho na CPI da Covid. Fluente, experiente, professora, boa gestora como prefeita de Três Lagoas/MT, cara larga que ocupa toda a tela em primeiro plano, simpática, Simone, seja qual for o resultado do pleito, estará na agenda da política nos próximos tempos. Tornar-se-á conhecida e, assim, mais palatável ao gosto do eleitorado. O novo Lula O Luiz Inácio Lula da Silva de 2022 não é o Lula de ontem. Cabelos embranquecidos, com áreas vazias, voz mais rouquenha que a do costume, algumas vezes incompreensível. A contundência do passado tem sido amenizada pela sua caminhada ao centro do arco ideológico, ditada pela decisão de repaginar seu manto de cores radicais. O Lula do centro, com Geraldo na chapa como seu vice, é menos incisivo para desgosto de sua base tradicional. O novo Lula não empolga tanto como no passado. Sua voz, muito rouca, prejudica o desempenho. Falta de fonoaudióloga, dizem. Mas tem carisma. Ciro Deve ir até o final, sem desistência e sem vontade de aderir à chapa encabeçada por Lula, conforme aceno deste no debate da Band. Ciro saiu-se bem, é o mais preparado dos candidatos, mas tem problema de imagem. Um perfil tempestuoso. Trata-se de uma fonte inesgotável de dados, informações, comparações, conhecimento de Brasil. Parte de suas ideias se perde no emaranhado de uma fala que corre mais que lebre fugindo do caçador. Bolsonaro Facilmente irritável, inesperado e pronto para enfrentar a briga. Palavroso, dispara um canhão de palavras de mal trato, deseducado, comete um disparate com a maior tranquilidade. Mas suas bases vibram com suas peripécias linguísticas. Suas motociatas ficarão na história das campanhas eleitorais. Não tem escrúpulos. Atira contra uns e outros, mais ainda contra umas (mulheres) e outras (mulheres). Uma cultura extremamente machista. Um cara corajoso. Sem querer esconder seus maus costumes. Como lembra Vera Magalhães: não gosta de ser questionado por mulheres. O último mês Quando setembro vier... (quem se recorda do filme de Robert Mulligan, com Rock Hudson, Gina Lollobrigida e Sandra Dee?). Pois é, setembro virá amanhã. O tempo de a onça beber água. O mês de eventuais viradas de chapas preferenciais. Ou até de consolidação de posições já tomadas pelo eleitor. Dia 15 é um prazo-chave. Vejamos se pesquisas ainda são diferentes ou tendem a aproximar seus números. Nenhum Instituto quer passar recibo de parcial, vendido, mentiroso. Dia 20, a 12 dias do pleito, o clima será de "quase" definitivo. Por que o "quase"? Pelo respeito que tenho ao Senhor Incomparável dos Anjos. Eleição sob o bolso Volto a repetir. A economia será o guia do eleitor nas urnas. Não vou repetir minha equação para não ser tão recorrente. Mas o estado geral da sociedade - satisfação/insatisfação, felicidade/infelicidade/, alegria/amargura, ditará o resultado das urnas. E tais estados de espírito costumam ser balizados pela economia, pelo bolso capaz de fazer a feira, pagar o remédio, a passagem de trem ou de ônibus. Lembro ainda: aquele Senhor (acima citado) costuma visitar o Brasil. Os programas eleitorais As velhas receitas voltaram em cheio para maltratar os ouvidos dos telespectadores. Mensagens repetidas saturam. Histórias humanizadas de alguns protagonistas parecem artificiais. Animais, vozes de narração esportiva, sobrenomes hilários, João Ponta Grossa, Manezim da Esquina, Lourival do Jabá, figuras estrambóticas, números gritados, falas gritadas, numa algaravia (confusão de vozes) de Torre de Babel, educação, saúde, transportes, enfim, um palavrório sem pé nem cabeça - esse é o calvário que temos de suportar nas próximas semanas. Bons programas. E aguardem o 2º turno. O Brasil será outro Aqui segue minha visão sobre o amanhã. O Brasil caminhará por outras vias. Não significa que teremos de mudar tudo. As exigências de uma comunidade exigente, crítica e com tendência a participar do processo decisório com mais firmeza são pressupostos para a formação de polos de poder e pressão em todo o território. A esfera política, por sua vez, vai focar sua ação nesse processo. E tomará decisões mais afinadas à sociedade. Da mesma forma, agirão os poderes Executivo e Judiciário. Parte II - Secos & molhados - 7 de setembro não terá parada militar, mas um espetáculo militar na praia de Copacabana. Quem apostou em refluxo das FFas perdeu. Vai haver saltos de paraquedistas, tiros de canhão do Forte de Copacabana, urros e gritos, bastante gente na motociata de Bolsonaro. - Marcas difíceis de apagar: corrupção no governo Lula; desprezo de Bolsonaro pelas mulheres e má gestão da pandemia; estrebuchadas do Ciro Gomes; desfile de perfis insossos na programação eleitoral. - Dinheirama não dá direito à vitória; eleitor é sabido. - Mulheres deverão fazer bancada forte na Câmara e Assembleias estaduais. - O soberano, segundo Thomas Hobbes, em Leviatã (1651), ouvia seus conselheiros de um a um, nunca em conjunto. - A obra é fundamental para o entendimento do comportamento humano, sobretudo no que tange ao poder, sua organização, exercício e compreensão pelo homem, além de ser um dos pilares fundamentais tanto da sustentação daquele regime quanto da compreensão do universo político, guardadas as devidas diferenciações e proporções, em todo o mundo e em todos os tempos. - Governantes: separem o Estado laico da religião. Não confundam alhos com bugalhos. - Maior conhecimento dos candidatos implica maior adesão ou distanciamento por parte do eleitor. - Candidatos: observem a lei das maiores quantidades. Maiores conjuntos eleitorais carecem de maior presença dos protagonistas. - Rejeição é fator crucial em um 2º turno. E chave do portão no primeiro turno. - Em São Paulo, a disputa para entrar no 2º turno será uma das mais acirradas do país. - Este analista acredita em viradas eleitorais de última hora. Quando o vento correr para determinado lado, não há força que o detenha. - Teremos um pleito com a maior organicidade social no país. Com o maior número de entidades representativas dos conjuntos sociais e profissionais. Fecho a coluna com a época da Inquisição. Dez truques Dez truques dos hereges para responder sem confessar: 1. A primeira consiste em responder de maneira ambígua. 2. O segundo truque consiste em responder acrescentando uma condição. 3. O terceiro truque consiste em inverter a pergunta. 4. O quarto truque consiste em se fingir de surpreso. 5. O quinto truque consiste em mudar as palavras da pergunta. 6. O sexto truque consiste numa clara deturpação das palavras. 7. O sétimo truque consiste numa autojustificação. 8. O oitavo truque consiste em fingir uma súbita debilidade física. 9. O nono truque consiste em simular idiotice ou demência. 10. O décimo truque consiste em se dar ares de santidade. (Manual dos Inquisidores - escrito por Nicolau Eymerich em 1376. Revisto e ampliado em 1578 por Francisco de La Peña). Resposta de Lula a uma pergunta se houve corrupção em seu governo: - Ora, se delatores confessaram o roubo, é porque houve.
quarta-feira, 24 de agosto de 2022

Porandubas nº 774

Abro a coluna com o meu Rio Grande do Norte. "Aposentem o homem" Dinarte Mariz era governador do Rio Grande do Norte. Em uma de suas costumeiras visitas à Caicó, visitou a feira da cidade, acompanhado da sempre presente Dona Nani, secretária de absoluta confiança. Dá de cara com um amigo de infância e logo pergunta: "Como vai, Zé Pequeno?" O amigo, meio tristonho e cerimonioso, responde: "Governador, o negócio não tá fácil; são oito filhos mais a mulher... tá difícil alimentar essa tropa vivendo de biscate. Mas vou levando até Deus permitir." Dinarte o interrompe de pronto: "Zé, que é isso, homem, deixe essa história de governador de lado. Sou seu amigo de infância, sou o Didi!" Vira-se para Dona Nani e ordena: "Anote o nome do Zé Pequeno e o nomeie para o cargo de professor do Estado." Na segunda-feira, logo no início do expediente, Dona Nani entra na sala de Dinarte e vai logo informando: "Governador, temos um problema, o Zé Pequeno, seu amigo, é analfabeto; como podemos nomear..." Antes que concluísse a fala, o governador atalha: "Virgem Maria, Dona Nani! O Rio Grande do Norte não pode ter um professor analfabeto. Aposente o homem imediatamente." E assim foi feito! (Historinha contada pelo amigo Lindolfo Sales). I. Ligeiras lições de ontem A morte de Getúlio O suicídio do ex-presidente da República, Getúlio Vargas, completa, hoje, 68 anos. Vargas começou a governar em 1930, com o movimento (revolução) que destituiu o presidente Washington Luis e o impedimento do presidente eleito, Júlio Prestes. De 1930 a 1937, Vargas governou com as mãos férreas de ditador. Um populista com estreita ligação com as massas. O nacionalismo O sindicalismo cresceu sob a égide do Estado, a censura ganhou corpo com o Departamento de Imprensa e Propaganda (DIP), o autoritarismo e nacionalismo acalentaram corações, sob o manto do populismo. Em 10 de novembro de 1937, Vargas deu o golpe que instaurou o Estado Novo, perdurando até 29 de outubro de 1945. Foi o período conhecido como Terceira República, ciclo em que priorizou investimentos em infraestrutura para o desenvolvimento industrial. A ditadura Já em 1935, o governo impulsionara sua propaganda anticomunista, legitimando o estado de sítio e instalando, em 1936, o estado de guerra. As eleições de 1938 não se realizariam. O momento de instabilidade política do país fez com que Getúlio Vargas desse o golpe de estado de 10 de novembro de 1937. A Constituição de 1934 proibia a reeleição de Getúlio, mas o ditador, matreiro, produziu o chamado Plano Cohen, um documento que atestava o plano comunista para destituir o governo. O plano, depois, foi denunciado como fraude. A ditadura ganhou apoio popular. Fez-se a Constituição de 1937, de inspiração fascista. A transição Em 1945, teve início um movimento chamado "queremismo", com foco na volta de Getúlio ao poder. Mas o slogan "Queremos Getúlio" não o sustentou, foi forçado a renunciar pelos militares. Organizou-se uma nova Constituição, iniciando-se a Quarta República, que vai de 1946 até 1964. A Constituição de 1946 teve caráter democrático. Elegeu-se o marechal Eurico Gaspar Dutra, que havia sido a favor da deposição de Vargas. O pai dos pobres Na eleição seguinte, de 1950, Getúlio, aclamado como "Pai dos Pobres", decidiu se candidatar ao cargo de presidente. Iniciada a campanha em agosto, o gaúcho agitou o país. Foram 80 discursos, versando sobre problemas locais, regionais e nacionais, saindo de São Borja e terminando também em sua terra natal. Ganhou com 48,73% (3.849.040) dos votos contra 29,66% (2.342.384) de Eduardo Gomes e 9,71% dos votos (569.818), de Cristiano Machado. Em 1953, criou a Petrobras, sob o slogan de "o petróleo é nosso". Em 24 de agosto de 1954, com um tiro no peito, suicidou-se. Deixou uma carta com um desabafo contra "os inimigos ocultos". Tem candidato se considerando "o pai dos pobres". A história se repete como farsa? II. Breves lições de hoje O coração de Pedro I O país completará, daqui a poucos dias, em 7 de setembro, 200 anos de sua independência. Para marcar as comemorações pela data, o governo fez articulações com Portugal para trazer ao Brasil o coração do imperador Pedro I, que proclamou a independência com seu célebre "Grito do Ipiranga", que os historiadores dizem ter sido "gritado" às margens do riacho Ipiranga, na cidade de São Paulo. Bizarrice Para comemorar o bicentenário da Independência, o governo articulou com as autoridades portuguesas a vinda ao Brasil do coração de Pedro I, que é guardado numa igreja da cidade do Porto, e que deixa Portugal pela primeira vez em 187 anos. Chegou segunda-feira e a relíquia foi recebida com honras de chefe de Estado. Uma bizarrice que só se vê em regimes autoritários. Dia 8 de setembro, retorna à Portugal. Aliás, já tínhamos assistido, antes, a esse tipo de evento. Sob os anos de chumbo, em 1972, o governo Médici conseguiu o feito de trazer os restos mortais de Pedro I para as comemorações dos 150 anos da Independência. Os governos usam a simbologia encarnada por figuras de nossa história para elevar seu prestígio junto às massas. Caixão maior Detalhe: o caixão vindo de Portugal era 8 cm maior que o sarcófago. Por isso, o sepultamento definitivo só ocorreu quatro anos depois na Capela Imperial no Ipiranga, em 1976. Lembrando, Pedro I faleceu em 1834 e seus restos mortais estão sepultados na cripta imperial, localizada no Parque da Independência, em São Paulo. Mas o coração permanecia guardado na capela-mor da Igreja de Nossa Senhora da Lapa, sob responsabilidade da Irmandade de Nossa Senhora da Lapa, no Porto, em Portugal. O governo brasileiro sempre se esforçou para trazer ao país os restos mortais dos imperadores. A história tem um quê de comédia. A propósito, um "causo" hilário. Escombros O contínuo do doutor Ernane Galvêas, quando presidente do Banco Central, de 1968 a 1974 e de 1979 a 1980, entrou correndo no gabinete: - Doutor, chegue na janela que estão passando lá embaixo os escombros de Dom Pedro. Eram os despojos de Dom Pedro I desfilando na avenida Presidente Vargas. A personalização da política A política ganha a aura da personalização. O voto é dado a beltranos e sicranos, não a programas, projetos, ideários. Daí a dualidade que temos de enfrentar: Lula versus Bolsonaro, Ciro e Tebet contra os dois, os outros - poucos sabem seus nomes - a favor de si mesmos, eis que a campanha oferece um palco para que possam ser conhecidos. Essa é a política estática, que se amarra na árvore do grupismo, do companheirismo, das claques, milícias e militantes. Golpe, sem condições Com um clima social tenso em função da campanha eleitoral, a chegada do coração de Pedro I não tem sido objeto de tanta atenção por parte da mídia. Poderia ser o gancho nacionalista para acender a fogueira das massas, caso o presidente Bolsonaro não houvesse arrefecido sua disposição de agitar suas bases. O desfile de 7 de setembro foi suspenso. Boa decisão. A narrativa de golpe vai para o lixo. Veríamos dois paredões de contrários se atritando. Risco de confronto violento. Baixando a poeira Nos últimos tempos, o presidente Bolsonaro baixou a poeira. Limpou sua linguagem de virulência. Tem sido mais contido. A entrevista ao Jornal Nacional ganhou tom menos agressivo do que se imaginava. Não agregou votos, também não perdeu. Consolidou posições já firmadas por aliados e adversários. Pesquisas diminuem distância As pesquisas estão diminuindo as distâncias entre Lula e Bolsonaro. Se giravam em torno de 15 a 18 pontos, caíram para a margem entre 9 e 12 pontos. Na média. Os resultados exibem discrepâncias, com exceção para pesquisas realizadas por entidades de algumas regiões, contratadas por partidos. A voz de Lula O arsenal de Lula dispõe de muitas armas. Uma delas é sua voz inconfundível. Seus discursos gritados. Ouve-se um Lula mais rouquenho. Em final de campanha, isso é um perigo. Recados não são bem entendidos. Mensagens são perdidas. Por isso, a preocupação de Janja é ter sempre à mão garrafas de água mineral. O Centrão se esgarça O Centrão, que abriga cerca de 300 parlamentares, se esgarça. Um aqui, outro ali, dão sinais de distanciamento do candidato Bolsonaro, e pensam que é hora de já ir (opa, que coincidência) tomando posição na esfera da esquerda. Um risco? Sim. Mas, sempre, para eles, há maneira de voltar. Empresários golpistas Esse movimento de empresários na direção de golpe tem muito estardalhaço. Não é crível que apoiem iniciativa antidemocrática. Sabe-se que um e outro são favoráveis a medidas extremas para evitar a volta do lulopetismo. Daí a enxergar apoio massivo do empresariado é exagero. Vamos ver em que vai dar essa investigação, que já conta com mandado de busca e apreensão na casa de alguns homens de negócios. Esse analista mudará de posição, a depender das investigações. O medo Medo de ver a inflação disparar. Medo de faltar comida. Medo de o país cair numa rede esquerdista. Medo de o país cair numa teia direitista radical. Medo de violência se expandir nas ruas. Medo de ver o barco navegar à deriva. Medo de a pandemia voltar com força ao nosso cotidiano. Medo de não ter dinheiro para pagar as contas. Medo de não ter o que comer hoje e amanhã. Um país amedrontado é um país sem horizontes. Fecho a coluna com um comício. O que eu sou? O caso é engraçado, mas verídico. O farmacêutico Claodemiro Suzart, candidato do PTB à prefeitura de Feira de Santana, decidiu fazer o comício de encerramento da campanha na rua do Meio, na zona do meretrício. E jogou o verbo: "O povo precisa estudar a vida dos candidatos, desde o nascimento deles, os lugares onde nasceram, para saber em quem votar direito". Por exemplo, Arnold Silva, da UDN, nasceu em Palácio, nunca falou com o povo. O que ele é? - Candidato dos ricos - gritava a multidão. - É isso mesmo. Não pode ter o voto de vocês. E Fróes da Mota, candidato do PSD, nunca sentiu o cheiro de povo. Só gosta mesmo é do gado de sua fazenda. O que ele é? - Candidato dos fazendeiros - delirava a galera. - Isso mesmo. Não pode ter o voto do povo. Já eu, meus amigos, nasci aqui, nesta rua do Meio, a mais popular de Feira de Santana. E eu, meus amigos, o que eu sou? Lá do fundo da turba, um gaiato soltou a voz: - Filho da puta. O comício acabou ali. (Hilária historinha do grande narrador, Sebastião Nery, em seu Folclore Político/Geração Editorial, do jornalista Luiz Fernando Emediato).
quarta-feira, 17 de agosto de 2022

Porandubas nº 773

Abro a coluna com uma historinha das Minas Gerais. No confessionário Numa cidadezinha de Minas, Padre Elesbão estava esgotado de tanto ouvir pecados, ou, como dizia, besteiras. Decidiu moralizar o confessionário. Afixou um papelão na porta da Igreja, dizendo: O Vigário só confessará: 2ª feira - As casadas que namoram 3ª feira - As viúvas desonestas 4ª feira - As donzelas levianas 5ª feira - As adúlteras 6ª feira - As falsas virgens Sábado - As "mulheres da vida" Domingo - As velhas mexeriqueiras O confessionário ficou vazio. Padre Elesbão só assim pode levar vida folgada. Gabava-se: - Freguesia boa é a minha... mulher lá só se confessa na hora da morte! (Leonardo Mota em seu livro Sertão Alegre) Panorama Sinais das pesquisas Como temos escrito, resultados de pesquisas exibem sinais trocados. Há duas semanas, Bolsonaro aparecia diminuindo a distância para Lula. Empuxado pelos impactos do Auxílio Brasil, Vale Gás e dinheirama dos candidatos, alocados no orçamento eleitoral (R$ 40 bilhões), a tendência seria a de crescer mais ainda e se aproximar de Lula. Porém, no início desta semana, aparece a pesquisa BTG/FSB, mostrando a hipótese de Lula liquidar o pleito no 1º turno. Lula subiu quatro pontos com a desistência de André Janones. E Bolsonaro teria estagnado. Alerto: muita água correrá por baixo da ponte, com possibilidades de cheia e pororoca. O Senhor Imponderável está à espreita. O medo O medo balizará o sistema decisório. Lembro os quatro instintos do ser humano, descrito por Pavlov: combativo, nutritivo (ambos ligados à conservação do indivíduo); e os impulsos sexual e paternal (ligados à preservação da espécie). O medo faz parte do primeiro, pois o ser humano luta para afastar os riscos; a necessidade de garantir as boas condições do estômago faz parte do segundo impulso, o nutritivo. Serão esses dois primeiros que balizarão o processo decisório. Rejeição A rejeição é um fator a se considerar no processo decisório. Lula, com 44% de intenção de voto, tem 33% de rejeição. Bolsonaro tem 32% de intenção de voto, mas 46% de rejeição, segundo última pesquisa do Ipec. Em São Paulo, Fernando Haddad (PT) lidera com folga a intenção de voto, com 29%, mas tem 32% de rejeição. Seus adversários, Tarcísio de Freitas (Republicanos), ex-ministro de Bolsonaro, e Rodrigo Garcia (PSDB), governador, carregam, respectivamente, 12% e 9% de intenção de voto, com rejeição de 12% (Tarcísio) e 11% (Rodrigo). Duas correntes Os analistas brigam com as hipóteses. Uns defendem a ideia de que os programas da teia social (Auxílio Brasil, Vale Gás etc.) já não alavancam o candidato governista, eis que os eleitores os consideram moeda eleitoral. Outros acham que os programas de distribuição de renda ajudam, sim, o candidato Bolsonaro. Minha análise. As massas carentes sentem-se aliviadas e recompensam o candidato. Mas certa parcela das margens, influenciada pelo meio da pirâmide, já não entra nessa onda. Votará com Lula ou outros (as) candidatos (as). "Maria vai com as outras"? Os tempos do "Maria vai com as outras" (conceito ultrapassado) são outros. A racionalidade altera o processo de decisão do eleitorado. A razão puxa as ferramentas da comparação de perfis; a autonomia, que carrega a vitamina da autoestima; o sentimento de pertinência, que faz o eleitor se considerar dono de seu destino e de sua individualidade. Essa carga valorativa mantinha seu habitat no meio da pirâmide social. Nos últimos tempos, porém, desceu alguns degraus em direção à base da pirâmide. Sombra esgarçada O candidato enfrenta um grande desafio: fazer chegar sua identidade aos eleitores. Identidade é um composto de pensamentos e ideias, experiências, história, atitudes e valores (plano semântico); e maneira de se vestir, de falar, de gesticular (plano estético). Identidade se ampara no sufixo idem (do latim), que significa semelhante, igual. Identidade, portanto, é a verdade da pessoa. Já imagem é a sombra da identidade, a projeção. Quando a sombra está muito distante da pessoa, cria-se uma dissonância. A imagem não corresponde à verdade. Por isso, candidatas e candidatos, procurem ajustar as imagens que desejam transmitir aos eleitores à identidade. A campanha Começou, ontem, oficialmente a campanha de rua, mesmo que os candidatos tenham burlado a lei e iniciado, antes, o pedido de votos. Cumprirão intensa agenda nas regiões, principalmente em bolsões de maior densidade eleitoral. Alguns fazem a campanha nos moldes tradicionais, sem enxergar os novos fenômenos que balizam o eleitorado, dentre os quais seleciono os seguintes. Os novos polos de poder A organicidade social faz com que as massas se fragmentem em grupos sociais com distintos interesses, diferentes demandas. Claro, prioridades nas áreas de saúde, educação, segurança, mobilidade, emprego são as mesmas para todos. Esses grupos, reunidos no entorno de categorias profissionais, constituem os novos polos de poder no país. Uso uma imagem: são ilhas circundantes de um arquipélago. Os candidatos, observa-se, trombeteiam discursos genéricos. Defesa de categorias O imenso contingente de profissionais liberais - médicos, engenheiros, economistas, pequenos e médios empresários, comerciantes, proprietários rurais, entre outros, - reparte-se em setores, criando fortalezas de defesa e ataque, geralmente sindicatos. Grupos em defesa de gênero, de raça e de cor, se multiplicam. O empoderamento se insere na representação das mulheres, em defesa da negritude, de integrantes da LGBTQIA+, gerando pressão junto às instituições do Estado. Trata-se do poder centrípeto fazendo pressão sobre o poder centrífugo. Os candidatos têm propostas para essas categorias? A estudantada Eis aqui um grupo que está completamente solto e disperso: os estudantes. Nas últimas décadas se afastaram da política, abrindo imenso buraco entre a classe estudantil e as esferas do poder. Ante a polarização que acirra ânimos, a estudantada ouviu os berros e urras, dando um avançado passo em direção à via política. Os jovens de 16 a 18, que ganham direito de voto, se farão mais presentes às urnas. Os candidatos estão conscientes sobre a nova moldura estudantil? As mulheres Eleitoras sobem degraus na escada do empoderamento. Chegam a 53% do eleitorado brasileiro. E dentro desse universo, também se repartem em territórios. A partir das donas de casa da base da pirâmide, que sentem os efeitos corrosivos da inflação sobre o parco dinheiro da família, as mulheres trombeteiam seus direitos, clamam por igualdade em todos os espaços da vida produtiva. Há uma miríade de organizações não-governamentais tocadas por mulheres. E no setor evangélico, sua voz chega aos lares mais modestos, sob o eco de um discurso messiânico. Bolsonaro tem como âncora, a mulher Michelle. Proximidade Será um elemento definidor de voto. O candidato que se mostrar, provar e comprovar sua proximidade com o eleitor, - bairro, cidade, região -, terá boas chances de ser bem votado. A carta A Carta em Defesa da Democracia, lida nos espaços da Faculdade de Direito do Largo do São Francisco, em São Paulo, deixou a hipótese de golpe no próximo 7 de setembro bem distante da viabilidade. Numa régua de 0 a 10, caiu de 4 para 1. Fake news As fake news inundarão os vãos e desvãos da campanha. Não sigo a interpretação da maioria dos analistas. Em minha visão, são armas do arsenal dos candidatos e servirão mais para consolidar as convicções das bases adversárias do que para capturar votos. A polarização se acirra, mas não atrairá novos eleitores. Moraes Alexandre de Moraes tomou posse, ontem, na presidência do TSE. Será um dique para conter as marés vazantes dos excessos de candidatos e discípulos de suas correntes. Barreira de contenção. Vitória no 1º turno Pesquisas de diferentes institutos mostram grande folga de ACM Neto (União Brasil) na Bahia. Probabilidade de ganhar a eleição no primeiro turno é de 95 na régua que vai de 0 a 100. É o que deduzo desta pesquisa que o Instituto Paraná Pesquisas acaba de me mandar. Obrigado, Murilo Hidalgo. Duas mulheres Uma das disputas mais acirradas para o Senado se dará no Distrito Federal envolvendo duas ministras do governo Bolsonaro: Flávia Arruda (PL), apoiada pelo presidente e integrante de seu partido, e Damares Alves (Republicanos), que contaria com o apoio de Michelle Bolsonaro, primeira-dama. Flávia lidera hoje a intenção de voto, com 36%, enquanto Damares tem 15%. Indicadores de peso No maior contingente eleitoral, São Paulo, que tem 36 milhões de votos, Lula lidera com 38%, enquanto Bolsonaro ostenta 28%. Em Minas Gerais, com mais de 16 milhões de votos, painel do Brasil de acordo com a tipologia eleitoral, Lula lidera com 40%. Já Bolsonaro tem 35% de preferência. Em minha visão, esses dois Estados definirão o vencedor. Segundo turno Reitero: a campanha deverá entrar numa segunda rodada. A ocorrer dia 30 de outubro. Contar com o tal do voto útil para liquidar a campanha no primeiro turno é sonho petista.
terça-feira, 9 de agosto de 2022

Porandubas nº 772

Abro a coluna com Belém do Pará. Socorro, socorro! João Botelho, candidato a prefeito de Belém, passou o dia inteiro anunciando um comício, à noite, na praça Brasil. Chegou na praça, não havia ninguém. Será que estou no lugar errado? pensou. Será que não estou enganado? Perguntou ao assessor. - Não houve engano não, deputado, a praça é esta mesma. Foi ao bar mais perto, pediu dois caixotes de madeira, pôs no centro da praça, subiu e passou a berrar alucinado: - Socorro, Socooorro, Socooooooorro! Correu gente de todo lado para ver o que era. Plateia arrumada, Botelho começou o comício: - Socorro para um candidato... E fez o comício. Panorama Secos & Molhados A primeira-dama A campanha ganha um tom messiânico com a entrada da primeira-dama, senhora Michelle Bolsonaro, na narrativa eleitoral. Segundo suas palavras, o Palácio do Planalto já foi consagrado aos demônios antes da posse do marido. Agora, é consagrado ao Senhor Jesus. Os evangélicos Os homens evangélicos dão mais apoio ao presidente Bolsonaro que as mulheres. A primeira-dama entra no discurso eleitoral até para aumentar o bolsão de votos do marido. O discurso místico pode pegar. O coronel das fake news O presidente do TSE tirou um coronel que fazia parte do grupo de análise do processo eleitoral por constar o comprometimento do militar com a propagação de fake news. O coronel do Exército, Ricardo Sant'Ana, será substituído. Por essas e por outras é que o conceito das Forças Armadas decresce junto à comunidade nacional. Bolsonaro cresce Nas últimas semanas, o candidato Jair Bolsonaro deu sinais de acrescimento. No Sul e no Centro-Oeste, lidera e aumenta sua distância para Lula. No Sudeste, situação estável. Lula cresce no Nordeste. Projeção deste analista: quando o impacto do Auxílio Brasil, Vale Gás e grana eleitoral chegar às bases, a tendência será a de diminuição da distância entre principais concorrentes. Olhem para minha velha equação: BO+BA+CO+CA= Bolso, Barriga, Coração, Cabeça. Mais um nome Acredita-se que um terceiro nome cresça até dia 15 de setembro. De qualquer maneira, a campanha deverá pagar ingresso para o 2º turno. A não ser que o Senhor Imponderável nos visite. Triângulo das Bermudas Formado por São Paulo, Minas Gerais e Rio de Janeiro, o Triângulo das Bermudas será o decisor da campanha. Os três somam cerca de 65 milhões de votos. Mais de 40%. Minas Gerais, sabe-se, é a antessala do país. São Paulo Este analista continua apontando o governador tucano, Rodrigo Garcia, como o mais provável vencedor da contenda paulista. Goiás Ronaldo Caiado lidera com folga o pleito em Goiás. Será difícil desbancá-lo. Ciro Gomes Com a missão da mulher - de suavizar sua imagem - Ciro Gomes promete deixar a esfera política, caso, mais uma vez, perca a eleição. Política, sabe-se, é cachaça. E caminha como o vento, fazendo-se e se refazendo. Faria Lima A avenida tornou-se referência de empresários e banqueiros. Tinha pavor de Lula. Hoje, um medinho. Mas Bolsonaro também não é seu candidato dos sonhos. Por isso, a depender dos protagonistas finais, os habitantes da Faria Lima fariam os gestos dos três macaquinhos: não vi, não ouvi, não falei. E apertam a tecla. Os manifestos Se a democracia depender de manifesto, a nossa estará salva. Há uns cinco a seis manifestos na mesa das assinaturas. De qualquer forma, trata-se de anseio da sociedade. Considero-os como manifestações da democracia participativa. Gestão histórica O presidente do Tribunal Superior do Trabalho (TST) e do Conselho Superior da Justiça do Trabalho (CSJT), ministro Emmanoel Pereira, foi outorgado com a medalha, o troféu e o diploma Raymundo Faoro por sua "trajetória valiosa para a história da Justiça em nosso país". Uma trajetória de mais de 20 anos. Palavras do presidente nacional da OAB, Beto Simonetti: "Aqueles que ostentam essa insígnia têm deveres indeléveis para com a cidadania". Lembrou que há mais de um 1,3 milhão de advogados distribuídos em todos os municípios. Abertura O ministro Emmanoel Pereira faz uma gestão histórica, caracterizando-se pelo esforço em buscar maior aproximação com os mais diversos setores da sociedade, nesse momento de debate sobre a pluralidade e a inserção de grupos organizados na textura institucional. A organicidade social Minhas homenagens a setores da sociedade organizada. Os pais Comemora-se, domingo próximo, o Dia dos Pais. A coluna solidariza-se com todos os pais, desejando que mitiguem suas aflições na paz da harmonia familiar. Vivemos tempos de sofrimento, medo, angústia, desemprego, temor pelo dia de amanhã. Haverá, sempre a brilhar, uma estrela no alto. Que mirem em seu brilho e façam da subida da montanha a vontade de superar todos os obstáculos. Escreveu Eliot: "somente aqueles que se arriscam a ir longe, sabem aonde podem chegar". Os famintos A cada dia, lemos estatísticas volumosas sobre a expansão da fome no país. Beiram os 35 milhões os contingentes jogados para os últimos degraus da escada social. Famintos se multiplicam nas ruas das metrópoles. A estética social se apresenta com imensos vazios, onde morrem de inanição os desvalidos. Os moradores de rua Afora os contingentes nomeados pelas estatísticas, há numerosos grupamentos sem identidade. São os moradores de rua, que perambulam de um lado para outro, sem saber se continuarão vivos mais tarde ou amanhã. Que sejam levados à mesa do consumo. Os filhos desgarrados Milhares de jovens retiram-se do aconchego familiar por não conseguirem escapar da força das circunstâncias. Desgarram-se de pais e mães e passam a habitar o espaço das drogas e da criminalidade. O futuro de uma Nação lhes fecha as portas. O Estado não se mostra capaz de puxá-los para a convivência social. Que triste. Os políticos Perdem força, mancham o conceito, passam a ser malvistos pela sociedade. Daí a necessidade de permanente interação com suas bases eleitorais. Cumpram compromissos, façam propostas que podem ser executadas, não façam da política profissão e, sim, exerçam a política dentro do ideário aristotélico, missão a serviço do bem comum. As mulheres Eixo matricial da sociedade. Coluna vertebral do lar. Educadoras, orientadoras, acolhedoras, mães que dedicam o melhor de suas vidas para engrandecimento dos filhos. Os homens devem juntar esforços para que as mulheres ascendam ao mesmo patamar que eles na vida profissional. Basta de violência contra as mulheres. O feminicídio cresceu no país. Um atraso na régua civilizatória. Nenhuma Nação alcança a plenitude dos valores democráticos sem a parceria central da mulher. Os profissionais de imprensa No compromisso em produzir e divulgar matérias de significação social, são, às vezes, incompreendidos, maltratados, desprezados. Exercem uma missão de relevo. Quanto mais a sociedade seja informada, e bem informada, mais sentimento cívico, mais integração ao propósito de construir uma grande pátria. O momento sugere a busca da verdade. Doa a quem doer. Os "teleguiados" Infelizmente, em ciclos de crise, expandem-se as redes de boatos, falsidades, rumores, que contam com alas e núcleos de pessoas "teleguiadas", a serviço da mentira. Urge identificar tais grupamentos e levá-los aos caminhos da Justiça para que a sociedade, como um todo, possa saber os pontos de ruptura na teia da verdade. As classes médias Desempenham um papel central na disseminação das informações e no enchimento do balão da opinião pública. Exercem a função que tem uma pedra jogada no meio da lagoa. Essa pedra forma ondas que vão rolando até as margens. Ou seja, as classes médias jogam suas crenças tanto para o alto, o topo, quanto para a base da pirâmide social. Daí a necessidade de enxergar e interpretar suas demandas e expectativas. Os empresários Cumprem a missão de empreender ações, projetos, programas para a grandeza do país. Em instantes de turbulência social, devem ter o bom senso de priorizar as ações que correspondam aos desejos e motivações da sociedade. Evitando, assim, abrirem o bolso para financiamento de projetos nocivos ao bem-estar coletivo. Os trabalhadores Gigantesca base em que se assenta o edifício social, os trabalhadores são a maior riqueza de uma Nação. A eles deve ser voltada a ação político-parlamentar, sob a crença de que constituem o fermento das massas. E, assim, são os detentores do poder da representação política. Originários de todos os espaços, raças, gêneros e categorias profissionais, os trabalhadores contribuem para elevar o país ao patamar da Nação. Fecho a coluna com Guimarães Rosa. As relações de Rosa Guimarães Rosa, o grande escritor mineiro, prezava o que chamava de 'Relações Exteriores', ou seja, suas relações pessoais com terceiros. O velho Rosa alinhava as normas de sua 'mineirice', dentre as quais Zé Abelha nos brinda com essas: "Combater a expansividade, em todas as suas formas. De uma maneira geral, é preciso guardar silêncio." "Dominar todos os impulsos. Não comunicar notícias, não transmitir novidades." "Never explain, never complain". (Nunca explicar, nunca se queixar) "Não ser afirmativo (dogmático) nem demonstrativo (explicativo)." "Não expressar nunca as nossas impressões, especialmente as que resultam das conversações que ouvimos." "Cada exclamação, cada palavra, cada gesto - conservador - aumentam nossas reservas." "Moderar todos os movimentos expressivos e dar apenas mui ligeiras mostras de emoção, surpresa, alegria, descontentamento."
quarta-feira, 3 de agosto de 2022

Porandubas nº 771

Abro com um filho inepto da Bahia. Velhos tempos. Tempos de deboche e criatividade. O deputado Luís Viana Neto estava na tribuna da Câmara: - Filho e neto de governadores da Bahia... Lá embaixo, o deputado Francisco Studart (MDB-RJ) gritou: - Não apoiado! - Senhor deputado, sou filho e neto de governadores da Bahia. - Perdão, excelência. Entendi mal. Entendi: "Filho inepto de governadores da Bahia"... Risadas gerais no plenário. Secos & molhados Cadê o pique? Percepção geral é a de que os generais do núcleo duro do governo perderam o pique que mostravam no início da gestão. Mais silenciosos, mais precavidos, mais observadores do cenário. Bivar Luciano Bivar é o chefão do partido que detém a maior fatia partidária e o maior tempo de mídia eleitoral: o União Brasil. Bivar deixa de ser candidato à presidência da República para voltar a ser candidato a deputado Federal por Pernambuco. Corre o risco de não se eleger. Coisas da política. O deputado Pazuello O ex-ministro da Saúde Eduardo Pazuello será candidato a deputado Federal pelo Rio de Janeiro. Declara ter patrimônio de R$ 1,288 milhão. Espera-se que tenha boa votação, empurrado pelo bolsonarismo. Desunião Brasil O União Brasil poderá se transformar, no próximo ano, no Desunião Brasil, com tantos interesses repartidos entre seus membros. O manifesto O documento em defesa da Democracia, preparado por docentes da Faculdade de Direito da USP, poderá chegar a 1 milhão de assinaturas. É denso e apartidário. Só não vê quem não quer. Pode ser tudo, menos uma "cartinha", como designou o presidente Bolsonaro. Arquivando O STF tem se mostrado disposto a não aumentar as tensões com o presidente Jair. Tende a arrefecer o ânimo de seus quadros, significando predisposição para arquivar os pedidos de investigação contra ele. Momento sugere distensão, diástole, não sístole. Muito manifesto Vejo multiplicação de manifestos. Advogados, entidades de imprensa, empresários e outros. Isso acaba gerando confusão, um processo de "canibalização" recíproca, uns comendo outros. Não se sabe O QUÊ E PARA QUEM... A chapa de Tebet Simone Tebet terá como vice, em sua chapa, a senadora tucana Mara Gabrilli, um perfil de respeito e impacto. Teve mais de 6,5 milhões de votos. Mara sofreu um acidente de automóvel que a deixou paraplégica, fundou uma ONG e se tornou uma figura emblemática na defesa dos portadores de deficiência. Não se pense que será uma chapa frágil. Ambas, Simone e Mara, mostram-se dispostas a provar que a política é também esfera do gênero feminino. Favas não contadas... A eleição de 2 de outubro não está com as favas contadas, conforme querem fazer crer 95% dos analistas de política. A campanha ganha oficialmente as ruas só agora, após as convenções. Nomes sacramentados, partidos com suas listas formadas, alianças feitas, a arena começa a receber os gladiadores. As pesquisas continuam a mostrar vantagem confortável de Luiz Inácio. Mas Bolsonaro reage um pouco. São Paulo, o epicentro O Estado mais forte da União, com seus 36 milhões de votos, será crucial para o sucesso ou o fracasso dos candidatos à presidência. Essa última pesquisa do Instituto Paraná Pesquisas mostra Bolsonaro com 40,1% e Lula com 36,2%. Na espontânea, Bolsonaro está com 26,9% e Lula com 23,9%. Essa margem, mesmo pequena, é significativa em se tratando do maior bolsão de votos do país. A recompensa Ademais, os impactos dos pacotes assistencialistas ainda não chegaram às margens. O Auxílio Brasil adicionará mais R$ 200. O pacotão de recursos do Orçamento para aplicação nas regiões, atendendo a critérios eleitorais, também fará diferença. Pensar que não se troca mais voto por recompensa é um erro. O toma lá dá cá, mesmo em tempos de voto mais racional, ainda funciona. Bolsa Auxílio pode ser confundido com Bolsa Família, dos tempos lulistas? Pode, mas os candidatos bolsonaristas vão tocar suas trombetas propagandísticas. Até 15 de setembro Os eleitores começam a abrir os ouvidos. O processo de internalização das mensagens - apreensão pelo sistema cognitivo e imersão - irá até meados de setembro. Daqui até lá, a paisagem aberta dará direito a comentários plurais, versões e contra-versões, fatos e fakes, ilações, observações. Atentem, candidatos de todas as esferas do Executivo e do Legislativo: vocês constituem a maior mensagem. O que dirão, o que fazem e farão, como pensam, a estética de apresentação, todos esses componentes influenciarão no processo decisório. O eleitor fará uma filtragem de tudo que capta. Simpatia e antipatia Dois fenômenos se instalarão, se não já se instalaram, no sistema cognitivo do eleitor. Refiro-me ao comportamento do eleitor quanto aos candidatos ao Legislativo na esfera estadual, porque em relação ao Executivo (nas esferas Federal ou mesmo estadual), uma posição prévia já foi tomada. Mas não há ainda um posicionamento definitivo quanto aos candidatos a deputado Federal ou estadual. Há certa simpatia ou alguma dose de antipatia em relação aos candidatos à presidência e governos de Estado. Simpatia, uma predisposição positiva, a antipatia, uma predisposição negativa. Empatia Mas a decisão se dá mesmo junto àqueles eleitores que se ligam empaticamente ao candidato. Empatia é a capacidade de um interlocutor - candidato - de amarrar o interesse, a boa vontade, o compromisso do eleitor, que enxerga nele o perfil mais completo na galeria dos candidatos. O eleitor ouve mensagens que aprecia e aplaude. Projeta suas demandas nos programas do candidato, de forma que se liga umbilicalmente ao candidato, considerado alguém próximo, quase um familiar. Primórdios "Rastreie, vá ao encalço de homens de toda e qualquer região, passe a conhecê-los, cultive e fortaleça a amizade, cuide para que em suas respectivas localidades eles cabalem votos para você e defendam sua causa como se fossem eles os candidatos". (Quinto Túlio Cícero aconselhando o irmão Marco Cícero, o grande tribuno, em 64. A. C., quando este fazia campanha para o Consulado de Roma) Marketing segmentado O marketing eleitoral abriga duas vertentes: o marketing massivo, voltado para atingir classes sociais e categorias profissionais, indistintamente; e o marketing vertical, segmentado ou diferenciado, voltado para atender agrupamentos especializados: profissionais liberais, donas de casa, formadores de opinião, núcleos religiosos, militares, funcionários públicos, etc. Nas campanhas, o marketing segmentado acaba assumindo tanta importância quanto o marketing massivo. E a razão está na intensa organicidade da sociedade brasileira. Na campanha deste ano, o marketing segmentado atingirá os mais altos graus de seu conceito. Rodrigo Garcia Fernando Haddad (PT), candidato de Lula, e Tarcísio de Freitas (Republicanos), candidato de Bolsonaro, lideram a campanha de São Paulo. Quem está encostando em Tarcísio é Rodrigo Garcia, o atual governador do PSDB, que, pelo domínio da máquina administrativa, ameaça entrar no 2º turno com o candidato do PT. E aí ficará mais difícil para Haddad. Os 5 ciclos É oportuno se lembrar dos cinco ciclos de uma campanha: lançamento, por ocasião da Convenção; crescimento, entre quatro e cinco semanas após a Convenção; maturidade/consolidação, quando a campanha se firma no sistema cognitivo do eleitor, após ampla visibilidade; clímax, momento em que o candidato alcança seu maior índice de intenção de votos; e declínio, quando o candidato tende a cair nas pesquisas de opinião. Todo esforço se faz necessário para o clímax ocorrer na semana das eleições. A dosagem dos ciclos há de acompanhar o funil da comunicação; joga-se mais força (volume de comunicação/visibilidade) na segunda quinzena de setembro. Candidato que começa a descer da escada antes do tempo, corre o perigo de morrer antes de chegar à praia. O povo O povo não é uma ficção. Eis ali o povão correndo para pegar o ônibus das 5, aboletando-se nos trens da periferia, aplaudindo e xingando nos estádios, grudado defronte às vitrines para pegar os lances do futebol, lambendo os beiços com os churrascos gregos das calçadas ou voltando, com o sol poente, dos campos e das roças para a cansada solidão de suas casas. O povo é a realidade dos mais de 30 milhões de brasileiros que se encontram à margem do processo de consumo, dando duro, levantando prédios, construindo máquinas, moldando a anatomia do país. A crise desse povo é a falta de comida, de emprego, de hospitais, de segurança, de casas, de lazer. A força moral A força moral é a arma mais poderosa da campanha eleitoral deste ano. Será o maior contraponto ao estado de degradação que corrói parcela razoável de nossos quadros políticos. Trata-se de uma força que funcionará como imã, puxando a atenção e a adesão dos eleitores. Os candidatos se esforçarão em dizer que a possuem. Ocorre que a força moral não é um conceito sobre o qual se possa cantar loas. Quem a carrega, não precisa discorrer sobre ela. Será reconhecido por isso. Gandhi, pobre e despojado, era um ícone de força moral. Arrastou multidões. Como a simplicidade, a força moral é a virtude dos sábios e a sabedoria dos santos.
quarta-feira, 27 de julho de 2022

Porandubas nº 770

Abro a coluna com uma historinha, aqui já contada. A pedidos, volto com ela. "O carro se atolou-se" Walfredo Paulino de Siqueira, típico coronel da política pernambucana, foi escrivão de polícia, comerciante, deputado, industrial, presidente da Assembleia, vice-governador de PE. Figura folclórica, como lembra Ivanildo Sampaio, ex-diretor de redação do Jornal do Commercio, de Recife, meu contemporâneo na faculdade. Um dia, dois eleitores discutiam sobre o uso da partícula "se". O exemplo era com um automóvel que ficara preso em meio a um atoleiro. O primeiro afirmava que a forma correta de se expressar era essa: "o carro atolou-se"; o outro insistia que não; o correto era "o carro se atolou". Consultado, Walfredo deu a sentença salomônica: - Escutem aqui, meus amigos. Se os pneus que ficaram presos foram os dois da frente, o correto é dizer que "o carro se atolou". Se foram os pneus traseiros, a gente fala assim: "o carro atolou-se". Mas, se ficarem presos os quatro pneus, os de frente e os de trás, então, meus filhos, a forma correta mesmo é: "o carro se atolou-se"... Santana Ontem, 26 de julho, os luisgomenses festejaram Senhora Santana, a padroeira de minha cidade, Luis Gomes, no Extremo-Oeste do Rio Grande do Norte, fronteira com Paraíba e Ceará. Viva! Cuidado com Narciso Eis o que ocorreu com Narciso. Os deuses condenaram Narciso a se apaixonar pela própria imagem. Ele tomou-se de amores pela imagem quando se contemplava nas águas límpidas de uma fonte. A partir daí, obcecado pela paixão por aquele reflexo, Narciso nunca mais conseguiu arrancar-se àquela contemplação e se afastar da beira da água. Ali definhou até morrer. Há candidatos fascinados pela própria imagem. Não sentem o que se passam. Não veem a paisagem. Não ouvem nem barulhos fortes, menos ainda sussurros. Correm o risco de definhamento lento e gradual. Michelle, um trunfo Dona Michelle Bolsonaro, primeira-dama do país, de 40 anos, é um trunfo no jogo de cartas das eleições. Dizia-se que não iria participar da campanha. Hoje, está na linha de frente. Mostrou que tem certo carisma, fez um discurso-oração-declaração de amor ao marido presidente, circulou pelo palco da Convenção do PL, sob o anúncio messiânico que o Jair Messias é o Enviado. Os evangélicos e adjacentes devem engrossar a crença nos próximos tempos. Em suma, a adesão da pastora Michelle à campanha de palanque fecha a locução com o objetivo de realçar a faceta "divina" do humano candidato. Haja dinheiro O governo pede aos seus bancos e à Petrobrás que mandem os dividendos a que tem direito. Coisa de uns R$ 7 bilhões. Essa grana vai se somar aos recursos para viabilizar o Auxílio Brasil e outros programas. Este analista nunca viu tanto esforço para se jogar recurso numa campanha eleitoral. A cooptação atende ao primeiro instinto do ser humano, segundo Pavlov, o impulso combativo, a luta pela sobrevivência. Impulso que dispara o segundo, o nutritivo. Garanta a barriga. O ataque ao STF Ao atacar, mais uma vez, o Judiciário em seu discurso na Convenção do PL, chamando seus ministros de "surdos de capa preta", Bolsonaro, mais uma vez, dá mostras que não ouve a voz do bom senso. Pois nesse momento, a razão mostra a necessidade de candidatos se apresentarem como pessoas moderadas, equilibradas, respeitosas. Ainda mais quando o candidato postula a reeleição ao cargo maior do país. O que estaria por trás dessa expressão destrambelhada? Estratégia. Quanto pior, melhor O capitão Jair põe fé na confusão, tensão, querelas, brigas entre alas, se possível, com repercussão. Ora, ele vem conseguindo há bom tempo ditar a pauta das mídias. Todos os dias, lá está ele com as suas palavras, termos fortes, alguns beirando as margens do dicionário chulo. Desse modo, anima as bases, supre os compartimentos emocionais de seus simpatizantes, pondo mais lenha na fogueira do antilulismo. Vejam bem: se Lula for ao 2º turno, não será um passeio a sua vitória, como alguns profetizam. O PT não conseguirá, da noite para o dia, limpar os borrões que sujam sua imagem. Getúlio Vargas Locuções de Getúlio Vargas: - A metade dos meus homens de governo não é capaz de nada e a outra metade é capaz de tudo. - Quase sempre é fácil encontrar a verdade. Difícil e, uma vez encontrada, não fugir dela. - Eu sempre desconfiei muito daqueles que nunca me pediram nada. Geralmente os que se sentam à mesa sem apetite são os que mais comem. - Os políticos olham muito o passado, se esquecem do presente e, principalmente, do futuro. Mas é perigoso este cacoete, pois quem muito olha para trás acaba torcendo o pescoço. MDB dividido? O MDB é uma confederação de partidos. Agora mesmo, uma ala entra na Justiça para adiar sua Convenção. O evento está marcado para hoje, quarta. A ala questionadora apoia-se no argumento de que a Convenção deve ser presencial, não virtual. Alega, ainda, que estaria comprometido o sigilo do voto usando-se a rede virtual. Baleia Rossi responde, dizendo que os estatutos permitem tal forma. Quem entrou com o recurso foi o presidente do MDB, prefeito de Cacimbinhas, Alagoas, do grupo liderado pelo senador Renan Calheiros. Hoje, segundo Simone, a Convenção virtual consagrará seu nome. Vamos ver. Em política, não há certezas. Simone A candidata Simone Tebet, senadora do MS, é quem mais tem crescido nas pesquisas. Na última pesquisa do IPESPE, ela pontou 4%. Na anterior, 2%. Aumentou, portanto, 100%. Uma questão de releitura das pesquisas (sem risos...). Já vi candidatos, com 2% em junho/julho, ganharem eleições majoritárias em Estados. Segunda-feira, Simone exibiu boa performance em entrevista concedida ao time da Globo News. Respondeu a todas as questões. Demonstrou conhecimento e fluidez de ideias. O novo manifesto Agosto vem aí. E com ele, a lembrança do professor Goffredo da Silva Telles. Que leu sua Carta aos Brasileiros em 8 de agosto de 1977, às 20h00, no Largo de São Francisco, repleto de estudantes, gente do povo e personalidades. No próximo 11 de agosto, o ex-ministro do STF, Celso de Mello, lerá um Manifesto em Defesa da Democracia no mesmo Largo. Assinado por mais de 3 mil pessoas. Goffredo Este analista era amigo do professor Goffredo. Tive a honra de receber dele pequenas mensagens, em cartões, com sua letra miúda, parecendo um desenho. Fazia referências a meus artigos em O Estado de São Paulo, onde escrevi por mais de duas décadas na segunda página. Certa feita, ao visitá-lo em seu amplo apartamento na avenida São Luiz, fez questão de oferecer-me seus livros. E, em um deles, Palavras do Amigo aos Estudantes de Direito, fez pequenas correções de letras e acentos e frases truncadas. Enorme deferência. Foi uma longa conversa sobre o país, recheada da sabedoria do mestre. Quão grande era esse Brasileiro. Theotônio Também apreciava meus artigos o afamado civilista e processualista civil, professor Theotônio Negrão, com quem fiz amizade por intermédio de uma amiga que o auxiliava, a advogada Maria Augusta. Visitei-o, ele já com dificuldade de locomoção, e, com sua simplicidade e lucidez, me transmitiu sábias palavras. Que tempos.....! Homenagens Presto minhas homenagens a esses dois grandes vultos do Direito nas pessoas dos amigos advogados, Antônio Claudio Mariz de Oliveira, Luiz Flávio Borges D'Urso, Carlos Miguel Aidar, Marcos da Costa, Marcelo Martins de Oliveira, Vitorino Francisco Antunes Neto, Eurico Leite, Fernando Fernandes e José Paulo Cavalcanti, entre outros. Pessoa - "Não sei quem sou, que alma tenho" (Consciência de plenitude - Fernando Pessoa) - "Não sabemos da alma Senão da nossa; A dos outros são olhares São gestos, são palavras" (Sem Título, 1934 - Fernando Pessoa In José Paulo Cavalcanti Filho, Fernando Pessoa, O livro das Citações) Espetáculo e política " ..os mundos do espetáculo e da política vão se entrosando cada vez mais. Como se, expostos às mesmas sujeições e igualmente forçados a seduzir o público, os performers do cinema e da política se compreendessem às mil maravilhas". ...A política é um exercício da sedução e quase um prolongamento da Arte de Amar, de Ovídio. Para ele, governar é mais seduzir que convencer. Valendo-se de todos os recursos do charme....chegando às raias donjaunismo..." In Roger-Gérard Schwartzenberg, O Estado Espetáculo. Fecho com a "A casa do cacete" No primeiro mandato de Garibaldi Filho, como governador, deu-se a largada dos projetos de recursos hídricos, com as adutoras que se tornaram marca registrada do seu governo. Em Pau dos Ferros, na inauguração oficial, Garibaldi foi cobrado de público pelo abastecimento d'água da cidade. Sem se afobar, como é do seu hábito, o governador pegou carona na cobrança popular com indisfarçável irritação: "Vou botar água em Pau dos Ferros nem que a água venha da casa...". Aí parou. Sentindo que não podia ir além, repetiu a frase: "Já autorizei Rômulo Macêdo a elaborar o projeto e vou botar água em Pau dos Ferros nem que a água venha da casa do...". Parou de novo. Populares de raciocínio apressado completaram: "Da casa do cacete...". O orador foi sutil e perspicaz: "Eu não queria dizer essa palavra...". Risos gerais. "Gari" guardara a postura e conseguiu o resultado. (História contada pelo espirituoso escritor Valério Mesquita).
quarta-feira, 20 de julho de 2022

Porandubas nº 769

Abro a coluna com uma deliciosa historinha da Paraíba. 'O POVO TAMBÉM ME CONHECE, ZÉ' Zé de Dora era um barbeiro da cidade de Santa Rita, no interior da Paraíba.  Quando comprou seu primeiro carro, resolveu ir a João Pessoa dar um passeio. Chegando lá, não tendo conhecimento de semáforos, saiu cortando tudo que era sinal - verde, amarelo e vermelho.  Ao ultrapassar os sinais vermelhos, os outros motoristas gritavam - "BARBEIRO". "BARBEIRO". Quanto mais chamavam o Zé de "Barbeiro",  mais ele ficava orgulhoso. E acenava, agradecido. Ao retornar a Santa Rita, sua mulher perguntou:  - E aí, Zé, como foi na capital?  Zé, orgulhoso, respondeu:  - Maria eu nem te conto! Tu sabe que em João Pessoa sou mais conhecido do que aqui em Santa Rita?  - Que é isso Zé, deixa de conversa.  - Pois então vamos juntos para eu te mostrar.  Saíram Zé de Dora e a mulher para passear em João Pessoa. Lá chegando, Zé foi cruzando os semáforos, um aqui, outro ali, sem se preocupar se estavam verdes, amarelos ou vermelhos. Ao cruzar o primeiro semáforo vermelho, um motorista que quase bateu o carro no do Zé, gritou:  - "CORNO". "Seu CORNO". Maria, nervosa, logo abriu a boca:  - ZÉ, vamos voltar logo pra Santa Rita, Zé, pois aqui o povo também me conhece.    Panorama 1. Campanha nas ruas A campanha eleitoral ganha foro oficial com as convenções partidárias, que se iniciam esta semana. A convenção do PDT, de Ciro Gomes, será a primeira, hoje, quarta. A do PT será realizada amanhã e a de Bolsonaro, no domingo. Mas a campanha já está nas ruas. Lula e Alckmin, correndo de um lado para outro, com foco na articulação política; Bolsonaro, juntando multidões em suas motociatas e Ciro, fazendo palestras e Simone, pequenas reuniões. 2. Quem junta mais? As dúvidas se entrelaçam no corredor das versões: quem junta mais gente? Este analista recebe vídeos das duas principais campanhas, a de Lula e a de Bolsonaro. Sem querer questionar a edição dos vídeos, coisa para as alas envolvidas, vê-se claramente que as motociatas de Bolsonaro e sua chegada aos ambientes exibem maior número de pessoas. Lula, ao que parece, tem evitado mobilização de rua. Com a campanha oficializada, são previsíveis multidões aqui e ali.  3. Nordeste A região nordestina tem sido o alvo dos dois candidatos. Ambos passaram por lá nos últimos dias. E as pesquisas começam a mostrar crescimento de Bolsonaro no Nordeste, não a ponto de superar os índices de Lula, mas diminuindo a distância. Depois do Sudeste, que soma mais de 50% dos votos, o Nordeste será palco de grandes batalhas. Lula ainda exibe o mérito de ser o pai do Bolsa Família. Bolsonaro, com muito esforço, ainda não conseguiu disseminar a ideia de ser o pai do Auxílio Brasil. 4. Combustíveis Dos 27 Estados, 14 e o DF anunciam redução da alíquota do ICMS sobre o etanol. Em São Paulo, a cobrança do imposto caiu de 13,3% para 9,57%. O etanol deve ter preço competitivo em relação a outros combustíveis, de acordo com a PEC dos Benefícios, que incorporou a PEC dos combustíveis. Se o consumidor acusar as reduções no etanol, na gasolina e no diesel, Bolsonaro faturará o preço menor. Seu grande desafio é comunicar tudo isso a menos de três meses das eleições. 5. O Judiciário como alvo O Poder Judiciário continuará sob a mira do capitão-atirador. Os ministros Alexandre de Moraes, Edson Fachin e Luis Barroso serão intensamente alvejados. Moraes continua duro, mandando bolsonaristas retirarem fakes das redes sociais. Fachin recusou participar da reunião com embaixadores. As tensões chegarão ao pico da montanha. Bolsonaro quer arrumar um pretexto para o dia seguinte ao anúncio do vitorioso do pleito. Se for ele, poderá alegar que teve mais votos do que os anunciados. Se for o derrotado, SDS.... Só Deus Sabe... 6. Reunião com embaixadores  A conversa que o presidente teve com embaixadores, na segunda feira, foi um ato de extrema gravidade. O presidente da República e Chefe de Estado anuncia ao mundo, de forma oficial, que as eleições brasileiras serão fraudadas. E o anúncio se dá na residência do Presidente. Um prédio do poder público usado como quartel general de campanha.  Provas? Não há. Apenas suspeitas e extenso blábláblá. Os "argumentos técnicos" das Forças Armadas, reunidos pelo Ministério da Defesa, são um castelo de areia. Os embaixadores saíram confusos. A reunião contou com a presença do general Augusto Heleno, do Advogado Geral da União, Bruno Bianco, do presidente do STM, Luis Carlos Gomes Mattos, Carlos França (ministro das Relações Exteriores), Paulo Sérgio Nogueira (ministro da Defesa), Ciro Nogueira (ministro da Casa Civil) e general Luiz Eduardo Ramos (Secretaria-Geral), entre outros. Embaixadores foram alertados por seus países a não endossar a tese do presidente. Mas a interrogação fica no ar. 7. Hackers O presidente insinua que os hackers vão invadir o sistema. O que, de certa forma, é um convite para que eles comecem a furar o bloqueio. A contaminação do processo se espalha como vírus no sangue. Fake news ganham status oficial. 8. Paisagem paulista A paisagem eleitoral do maior colégio eleitoral do país sinaliza um segundo turno entre Fernando Haddad e Rodrigo Garcia, PT versus PSDB. Tarcísio de Freitas, o candidato de Bolsonaro, já ganhou a marca de "um estrangeiro" no Estado. Inscreveu-se como morador de São José dos Campos. Mas o ex-ministro da Infraestrutura (Republicanos) não mora no endereço que declarou como seu domicílio no estado de São Paulo. Será difícil chegar ao 2º turno. Rodrigo tem mais chances. E expressa mais modernidade que Fernando Haddad. De Haddad, Delfim Netto já dizia: é o único marxista do PT. 9. Projeto de 4 décadas? O abre-alas do discurso eleitoral anuncia: se o PT ganhar as eleições presidenciais e o governo do Estado de São Paulo, as próximas décadas estarão sob o jugo autoritário. O PT aprendeu com seus erros. Colocou Dilma no despenhadeiro. Agora, sabe como dominar, cooptar, dividir para somar. Se Lula ganhar lá e Haddad, aqui, o lulismo criará as bases para uma hegemonia nunca vista no país. Junta-se a fome com a vontade de comer. Tal previsão está sendo "parafusada" pelos "engenheiros" da máquina petista.  10. MDB com Lula O MDB é mesmo uma confederação de partidos. Mesmo tendo Simone Tebet como candidata do partido, 11 diretórios estaduais decidiram fechar posição em torno de Lula. 11. O líder informal Conta Roger-Gérard Schwartzenberg, em O Estado Espetáculo, que o rei Luis Felipe suprimiu o cerimonial solene nas Tulherias, passeava por Paris com seu chapéu cinzento, e parava para conversar com os operários de uma construção. Que Pierre Trudeau, pai do atual primeiro-ministro do Canadá, Justine Trudeau, abandonando a liturgia oficial, escorregou pelo corrimão de uma escada, envergava uma camisa Lacoste, paletó esporte e usava sandálias. Que Giscard d'Estaing, presidente da França, vestia uma camisa quadriculada e tocava acordeão nas ruas de Paris, semanas depois de ter jogado como centro-avante num time francês. 12. A dissimulação Em Paradoxo do Comediante, Diderot descreveu: "o que faz os autores medíocres é a extrema sensibilidade...e é a ausência absoluta de sensibilidade que prepara os atores sublimes. As lágrimas do comediante escorrem de seu cérebro; as do homem sensível descem do seu coração. Dir-se-á - o orador é sempre melhor quando se inflama, quando irritado. Nada disso. É quando ele finge estar encolerizado. Os comediantes impressionam o público, não quando estão furiosos e sim quando representam bem o furor'. 13. Buraco negro 'Polícia dos buracos negros' descobre primeiro buraco negro estelar 'adormecido' fora da Via Láctea. Esse fenômeno é bastante difícil de ser detectado. "Conseguimos identificar uma agulha num palheiro". afirmou um astrônomo do projeto. Ciência avança sob os olhos de bárbaros que ainda povoam o planeta. 14. Mais de 200 Há mais de 200 pré-candidatos aos governos de Estado. Campanha mais participativas das últimas décadas. 15. Marketing segmentado Este consultor tem chamado a atenção dos perfis que se postam na arena eleitoral. Ante o alto grau de organicidade social, a campanha deste ano será a de maior apelo aos grupos organizados da comunidade política. Movimentos, alas, setores, organizações de todas as modelagens - sindicatos, associações, federações, etc-, sinalizam para um marketing segmentado. Ou seja, o discurso com maior eficácia é aquele que se direciona aos grupos organizados, cujas demandas devem receber respostas e compromissos por parte de candidatos. 16. Pasteurização Após as eleições, a paisagem política deverá ganhar novo ordenamento. O país fechará a era da pasteurização partidária para abrir, em seu lugar, o ciclo de conteúdos claros e doutrinas com substância programática. 17. Imagem do PT O Partido dos Trabalhadores, seja qual for o resultado das eleições, deverá se submeter a um processo intenso de limpeza de imagem. As velhas mancham - Nós e Eles - ainda deixam milhares de eleitores com receio de ficar sob seu cobertor. Persiste o estigma de partido autoritário. Que deixou manchas fortes no tecido democrático. 18. Alckmin Geraldo Alckmin, em caso de eventual vitória do petismo, deverá ser o porteiro com a missão de abrir portas no meio do arco ideológico. 19. O modelo Palocci Diz-se que Lula gostaria, caso ganhe as eleições, de ressuscitar o modelo Palocci, ou seja, colocar um político na economia. Com a finalidade de pacificar a área política. Ora, os efeitos daquela modelagem ainda hoje causam arrepios. 20. Covid-19 A pandemia continua com seus números macabros. Média alta de casos, mortes na faixa de 300 pessoas, diariamente. A pandemia chegou para ficar. Não irá embora de repente. Nossa cultura gera impermeabilização de sentimentos. A morte banalizada.    Fecho com Fernando Pessoa Se sou alegre ou sou triste? Francamente, não o sei A tristeza em que consiste? Da alegria o que farei? ( Sem título- 20-08-1930) Fernando Pessoa In Jose Paulo Cavalcanti Filho - Fernando Pessoa - o livro das citações. Ed. Record, 2013. RJ/SP
quarta-feira, 13 de julho de 2022

Porandubas nº 768

Abro a coluna com o folclore político de Minas Gerais e fecho com uma historinha do Piauí, onde, em 1986, coordenei a campanha de um candidato ao governo do Estado. Proibindo eclipses O coronel Zé Azul, chefe político de São Gonçalo do Abaeté, em Minas, era candidato a prefeito pela UDN. O calendário marcava: vésperas de um eclipse do sol que a imprensa vinha prevendo para começo do ano seguinte, como o mais forte já visto no Brasil. O medo generalizou-se. Espraiavam-se relatos de crianças que iam nascer defeituosas, galinhas que deixariam de pôr ovos, cabritos que não mais berrariam e a cachaça que ficaria envenenada. No dia 1º de outubro, o coronel Zé Azul fez o último comício da campanha e acabou com um juramento sagrado: - Pode ser que, na prefeitura, a partir de janeiro, eu não consiga fazer tudo que pretendo por esta terra. Mas juro para vocês que meu primeiro decreto será proibir definitivamente eclipses em São Gonçalo do Abaeté. Ganhou a campanha. No Brasil, candidatos ainda continuam com coisas desse gênero. Panorama O estuprador Um crime que desafia os compêndios da criminalidade. Um médico, um profissional que jura defender a honra, a ética e a moral, comete um ato de barbárie contra uma parturiente. O anestesista exagerava nas doses de sedação. E foi flagrado em uma cena horripilante. Pena de 15 anos de prisão? É pouco, muito pouco, se for essa a condenação. Bilhões de sóis e estrelas O terrível acontecimento no Paraná ocorre no momento em que a sociedade mundial contempla, embasbacada, a visão de outras galáxias, captada pelo telescópio James Webb, da Nasa, o mais poderoso que já se construiu. Bilhões de sóis e estrelas esperam ser descobertos. Um longo passeio por outros espaços será iniciado. O futuro começa a se mostrar sob a sombra gigantesca da barbaridade que assola nosso planeta. A tensão aumenta A polarização ganha volume com o impulso expressivo do presidente Jair. Para quem o duelo das ruas, os tiros e emboscadas farão bem à campanha eleitoral que já está nas ruas. O assassinato de um policial no Paraná é o primeiro ato de uma peça que se estenderá para além de 2 de outubro. O dirigente do PT, apoiador de Lula, morto por um bolsonarista, é o chamariz para uma luta que tende a incendiar o país, se não for contida a tempo. O bolsonarismo pegou Não se enganem, leitores (as). A semente da árvore bolsonarista foi plantada e começa a vicejar. Vai se espalhar por aqui e ali, sob o empuxo de grupos radicais que destilarão ódio e violência. Jair Bolsonaro pode, até, perder as eleições, mas seu pensamento vingará. A extrema direita, que se mantinha calada nas últimas décadas, encontrou um ícone, ou como chama, "o mito". As bancadas das extremidades do arco ideológico engrossarão o caldo na próxima legislatura. A conferir. Nome ainda indefinido Este analista diverge da maioria dos intérpretes da política, que apostam na eleição de Lula, no primeiro ou no segundo turno. A campanha não está decidida. Temos o restante de julho, e dois meses fatais - agosto e setembro. As águas tumultuadas de 7 de setembro podem servir de pretexto para arrombamento de barragens. Lula e o PT ainda não diminuíram seus altos índices de rejeição. A cooptação Bolsonaro também tem alta rejeição. Com desaprovação maior que aprovação. Mas detém o poder da caneta. O Auxílio Brasil será aumentado com mais R$ 200. E cerca de mais dois milhões de pessoas deverão ser incorporados ao programa. A cooptação será intensa. A vantagem de Lula tem diminuído. Algumas pesquisas mostram uma vantagem de menos de 10 pontos. O ar está muito embaçado. Horizontes turvos. Triângulo das Bermudas Minha hipótese é de que o vencedor no Triângulo das Bermudas será o comedor das batatas. Sentará na cadeira presidencial. O Triângulo é formado por São Paulo, com cerca de 35 milhões de eleitores; Minas Gerais, cerca de 16 milhões e Rio de Janeiro, cerca de 13 milhões. O total do eleitorado é de aproximadamente de 150.000.000 dos quais 79.224.596 são mulheres e outros 78.444.900 são homens. O Nordeste A região tem cerca de 40 milhões de eleitores, assim distribuídos: Alagoas: 2.121.081; Bahia: 10.531.439; Ceará: 6.325.143; Maranhão: 4.583.402; Paraíba: 2.887.698; Pernambuco: 6.515.670; Piauí: 2.388.725; Rio Grande do Norte: 2.401.415; Sergipe: 1.528.448. Luis Inácio detém, hoje, maioria na região. Mas uma incógnita está no ar: como se comportará a base da pirâmide com o Auxílio Brasil? Ao que se sabe, o eleitor das margens carentes ainda atribui a Lula o patrocínio e o mérito do assistencialismo. Centro-Oeste/Norte/Sul São as regiões onde Bolsonaro poderá obter vantagem. Hoje. O mundo revirado A guerra entre Ucrânia x Rússia está aprofundando um novo eixo geopolítico. Rússia + China x Oeste da Europa + EUA. O mundo dá voltas. O clima de tensão e de desconfiança tende a permanecer. E os conflitos, a ganharem intensidade. Uma nova ordem mundial se apresenta. Vai e volta O ex-governador e ex-senador José Roberto Arruda está dando a volta por cima. Deve ressurgir no pleito deste ano. A política é também a arte da ressurreição. O IMREA Por trás dessa sigla está um empreendimento dos mais importantes para a vida nacional: O Instituto de Medicina Física e Reabilitação do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo - IMREA HC FMUSP. Trata-se de uma entidade do governo do Estado, que objetiva servir às pessoas com deficiência física, transitória ou definitiva, necessitadas de receber atendimento de reabilitação, desenvolvendo seu potencial físico, psicológico, social, profissional e educacional. Centro e referência em reabilitação. Nasceu em 1975. Linamara Em 2009, ganhou o status de hoje. conhecido por integrar a Rede Lucy Montoro de Reabilitação. Conta com 11 unidades em funcionamento. Comandado pela experiência e visão empreendedora da professora Linamara Rizzo Battistella. Linamara, para termos melhor ideia de seu conceito, é membro efetivo da National Academy of Medicine dos EUA. Este analista conhece a Instituição e constata a abnegação e o zelo de seus profissionais. Fecho com a historinha do Piauí. Que espetáculo de comício 1986. Comício de encerramento da campanha de Freitas Neto (PFL) ao governo do Piauí. Os carros de som anunciavam, desde cedo, o monumental comício de fechamento da campanha. Um espetáculo com showmício da grande cantora Elba Ramalho na praça do Marquês. Na época, as carretas com imensos aparelhos de som saíram do Rio de Janeiro, dez dias antes da data. Mas as fortes chuvas na região atrapalharam o transporte. A lama nas estradas atrasou a chegada. O som chegou quase em cima da hora do comício. Coordenador da campanha do candidato, cheguei ao local um pouco antes para ver o ambiente. O toró... Os técnicos se esforçavam para instalar os aparelhos e arrumar os grossos cabos. 18 horas. Um toró (como se diz no Nordeste) começa a cair. A chuva torrencial começou a fazer a festa. Praça lotada. Três mil piauienses pulavam entusiasmados sob a água que caía. As garrafas de cachaça corriam de mão a mão. De repente, um estrondo, seguido de outros. Fogo e fumaça nos cabos. Corre corre dos técnicos e o aviso: "Acabou o som. Não há condição". Não havia aquele tipo de cabo. Elba Ramalho foi logo avisando: - Está aqui meu contrato. Sem som, não canto. Conversa daqui, conversa dali, aflição por todos os lados. Depois de muita insistência, ela admite: - Cantarei uma música, só, e me arranjem um acompanhamento. Encontraram um cara com um banjo. O povão urrava: - Elba, Elba, Elba, cadê a Elba ? Bate, bate, bate, coração... A cantora saiu de trás. A multidão explodiu. E lá vem a música: - Bate, bate, bate, coração! Nem bem terminou a estrofe, Elba parou. Presenciei, ali, uma das maiores aflições de minha vida, um esculacho na multidão: - Seus imbecis, seus loucos, covardes, miseráveis. Como podem fazer uma coisa dessas? O que era aquilo? Por que aquele carão? Olhei para o meio da multidão. E vi a cena: um sujeito abrindo a boca de um jumento, enquanto outro despejava nela uma garrafa de cachaça. Foi o toque que faltava para o anticlímax. Quanto mais Elba xingava a multidão, mais apupos, mais vaias. No dia seguinte, Teresina respirava um ar de gozação. O showmício de Freitas Neto foi um desastre. Senti o ar pesado. Pesquisas nos davam 3% de maioria sobre Alberto Silva, candidato do PMDB. Perdemos a campanha por 1%. O desastre virou o clima. Quando faço palestras sobre Marketing Político, costumam me perguntar: - Professor, qual é o fator imponderável em campanha eleitoral? Respondo: - Um jumento bêbado no Piauí.
quarta-feira, 6 de julho de 2022

Porandubas nº 767

A historinha engraçada de hoje está no final da coluna. Assim, forço um pouco amigas e amigos a passarem uma vista d'olhos nas notas. Rsrs Pleito está decidido? A maioria dos analistas políticos dá o pleito eleitoral de 2 de outubro como decidido. Ou Lula ou Bolsonaro. Ouso por uma pimentinha nesse caldo e dizer: se a política fosse regida só pela lógica, sim, o resultado seria contemplar um dos dois perfis com maiores índices de intenção de voto. Ocorre que política também é emoção. E com emoção, as coisas podem se tornar imprevisíveis. O Imponderável costuma nos visitar. Equação eleitoral Fatos + Barriga (cheia ou vazia) e outras Demandas Sociais + Circunstâncias +  Imponderável = Um elefante bem desenhado e/ou um elefante com a tromba no rabo. Quem estaria no jogo? Luiz Inácio, Jair Bolsonaro, Ciro Gomes e... Simone Tebet. Mesmo patinando na casa entre 1% a 3%, Simone não estaria fora do jogo. Teria, claro, desafios maiores a vencer. Trata-se do perfil que ganha grande visibilidade, mesmo com sua pequena margem de intenção de voto. Vê-se certa simpatia da mídia em relação a ela. O primeiro grande desafio é o da visibilidade. Precisa ser conhecida nos grandes, médios, pequenos centros de agregação de votos, e nos cafundós onde Judas perdeu as botas. As botas de Judas Se candidatos (as) passarem a ser bem identificados (as) nos cafundós de Judas, a probabilidade de ganhar um voto é de 50%, enquanto os (as) desconhecidos (as) se aproximam de zero. Rejeição Pesquisa deve ser lida como um instantâneo do momento. E o instantâneo flagra a paisagem ali adiante. Mas por trás da paisagem ou ao seu lado, há alguns elementos nem sempre observados pelos analistas de pesquisas. Refiro-me à rejeição, que mostra o desacordo do eleitor: não voto de jeito nenhum nessa pessoa. Esse fator é decisivo em um eventual segundo turno. Bolsonaro e Lula exibem altos índices de rejeição, beirando os 50%, na média. Equação da rejeição Rejeição = Desprezo + objeção ao nome + Distanciamento + Vingança + Passaporte de volta para casa. Percepção O eleitor precisa perceber a existência de Simone Tebet. Perceber é mais que saber seu nome, identificá-la pelas feições. Perceber é receber informações sobre ela e, a seguir, internalizar tais inputs. Internalizar é introduzir no sistema cognitivo um acervo de informações, imagens e conceitos sobre a pessoa, de modo que o eleitor possa aduzir: é com essa que vou às urnas. Se o eleitor considera que se trata da candidata a atender seus reclames e necessidades cotidianas, pode mudar de posição e inclinar-se em sua direção. A luz no fim do túnel é enxergada e passa a iluminar o corredor escuro. Mais que gênero Mulher, Simone Tebet canaliza a organicidade do gênero feminino, a ponto de poder fazer disso um armamento de competição. Mas deve evitar que seja conhecida como candidata das mulheres. Porque, assim o fazendo, criaria uma dualidade - candidato dos homens e candidata das mulheres. Candidatos e candidatas disputam o voto de todos, não apenas de gêneros, grupos, alas, categorias profissionais. Se as mulheres se sentem poderosas com a candidatura da Simone, ótimo. É um plus, um algo a mais. Mas não deve ser esse o único trampolim. Equação do gênero Decisão de votar = Identificação de propósitos (discurso) + Simpatia + Empatia + Proximidade + O fato de ser mulher (identificação de gênero -plus). Tasso, boa imagem Se incluir o senador tucano Tasso Jereissati na chapa como vice, Simone Tebet terá mais um fator de indiscutível peso. Tasso soma. Foi um bom governador do Ceará por dois mandatos, considerado reserva moral e política do PSDB, respeitado. Um perfil que expressa seriedade. A senadora Tebet deve anunciar isso nos próximos dias. Discurso programático Mais forte que gênero e raça, é o discurso programático. A identificação do (a) candidato (a) com um ideário tem mais força. Por exemplo, uma revolução na educação. Um plano de barateamento dos alimentos. Diminuir os índices de violência na sociedade. Defender o agronegócio e sua integração ao meio ambiente. Uma revolução no sistema de transportes no Brasil, com peso nos sistemas ferroviários de passageiros e carga. E assim por diante. A organicidade social A sociedade brasileira está de olho na política, ao contrário do que muitos duvidam. A descrença e indignação com a política funcionam como molas propulsoras de engajamento e participação. Mais ou menos assim: se os políticos tradicionais não dão respostas a nossas demandas, vamos eleger pessoas mais comprometidas com nosso grupo. A sociedade está organizada: núcleos, setores, categorias profissionais, alas, movimentos. Campanha bem feita é aquela que mobiliza um ou vários desses organismos e faz com que o discurso do candidato seja internalizado (conceito acima) por todos os participantes. A menor distância Tenho dito e repetido que Simone já ganhou imensa fatia do bolo com sua pré-candidatura. Se perder eleitoralmente, ganha politicamente. Fato incontestável. Ademais, atente-se para este princípio que tenho avocado: na geometria euclidiana, a menor distância entre dois pontos é uma reta; mas, na política, a menor distância pode ser uma curva. Fernando Henrique perdeu a prefeitura de São Paulo para Jânio Quadros e, mais adiante, ganhou a presidência da República. Na geometria euclidiana, A-------------Z= Menor distância entre dois pontos é uma reta. Na política, pode ser uma curva A...(curva).....Z. Devassa Pedro Guimarães, ex-presidente da CEF, acusado de assédio sexual e moral, fez, ontem, artigo na Folha de São Paulo, onde pede uma devassa completa em sua gestão no banco, desafiando autoridades e vítimas de mostrarem provas. Submete-se à transparência total. Aprofunda a desmoralização ante a bateria de depoimentos contra ele. Um caso a ser acompanhado com acuidade. A compra de voto A compra do voto está no tabuleiro do jogo. Essa PEC Kamikaze é uma bomba de efeitos mortíferos. Aliviará a barriga das bases que vivem na miséria, mas estourará as contas públicas, já sendo considerada a maior pedalada desses tempos turbulentos. Bolsonaro conta com esse pacote de "bondades e benefícios" para cooptar o voto da base da pirâmide. Por isso, não se pode dizer que Lula já ganhou a campanha. Essa projeção está mais para salto alto. E pode atropelar o petista. A burla eleitoral A burla está escancarada. Campanha não começou oficialmente. Mas, candidatos teimam em driblar a legislação. TSE, onde estás? Fecho a coluna com o golaço do Dirran. O goleador francês Dirran (com "biquinho" para parecer francês correto), meio sarará, entroncado e de pernas curtas, jogava no Clube Atlético Potengi, no Rio Grande do Norte. Um dia, disputava no Machadão uma partida contra o Potyguar de Currais Novos, pela 2ª divisão do campeonato potiguar. O jogador atleticano era o destaque. Fazia dribles desconcertantes e lançamentos perfeitos. Fechou as glórias com um golaço. O narrador da Rádio Poti gritava: "Dirran é um craque", "Dirran, grande aquisição do futebol norte-rio-grandense". Dirran prá cá, Dirran pra lá. No final do jogo, o Clube Atlético Potengi perdeu por 3 x 1. Mas o destaque foi Dirran. Vendo todo aquele sucesso, um jovem repórter da Rádio Poti correu para fazer uma entrevista com o craque na beira do gramado. Disparou uma bateria de perguntas: Você deixou seus pais na França? Qual a cidade onde nasceu, Monsieur? Já desfilou no Arco do Triunfo? Como veio parar no Brasil? Pode comparar o futebol europeu com o futebol brasileiro? Qual a origem de seu nome? Desconfiado, espantado, zonzo, o jogador respondeu ao incrédulo repórter: "Pera aí, meu sinhô, num é nada disso; meu apelido é Cú de Rã, mas como num pode falar isso na rádio. então, eles abreveia". (Historinha muito conhecida e contada no Jô Soares).
quarta-feira, 29 de junho de 2022

Porandubas nº 766

Abro com uma hilária historinha envolvendo o folclórico deputado Antônio Bilu, potiguar do meu querido RN. Hotel Zero Km O deputado do Rio Grande do Norte desceu no aeroporto Santos Dumont, no Rio, pegou um táxi: - Hotel Zero Quilômetro. - Zero Quilômetro? Não tem esse hotel, não. - Tem, sim. Em frente ao Hotel Ambassador. - Ah, Hotel OK Senador Dantas, não é? - Não, senhor, Deputado Antônio Bilu, de Natal. Pitadas filosóficas O luxo do funeral a) "O luxo do funeral e a suntuosidade do túmulo não melhoram as condições do morto; satisfazem apenas a vaidade dos vivos". (Dante Veoleci) b) Sabedoria popular Quando Confúcio visitou a montanha sagrada de Taishan, encontrou uma mulher cujos parentes haviam sido mortos por tigres. - Por que não se muda daqui, perguntou Confúcio. - Porque os governantes são mais ferozes que os tigres. Análise da conjuntura Braga Netto O general Braga Netto, filiado ao PL, foi escolhido pelo presidente Bolsonaro como candidato a vice em sua chapa. Primeira constatação: não agrega um voto. A ex-ministra da Agricultura, Tereza Cristina, seria um nome com mais apelo ao eleitorado feminino - onde Jair tem votação menor - ou mesmo a ex-ministra da Pasta da Mulher e da Família, Damares Alves. Passaporte O ex-ministro da Defesa, Braga Netto, poderia ser o passaporte que Bolsonaro pensa ter para se sentar novamente na cadeira presidencial no voo de um golpe? Digamos que a hipótese passa pela cabeça do capitão. Fiquemos, porém, no terreno de um improvável evento de ruptura. As Forças Armadas, em sua plenitude, não topariam entrar nessa aventura. Não há clima político para abrigar um golpe. Não haveria endosso social. A economia, a escassez, a fome seriam também grandes armas contra o golpismo. O Centrão reclama O Centrão não quer Braga Netto como candidato a vice. Vai chiar. Mas o general, se não será o passaporte para uma inclinação golpista, deve funcionar como bastião de defesa contra eventual prisão do capitão-comandante das FAs, em caso de sua derrota. E disso o Centrão será instado a acreditar. As democracias A paisagem mundial faria parte também do painel de contrariedades. As democracias ocidentais não fechariam os olhos a uma eventual ação golpista. O mundo é, hoje, interdependente. Vejam o caso de isolamento da Rússia por causa de sua empreitada de invadir a Ucrânia. Vladimir Putin está isolado, com exceção da posição da China e da dubiedade que paira sobre a conduta de algumas poucas Nações, entre as quais, o Brasil. Esquisitice Caem sobre as nossas cabeças essas esquisitices. A geopolítica, com seus interesses comerciais, faz com que países de ideologias opostas se unam em alianças pragmáticas. Ora, o Brasil de Bolsonaro faz virulenta "guerra de palavras" contra o comunismo, as ameaças vermelhas que ainda existem aqui e ali, condenando aqueles que se identificam com elas, como Cuba, Venezuela, China e, claro, Rússia. E qual o parceiro que Bolsonaro faz questão de glorificar a todo momento? Com quem falou segunda-feira última? Vladimir Putin. Que, por sua vez, tem interesse em formar uma cabeça de ponte por essas bandas do sul do continente. Não beberei Minha querida mãe sempre me dizia: "meu filho, nunca diga: desta água não beberei". Polarização e inquietude O artigo "Polarização e Inquietude", do padre João Medeiros Filho, na mídia potiguar, é oportuno, denso e merece profunda reflexão. "Diante de fundamentalismos ideológicos e religiosos, polêmicas jurídicas e políticas, importa meditar sobre as palavras de Cristo: 'Deixo-vos a Paz, dou-vos a minha vida, não como a dá o mundo'. (João, 14, 27). Um terço à deriva Se os dois candidatos somam, juntos, cerca de 70% das intenções de voto, vale inferir que 30% estão com um olho no norte, outro no sul. Olham para cima e para baixo. O eleitor brasileiro é mutante. Garantir que a eleição será decidida no primeiro turno é esquecer o histórico de campanhas eleitorais. O vento pode mudar de rumo. E se mudar, não haverá força a impedir sua trajetória. Lula cá Lula é um candidato partido ao meio. Vez ou outra, o discurso palanqueiro emerge e ele embarca nos velhos refrãos do passado. Mas, no geral, corre para o meio, onde espera atrair votos de segmentos refratários ao petismo. Aborto, controle da mídia, estatização, reforma trabalhista e outros temas polêmicos continuam integrando a velha pauta lulista. O Lula Lá e o Lula Cá deixam confusos muitos eleitores. Combustíveis Digamos que os preços dos combustíveis sejam contidos e segurados pela mão do novo comando da Petrobras. Vai adiantar e dar votos a Bolsonaro? Este analista tende a acreditar que não reverterão em votos para o presidente. A imagem da economia fraturada, inflação alta, juros subindo, alimentos distantes das mesas pobres - essa mistura quase venenosa acabará puxando a gasolina, o diesel, o gás de cozinha para o caldeirão da indignação. Reverter imagem negativa, com esse andar da carruagem, é tarefa para gigantes de estatura moral. A barriga ronca Sou recorrente com a minha hipótese: a barriga roncando de fome e panelas vazias definirão o voto em 2 de outubro. A fome se espalha. A estética dos polos urbanos está locupletada de pedintes, mendigos e sem teto. O bem contra o mal? Jung perguntou, certa vez, a um rei africano: - Qual é a diferença entre o bem e o mal? O rei meditou, meditou e respondeu às gargalhadas: - Quando roubo as mulheres do meu inimigo, isso é o bem. E quando ele rouba as minhas, isso é o mal. Bolsonaro disse que a campanha eleitoral desse ano será uma luta do bem contra o mal. Quem vai roubar? Entendamos que esse posicionamento vale para os dois lados. Pois Lula deve dizer a mesma coisa. Se Bolsonaro roubar os votos do petista, o bem estaria do lado dele? Assim como Lula, se conseguir roubar os votos do bolsonarismo? Ambos garantem que sim. Agregador de pesquisas Os Institutos de Pesquisa, em sua quase totalidade, atribuem ao candidato do PT uma margem entre 10 pontos a 19 pontos de maioria. O índice depende da metodologia usada. Pelo sistema de agregação de resultados de pesquisas, montado pelo Estadão, a média é de 15 pontos. A virtude está no meio? Vamos acompanhar esses números. Até quando? O novo presidente da Petrobras - a ser ainda referendado pelo Conselho - ficará no cargo até quando? Promete nova dinâmica de preços na estatal. Dinâmica de preços - eis o vocabulário da crise. Terceira via Foi para o beleléu, segundo muitos analistas. Este escriba ainda vê faíscas no fim do túnel. Ciro com 10 pontos Ciro Gomes deve entrar na faixa dos dois dígitos. Simone Tebet terá fôlego? É a candidata de contingentes médios. Pelo menos, nas expectativas. França baixando a crista Marcio França (PSB) até que suportou bem as pressões. Mas poderá abandonar o barco da pré-candidatura ao governo de São Paulo e se refugiar na canoa de candidato ao Senado com apoio de Fernando Haddad. O PT parece ter ganhado a parada. Lula teria costurado bem. Quando França fará o anúncio? No Rio de Janeiro Marcelo Freixo (PSB) deve escolher Cesar Maia (PSDB) em articulação feita por seu filho, Rodrigo Maia (PSDB) como vice em sua chapa ao governo do Rio de Janeiro. Pode ganhar do atual governador, Claudio Castro (PL), candidato de Bolsonaro, por enquanto na frente. O prefeito Eduardo Paes(PSD) apoia o ex-presidente da OAB, Felipe Santa Cruz (PSD). Mas pode desistir desse apoio por causa do baixo índice de intenção de voto de Santa Cruz. O véio Lunga Seu Lunga estava cortando uns limões, quando passa sua mulher e pergunta: - Esse limão é pra fazer suco? - Não, é pra eu usar de colírio! Prefiro um sabonete Entra um sujeito na sucata de seu Lunga, escolhe um relógio um pouco velho e pergunta: - Seu Lunga, esse relógio presta pra tomar banho? - Eu prefiro um sabonete - resmunga o velho. Amor próprio "Um maltrapilho dos arredores de Madrid pedia esmolas com grande dignidade. Um transeunte lhe disse: - "Não tem vergonha de exercer essa infame atividade quando pode trabalhar?" - "Senhor, respondeu o mendigo, peço-lhe esmola e não conselhos". E tendo dito isto, deu-lhe as costas com toda a empáfia castelhana. Era um mendigo orgulhoso esse; pouca coisa bastava para ferir sua vaidade. Por amor de si mesmo pedia esmola; e ainda por amor de si mesmo não permitia que lhe fizesse qualquer reprimenda". (Voltaire)
quarta-feira, 22 de junho de 2022

Porandubas nº 765

Abro a coluna com um caso hilário da velha Bahia. Grande prole... Da Bahia, vem a historinha. José de Almeida, contador do Banco do Brasil, fazia o cadastro da agência. Um dia, chega Heroíno Pita, fazendeiro, que responde na bucha o formulário: nome, idade, imóveis, renda anual, dívidas. Aí vem a pergunta: - Quantos filhos o sr. tem? - 8 filhos - Tudo isso? O senhor tem uma prole grande. Heroíno, entre sorridente e cabreiro, abre o gesto com as duas mãos: - Não, senhor. É normal. Normal. Agora, respire e leia minha análise da conjuntura. A crise I - O golpe A crise amplia seus contornos a cada semana. Olhemos para os lados de nosso amanhã. A ameaça sobre um golpe a ser desferido pelo presidente Bolsonaro, caso perca as eleições, vem ganhando volume. O receio se alastra nos estratos do meio da pirâmide para cima. O leit motiv, que faz o pano de fundo desse risco, é o processo de votação, sujeito a fraudes, na concepção do bolsonarismo. A crise II - As Forças Armadas As Forças Armadas, historicamente discretas e distantes do tiroteio eleitoral, entram na arena dispostas à briga. Dizem com todas as letras que farão o seu sistema, próprio e intransferível, de auditoria, politizando a questão e praticamente desafiando o TSE a um duelo. Na última reunião da Comissão de Transparência Virtual presidida pelo ministro Edson Fachin, o representante das Forças Armadas, o general Heber Portella manteve-se calado e com a câmera desligada. Sinal de que o clima está mais que tenso. A crise III - As urnas eletrônicas O presidente Bolsonaro, por sua vez, se esforça para adensar a tese de fraude nas urnas eletrônicas, alimentando a base bolsonarista e tentando influenciar segmentos de todos os espaços do eleitorado. A campanha já está mostrando que será uma corrida de brutos desembestados em direção ao pódio. As Forças Armadas podem, até, com sua disposição de questionar o processo eleitoral, despertar grupos militares contrários ao seu rompante. A crise IV - A Petrobras A fogueira da crise sobe com mais algumas estacas. No centro da fornalha, a Petrobras. O governo decidiu nomear o quarto presidente da estatal na atual administração. O valor de mercado da empresa caiu em mais de R$ 100 bilhões nos últimos dias. Grana pesada. A CPI da Petrobras jogará a crise no cume da montanha. A intenção de Bolsonaro: atribuir à estatal a alta no preço dos combustíveis. A mão do Estado quer ser mais forte na definição dos rumos. O fato é que o presidente atual e o ex-presidente Lula defendem o que chamam de "abrasileiramento" da política de preços dos combustíveis. A crise V - O intervencionismo Lula pula no ringue, tentando escapar do adversário, mas na questão da Petrobras é francamente contrário à privatização. Tem dificuldade em ficar calado. A voz do Estado, com Lula ou Bolsonaro, será mais alta. Intervencionismo. E essa tendência assusta os pilares dos edifícios da av. Faria Lima. Os investidores ficam com um olho na bocarra do Estado e outro olhando para os limites da economia de mercado. A crise VI - Os alimentos E haja lenha na fogueira. Os juros que, logo, logo, devem chegar aos 15% mensais, fazem disparar o preço dos alimentos. Nos supermercados e feiras livres, os preços sobem aos céus. O programa Auxílio Brasil não enche mais os carrinhos. A carne de porco substitui a carne de boi. Feijão e arroz, sob medida, são os componentes centrais das refeições. A guerra da Rússia x Ucrânia escasseia e encarece os grãos, a partir de trigo e soja. O mundo entra em um ciclo de intensa carência alimentar. A crise VII - O impacto Nesse ponto, acende-se o farol vermelho. Está chegando o Dia D. A hora da verdade. 2 de outubro. Eleições. A retração da economia, os juros, as indefinições na área política, Petrobras, a pandemia, o contexto nebuloso que cobre o planeta, todo esse cipoal impactará o sistema de decisões do eleitor, que tende a reagir de acordo com a equação que, há tempos, tento mostrar aos leitores: BO+BA+CO+CA= Bolso cheio, Barriga satisfeita, Coração agradecido, Cabeça votando em quem viabilizou esse fluxo. A recíproca é verdadeira. Se a barriga roncar, a raiva, a indignação, o troco do eleitor virão com juros e correção monetária. Porrada nos candidatos identificados com a fome. A crise VIII - Quem pagará o pato? A conta começa a multiplicar números. Qual será a estatística dos mortos e contaminados com o coronavírus? Quem diz que os pobres não serão influenciados por isso fala bobagem. Lembro, mais uma vez: os seres humanos agem e lutam para sobreviver e perpetuar a espécie, como ensina Pavlov. Nesse esforço, despertam quatro instintos, dois voltados para a conservação do indivíduo e dois voltados para a preservação da espécie: o impulso combativo contra ameaças à vida; e o de nutrição (satisfação da barriga); e os dois de preservação da espécie são o instinto sexual e o paternal. A crise IX - As associações Os instintos são acionados por todos. Não apenas por um estrato social. Pobres e ricos, feios e bonitos, gordos e magros, negros e brancos, todos comem do mesmo prato instintivo. Hoje, a tendência é associar Bolsonaro às coisas ruins - fome, doenças, ameaças ao indivíduo. Porém, ele também será acionado a fatores positivos por alguns núcleos: família, valores etc. Ou seja, instinto paternal. Pátria, acima de todos; Deus, acima de tudo. Lula, aos valores positivos da barriga (acesso ao crédito, alimentos-Bolsa Família) etc. E, também, haverá certa associação com medo - comunismo, Cuba, Venezuela, etc. A corrupção será jogada no colo de ambos. Paixões tristes I A individualização de desigualdades toma o lugar da coletivização das desigualdades. Esse é o fenômeno em foco nesses nossos tempos turbulentos. Essa é a tese central de François Dubet, um dos maiores sociólogos da França, exposta em seu livro O Tempo das Paixões Tristes. Dessa hipótese, emergem o ódio, as cóleras, as indignações - um pacote rancoroso que acaba aplainando os caminhos do populismo. Paixões tristes II Classes superiores, médias e inferiores, que formavam a modelagem da pirâmide social, agora dão lugar aos grupos singulares e às desigualdades específicas: mulheres contra as discriminações; aglomerações de categorias profissionais nas ruas; jovens descendentes de imigrantes; desocupados e os contingentes sem acesso à saúde, à educação, à cultura, e submetidos aos influenciadores, entre outros. Vivemos tempos de paixões tristes. As desigualdades mudam de natureza. Pente fino - Tereza Cristina, ex-ministra da Agricultura, pode entrar na chapa de Bolsonaro como candidata à vice-presidente. Mas, parece não querer se arriscar. - O general Hamilton Mourão tem condição de se eleger senador pelo RS. - Romeu Zema, de MG, deverá se reeleger. - Quem ganhar em MG poderá ser eleito presidente em outubro. Minas Gerais representa o universo brasileiro. - O Nordeste, hoje, mostra Lula ganhando de goleada. Porém, tende a diminuir sua vantagem. - Em São Paulo, Fernando Haddad encontrará um paredão de resistência ao lulopetismo. Trata-se do Estado mais contrário ao petismo. - Simone Tebet ainda não saiu do páreo. Pergunta que se faz nos segmentos médios: você vai votar em quem? Tebet surpreende. Muitos apontando para ela o seu voto. O que não aparece nas pesquisas. - Sérgio Moro, candidato a que no Paraná, senador, governador? A impressão é a de que está sendo boicotado por seu partido, o União Brasil. - Este partido patrocinou pesquisa mostrando que Sérgio Moro não tem chance de vencer as eleições ao governo do Paraná contra o governador Ratinho Júnior. Daí a ideia de lançar o ex-ministro da Justiça de Bolsonaro ao Senado. Blog do Metrópoles. - O Conselho da Petrobras vive o dilema: como sair do imbróglio - entre a cruz e a caldeirinha? - O TSE, a ser comandado pelo ministro Alexandre de Moraes, a partir de agosto, vai endurecer e punir desafiadores da lei. A conferir. - José Roberto Arruda, se conseguir viabilizar sua candidatura ao governo do DF, tem chances de voltar a dirigi-lo. - O PSD, de Gilberto Kassab, avançará bem no pleito, com chances de formar uma grande bancada. - A morte de Bruno e Dom joga a imagem internacional do Brasil no fundo do poço. - De meu artigo na Folha de São Paulo, no último domingo: "O beabá para combater a violência deve começar com o desfazimento da cosmética de miséria que se instalou no país. Os cinturões metropolitanos, já saturados de lixões que ofertam um banquete pantagruélico para urubus, crianças e mães famintas, são também palco para a exibição de corpos chacinados em decomposição, vítimas do ciclo de violência desses tempos horripilantes. O que se vê é a expansão dos contingentes das ruas, esmoleres e mendigos, que passam a noite embaixo de pontes e viadutos, cobertos por caixas de papelão.... Sem ânimo, emoções envenenadas, os cidadãos se veem acossados pela violência, entram em um limbo catatônico, assemelhando-se a dândis em passeio macabro e estonteante por um jardim de horrores. A violência suga a vitamina da vida, a alegria de viver. Ao fundo, a sombra do vírus da pandemia em sua quarta visita ao nosso habitat".
quarta-feira, 15 de junho de 2022

Porandubas nº 764

Começo com o Papa Francisco numa cadeira de rodas. O papa e a artrite O bêbado entrou no ônibus aos tombos. Malvestido, sujo, tossindo, tropeçando, tremendo, com um jornal na mão, sentou-se ao lado de um padre. A cada arranco do ônibus, tombava para o lado do padre, que, irritado, o empurrava sem piedade ou indulgência, e com nojo. O bêbado abriu o jornal, tentou ler, mas não conseguia porque tremia muito, bateu no braço do padre: - Padre, o que é artrite? - É uma doença muito ruim, muito triste, muito feia, muito nojenta, que dá nas pessoas que bebem muito. - E mata, padre? - Mata, sim, e mata rápido. Ou o doente para de beber ou morre logo. - Padre, o senhor jura que não está me enganando não? - Juro por essa cruz que está aqui no meu peito. Não estou enganando. E tem coisa pior. Quem morre de artrite, porque não parou de beber, não vai para o céu, nem mesmo para o purgatório. Vai direto para o fogo do inferno. - Coitadinho do argentino, padre. - Dele, quem? - Do Papa, padre. O jornal está dizendo aqui que o Papa Francisco está com artrite. O padre se levantou, trocou de lugar, e foi lá pra frente. (Historinha de Sebastião Nery, adaptada para a atualidade por este escriba). A imagem do Brasil No fundo do poço. O assassinato do indigenista Bruno Pereira e do jornalista inglês, Dom Philips, no Vale do Javari, Amazonas, devasta ainda mais a imagem do Brasil na paisagem internacional. Soma-se ao rol de coisas ruins que as Nações enxergam em nossas plagas, a partir do desmatamento da floresta, do garimpo ilegal, da exploração de minérios, enfim, do descaso ao qual foi relegada a região amazônica pelo governo. Infere-se que... O presidente Bolsonaro se depara com mais um obstáculo a ultrapassar em sua corrida para voltar a sentar na cadeira presidencial. A morte de Bruno e Dom abre mais espaço na mídia nacional (e internacional), com sobras de tiros em direção a um governo que acolhe bárbaros que devassam a região. Sob uma política complacente. Ou seja, esse episódio afasta muitos eleitores que poderiam votar em Bolsonaro. Recuam ante a escalada de violência e brutalidade que assolam o Brasil no atual ciclo político. A banalização do mal O mal está banalizado aqui e alhures na esteira das práticas que o alimentam. A famosa tese de Hannah Arendt sobre o tema, com foco no assassinato em massa, comandado pelo coronel nazista Adolf Eichmann ao jogar milhões de judeus nas câmaras de gás dos campos de concentração. O Álbum de Auschwitz mostra a chegada dos trens, o processo de seleção e o lugar para onde eram levados os pertences dos assassinados - conhecido como Canadá... "mulheres, crianças, idosos não sabiam o destino que os esperava; nós, porém, sabemos o que ia acontecer em minutos ou horas: seu destino eram as câmaras de gás... Entre a primavera e o início do verão de 1944, Auschwitz chegou ao limite de sua capacidade de extermínio e o superou no mais horrível e frenético período de assassinatos que o campo viveria". O criminoso cumpria ordens. Sem piedade. Um burocrata dando vazão ao sistema. A banalização do mal. A natureza do mal O mal tem origens. Nasce, por exemplo, da inação de governantes que fecham os olhos para práticas imorais, perversas, estúpidas, calamitosas. A semente do mal viceja na seara da ignorância. Massas sem acesso à educação ensejam a multiplicação de grupos, máfias, milícias. Em suma, a morte do indigenista e do jornalista inglês no Amazonas se ancora no desmando de uma administração que deixa a floresta ser devastada por "novos povoadores", os cultores do uso da bala, que emergem como "bandeirantes bárbaros" das reservas indígenas. Sob o olhar de um governo que considera a destruição do espaço amazônico um impulso ao desenvolvimento do país. Os três macaquinhos Parcela do eleitorado que votará em Lula deve fazer o gesto dos três macaquinhos - que fecham os olhos, os ouvidos e a boca. Não veem, não ouvem e não sentem o clima que envolverá sua decisão nas urnas. Votarão em Lula para evitar Bolsonaro. Hipótese que também vale para o mandatário-mor. A opção de votar nele é, para muitos, uma tentativa de deixar longe do poder o lulopetismo. Parcela ponderável do eleitorado tenta enxergar luz no fim do túnel. Quem vai segurar o farol? Programa petista Volto a lembrar. O programa de Luiz Inácio, vazado pela mídia na semana passada, mostra que o ex-metalúrgico não esquece temas que causam pesadelo junto a segmentos importantes: a revogação da reforma trabalhista, o aborto, a regulação da mídia (com cheiro de censura), a tributação dos endinheirados, entre outros itens. E, ainda, ele concorda com o uso da caneta para definir os rumos da Petrobras e, assim, abrir o ciclo de maior intervenção do Estado na economia. Lula no meio? Uma ficção O comandante petista tem se posicionado no meio do arco ideológico. É sua expressão junto aos setores produtivos. Mas, vez ou outra, o velho Lula reaparece em discursos inflamados. Geraldo Alckmin tem sido usado como colchão amortecedor junto aos setores produtivos. Um drible que poderá quebrar as pernas do jogador. O tempo provará essa hipótese. Esperemos. Em suma Jair tem apoio de 25% a 30% dos eleitores que consideram seu governo bom ou ótimo. Mesmo não sendo popular, Bolsonaro tem razoável apoio entre os padrões da América Latina. Com esse índice, ainda está na disputa. Já a rejeição a Lula tende a subir, o que tornaria a eleição competitiva. Se Bolsonaro conseguir recuperar popularidade, a eleição será apertada. Simone Tebet Toda a expectativa do grupo nem-nem se volta para Simone Tebet. Julho é seu deadline, o fim de linha. Passou o mês sem sinais de subida, será improvável permanecer no páreo. Este analista acha que haverá um pouco de pista para ela decolar. Doria, adeus João Doria diz adeus à vida pública. "A ser verdade", este analista registra algumas conclusões: 1. João fez bem à democracia brasileira; 2. O ex-governador paulista deixa marca forte no Estado mais poderoso da Federação; 3. Seu governo não ganhou o reconhecimento que merece; 4. Foi impossível ao ex-governador diminuir índices de rejeição; 5. A rejeição abriga componentes relacionados à índole de João (elite, autossuficiência, representação da cara do poderio paulista (elemento muito rejeitado pelo eleitor), imposição, pouco propenso ao diálogo, entre outros pontos. Verdade Este analista escreveu acima - "a ser verdade". A observação é para lembrar que há sempre um caminho de volta. Se as circunstâncias, no dia de amanhã, abrirem espaço para sua volta, quem garante que ele não montará no cavalo selado diante de sua porta? Minha querida e saudosa mãe sempre me dizia: "meu filho, nunca diga - desta água não beberei". Acrescento: aprendi com o filósofo Heráclito, de Éfeso, que a travessia do rio duas vezes no mesmo lugar por uma pessoa não se repete, pois as águas e a própria pessoa estarão modificadas; aprendi, também, que a pessoa pode atravessar o rio noutro momento, sob novas circunstâncias. O rio e a pessoa serão outros. A menor distância A propósito, a menor distância entre dois pontos, na geometria euclidiana, é uma reta. Tenho dito e repetido este bordão: Na política, porém, a menor distância entre dois pontos pode ser uma curva. Lembro: Fernando Henrique perdeu a eleição municipal para Jânio Quadros e, a seguir, ganhou a presidência da República. Queda da bolsa O mercado financeiro enfrenta momentos nervosos no mundo e por aqui. Bolsas fechando em baixa. O pessimismo é reflexo de preocupações generalizadas com a inflação, que está acelerando sobretudo nos EUA. Recessão mundial Anotem a inferência. O mundo deverá entrar, um pouco mais adiante, em um processo de refluxo nas economias. A partir da recessão que deve ocorrer nos Estados Unidos, a maior potência econômica. Senhoras e senhores investidores: refaçam seus prumos...e rumos. Paisagem que desenho a partir de minhas leituras. Um dos movimentos para a desvalorização do real é o estímulo à fuga de investidores do Brasil com a iminente nova elevação dos juros americanos. Os investidores retiram seus recursos da renda variável... Ucrânia Está perdendo a guerra. Rússia vitoriosa aumentará as tensões na Europa. A OTAN se dispõe a abrigar novos países. Putin irado. Sinais de paz se apagam. Os Gomes Quem deverá voltar à iniciativa privada, no próximo ano, é o presidenciável Ciro Gomes. Um perfil qualificado. Um grande conhecedor do nosso país. A propósito: os irmãos Ferreira Gomes deram um passo adiante no sistema educacional de Sobral, Ceará. Depoimento de uma figura mais que prestigiada....o homem mais rico do Brasil: Jorge Paulo Lemann. A propósito do Ceará... Junho é um mês histórico na minha trajetória. Nesse momento em que se fala da indicação de Tasso Jereissati para compor a chapa de Simone Tebet (MDB-MS) talvez seja interessante lembrar os tempos em que Tasso abriu sua jornada política. O início Há 36 anos, em 24 de junho de 1986, indicado por Fernando César Mesquita, assessor de imprensa do presidente José Sarney, cheguei à Fortaleza, Ceará, para ajudar na campanha de Tasso Jereissati ao governo do Estado. Do hotel Esplanada, onde me hospedei, fui a uma noite de São João. Tasso Jereissati, convidado por Barros Pinho, deputado estadual do MDB, dirige-se a um clube de bairro popular de Fortaleza. Primeira experiência no meio do povo. Candidato a governador do Ceará, sua missão: presidir um júri que vai julgar fantasias juninas de adolescentes. Peixe fora d'água... Estava ao seu lado como conselheiro e profissional de campanhas políticas (hoje chamados de marqueteiros). Tasso circula de mesa em mesa, apresentando-se. Encabulado. A seguir, preside o evento. Não sabe o que fazer. Ou dizer. Era muito conhecido no bairro de classe média alta, Aldeota, mas sem acesso às massas. Na época, tinha 2% de intenção de voto. "Tô fora"... Depois do evento, angustiado, ele, Sérgio Machado, na época braço direito, e este escriba, dirigem-se a um restaurante na praia para degustar uma lagosta. Logo no início da conversa, Tasso desabafa : "desisto, amigos; se política for isso, assistir a batizado, casamento, velório, festa junina, não contem comigo. Tô fora". Transtornado e disposto a abandonar a candidatura. No Hotel, dia seguinte, em uma pequena máquina de datilografia, Lettera 22, esbocei o planejamento de sua campanha. O moderno contra o arcaico O novo contra o velho. O moderno contra o arcaico. O lema que orientou a campanha. Fui à MPM, em Brasília, para que esta agência criasse o visual. Fizemos a apresentação. Mas a Propeg, de Fernando Barros, Salvador/Bahia, sob o mesmo lema, acabou sendo a agência escolhida. Fui coordenar a campanha de Freitas Neto (PFL-PI). Acompanhando o que ocorria no CE. Resumo: Tasso deu um banho nos três coronéis que comandavam a política cearense, Virgílio Távora, César Cals e Adauto Bezerra. Ganhou de Adauto Bezerra, obtendo quase 1,5 milhão de votos. Fez um governo mudancista. Hoje, senador do PSDB, é um quadro respeitado em todos os segmentos da política. Fecho com o Ceará. Com "SEU LUNGA", o famoso casca dura de Juazeiro do Norte, vendedor de sucatas, pai de 13 filhos, quase analfabeto, que ganhou fama pela língua solta e afiada. No copo? Seu Lunga descansava na rede. Manda o sobrinho trazer-lhe um pouco de leite. O garoto pergunta: - No copo? Ele responde: - Não. Bota no chão e vem empurrando com o rodo, imbecil. A promissória O funcionário do banco veio avisar: - Seu Lunga, a promissória venceu. - Meu filho, pra mim podia ter perdido ou empatado. Não torço por nenhuma promissória. Tá doente? Seu Lunga vai saindo da farmácia, quando alguém pergunta: - Tá doente? - Quer dizer que se eu fosse saindo do cemitério, eu tava morto?
quarta-feira, 8 de junho de 2022

Porandubas nº 763

Abro a coluna com a Paraíba. Silêncio, silêncio Flávio Ribeiro, presidente da Assembleia (depois foi governador da Paraíba), estava irritado com as galerias, que aplaudiram e vaiaram durante um debate entre o deputado comunista Santa Cruz e o udenista Praxedes Pitanga. De repente, tocou a campainha, pediu silêncio e avisou, grave: - Se as galerias continuarem a se manifestar, eu evacuo. Felizmente, as galerias se calaram. Na corda bamba O governo anunciou, segunda, medidas para zerar impostos sobre combustíveis. A ideia é permitir que o imposto cobrado apenas sobre o óleo diesel e sobre o transporte público seja zerado até o final do ano. Promete zerar os impostos federais - PIS, Cofins e Cide - sobre a gasolina e o etanol. Mas isso só pode ser feito com redução de tributos estaduais. Improvisação... O objetivo é compensar parte da perda de arrecadação dos Estados com recursos federais. Os Estados olham enviesado para esta promessa. Quem vai garantir isso? Paulo Guedes promete verba de até R$ 50 bilhões (de R$ 25 a R$ 50 bilhões, prometeu o ministro....que parece não ter certeza). O anúncio das medidas tem certa semelhança com a explicação capenga e improvisada de Zélia Cardoso de Melo, por ocasião do confisco da poupança nos tempos tormentosos do governo Collor. Cidades pobres e a ostentação Um escárnio. É o que se pode dizer das cidades pobres do país, a imensa maioria dos 5.674 municípios, cujos mandatários tiram dos esvaziados cofres municipais, 700/800 mil e até mais de um 1 milhão de reais para levar cantores e shows de música. Os munícipes até aprovam essa conduta. Afinal, a festa, a descontração, a farra fazem parte da índole nacional. E não querem saber se esses shows acabam tirando dinheiro de programas em áreas vitais como saúde e educação. Nossa índole Nossos grandes antropólogos e sociólogos já escreveram sobre nossa índole festivo, hospitaleira, que aprecia o ócio, o lazer, a festa. Não somos um povo ordeiro, cumpridor de normas. As decisões contemplam mais o fator emotivo que a componente racional. Daí a propensão para comportamentos extravagantes no campo dos costumes. Veja-se essa gastança com o dinheiro público nessa quarta onda da Covid-19. Baixa convicção O brasileiro não tem a convicção de um anglo-saxão, para quem pau é pau, pedra é pedra. Dependendo do momento e das circunstâncias o pau pode ter a consistência de pedra a ponto de o homo brasiliensis jurar diante de um tronco de madeira que se deparou com uma dura rocha. Essa característica tem raízes no DNA do nosso povo, alegre e acolhedor, flexível e adaptável aos momentos. Somos um povo de paz, que procura harmonizar posições, tirando proveito das situações, piscando à direita e à esquerda. Não somos de pegar forte no trabalho, dizem. Já começou a perseguição Conta-se a historinha do brigadeiro Eduardo Gomes (UDN), em seu primeiro comício, no Largo da Carioca, no RJ, idos de 1945: "brasileiros, precisamos trabalhar". Do meio do povo, um ouvinte gritou: "vixe, já começou a perseguição". O comício quase acabou. O fato é que não cultivamos a semente das convicções. Somos afeitos às imprecisões. "Quantas horas o senhor trabalha por semana"? "Mais ou menos 36 horas". "O senhor é católico"? "Sou, mas não vou à missa". Petrolina não viu, até hoje, uma gota de petróleo de sua terra, nem Petrolândia ali perto. Quem leu Jorge Amado chega à conclusão de que a Bahia de Todos os Santos deveria ser apropriadamente chamada de Bahia de Todos os Pecados. Pernas pro ar... Já o gordo pernambucano Ascenso Ferreira, genial intérprete da nossa cultura, cantava: "Hora de comer - comer! Hora de dormir - dormir! Hora de vadiar - vadiar! Hora de trabalhar? - Pernas pro ar que ninguém é de ferro!" Água subirá a serra? Vejo com esperança a detonação de uma rocha no pé da serra de Luis Gomes, minha querida cidade potiguar, que faz fronteira com a Paraíba e com o Ceará. Explosão marcada para ontem, terça, e que dará início às obras de um túnel que propiciará a chegada da água no extremo oeste do RN e outras regiões cobertas pelo Ramal do Apodi. Ufa! Sonho de gerações. No dia em que a água chegar em cerca de 54 cidades do Nordeste, o Brasil dará um salto de progresso. Puxadores de votos Em toda eleição, emergem as figuras classificadas como puxadores de votos, ou seja, nomes de grande visibilidade, famosos, perfis polêmicos e mesmo pessoas bem qualificadas na esfera política, como a ex-senadora Marina Silva. A ex-ministra acreana deverá compor a chapa de nomes para deputado Federal em São Paulo pela Rede Solidariedade. Muito bem. Ocorre que essa prática se tornou um anzol torto para pescar eleitores. Torto? Sim. Os candidatos transferem seu domicílio eleitoral para praças mais densas de votos, forma de aumentar as bancadas partidárias. Desconhecimento Vejam o caso do deputado Federal Eduardo Bolsonaro. Não se vê tal figura circulando em São Paulo, onde obteve extraordinária votação em 2018, cerca de 1,84 milhão de votos, a maior do país. O PSL, que era o partido de Jair Bolsonaro naquele ano, foi o que teve as maiores votações em cinco Estados. Pergunte-se ao deputado se ele sabe onde é o Tatuapé ou a Capela do Socorro, na capital paulistana. Ou ainda: já foi, por exemplo, a Santa Rita do Passa Quatro, na região de Ribeirão Preto? Faça-se a mesma pergunta a Marina Silva. E mais: que ações foram feitas por Vossa Excelência para São Paulo, deputado Eduardo? Um drible? Será que essa prática continuará a integrar o nosso sistema eleitoral? Não é um drible em nossa democracia? Tiririca Briga entre famosos. O deputado Federal Francisco Everardo Oliveira Silva (PL-SP), o Tiririca, pode perder o seu número no Partido Liberal depois da chegada de Eduardo Bolsonaro à sigla. O humorista usa o 2222, que seria cobiçado pelo filho do atual presidente da República. P.S. Na eleição de 2010, Tiririca se elegeu como o deputado Federal mais bem votado do país, recebendo 1 milhão e 300 mil. Usava o jargão: "pior que tá não fica. Vote em Tiririca". Um absurdo É um absurdo vermos uma operadora de carga privilegiando a compra de trens importados de passageiros em detrimento dos nacionais. Uma vergonha. Emprego e renda ao estrangeiro e não a nós, brasileiros. O setor ferroviário de passageiros tem melhor capacidade de fabricar estes trens e mantê-los por três décadas de uso. Os equipamentos importados da China não são bons e os últimos tiveram que ser mantidos pela indústria nacional. Na hora de apoiar as renovações antecipadas foi a indústria nacional que esteve presente, que deu um passo à frente, financiando estudos e demonstrando sua viabilidade E agora, quando se apresenta o momento de participar do desenvolvimento nacional, o setor de passageiros se vê relegado ao esquecimento. Quarta onda O costume acaba aplainando o terreno das restrições. A primeira fase da Covid-19 trouxe muito medo. Com os tempos, as pessoas foram se acostumando e se adaptando ao clima da pandemia. Vivemos, hoje, a quarta onda. Tudo parece normal. Circulação nas ruas e nos escritórios. Contaminados em expansão. Mortes em fluxo decrescente. As piores mazelas entraram no espaço da banalização. Que tempos... Os generalistas Nos últimos anos, ganhou projeção a figura do generalista, o profissional que, possuindo conhecimentos específicos, reúne condições e potenciais para estabelecer abordagens abrangentes da sociedade. O generalista era considerado um profissional não muito respeitado pelo fato de "querer saber de tudo" e, no fim das contas, "não saber nada". Sua imagem, porém, ganhou consistência. A holística O conhecimento holístico, capaz de integrar as partes no todo, constitui uma exigência do mundo competitivo e globalizado. As análises simplistas começam a ser rejeitadas. Um dos mais imperiosos desafios dos profissionais de comunicação reside na capacidade de saber ler cenários e projetar situações. Discurso político 1. Slogan-repetição É bastante eficaz, nas campanhas políticas, a aplicação de um bordão ao final dos discursos, repetido todas as vezes em que o candidato discursa. Exemplo de fecho de discurso, que ficou famoso, é o do senador Catão, no Senado Romano, que terminava sua oração da mesma forma: "Ceterum censeo, Carthago delenda est" ("em outras palavras, Cartago deve ser destruída"). 2. Força mística Hoje, muitos se valem do escudo religioso. O eleitorado respeita e tem veneração pelo eixo místico. Candidatos de igrejas evangélicas costumam recitar salmos, do tipo: "Deus é o meu pastor e nada me faltará"... "se Deus está comigo, quem estará contra mim?". 3. Valores do ciclo eleitoral Valores que o candidato deve alinhar ao discurso: participação - a sociedade está querendo participar do processo político; cobrança - o eleitor quer fiscalizar a vida e as promessas; autonomia - a capacidade de um candidato de decidir sobre seus atos, seus fins, a capacidade de escolher os meios para atingir os fins; juventude - conciliar uma certa jovialidade com a experiência do adulto, não passar ideia de muito impetuoso nem muito velho; cidadania - é um conceito muito importante hoje. Cada vez mais o cidadão quer reforçar a sua cidadania. A cidadania se conquista com emprego, saúde, melhores condições de vida, segurança, liberdade e conquistas dos direitos individuais e sociais. É oportuno lembrar: os valores estão presentes dentro do contexto sócio-político: participação, fiscalização, cobrança, mudanças no sentido de inovação, simplicidade, mais ação menos palavras, autonomia, juventude, experiência, cidadania. 4. Eficácia do discurso O interesse pelo discurso se relaciona ao uso que o leitor/ouvinte poderá fazer da mensagem. Quanto mais benefício ela trouxer, mais possibilidade terá de ser selecionada. Esse benefício, por sua vez, está relacionado à proximidade psicológica/distância psicológica que ela apresenta. As modulações pessoais da linguagem oral, por exemplo, reduzem a distância do indivíduo. E o uso de apelos emocionais facilita o encaixe da mensagem na psique. A mensagem precisa ser inteligível, de forma a ser compreendida plenamente pelo receptor. Maquiavel Pinceladas do pensamento de Maquiavel: - A ofensa que se fizer a um homem deverá ser de tal ordem que não se tema a vingança. - Arruína-se quem é instrumento para que outro se torne poderoso. - Não há coisa mais difícil de se fazer, mais duvidosa de se alcançar, ou mais perigosa de se manejar do que ser o introdutor de uma nova ordem, porque quem o é tem por inimigos todos aqueles que se beneficiam com a antiga ordem, e como tímidos defensores todos aqueles a quem as novas instituições beneficiariam. Fecho a coluna com Pernambuco. "Só expectorante" Reunião de vereadores com o chefe político da região numa pequena cidade de Pernambuco. Cada um tinha de falar sobre os problemas do município, reivindicações, sugestões, etc.. Todos falaram alguma coisa, com exceção de um deles, meio acabrunhado no canto da sala. O chefe político cobrou dele a palavra: - E você, amigo, não tem nada a dizer? O vereador, tonto com a provocação, não teve saída. Respondeu: - Não, doutor, estou apenas expectorante. Abriu a gargalhada dos companheiros espectadores. ("Causo" do ex-governador de PE e ex-senador Maciel com relato de Geraldo Alckmin.)
quarta-feira, 1 de junho de 2022

Porandubas nº 762

Abro a coluna com uma historinha da lavra de Vítor Sérgio, de Manaus. Urgência na farmácia Com a palavra, Vitor: Tenho um amigo que mora em Canutama, município do Amazonas. Certa vez resolvi visitá-lo e fiquei contente porque ele prosperara e montara uma drogaria, que funcionava no térreo de sua casa. Num domingo de sol, bebíamos umas "geladas", comendo churrasco, quando começou a cair o maior "toró". A chuva já estava passando quando escutamos um barulho vindo do andar de baixo. Me debrucei e verifiquei que havia um cara bêbado, "chapado", batendo na porta da drogaria e dizendo: - Por favor, abra a porta, abra porta!!! Avisei ao amigo: Tem um cara querendo comprar algum medicamento. - Dia de domingo, eu não abro a drogaria nem pra minha mãe, além disso o cara tá cheio da "maldita". - Pro cara tá batendo debaixo de chuva deve ser alguma urgência... -Vou nada, hoje é meu dia de folga, não vou nem "amarrado". - O bebum vai ficar batendo e aperreando a gente, vai lá ver o que ele quer. Hoje é ele quem está precisando. Amanhã pode ser um de nós. Abra a drogaria, atenda esse homem, depois você volta. - Tá bom, só vou porque você tá pedindo. O colega desceu as escadas, acendeu as luzes, e abriu o portão de enrolar de ferro. Minutos depois escutei-o esbravejar: - Vai tomar no ..., bêbado filho de uma ...! Desci correndo as escadas, pensando se tratar de briga ou assalto. Encontrei meu amigo fechando o portão. - O que foi? perguntei - Qual remédio ele queria? - Ele não queria remédio não, queria que eu ligasse a balança eletrônica pra ele se pesar...... As mortes anunciadas Mais de 500 pessoas morreram no território nacional do fim do ano passado até hoje. Vítimas de tempestades e temporais. A natureza dá suas respostas aos desmandos, à irresponsabilidade de políticos e governantes que só olham para as catástrofes quando as mortes ganham altos índices. Descaso Muitos se contentam em observar as cenas e a produzir platitudes: "catástrofes infelizmente acontecem". O Brasil é um laboratório mundial da ausência de planejamento urbano e descaso com a anatomia das cidades. Todos os anos, centenas de famílias choram as mortes anunciadas nas inundações. Decalagem Um governo eficaz tem aptidão para prever problemas e antecipar soluções. Usa a técnica da "decalagem" (avanço), a capacidade do atirador, que calculando a distância e a trajetória do alvo móvel, acerta-o em cheio, disparando um pouco à frente do ponto escolhido. Mas a ausência de planejamento se faz ver em toda a parte. A estética das ruas O país vê se avolumar o número de pedintes, mendigos, moradores de rua, corpos estirados sob pontes e viadutos. A estética urbana é um desfile de pessoas enroladas em trapos e escondidas em caixas de papelão. Os espaços de concentração de consumidores e vendedores de drogas se expandem, como a cracolândia na capital paulista ganhando manchetes, repressão e choques com a polícia. O país da miséria se apresenta por inteiro. Mais da metade Mais da metade dos 5.574 municípios brasileiros está no universo da pobreza ou da extrema pobreza. A fila dos auxiliados pelas migalhas dos pacotes assistencialistas dobra quarteirões. Hoje, o total de famílias dentro do programa é de 18 milhões, mas a fila que está fora dá voltas pelo perímetro das principais cidades do país. Este é o pano de fundo que se desenha a um pouco mais de quatro meses das eleições. E é claro que a necessidade de abastecer a barriga se fará presente dia 2 de outubro. A negritude Este analista põe os seus sentidos no campo de observação do "pretagonismo", termo que toma emprestado da biblioteca da perspicaz jornalista Flávia Oliveira, cujos livros ao fundo na Globo deixam títulos bem visíveis. Há, ali, um livro sobre o protagonismo dos negros. Pois bem, feita a observação, minha inferência: os negros expandem, mesmo de maneira lenta, sua participação na vida social e política do país. Nos espaços midiáticos, a partir de anúncios publicitários, sua presença tem sido marcante, sobressaindo-se mensagens de cunho alegre e lindas imagens de mulheres e homens negros. Na política Não podemos dizer, ainda, que os negros tenham conseguido chegar ao patamar dos "brancos" (a cor nacional preponderante não é essa). A proporção de negros no Brasil é de 56%, mas sua participação nas eleições para deputado Federal, entre 2014 e 2018, foi de 40%. Defasagem de 16 pontos. O fato é que a defesa da diversidade, da inserção negra na esfera da política e de outros espaços da vida social, ganha tons mais altos nesses tempos de elevação do discurso sobre os direitos humanos. Artigos e análises sobre o tema inundam as searas midiáticas. Milton Gonçalves Cheguei a engatar bons papos com o excepcional ator Milton Gonçalves, como eu, um dos integrantes do Conselho de Desenvolvimento Econômico e Social, o Conselhão, por ocasião do governo Michel Temer. Participávamos do mesmo grupo de discussões. Um brasileiro com firme convicção política. Um cidadão que pensava bem o seu país. Um ator, cujos feitos, filmes e peças teatrais, orgulha o painel das artes e da cultura nacionais. Rejeição Sei que muitos eleitores e leitores não acreditam em pesquisa. Mas uma coisa parece certa. O índice de rejeição aos principais candidatos é alta. Segundo pesquisa do BTG Pactual/FSB, divulgada nesta segunda-feira, 59% dos entrevistados não votariam em Jair Bolsonaro de jeito nenhum. Ciro ganha a segunda posição com 49% dos entrevistados e Lula alcança o índice de 43%. Rejeição quer dizer: não votarei nessa pessoa nem que a vaca tussa. E agora? Há chance de O Imponderável nos visitar até 2 de outubro? Marcio França Segunda, no SEAC-SP, Marcio França, do PSB, em palestra para empresários de serviços, garantiu que irá até o fim em sua campanha ao governo de São Paulo. Está firme e confiante que tem "grande chance de ganhar". Rodrigo Garcia Usa bem os espaços publicitários do PSDB para se apresentar. Pode crescer. Principalmente, ante eventual polarização com Tarcísio de Freitas, candidato de Bolsonaro, e Fernando Haddad, do PT. Márcio França corre pelo meio. Simone Tebet Precisa usar melhor a mídia eleitoral do MDB. Uma grande barreira a impede de crescer: o desconhecimento por parte do eleitorado. É preparada e de boa fluência ideativa. Marqueteiros Precisam se convencer: o marketing antigo não mais funciona em tempos de eleitores que influenciam as redes sociais. Paulo Guedes De bicho papão, tornou-se camaleão. Adapta as falas para agradar à esfera política. Assume a cor do momento. Não mais contraria interesses da política. Flexível como um caniço ao vento. Lula Vez ou outra, esquece o meio e vira porta-voz da extrema esquerda ideológica. Nunca esquece os passeios pelo palanque. Bolsonaro Não tem jeito. Vai enfrentar as eleições com o discurso radical. Agrade ou não aos generais. Forças Armadas Avoluma-se o discurso de que "não haverá golpe". As quatro linhas da letra constitucional se transformam em slogan dos militares. O Nordeste Continua a ser o bastião avançado do lulopetismo. Muitos bolsonaristas atacam as pesquisas que dizem isso. O Sudeste No Sudeste, mais precisamente em São Paulo, Minas Gerais e Rio de Janeiro, está o Triângulo das Bermudas. Quem não afundar nas tormentas desse pedaço, ganhará a campanha. O Sul Já foi muito bolsonarista. Está amainando a imagem conservadora. Com 15% do eleitorado, mostra-se fugindo de Bolsonaro. O Centro-Oeste É a região bolsonarista por excelência. Mas o agro começa a arar o terreno das dúvidas. Será que o atual governante merece nossa confiança? Covid-19 Os hospitais do Sudeste acusam: a Covid-19 ganha novo impulso na região. O patamar móvel nas últimas semanas tem registrado crescente aumento de internações. Os mais jovens se afastaram dos postos de vacinação. Teremos de conviver com o vírus por um longo tempo. A máscara veio para ficar. Redes sociais Esta é a mais consequente ferramenta usada pelo bolsonarismo. Sob os domínios do vereador Carlos Bolsonaro, filho do presidente, que sabe manobrar a arma de ataque do bolsonarismo. Uma torrente de fake news nos aguarda. Petrobras O presidente continua a fazer trocas no comando da Petrobras. Antigamente, o Conselho da Petrobras escolhia o presidente da empresa. Hoje, o presidente da empresa, nomeado pelo presidente da República, é quem escolhe os componentes do Conselho. Que tempos.... Pacheco e Lira Os presidentes das casas congressuais mostram-se no espelho midiático como protagonistas da defesa da institucionalidade. Arthur Lira, da Câmara, com falas mais estreitas e voltadas para os componentes do Centrão; Rodrigo Pacheco, do Senado, com falas mais abertas em defesa da democracia. Ambos tentando alargar as veredas do amanhã. Sobre o bem, o mal e o canibalismo a) Jung Carl Jung perguntou a um rei africano qual a diferença entre o bem e o mal. Às gargalhadas, o soba respondeu: "Quando roubo as mulheres de meu inimigo, isso é bom. Quando me rouba ele as minhas, isso é ruim". b) Humboldt Sugestão feita a indígenas por Alexander von Humboldt, geógrafo, filósofo, historiador, explorador e naturalista alemão nascido em Berlim, que deu início, em fins do século, a memoráveis expedições naturalísticas, considerado o fundador da moderna geografia física. "Não comam os outros". Resposta dos índios: "O senhor tem razão. Não podemos compreender que mal há nisso, pois os homens que comemos não são nossos parentes". Esse duplo padrão ético é a luz que ilumina nossa representação política e nossos governantes. c) Um turco e um canibal Um turco se encontrou um dia com um canibal. "Sois muito cruéis, pois comeis os cativos que fazeis na guerra", disse o maometano. "E o que fazeis dos vossos?", indagou o canibal. "Ah, nós os matamos, mas depois que estão mortos não os comemos." Montesquieu arremata a passagem contada no livro Meus Pensamentos: "Parece-me que não há povo que não tenha sua crueldade particular."
quarta-feira, 25 de maio de 2022

Porandubas nº 761

Abro a coluna de hoje com uma deliciosa historinha do Brejo das Freiras, lá nos fundões da Paraíba, pertinho do meu torrão, Luis Gomes/RN. Lascou-se... Brejo das Freiras é uma Estância Termal nos confins da Paraíba, perto de Uiraúna e Souza. Trata-se de um lugar para relaxamento e repouso. O governo da Paraíba tinha (não sei se ainda tem) um hotel, com uma infraestrutura para banhos nas águas quentes. Década de 70. Apolônio, o garçom, velho conhecido dos fregueses da região, recebe, um dia, um hóspede de outras plagas. Pessoa desconhecida. Lá pelas tantas, quase terminando a refeição, o senhor levanta a mão, chama Apolônio e pede: - Meu caro, quero H2O. Susto e surpresa. Anos e anos de serviços ali no restaurante e ninguém, até aquele momento, havia pedido aquilo. Que diabo seria H2O? Apolônio, solícito: - Pois não, um instante! Aflito, correu na direção da única pessoa que, no hotel, poderia adivinhar o pedido do hóspede. Tratava-se de Luiz Edilson Estrela, apelidado de Boréu (por causa dos olhos grandes de caboré), empedernido boêmio, acostumado aos salamaleques da vida. - Boréu, tem um senhor ali pedindo H2O. O que é isso? Desconfiado, pego sem jeito, Boréu coça o queixo, olha pro alto, tenta se lembrar de algo parecido com a fonética e, desanimado, avisa: - Apolônio, sei não. Consulte o Freitas. Freitas era o diretor do Grupo Escolar, o intelectual da região. Localizado, o professor tirou a dúvida no ato: - H2O é água, seus imbecis. Quer dizer água. Água, água. Apressado, Apolônio socorreu o freguês com uma jarra do líquido. Depois, no corredor, glosando o feito, gritou em direção a Boréu: - Ah, ah, ah, esse sujeito achava que nós não sabia ingrês. Lascou-se! Panorama PSDB em chamas A renúncia de João Doria era algo previsível. Percebera há tempos que a prévia partidária, que ganhou, não tem a mesma força da convenção. A cúpula tucana o rifou. João ganhou prévias para a prefeitura e para o governo do Estado. E se submeteu à prévia para a candidatura à presidência. Ganhou, mas não levou. Coisas do Brasil. Fez uma excelente gestão no governo. O pai da vacina brasileira. O governante deixa um jardim na marginal do rio Pinheiros, que deixa de ser poluído. Reconhecimento? Mais tarde A história não lhe negará o reconhecimento. O torvelinho do momento e a dissonância criada na esteira do debate eleitoral abafam as análises lógicas, elevando as tensões emocionais. E a ambição de João, sua determinação em disputar cargos elevados o inserem na lista da desconfiança. O eleitorado se afasta, daí a rejeição ao nome. Mais adiante, poderá ser chamado pelo partido para um novo desafio. A conferir. E Tebet decola? A resposta requer um conjunto de situações: - boa visibilidade na mídia; - capacidade de aglutinar contingentes que integram o nem-nem (nem Lula nem Bolsonaro), principalmente setores médios e profissionais liberais; - aperto na economia, com baixo índice de Bolsonaro; - alta rejeição ao lulopetismo; - mobilidade - capacidade de visitar todas as regiões, a partir dos três maiores redutos eleitorais - São Paulo, Minas Gerais, Rio de Janeiro e Bahia; - apresentação de um projeto Brasil, que seja denso, consistente, com eixos que sejam simpáticos e tenham capacidade de laçar (loop) áreas e setores; - impregnar-se do conceito de "novidade", "renovação", "assepsia", "o espírito do tempo"; - Recursos para enfrentar uma campanha nacional. Uma bússola populista Jair Bolsonaro está desesperadamente à procura de uma bússola popular, algo que o amarre na árvore de atração das massas. A inflação e o pacote do auxílio Brasil, sob o encarecimento dos transportes e dos alimentos, corroem seu poder agregador. Pode isso lhe custar a eleição. Indignação das massas lá por setembro é uma ameaça ao esforço para recuperar votos perdidos. Os preços dos combustíveis serão contidos? A mudança no comando da Petrobras poderá se tornar insuficiente para alargar o caminho bolsonarista. Nordeste O governo conta com um grande trunfo no Nordeste: a transposição das águas do São Francisco. A água do velho Chico está chegando à região. As obras compõem a estética da zona rural, com máquinas trabalhando dia e noite. A água, para o nordestino, é um sonho acalentado desde sua tenra idade. A chuva é uma festa, mas depender de chuvas tem sido um exercício de expectativas revertidas. Choro e vela. E fome. A água As maiores alegrias para este escriba, em sua infância, vinham dos céus. Chuvas torrenciais, relâmpagos e trovões faziam a alegria da garotada, que, nas ruas, corria para as bicas formadas nos tetos das residências e prédios do comércio. E brincava de fazer "pequenos açudes", escavando no barro vermelho das ruas e juntando as águas das correntes. Que tempos bucólicos. Mas eram raras as chuvas. E a paisagem de caminhões-pipa e água buscada longe, nas lagoas, no lombo de jumentos, eram cenas constantes em nossas vidas. Sonho realizado Por isso, a água do São Francisco chegando às cidades, saindo das torneiras nas casas, é uma chave que poderá propiciar uma torrente de votos para Bolsonaro no Nordeste. O PT certamente vai dizer que na administração petista, ao longo de 12 anos, fez a maior parte das obras que estão realizando o sonho nordestino. Não sei. Debate aceso. Recheado de números e ideias. Cada qual vai querer tirar uma fatia deste apetitoso bolo. A discussão vai longe. O fato é que um "milagre" fará do Nordeste uma "terra prometida". Pero Vaz de Caminha, cutucando Pedro Álvares Cabral, deve estar alegre: "ali, se plantando, tudo dá". Bons risos. SP e NE São Paulo, sozinho, tem cerca de 36 milhões de votos; o Nordeste abarca cerca de 40 milhões. Quem levar a melhor votação nesses dois territórios deve se sentar na cadeira presidencial. Claro, garantindo também bons índices em outras regiões. Renovação A renovação nas casas congressuais - Câmara e Senado - deve ultrapassar os 50%. Pode chegar a 60%. A conferir. Biden e a fogueira Na Coréia do Sul, respondendo a uma pergunta, Joe Biden, presidente dos EUA e maior protagonista ocidental na esfera política, admitiu que usaria força para defender Taiwan. A China, pertinho, ouviu a resposta. E, assim, a Guerra Fria vai se tornando quente. Os Beatles? Que triste. No Reino Unido, 1 em cada três da geração Z - aqueles que nasceram entre a 2ª metade dos anos 90 até o ano de 2010 - não conhece os Beatles. Não sabem o que estão perdendo. Prova de fogo Já se especula que Lula não irá a debates. Bolsonaro também deve se recusar. Ora, um debate é a oportunidade de o eleitor tirar a limpo suas interrogações. E definir seus rumos. Sugiro dois debates com três candidatos. Um no início da campanha, outro em final de setembro. Lesmas e camaleões Quem sabe a semelhança entre a lesma e o camaleão? Aparentemente, quase nada, a não ser o fato de que ambos podem se arrastar pelo chão. Estudando atentamente as qualidades desses dois animais, identifica-se em ambos algo semelhante: a capacidade transformativa. O pequeno molusco, atingido por uma camada de sal, derrete e se transforma em água. O garboso lagarto, por sua vez, tem a capacidade de vestir as cores do ambiente em que se instala, saindo do verde das folhas para o marrom dos galhos secos com a maior facilidade. Símbolos Esses dois transformistas serão os principais símbolos da campanha eleitoral. Centenas de candidatos sairão líquidos das urnas, atingidos pelo sal grosso jogado pelo eleitor, enquanto outros, camaleões sabidos, ganharão solidez porque passarão a ter a cor do galho do momento, correndo atrás de um cidadão indignado. Mudarão o modo de agir, de se comportar, de dizer que nunca disseram isso e aquilo e até tentando se desvincular de atos do passado e de perfis rejeitados. Lembram-se de alguém? Alexandre Todo líder possui uma qualidade notável: a de antever possibilidades, quando os outros só veem restrições. Dois casos clássicos demonstram a capacidade estratégica de um líder. O primeiro envolve Alexandre Magno. Quem conseguisse desatar o nó que unia o jugo à lança do carro de Górdio, rei da Frígia, dominaria a Ásia. Muitos tentaram. Foram a Alexandre. Ele tinha duas opções: desatar o nó ou cortá-lo com a espada. Optou pela via mais rápida e certeira com um golpe forte. Sabia que perderia tempo tentando desatá-lo. Colombo O segundo caso é o ovo de Colombo. Levaram um ovo para o almirante e pediram que ele o equilibrasse. Com um pouco de força, Colombo colocou o ovo em posição vertical sobre a mesa. A questão que se coloca aos candidatos: descobrir se possuem a determinação férrea de Alexandre ou a matreirice de Colombo. Já sabemos que alguns perderão a Ásia, chegando a outubro próximo com o ovo rolando sobre a mesa. Quem é Giordano? Esperem minha reflexão de fim de semana.
quarta-feira, 18 de maio de 2022

Porandubas nº 760

Abro a coluna com uma historinha do Ceará. Que mundo doido... - É o diabo, o mundo endoidou - exclamava Maneco Faustino nas ruas de Limoeiro/CE. E completava: - Veja vosmicê: tá se vendo estrela a mei dia; já hai galinha com chifre; cangaceiro dá esmola pra fazer igreja; já apareceu bode que dá leite; chove no Ceará em agosto. Muié já se senta em cadeira de barbeiro. Pedro Malagueta confirmava: - Tá mesmo, cumpade, o mundo endoidou. Tenho três filha, duas casada e uma solteira: as duas casada nunca tiveram menino; agora a solteira todos os ano me dá um neto... Panorama Vamos a nossa leitura sobre a paisagem político-institucional. Golpe A cúpula militar não aprova ideia de golpe. A caserna está comprometida com profissionalismo. E preocupada em manter sua boa imagem. Numa régua de 0 a 10, a hipótese de golpe é zero. Na visão deste analista, claro. Perna capenga A perna social do governo, o programa Auxílio Brasil, está mancando. Cerca de 1,3 milhão de pessoas estão na fila, aguardando cadastramento. E tome queixa dos desassistidos. Ruim para Bolsonaro e bom para Lula, relembrado como o pai do Bolsa Família. Se essa perna continuar a mancar, imenso contingente mostrará sua indignação nas urnas no dia 2 de outubro próximo. 62 milhões Falta grana no bolso de quase 62 milhões de brasileiros para pagar suas contas. A inadimplência aumentou 6% no mês passado, fazendo com que quatro em cada 10 brasileiros ficam com pendências junto aos birôs de crédito. Ruim para Bolsonaro. Baratear fica caro Brasduto - esta é a solução que os integrantes do Centrão estão maquinando para equacionar a falta de energia no país. Significa um aporte de R$ 100 bilhões para construir uma rede de termelétricas à gás perto de polos industriais, muitos longe dos consumidores. Uma ideia que vai encarecer muito o parque energético. Os recursos viriam do pré-sal. Regiões a serem contempladas: Norte, Nordeste e Centro-Oeste. A rede de gasodutos, comenta-se, atenderia aos interesses de Carlos Suarez, o S da construtora OAS, de onde saiu em 1996. E, claro, aos interesses do Centrão. Objeto: construção de um "centrãoduto". A inflação Bolsonaro minimiza os efeitos da inflação, que corrói a grana dos mais pobres. A inflação expande o custo dos alimentos, inflando o preço da cesta básica. O salário mínimo, hoje, tem um poder de compra bem menor do que no início da administração bolsonarista. Fala contundente Ouvi o discurso do presidente Bolsonaro no evento dos supermercados. Quase uma hora de fala aos gritos. Confesso que fiquei impressionado com sua exaltada expressão: abordou todos os temas, de improviso, usando exemplos e metáforas, ao lado de um desfile de palavras de baixo calão (tirar o meu da reta, porra, é foda e outras...). A impressão é a de que a fala aberta conquista ouvintes e é fator determinante para reforçar a cooptação de simpatizantes. Foi aplaudido diversas vezes. Um ataque duro ao lulopetismo e em defesa dos valores conservadores. Tucano se bicando... Os tucanos estão em alvoroço ante o incêndio que consome sua floresta. A cúpula tucana isolou o pré-candidato João Doria, que deixou o governo de São Paulo, submeteu-se ao filtro das prévias, ganhou a disputa e, agora, se vê "golpeado" por tucanos da cúpula. Há exceções, claro. Pegando fogo Fernando Henrique defende Doria por ter ganho as prévias. O próprio adversário, Aécio Neves, identifica um "golpe" contra João. Como se sabe, Doria e Aécio são desafetos e adversários políticos no xadrez do PSDB, mas a conjuntura colocou os dois no mesmo lado na reunião decisiva da Executiva Nacional tucana marcada para ontem, às 16h, na sede da legenda em Brasília. Como ficou o imbróglio? Até o fechamento desta nota, não havia informação de que Doria iria apelar para a Justiça para manter a decisão da prévia partidária. A direita dá um salto Surpreendente: 21% dos brasileiros simpatizam com ideias conservadoras, quase o dobro dos eleitores que se posicionam à esquerda, 11%. Este é o resultado de uma pesquisa feita pelo Senado junto a 5.850 pessoas entrevistadas. Trata-se de novidade. A impressão é a de que a esquerda havia tomado impulso nos últimos tempos. Mas, atenção: o grupo do nem-nem, nem esquerda, nem direita, nem centro, subiu de 50% para 55% de 2021 para cá. Em 2019, os centristas somavam 32%, em 2021, 11% e hoje somam apenas 9%. Na visão deste analista, deve haver um erro na metodologia. Como explicar a preferência do eleitorado para votar em perfis de esquerda? Lula terá votos conservadores? Essa é a dúvida que emerge. Será que o lulopetismo se alimenta de valores do conservadorismo? A hipótese parece não se sustentar. Pano de fundo: grande parcela dos entrevistados defende as urnas eletrônicas, diz ser contra a devastação ambiental e a expansão da população armada. Lavareda O cientista político, Antônio Lavareda, atesta: "essa tendência de uma guinada à direita vem ocorrendo desde 2012". Fenômenos da atualidade Nesta parte, passo a apresentar alguns fenômenos da atualidade. 1. O protagonismo evangélico Os evangélicos estão entrando de corpo e alma no território da política. Não apenas apoiando e lançando candidatos, mas lançando seus próprios nomes ao sufrágio universal. Evangélicos expandem suas bancadas e dão palpites em matérias diversas, a partir dos valores da família. E o Estado laico? A separação entre as coisas da religião e as coisas do Estado. Discurso ultrapassado. No MEC, faziam pressão, até com caravanas de pastores que frequentavam as antecâmaras do poder. "Dai a Deus o que é de Deus e a Cesar o que é de César?". Eis um princípio que já não entra nos ouvidos evangélicos. 2. O protagonismo militar Os militares também entram com mais vontade na seara da política, seja participando das máquinas administrativas nas áreas Federal, estaduais e municipais, seja como candidatos na esfera da participação eleitoral. Generais e coronéis tomam assento no Palácio do Planalto, têm remuneração aumentada com salários que se somam aos soldos e tomam decisões em setores estratégicos. Em suma, gostam desse tipo de participação. E parece desejarem continuidade nesse mister. 3. O protagonismo feminino As mulheres avançam no terreno da política e nos espaços midiáticos. Mesmo que esse protagonismo ainda não tenha conquistado maior número de parlamentares e governantes, são visíveis os sinais de empoderamento das mulheres, que agem de forma mais intensa e organizada nos painéis que discutem políticas de elevação da cidadania. 4. O protagonismo da LGBTQIA+ Lésbicas, gays, bissexuais, travestis, transexuais, queer, intersexuais, assexuais e outros grupos e variações de sexualidade e gênero, sob a bandeira da Associação Brasileira - LGBTQIA+ -, passaram a ter participação mais intensa nos foros nacionais do debate. Nas ruas e parques, sua presença se insere na estética dos novos tempos, de maneira desassombrada e consciente de seus direitos. 5. O protagonismo dos negros Os negros ganham respeito e espaço na vida institucional e política. Nos domínios midiáticos, integram programas jornalísticos, novelas e mídias publicitárias. Estão presentes em praticamente todos os meios, podendo-se inferir que avançam nos caminhos da elevação da cidadania. Mesmo que ainda sejam alvo de discriminação por parte de um ou outro indivíduo. 6. A ladroagem tecnológica Outro fenômeno da atualidade é a ladroagem que se expande pelas malhas da tecnologia. Hackers agem como ladrões tecnológicos, roubando cartões de crédito e senhas de usuários para surrupiar seus recursos. Os sistemas de segurança de bancos e lojas não garantem plena proteção aos consumidores, deixando janelas abertas ao crime. É a tecnologia usada pela criminalidade, que tende a ser uma mazela dos tempos modernos, aqui e alhures. A defesa da cultura Grupos de intelectuais se juntam para defender padrões culturais, tradições e costumes. Essa fortaleza de defesa é a esperança de que nossa cultura resista aos efeitos deletérios da globalização, que tende a apagar nossa memória. Partes de nossa história, parcelas de seus personagens, enredos e produção literária são frequentemente esquecidas ou jogadas no baú das coisas inúteis. Um desprezo ao passado. Felizmente, pessoas e grupos comprometidos com a cultura e as artes se unem em um cordão de proteção, buscando resgatar a semântica e a estética do ontem e trazendo à tona livros, poesias, imagens, quadros, crônicas, enfim, relatos que emolduram as páginas de nossa cultura. Um exemplo Querem um exemplo? Um grupo de acadêmicos - poetas, romancistas, cronistas - que integram a Academia Norte-rio-grandense de Letras. Quase diariamente, participantes do grupo nos brindam com a divulgação de acervos -, histórias, romances, crônicas, pinturas -, que pinçam dos recantos da memória. Nomeio alguns deles: Lívio Oliveira, prof. Ivan Maciel, Ivan Lira, Carlos Gomes, Iaperi Araújo, Prof. Benedito Vasconcelos Mendes, Leide Câmara, Humberto Hermenegildo, Edilson Nobre, Roberto Lima, Marcelo Alves, Armando Negreiros, Sonia Faustino, Diva Cunha, Marcelo Navarro, entre outros. Grupos assemelhados se espalham pelas unidades da Federação. Balões de oxigênio vitalizam a cultura brasileira. Um viva a esse Grupo! Casamento Lula casa, hoje, com a socióloga Rosângela da Silva, 55, Janja (Janjinha, como a chama). A noiva usará um vestido coberto de bordados feitos por moradoras de Timbaúba dos Batistas, cidade da região do Seridó, do Rio Grande do Norte. O evento é muito disputado. Terá cerca de 200 convidados. E mais de 500 esperando uma brecha. Malha ferroviária de passageiros A indústria ferroviária acaba de lançar um manifesto em que solicita ao governo investimentos para alavancar o desenvolvimento do sistema ferroviário regional de passageiros. Clama pelo marco regulatório do setor com vistas a maior segurança jurídica, garantindo que dispositivos já existentes, como o das autorizações ferroviárias, possam ser aplicados à área de passageiros, aumentando o rol de investimentos em infraestrutura nacional. O manifesto O manifesto, assinado por empresas e entidades, explica que, nos últimos 10 anos, a participação privada no setor metroferroviário urbano de passageiros aumentou mais de 300%. "A inexistência de um marco regulatório específico para o transporte regional de passageiros, segmento totalmente diferente do ferroviário de carga, em especial no que tange à operação, segurança, interface com os clientes e serviços ofertados, gera insegurança jurídica e instabilidade regulatória, que contribuem sobremaneira para o afastamento do mercado e o desinteresse pelo investimento privado", argumentam os manifestantes. EUA: cinco questões Na campanha entre Bill Clinton e Bob Dole, em 1996, cinco questões básicas relacionadas a valores permitiam prever se alguém votaria num ou noutro. Os que deram respostas predominantemente conservadoras votaram em Dole. Aqueles cujas respostas revelaram que estavam menos comprometidos com os valores tradicionais votaram em Clinton. As perguntas eram as seguintes: "1. Acredita que sexo antes do casamento seja moralmente errado? 2. A religião é importante na sua vida? 3. Já se interessou por ver pornografia? 4. Tem opinião mais desfavorável sobre alguém que engana o cônjuge? 5. O homossexualismo é imoral?" (Dick Morris em Jogos de Poder)
quarta-feira, 11 de maio de 2022

Porandubas nº 759

Recebi uma saraivada de protestos por não ter inserido a historinha que abre Porandubas. Volto ao modelo. E, como brinde, mais uma historinha no final. Então, aqui vai. Está "distituído" O major José Ferreira, cearense dos bons, amigo do padre Cícero, é quem relata: "Há muito matuto inteligente e sagaz, mas também há muito sujeito burro que se a gente amarrar as mãos dele pra trás das costas, ele não sabe mais qual é o braço direito nem o esquerdo... Eu também conheço matuto que, abrindo a boca, já sabe: ou entra mosca, ou sai besteira". O major continua a conversa: "Quando foi criado o município de Missão Velha, a escolha do primeiro intendente recaiu num velho honrado, benquisto e prestigioso, mas muitíssimo ignorante. Cabia-lhe o encargo de declarar instituído o município. Um dos "língua" do lugar seria o orador oficial. Ele, o chefe do executivo municipal, deveria dizer simplesmente: "Está instituído o município de Missão Velha!". Levou quinze dias decorando a frase, e, na ocasião da solenidade, exclamou: "Está DISTITUÍDO o município de Missão Veia". (Historinha captada pelo bom Leonardo Mota em Sertão Alegre - poesia e linguagem do sertão nordestino). A conjuntura Vamos iniciar a coluna com uma análise sobre o tema mais polêmico da atualidade. O golpe Analistas e articulistas de todos os calibres passaram a comentar, nas últimas semanas, sobre eventual golpe a ser desfechado pelo presidente Jair Bolsonaro caso venha a perder o pleito de outubro. Seria possível? Quais as condições objetivas para que isso ocorra? Que forças e recursos estariam ao lado do presidente? Faremos algumas observações. O argumento O argumento central de Jair Bolsonaro é a fraude no sistema eletrônico de voto. Nos últimos tempos, uma Comissão Especial do TSE, inclusive, com o apoio das Forças Armadas, tem tomado providências para ampliar a transparência do processo, de forma a sanar quaisquer dúvidas e questionamentos. Mas, pasmem, alguns militares defendem que o sistema de apuração tenha dois dutos: um, do próprio TSE, enquanto o outro correria diretamente para os quartéis. Ou seja, uma apuração paralela pelas FFAAs. P.S. O ministro da Defesa, em ofício, já pediu para ficar com ele a vaga na Comissão que cuida da transparência das eleições. Pediu para retirar daquela Comissão o nome do general Heber Portella. O TSE alega que não há "sala escura" no sistema de apuração de votos. Termo usado pelo presidente Bolsonaro. Sinais E onde estão os sinais de golpismo? A insistente peroração do presidente contra o sistema eletrônico de votação, contra o TSE e até contra o STF; o protagonismo assumido pelos militares na frente da apuração eleitoral; as manifestações da base bolsonarista em apoio ao chefe; expressões de uns e outros apoiadores do presidente na esfera política, entre outras sinalizações. Apoio social Emerge a questão: Bolsonaro contará com a força das ruas? A essa altura, é possível garantir que a maioria da comunidade nacional não daria endosso a uma escalada autoritária com a ocorrência de um golpe. Sem apoio, qualquer iniciativa golpista tende a ser repudiada. Não é possível fazer comparação com 1964 e muito menos traçar cenários de um Brasil ameaçado pelo comunismo. O mundo é outro, o Brasil é outro, o pensamento nacional mudou muito. Imagem do país No planeta globalizado, os países se alinham de acordo com interesses comuns, visões ideológicas, a índole. E a teia de interesses do nosso país abriga, hoje, potências econômicas e comerciais, identidade de propósitos políticos, na esteira de uma interpenetração ideológica. A imagem do Brasil iria ao fundo do poço, ocasionando pressões e contrapressões do mundo civilizado, se houvesse golpe. Não há regime que tenha forte sustentação caso se isole na paisagem internacional. Alas radicais É possível afirmar que Bolsonaro, sob o argumento de urnas eletrônicas fraudadas, possa contar com o apoio das alas mais radicais do bolsonarismo. Mas nem todos os grupos bolsonaristas aceitam tal hipótese. Falemos, então, em torno de 15% a 20%, uma minoria. Com a polarização acentuada, é previsível a tensão entre os contingentes que ocupariam as ruas. Não se descarta a hipótese de acidentes/incidentes, inclusive com a ocorrência de vítimas fatais. Ampla mobilização social funcionaria como um paredão de defesa da ordem democrática. Forças Armadas O presidente conta com o apoio de uma boa parcela da cúpula militar para realizar seu intento. Sabemos que o esforço de profissionalização das Forças Armadas tem ocorrido de forma gradual, desde o começo da redemocratização, sob a letra da Constituição de 88. Os militares se recolheram à caserna, deixando aos políticos e aos técnicos a missão de administrar a política e a burocracia estatal. Portanto, seria uma forte ingerência a ocupação da seara política pelos militares. Essa inclusão militar na área da política corrói a imagem das Forças. Ingresso na Administração Ocorre que o governo bolsonarista encheu os espaços da máquina administrativa com militares de escalões superiores, que deixaram a ativa para receber salários da administração Federal. Tal aproximação produziu uma leva de simpatizantes da continuidade administrativa. Muitos querem continuar com suas tarefas, enquanto outros procuram a própria caminhada eleitoral, tornando-se candidatos em praticamente todos os Estados da Federação. Esse núcleo, que tem assento nas proximidades do presidente no Palácio do Planalto, estará ao lado de Bolsonaro, apoiando suas estratégias. Cisão na área Nem todos os membros da cúpula militar topam a aventura golpista. Daí a inferência: haveria uma cisão na caserna. Parte das Forças estaria respaldando o Estado Democrático de Direito. Faltariam, então, condições objetivas para um salto autoritário. Generais e coronéis, aposentados ou na ativa, se alinhariam à ordem social, tentando demover o outro grupo, disposto a uma escalada dura no regime. A moldura política Os políticos terão um olho no novo governante e outro, nas ruas. Seguirão os passos da comunidade política. Agirão sob a bússola do pragmatismo. Por isso, se a derrota de Bolsonaro for por larga margem, tomarão posição bem antes da primeira semana de outubro. Entrarão em campo festejando o vitorioso, seja Lula ou outro. Importa saber que ventos do momento sinalizarão o lado em que se postarão os políticos. Diferenças Rodrigo Pacheco, presidente do Senado, mostra um discurso menos engajado que o de Arthur Lira, presidente da Câmara. Olha mais para o futuro, sob o compromisso de defesa do Estado Democrático de Direito. Lira olha para o presente, sob o comando de um grupo do Centrão, que caminha conforme sua orientação. Economia, o pêndulo Tenho lembrado e relembrado: a política navega nas águas das circunstâncias. E estas, nos meados do próximo semestre, serão balizadas pelos ventos da economia. Dinheiro no bolso, suficiente para alimentar as barrigas, será determinante na medição da temperatura social. Repito a equação BO+BA+CO+CA? (Bolso, Barriga, Coração, Cabeça). Brevíssimas... - O PSD deve liberar as bancadas, não fechando posição no primeiro turno. Em Minas Gerais, o candidato do PSD ao governo, Alexandre Kalil, apoia Lula. Outros líderes do partido, inclusive o presidente da sigla no Estado, senador Alexandre Silveira, dão apoio a Bolsonaro. - Tarcísio de Freitas (PR), candidato bolsonarista ao governo de SP, transferiu título eleitoral para o Estado há pouco tempo. Cumpre maratona de visitas ao Estado. - Marcio França (PSB) e Fernando Haddad (PT) tendem a ser candidatos por seus partidos ao governo de SP, impossibilitando uma aliança. - Os rachas regionais propiciarão palanques múltiplos a Lula e a Bolsonaro. O apoio a Jair deverá ocorrer em Mato Grosso, Mato Grosso do Sul, Amazonas e Rondônia. Há movimentos de aproximação no Ceará e na Paraíba. Lula teria palanque múltiplo em mais Estados. - O papa Francisco numa cadeira de rodas integrará a estética do Vaticano nos próximos tempos. Artrose no joelho. -Putin não se cansa. Espera a hora de apertar o botão de seu arsenal balístico. Faz ameaças quase diárias aos países da OTAN. Mas, na comemoração da Guerra Cívica, segunda, 9, conteve-se. O desfile militar nas muralhas do Kremlin foi pomposo. E o mundo ouviu um discurso tradicional. - Putin parece mais pesado e menos vigoroso. - Suécia e Finlândia estão sendo empurrados por Putin para a OTAN. - O presidente da Ucrânia, V. Zelensky, tomou gosto pelo degrau da fama. Quase todos os dias dá boas-vindas a celebridades. Essa guerra vai longe. - Os regimes autoritários ganham força no planeta. - O mundo se prepara para implantar uma Nova Ordem. O realinhamento ideológico de países fará lembrar os anos nervosos da Guerra Fria. A essa altura, é possível enxergar a China e a Rússia liderando uma das bandas do planeta. Fechando a coluna. "Você tá morto, cara" O caso deu-se São Bento do Una/PE, nos idos de 60. O caminhão, entupido de gente, voltava de um jogo de futebol, corria muito, virou na curva da estrada. Foram todos para o hospital. Uma dúzia de mortos. Lívio Valença, médico e na época, deputado estadual do MDB, foi chamado às pressas. Pegou a carona de um cabo eleitoral, entrou na sala de emergência do hospital e foi examinando os corpos: - Este está morto. Examinava outro: - Este também está morto. O cabo eleitoral se empolgava: - Já está até frio. De um em um, passaram de 10. Lá para o fim, Dr. Lívio examinou, reexaminou, decretou: - Mais um morto. O morto gritou: - Não estou morto não, doutor, estou só arrebentado. O cabo eleitoral, servindo como paramédico, foi taxativo: - Você está morto, cabra, quer saber mais que o médico?
quarta-feira, 4 de maio de 2022

Porandubas nº 758

Brevíssimas... Por aqui...  - O presidente Jair continua apostando em intensa polarização da campanha eleitoral. Ele será responsável pela expressão radical de um lado. Vai dominar as redes sociais, onde Lula não é muito requisitado. - Artigo de Élio Gaspari na FSP, com muita repercussão, diz que o presidente ensaia um golpe, sendo a noite do dia 2 de outubro, uma espécie de prazo fatal para um movimento golpista, caso Bolsonaro perca as eleições. - Tenho dito e repetido, o fator determinante para a vitória ou derrota do presidente será a equação BO+BA+CO+CA= Bolso, Barriga, Coração, Cabeça. Dinheiro no bolso significa geladeira cheia, barriga satisfeita, coração (agradecido ou enfurecido), cabeça disposta a eleger ou a mandar o governante para casa. - Lula terá palanques múltiplos em alguns Estados. Mais do que terá Bolsonaro. - Alckmin, pasmem, está tentando se localizar na esquerda. Teve, até, de cantar o hino da Internacional Socialista no evento do PSB que emplacou seu nome como vice de Lula. - A propósito, respondendo a uma consulta da Coluna, Gilberto Kassab ouve os presidentes do PSD nos Estados, mas adianta que a tendência é a de liberar as bancadas. Eis o que levantou Kassab até o momento: RJ: candidatura própria (se não tiver, liberar). BA: coligação com Lula. AP: candidatura própria (se não tiver, liberar). PR: candidatura própria (se não tiver, liberar). RS: candidatura própria (se não tiver, liberar). AM: coligação com Lula. PA: candidatura própria (se não tiver, liberar) - O Instituto Paraná Pesquisas acaba de fazer sua pesquisa periódica em SP. Murilo Hidalgo manda para a coluna: Fernando Haddad, PT; 29,7%; Márcio França, PSB, 18,6% e Tarcísio de Freitas, Republicanos, 15,2%; nenhum, branco/nulo, 19,3%. Muito difícil para o ex-ministro de Bolsonaro ganhar em São Paulo. Já Marcio França tem chances se for ao 2º turno. - PSDB é um partido que terá de renascer das cinzas de seus rachas internos. -  Tendência de renovação da Câmara, na eleição de outubro, sinaliza mais de 50% do atual corpo parlamentar. - As manifestações de 1º de maio estiveram bem abaixo das expectativas. Para os dois lados: de Bolsonaro e Lula. - Lula, em um evento em Brasília, disse que Bolsonaro "não gosta de gente, só gosta de polícia". Cometeu a gafe e se desculpou junto aos policiais, acrescentando que queria dizer "só gosta de milícia". E de gafe em gafe, os governantes vão pavimentando sua estrada. - O pêndulo eleitoral vai ser alvo de especulação até as margens do pleito. Dados e relatos verdadeiros e falsos confundirão o sistema cognitivo nacional. - Interessante nessa campanha: grupos familiares repartindo-se para os dois lados, situação e oposição. - Bolsonaro usa bem a mídia: faz manchetes com suas tiradas radicais. - A última: o presidente brasileiro, que não foi convidado mais uma vez ( 3ª vez) a participar do G7, sugeriu ao embaixador da Turquia uma comitiva de chanceleres de alguns países, Brasil na frente, para visitar Putin, em Moscou, e articular com ele o final da guerra na Ucrânia.( O Itamaraty ficou calado ante tal disparate.) - Por que Elon Musk comprou o Twitter? Resposta: para encher mais ainda o bolso. Não tem compromisso com ética e moral. - Mesmo que tenha perdido dinheiro com a baixa nas ações da Tesla, por causa da compra do Twitter, Musk olha para o império do amanhã, as tecnologias avançando, 5G chegando, sob a certeza de que o domínio e o poder dependerão, cada vez mais, do mando sobre as telecomunicações. - O interessante em Musk é que ele já tirou a máscara: vai permitir que a mentira se faça presente em sua rede tecnológica, ao lado de fatos. Basta que os dólares entrem em seus cofres. - A guerra na Ucrânia trará necessariamente uma nova ordem internacional. Com o ressurgimento de sinais dos tempos da guerra fria. - Jornalistas amigos de Vladimir Putin, que conhecem sua alma, dizem com todas as letras: o ex-agente da KGB não sairá derrotado. É capaz, para amaciar seu ego, de utilizar o arsenal nuclear da Rússia. E apertar um botão para destruir Berlim, Viena, Paris, enfim, para acionar os mecanismos de uma 3ª guerra mundial. - Este analista, em 50 anos de atividade, considera que avançamos, de maneira açodada, em direção ao caos. - A China sinaliza que fecha posição com a Rússia. E ataca o Ocidente. - A China voltou a ver a Covid-19 baixar nas grandes cidades, como Xangai e Pequim, com muita força. - Putin estuda com seus generais a melhor alternativa para conter o envio de armas para a Ucrânia pelos países da OTAN. Nada mais óbvio: por meio do ataque balístico. Não se trata de exagero. -  Os bilionários russos começam a sofrer grandes perdas. E acusam Putin. Que está lhes dando uma banana. - O chanceler russo, Lavrov, com sua bola fora: Hitler tinha sangue judeu. Israel protesta. E o mundo, em pasmo, indaga: não há mais vergonha, dever, direito à verdade nessa Torre de Babel? (P.S. Zelensky, o presidente ucraniano, é judeu). - Joe Biden começa a impor seu estilo de enfrentamento. Já mandou montanhas de dinheiro e armas para a Ucrânia. E sempre disposto a mandar mais. Pediu ao Congresso a aprovação de mais 30 bilhões de dólares para mandar aos ucranianos. - Trump no olho do furacão: em um livro que acaba de sair, seu ex-secretário de Defesa, diz que ele sugeriu aos policiais atirar na perna dos participantes de um evento antirracista. - O ex-presidente continua mantendo estreita articulação com os republicanos. Poderá voltar à Casa Branca em 2024. -  A Alemanha e seu dilema: mandou armas para a Ucrânia. Mas continua a comprar o gás da Rússia. Que, agora, paga em rublos. Outros países da OTAN enfrentam o mesmo dilema. - A França de Macron se prepara para um novo período, sob a égide de um governante mais experiente e com vontade de endurecer em algumas áreas. - A Venezuela saiu do mapa mundi? Ou mesmo do mapa latino-americano? Maduro passou a ser verde em matéria de afastamento midiático. - Amigos que chegam da Europa estão assombrados com o mal conceito do Brasil nos últimos tempos. - Em Lisboa, brasileiros invadem praças, museus e restaurantes. Portugal fica ali na esquina. Vai e vem. E na esfera das ideias?  Tratemos, na coluna, de um tema muito sensível aos candidatos: rejeição. - Rejeição a candidato é coisa séria. Não se apaga um índice de rejeição da noite para o dia. O maior adversário de certos candidatos é uma rejeição em torno de 30% a 40% dos eleitores. - Os nossos dois principais candidatos estão com altos índices de rejeição, na margem dos 50%. Um perigo. - Em um colégio eleitoral de 35 milhões de eleitores, como é o caso do estado de São Paulo, uma rejeição maior que 30% é uma montanha difícil de escalar. Trata-se de uma barreira que pode derrubar qualquer candidato, principalmente se este for ao segundo turno de uma campanha majoritária. - Quando um candidato registra um índice de rejeição maior que a taxa de intenção de voto, é bom começar a providenciar a ambulância para entrar na UTI eleitoral. Caso contrário, morrerá logo nas primeiras semanas do segundo turno. - A rejeição deve ser convenientemente analisada. Trata-se de uma predisposição negativa que o eleitor adquire e conserva em relação a determinados perfis. Para compreendê-la melhor, há de se verificar a intensidade da rejeição dentro da fisiologia de consciência do eleitorado. - O processo de conscientização leva em consideração um estado de vigília do córtex cerebral, comandado pelo centro regulador da base do cérebro e, ainda, a presença de um conjunto de lembranças (engramas) ligadas à sensibilidade e integradas à imagem do nosso corpo (imagem do Eu) e lembranças perpetuamente evocadas por nossas sensações atuais. Ou seja, a equação aceitação/rejeição se fundamenta na reação emotiva de interesse/desinteresse, simpatia/antipatia. Pavlov se referia a isso como reflexo de orientação. - A intensidade da rejeição varia de candidato para candidato. Paulo Maluf era (e ainda é) um perfil  que sempre teve altos índices de rejeição. Passou a administrar o fenômeno depois de muito esforço. Mudou comportamentos e atitudes. Tornou-se menos arrogante, o nariz levemente arrebitado desceu para uma posição de humildade e começou a conversar humildemente com todos, apesar de não ter conseguido alterar aquela antipática entonação de voz anasalada. - Orestes Quércia era outro. Que tinha a rejeição inscrita na testa. - Os erros e as rejeições dos adversários também contribuíram para atenuar a predisposição negativa contra ele. Purgou-se, também, pelos pecados mortais dos outros. Maluf aprendeu bem a arte de engolir sapos. - Em regiões administradas pela velha política, a rejeição a determinados candidatos se soma à antipatia ao familismo e ao grupismo. O eleitor quer se libertar das candidaturas impostas ou hereditárias. Mas não se pense que o caciquismo se restringe a grupos familiares. Certos perfis, mesmo não integrantes de grandes famílias políticas, passam a imagem de antipatia, seja pela arrogância pessoal, seja pelo estilo de fazer política ou pelo oportunismo que sua candidatura sugere. Em quase todas as regiões do país, há altos índices de rejeição, comprovando que os eleitores, cada vez mais racionais e críticos, querem passar uma borracha nos domínios perpetuados. - A rejeição pode ser diminuída quando o candidato, indo a fundo nas causas profundas que maltratam a candidatura, enfrenta o problema sem tergiversação nem firulas. Pesquisas qualitativas, com representantes de todas as classes sociais, indicam as causas. Aparecerão questões de variados tipos: atitudes pessoais, jeito de encarar o eleitor, oportunismo, egomarketing. mandonismo familiar, valores como orgulho, vaidade, arrogância, desleixo nas conversas, cooptação pelo poder econômico, história política negativa, envolvimento em escândalos, ausência de boas propostas, descompromisso com as demandas da sociedade. - Para enfrentar alguns desses problemas, o candidato há de comer muita grama. Não se equaciona a rejeição de modo abrupto. Ao contrário, quando o candidato demonstra muita pressa para diminuir a rejeição, essa atitude é percebida pelo conjunto de eleitores mais críticos, que é exatamente o grupamento mais afeito à rejeição. E aí ocorre um bumerangue, ou seja, a ação se volta contra o próprio candidato, aumentando ainda mais a predisposição negativa contra ele. - Trabalhar com a verdade, eis aí um ponto-chave para começar a administrar a taxa de rejeição. O eleitor distingue factoides de fatos políticos, boas intenções de más intenções, propostas sérias de ideias enganosas. O candidato há de montar no cavalo de sua identidade, melhorando as habilidades e procurando atenuar os pontos negativos. É errado querer mudar de imagem por completo, passar uma borracha no passado e cosmetizar em demasia o presente. Mas é também grave erro persistir nos velhos hábitos. Mudar na medida do equilíbrio. Mudar sem riscos. - Todo cuidado com mudanças constantes e bruscas, de acordo com a sabedoria da velha lição: não ganha força a planta frequentemente transplantada.
quarta-feira, 27 de abril de 2022

Porandubas nº 757

Abro a coluna com uma historinha do comandante Idôneo. Idôneo, o comandante Em uma cidade fluminense, o chefe local era um monumento de ignorância. A política era feita de batalhas diárias. Um dia, o chefe político recebeu um telegrama de Feliciano Sodré, que presidia o Estado: - Conforme seu pedido, segue força comandada por oficial idôneo. O coronelão relaxou e gritou para a galera que o ouvia: - Agora, sim, quero ver a oposição não pagar imposto: a força que eu pedi vem aí. E quem vem com ela é o comandante Idôneo. (Historinha contada por Leonardo Mota, em seu livro Sertão Alegre) A crise - Breves comentários (Ideias para um papo entre amigos e adjacências....) - A quadra pós-carnavalesca não consegue esconder o temor que a crise político-institucional, com o perdão concedido ao deputado Daniel Silveira, chegue ao cume da montanha. Para piorar há outras fontes que alimentam a crise. - O Ministério da Defesa, comandado pelo general Paulo Sérgio Nogueira, em nota, repudiou a fala do ministro do STF, Luis Roberto Barroso, de que as Forças Armadas estariam orientadas a desacreditar nas eleições, por causa de fraudes na urna eletrônica. Fato que se soma ao episódio do indulto. - A Alta Corte do Judiciário e a Alta Corte governista estão com a expressão prestes a explodir. Mas o Supremo quer adiar qualquer decisão sobre o indulto, e não responder de imediato às demandas partidárias que chegaram à Casa da Justiça. - Os generais do Palácio do Planalto, a partir do general Luiz Eduardo Ramos, fizeram coro à nota do ministro da Defesa. Ou seja, a cúpula militar se faz presente à mesa de discussão. E teria se alinhado em bloco ao presidente. - O presidente Bolsonaro, em fala na Agrishow, em Ribeirão Preto/SP, referindo-se à demarcação de terras indígenas (marco temporal, que está em julgamento), disse que se o ministro Edson Fachin não atender o que o governo defende, teria duas alternativas: a) entregar as chaves do Executivo ao STF e b) não cumprir o que o Supremo determinar. Claro, sugerindo que seria esta sua alternativa. - O quadro da expressão litigiosa se agrava. - Não é ficção projetar um cenário de endurecimento, mais cedo ou mais tarde. - O pano de fundo é nossa própria trajetória. Ao longo de sua história contemporânea, o país tem atravessado ciclos sucessivos de democracia e autoritarismo. - Na área partidária, desde a Independência, o país já teve sete diferentes regimes partidários. - Um golpe militar criou o Estado republicano, em 1889, surgindo, em 1891, a primeira Constituição. Tivemos um período democrático até a revolução de 30, quando se constituiu o governo provisório de Vargas. -Depois, tivemos novos atos de força, que geraram o Estado Novo e a Constituição de 1937. Abrimos mais um ciclo democrático com a Constituição de 1946, interrompido pelo golpe militar de 1964 e o regime ditatorial. - Em 1985, instaura-se a 4ª República, consolidada pela Constituição de 1988, que passou exprimir a emergência dos grupamentos sociais na composição do poder. - A ciclotimia que tem balizado o sistema político nacional tem muito a ver com a situação de deterioração do país e o consequente estado de ânimo das elites e das massas. - O regime militar só pegou, porque o ambiente social, conturbado, abria condições para sua implantação. As classes médias acorreram às ruas em passeatas. - E o que tem isso com a atual situação do país? Hum, tristes lembranças. Não se pode deixar de ver um certo movimento embrionário, recheado de indignação, que agita bases bolsonaristas. - Tem um razoável contingente que clama pelo endurecimento do regime. - Brutamontes capazes de fazer falta, ameaçar juízes, blindar amigos e parceiros, cooptar a classe política com recursos do orçamento, enfim, fazer gols violentos podem ser ovacionados pela torcida. - As forças democráticas estão de soslaio e com muito receio de que as coisas abram um espaço de caos. Um herói? - O Brasil está à procura de um herói. Mas o herói procurado não é aquele capaz de operar milagres, um São Jorge de espadas determinado a matar os dragões da maldade. Quem vestiu esse manto, como um ex-presidente alagoano, acabou sendo eleito presidente da República, mas foi tragado pelo tufão social, que forçou seu impeachment, a partir da maré de denúncias e escândalos vazados pela mídia. - Até outubro, o eleitor estará à procura de um herói. Será que já o encontrou? Se não encontrou, ainda, o eleitor tem cerca de cinco meses para achá-lo. - Ele não precisa apostar em heróis com a aura dos santos. Basta escolher um protagonista comprometido com os valores da democracia. O eleitor deve examinar os perfis, avaliar o passado, examinar suas propostas para o presente, compará-los entre si e escolher aquele que mais se afina ao ideal pelo qual luta. - Cuidado, eleitor: não compre gato por lebre. Há muito lobo querendo se passar por cordeiro. E há muito canalha desejando parecer santo. Ligeiros sinais dos tempos - A vitória de Emmanuel Macron, na França, permite aos franceses viver mais uma temporada sob a bandeira da democracia. Mas, aqui pra nós, a direita avançou. Marine Le Pen teve desempenho um pouco melhor que no pleito passado. Ficou menos radical. - O socialista Jean-Luc Mélenchon tem condição de ser o primeiro-ministro? Se fizer maioria nas eleições legislativas que ocorrerão em 12 de julho... A tendência é que seja escolhida por Macron a ministra do Trabalho, uma mulher, Élisabeth Borne. Macron e seu primeiro-ministro, Édouard Philippe, estão verificando os registros tributários e potenciais conflitos de interesse entre os cotados para o ministério. - A direita cresce aqui, ali e acolá. Um pesado sinal dos tempos. A democracia não tem dado respostas suficientes às demandas sociais. - Trump foi condenado a pagar 10 mil dólares por dia se não entregar documentos autorizados a vir a público pela Justiça. - Os generais russos, quando vão despachar com Putin, levam as falas por escrito. Temem errar. Ou gaguejar? - Quem sai com a imagem arranhada nesses tempos turbulentos e de guerra é ele mesmo, Vladimir Putin, que calculou mal os custos para a Rússia. E recebeu péssima consultoria de seus generais. - Putin pode tomar uma decisão tresloucada por ver os EUA ajudando a Ucrânia com armas e dinheiro. A conferir. - Por aqui, com exceção do PT, partidos lançaram candidatos oficialmente. Lula não se pronunciou a respeito do indulto de Bolsonaro e ainda não disse que é candidato do PT à presidência da República. Parece, até, que espera por algo. O que seria? - Este analista tem ligeira desconfiança (incerteza?) sobre a candidatura de Lula. Um mistério cerca seu aviso, ainda não dado, de que será o candidato. - Bolsonaro, por sua vez, quer esticar a corda até vê-la esgarçada e prestes a se romper. Sua situação vai depender da economia. - P.S. Paulo Guedes testou positivo no Covid-19. Era muito prevenido. - O Centrão irá dar apoio ao presidente Jair até quando? - João Doria irá até o fim? É determinado, mas tem bom senso. O clima no PSDB está mais para um calor intenso. - João levou um "bolo" de Luciano Bivar e Simone Tebet. Havia um jantar dos três nessa segunda. Mas o presidente do União Brasil e a senadora do Mato Grosso do Sul não toparam jogar os holofotes ao ex-governador de SP e candidato (por enquanto) do PSDB à presidência da República. Mas sabe-se de um almoço apenas com os presidentes de partidos. - Eduardo Leite dá mostras de que recuou, deixando o terreno livre para João avançar. Mas se este não sair do lugar? - O general e ex-ministro Carlos Alberto dos Santos Cruz pôs seu nome à disposição do Podemos, partido ao qual se filiou. - Sérgio Moro sinaliza que não será candidato a nenhum cargo. Nem a deputado. Foi engolido pelas circunstâncias. - Simone Tebet tem conversado muito sobre economia e meio ambiente com grandes economistas e ambientalistas. É determinada. Mas irá até o fim? O tempo dirá... - A vida voltou ao normal? O Brasil voltou à velha rotina. E se tivermos novos surtos? A vida passou a valer menos? Na visão de muitos contingentes, sim. - Anita é o furacão brasileiro nas paradas musicais do planeta. A moça tem muita sensibilidade para o marketing. - O cara fez uma oferta: 41 bilhões de dólares. Os donos do Twitter não aceitaram. "Peraí, é assim? Vocês gostam de dinheiro?" Então, coçou os bolsos e mandou: "aqui estão mais 3 bilhões de dólares". Dobrou os donos e comprou o Twitter. Elon Musk, o homem mais rico do mundo, faz o que quer. Até inventou uma viagem espacial. - O novo dono do Twitter preside quatro empresas das quais ele é o cofundador. São elas a Tesla (montadora), SpaceX (sistemas aeroespaciais), Neuralink (chips cerebrais) e a The Boring Company (infraestrutura). - O principal negócio do bilionário é a fabricante de carros elétricos Tesla, que tem como missão acelerar a transição mundial para o uso de energias sustentáveis. Já a firma aeroespacial Space X se tornou a primeira empresa privada a enviar astronautas para a órbita terrestre em maio, numa parceria com a Nasa. - Uma excentricidade. "Desafio Vladimir Putin para um combate individual. A aposta é a Ucrânia", tuitou Musk. O empresário usou o alfabeto cirílico, utilizado pelos russos, para escrever o nome de Putin e alguns trechos da mensagem. - Até onde Elon Musk irá?
quarta-feira, 20 de abril de 2022

Porandubas nº 756

Abro a coluna com uma historinha do Piauí. Mão Cheinha era louco e muito querido no Ceará, conta Sebastião Nery. Um dia, levaram-no para o Sanatório Meduna, no Piauí. Mão Cheinha, muito vivo, acabou virando louco-chefe. Tomava conta dos outros e era respeitado por isso. No sanatório, havia um pé de mangueira que nunca dava fruta. Mão Cheinha achava que a mangueira tinha de produzir manga. Chamou oito loucos: - Olha, minha gente, vocês todos são mangas maduras. Vão lá para cima. Quando eu gritar, as mangas vão caindo, porque manga madura cai. Manga madura sempre cai. Uma a uma. E chispem. Subam. Os oito subiram. Mão Cheinha, de baixo do pé de mangueira, gritou: - Manga um! Pluf! O primeiro louco se esborrachou no chão aos gritos de "ai, ai, ai". - Manga dois! Manga três! Manga quatro! Iam se largando lá de cima e arrebentando-se cá embaixo. Gritos e mais gritos. O louco-chefe mandou: - Manga sete! Nada. - Manga sete! Nada. - Manga sete, seu p...! O sete respondeu: - Mão Cheinha, chama manga oito, pois eu ainda estou verde! Brevíssimas Observações para iniciar uma conversação. -PSDB, seja qual for o desfecho, será um partido fragmentado, desunido, desestruturado. - Bolsonaro ganha uns pontinhos na intenção de voto por causa do programa de auxílio e ainda porque a vida está voltando ao normal - a pandemia começa a ficar para trás. - Lula passou a amedrontar por causa de suas recentes falas que lembram o velho Lula de palanque: a classe média é escravista, vai revogar a reforma trabalhista e as bases sindicais deveriam fazer mobilização diante das casas dos parlamentares em vez de gastarem fortunas indo à Brasília. - Campanha de São Paulo, com Haddad na frente, é um retrato do momento. Rejeição ao petismo em São Paulo é recorde no país. É difícil que o PT eleja Fernando Haddad para governador de SP. - Federação de partidos é uma alternativa sem futuro. Poucas federações e muita desconfiança. Quatro anos juntos? Para o país, é uma grande temporada. - Motociatas de Bolsonaro são mais uma opção de passear de moto. Engajamento ideológico é pequeno. - Estão fazendo comício, aqui, ali e alhures. Não pode haver comício agora. TSE faz de conta que não vê. - Marcio França, se for ao 2º turno com Haddad, levará a melhor. O mesmo pode ser dito em relação a Rodrigo Garcia, o vice que assumiu no lugar de João Doria. - Campanhas gastarão a maior grana que já se viu em verbas partidárias. Fundão chega a R$ 5 bilhões. - PT poderá fazer a maior bancada de deputados Federais. - MDB, que liderou a lista de maior partido desde a eleição de 1986, perde o trono. Sai fragmentado. - Baleia Rossi é bem articulado e tem conseguido segurar o partido. Mas as velhas raposas do MDB já tomaram seu rumo. - As mulheres terão boa votação na campanha. Este analista projeta aumento da bancada feminina. - As bancadas especializadas - agronegócio, profissionais liberais, policiais, mulheres, negros etc. - tendem a adensar sua representação em função da maior organicidade social. - São Paulo, Minas Gerais e Rio de Janeiro formam o chamado Triângulo das Bermudas e decidirão o pleito. São Paulo, sozinho, tem 35 milhões de votos. - Alguns nomes são considerados puxadores de votos: Boulos em São Paulo; Dalagnol no Paraná; Datena em São Paulo; Roseana Sarney (MA); José Serra, em SP; José de Abreu (ator) (será candidato?); cantor Netinho, na Bahia; ex-governador Fernando Pimentel, em MG; Eduardo Bolsonaro (?) em SP, entre outros. Observação: é possível haver muita decepção. -Tem, ainda, a bancada bolsonarista de raiz: Zé Trovão (líder dos caminhoneiros); Mayra Pinheiro, ex-secretária da Pasta da Saúde, conhecida como capitã Cloroquina; Nise Yamaguchi, que integrava o gabinete paralelo no Ministério da Saúde; Queiroz, o operador da rachadinha. Interrogação: o ex-deputado Eduardo Cunha voltará? Dizem que sua filha ocupará o lugar do pai como candidata no RJ. - Eleição muito provável é a do ACM Neto ao governo da Bahia. O baixinho está bem situado. Breves Neste bloco, vamos tentar desenhar as paisagens que começam a se desenhar nos horizontes: 1. O fim de um ciclo - O país ainda não se libertou do ciclo autoritário. Bolsonaro consegue reviver problemas antigos. Tanto que os vídeos vazados do Supremo Tribunal Militar levantam as feridas e mortes da tortura. O tema tem passaporte para trilhar o discurso eleitoral. Campanha polarizada pegará fogo. 2. A família Bolsonaro - Fincou-se como uma forte estaca eleitoral. O mais radical, o deputado Federal Eduardo Bolsonaro, acaba de colocar Brilhante Ustra na galeria de seus heróis. Muita gente acredita nessa hipótese. Um torturador acabará ajudando ao deputado Bolsonaro se eleger mais uma vez com uma grande votação? Coisas da política brasileira. 3. Desconhecimento - Quanto a situações negativas envolvendo outros filhos, o presidente aprendeu com os caciques da velha política: faz tempo que não converso com o Renan (o número 4). Não sei o que faz. Foi mais ou menos esse o sentido de sua expressão sobre o filho, que mora com a mãe. Ora, isso até pode ser verdade. O que significa em outros termos: não controlo a vida de nenhum filho. Só faltaria dizer: que Renan, Renan? O Calheiros? 4. Joyce e Janaína - Ninguém atravessa um rio no mesmo lugar. Tanto Joyce Hasselmann quanto Janaína Paschoal não terão as mesmas votações extraordinárias da eleição de 2018. As águas do rio são outras. 5. A caciquia - Os caciques do MDB e de outros partidos não terão o poder de mando de outros tempos. Não elegerão facilmente seus apadrinhados. Mesmo o maior deles, o ex-presidente José Sarney, está debilitado. Renan Calheiros vai apoiar Lula em Alagoas. O voto de Lula no Estado já é dele, de Luiz Inácio, há muito tempo. Renan Filho é candidato ao Senado. 6. Sinais de renovação - Vai haver certa renovação, sim, nas casas legislativas. Mas não devemos esperar por uma grande mudança. O eleitor brasileiro é, no final das contas, mais conservador do que renovador. 7. Requião - O ex-senador Roberto Requião quer voltar ao governo do PR, governado por Ratinho Júnior. Este aposta em Bolsonaro. Requião, até que enfim, encontrou o partido onde sua linguagem é bem aceita. 8. O PT no RN - Fátima Bezerra, governadora, pode se reeleger pelo PT por ter liderado bem a política no Estado e porque os eventuais opositores estão com receio de enfrentar o poder da máquina. Fátima não tem adversários à altura. Ou tem? Apareceu um corajoso. 9. Fábio Dantas, do Solidariedade, ex-vice governador, será o candidato das oposições ao governo do RN. Na chapa ao Senado, estará o ex-ministro e ex-deputado Rogério Marinho. Fábio se convenceu de que o cavalo está passando na sua frente, pronto para uma corrida. Tem boa estampa e fluidez de pensamento. Impregna-se do "novo". Comenta-se que tem boas chances. A conferir. 10. O PT deverá fazer a maior bancada de deputados Federais. E fará uma bancada que dominará a política nos Estados. Será seu reencontro com a história. Será o último ciclo de importância no partido? Vai depender da saúde de Lula. 11. Luciano Bivar, do União Brasil, fechou uma Federação de Partidos. O problema que enfrentará: capital político para administrar todas as demandas que chegarem à sua mesa. A Federação que o PT fechou com o PV e o PC do B (Brasil da Esperança) já foi registrada em cartório. 12. O vice Mourão - Hamilton Mourão, o vice-presidente da República, será candidato a senador pelo RS. Terá de aprender discurso de palanque. E expressar o desejo de ser eleito. Mourão parece um ser superior. E ultrapassou os limites do bom senso, ao gracejar com a tortura. (Ver os áudios vazados do STM). 13. Kassab - Gilberto Kassab, presidente do PSD, deverá ter maior influência na política. Sabe articular, ouvir e administrar bem as pressões. Seja quem for o eleito, estará bem na próxima administração. 14. João Doria sempre foi determinado. Mas, nos últimos tempos, deixou a ponderação de lado. Se não se eleger, tchau. A política não perdoa. Recuperar um partido cindido é tarefa para um gigante, mas João ainda não tem esse corpo. Deixaria de ser candidato dando lugar a outro? Hipótese descartada... mas em política, o impossível acontece. 15. O melhor e mais competente consultor de João Doria é o ex-prefeito de Salvador e ex-governador da Bahia, Antônio Imbassahy, que tem feito o que pode. Um grande praça e um ótimo cabo eleitoral. Sério. 16. Fernando Haddad, voz corrente, está a um passo do Palácio dos Bandeirantes. Este analista, porém, ainda não acredita nesta hipótese. Vamos ver mais adiante. 17. Milton Leite é presidente da Câmara Municipal de São Paulo. Tem votos distritais, regionalizados. Qualquer boa aliança em São Paulo, capital, passa por suas decisões. 18. Simone Tebet não aceitará a posição de vice numa chapa presidencial, seja com Eduardo Leite ou outros. Simone é determinada. Tem um sonho. E é firme no seu ideário com o pai, Ramez Tebet. 19. Geraldo Alckmin cometeu a maior dissonância cognitiva de sua vida. Aos gritos, aos gritos (repito), fez elogios ao maior líder popular do Brasil - Lula. É um fato. Mas Alckmin gritando no microfone não combina com a imagem apaziguadora do ex-governador. Este analista de Porandubas, que tem em Alckmin um dos seus leitores semanais, teve de se beliscar para constatar que não era um sonho. 20. Onde está José Dirceu? Trata-se do quadro mais preparado do PT, sem querer entrar na polêmica de problemas na Justiça. Zé Dirceu foi o maior responsável pelo amadurecimento do PT. Domina muito bem a moldura política. Deve estar articulando por aí... 21. O Triângulo das Bermudas - Conhecida como a área que produz ciclones e derruba aviões, na região do Caribe, o Triângulo das Bermudas é o território que elegerá o próximo presidente. Juntos, SP, MG, RJ e ES tem mais de 50% dos votos do país. Só SP tem cerca de 35 milhões de votos, seguido de MG, com quase 20. Anotem. 22. Tempos de Odorico Paraguaçu, em Sucupira: compras de viagra e próteses penianas para o Exército. Este analista pensou que era uma pegadinha. Dias Gomes, o saudoso novelista, está gargalhando no túmulo. 23. FMI revisa para cima estimativa de crescimento do Brasil e corta previsão global. Tirano Maquiavel conta no Livro III dos Discursos sobre os primeiros 10 livros de Tito Lívio a história de um rico romano que deu comida aos pobres durante uma epidemia de fome e que foi por isso executado por seus concidadãos. Argumentaram que ele pretendia fazer seguidores para tornar-se um tirano. Essa reação ilustra a tensão entre moral e política. Mostra que os romanos se preocupavam mais com a liberdade do que com o bem-estar social.
quarta-feira, 13 de abril de 2022

Porandubas nº 755

Abro com uma historinha de Zé Abelha. As três pessoas No confessionário, Monsenhor era rápido. Não gostava de ouvir muita lengalenga. Ia logo perguntando o suficiente e sapecava a penitência que, sempre, era rezar umas ave-marias em louvor de N. S. do Rosário. Fugindo ao seu estilo, certa feita ele resolve perguntar ao confessando quantos eram os mandamentos da lei de Deus. - São 10, Monsenhor. - E quantos são os sacramentos da Santa Madre Igreja? - São 7, Monsenhor. - E as pessoas da Santíssima Trindade, quantas são? - São 3, Monsenhor. Monsenhor, notando que o confessando só sabia a quantidade, pergunta rápido: - E quais são essas pessoas? A resposta encerrou a confissão: - As três pessoas são o senhor, o dr. Didico e o dr. Zé Augusto. (Historinha contada por José Abelha em A Mineirice). Hoje, dedicarei o maior espaço da coluna para entrar na mente do eleitor. Afinal, quem e por que um candidato merece seu voto? O que se passa com seu sistema cognitivo? Adiante, algumas observações. Antes, um rápido painel. Brevíssimas - A terceira via terá imensas dificuldades para viabilizar um nome. - Lula estaria passando por problemas de saúde. - Geraldo Alckmin começa a não ter tanto apoio no PSB. - O STF será alvo de tiroteio na campanha. Tiros mais fortes. - Lula fala muito e começa a incomodar seus aliados. - Bolsonaro tem um índice de rejeição difícil de administrar. - Não seria surpresa para este analista se na hora H, Lula desistir. - Rodrigo Garcia tem melhores condições para ganhar o pleito de SP. - A União Brasil não terá coragem de indicar Luciano Bivar como seu candidato. - Candidatos importantes poderão ser objeto de intenso tiroteio pelos artilheiros que elegeram o discurso de corrupção no governo Bolsonaro. - Eduardo Leite pode arrumar um jeito de sair como candidato. - Ciro Gomes está demonstrando ser o mais preparado entre os candidatos. - Se Marine Le Pen levar a melhor no 2º turno da França, a UE entra em caos. - Macron deixa de ser franco favorito. Tem pequeno índice à frente. - Putin espera destruição total da Ucrânia. Questão de autoestima. Uma batalha em 5 rounds Uma campanha política é uma guerra com cinco batalhas. A primeira é a da viabilização dos nomes na convenção dos partidos. Depois, vem a batalha do crescimento, travada na campanha de rua. Em agosto, inicia-se o terceiro estágio, com o embate da programação eleitoral gratuita na televisão e no rádio. O quarto desafio é alcançar o clímax e a quinta frente de luta é contra o declínio, que geralmente atinge alguns candidatos antes do dia D. Para cada uma delas, são precisos munição, bala, investimentos em comunicação, mobilização e articulação de entidades sociais. Todas essas armas precisam ser compradas e, quem tem mais dinheiro, evidentemente, possui maiores condições de ganhar. Mas, às vezes, só a munição não garante a vitória e é preciso unir habilidade, tática e estratégia. Pobre ganha campanha? Sim, quando tem o apoio de entidades, movimentos sociais ou quando possui uma grande folha de serviços prestados à comunidade. Candidato não é sabonete O eleitor quer um candidato honesto e com experiência administrativa, mas que seja banhado pelo conceito da assepsia, da higienização política. O ideário da inovação e da renovação ganha espaço em meio a nomes carimbados do quadro nacional. Também quer votar em pessoas que passem a ideia de bons controladores do orçamento municipal. Nesse aspecto, as candidatas levam vantagem - a mulher sempre controlou o orçamento doméstico e transmite maior confiança. Chega ao fim o "candidato sabonete", apresentado como um verdadeiro produto para o consumo de massa e cuja imagem era construída via efeitos cosméticos e publicitários. Mostrar a cara A influência da Internet será maior do que nas eleições passadas, mas ela não constitui, ainda, um veículo fundamental. Os candidatos deverão receber muitas visitas nos sites. Nada substitui o contato pessoal do candidato com seu eleitorado. Diante da crise social, da desconfiança e da descrença, as pessoas sentem necessidade de ver seus candidatos de perto. Os políticos devem sair às ruas e andar pelas casas e pelos bairros. Mais importante do que os grandes comícios serão os pequenos encontros, como cafés da manhã, visitas, mutirões e carreatas. Cuidado com os dribles Que limites devem se impor àqueles que lidam com imagem de políticos e campanhas eleitorais? Primeiro há de se atentar para a significação da política, enquanto instrumento para satisfação dos interesses da sociedade e alavanca de mudanças. Os candidatos devem se amparar em um código de conduta, com espaço para valores como ética, verdade, franqueza, objetividade, transparência, todos inseridos no campo maior da dignidade humana. Tal escopo, porém, acaba corroído pela instrumentalização da política, que tem se tornado um empreendimento a serviço de indivíduos e grupos. A esperteza, o vale-tudo, a dramatização, os recursos artificiais, a hipocrisia e a insinceridade têm sido a tônica da cultura política, no ciclo da sociedade pós-industrial. A política e seus meios inspiram a personalização do poder, propiciando intensa competição utilitarista entre atores. Candidatos como sabonete estão sendo afastados. Dissimulação Os 150 milhões de eleitores brasileiros deverão ser envolvidos pela "feitiçaria" que a publicização política haverá de construir, nos próximos meses. Como podemos evitar a embrulhada engendrada pela atmosfera criada pela ditadura da propaganda eleitoral, já em pleno curso, apesar de proibida nesse momento pré-eleitoral? Primeiramente, identificando os pontos de saturação, que podem estar na cosmética exagerada sobre os perfis, operação que apresenta geralmente três graus de dissimulação: quando o perfil desaparece sem ser notado ou quando se impede que o tomem como tal qual é; quando o candidato exibe sinais e argumentos de que não é o que é; e quando ele, de forma hipócrita, finge e pretende ser o que não é. Ora, "nenhum homem, por maior esforço que faça, pode acrescentar um palmo à sua altura", diz a Bíblia, e alterar o pequeno modelo que é o corpo humano. Mesmo usando a engenharia de artimanhas do marketing. Há, de fato, cerca de 30 milhões de brasileiros que vivem em estado deplorável. O país mostra sinais de anomia e degeneração de valores. Mas tem uma base sobre a qual se pode navegar com segurança. Usar o acervo de mazelas, sob o artifício de emoções falsas, costuradas na colcha de diagnósticos por demais conhecidos, sem apontar caminhos e soluções para os avanços, é querer instrumentalizar a catarse coletiva, tirando dela proveito próprio. O bolso Eis a pergunta: "o que faz um eleitor preferir um candidato a outro"? Não há uma resposta fechada para a questão. Mas alguns elementos podem ser alinhados e, de sua combinação, pode-se chegar próximo a uma resposta razoável. Dependendo do candidato e da região, certos fatores pesam mais que outros. O primeiro apelo é o do bolso. Relaciona-se à luta pela sobrevivência e à necessidade de se garantir o alimento. É um dos impulsos básicos do ser humano, que age principalmente em épocas de contenção, crise e desemprego. Quaisquer propostas para garantir o sustento de pessoas e famílias, quando feitas de maneira crível e objetiva, laçam o interesse das pessoas. Um bom emprego ou a perspectiva de melhorar de vida simbolizam o eixo desse discurso. O segundo fator de interesse liga-se à região, ao município, ao bairro, à rua. Trata-se do fator proximidade, que, nos últimos tempos, tem despertado a intenção dos eleitores. O voto está ficando, cada vez mais, distritalizado, regionalizado. As pessoas querem ver melhoramentos nos espaços que as abrigam. Esses são fatores de natureza racional. Proximidade O terceiro elemento está voltado para a proximidade psicológica entre eleitor e candidato. Trata-se, no caso, do conhecimento que o eleitor tem do candidato, aí incluídos os contatos, a aproximação, a tradição familiar, o grau de intimidade. É como o eleitor estivesse votando em alguém da família. Outro tipo de apelo, próximo ao anterior, relaciona-se às indicações feitas pelo grupo de referência do eleitor - seus próprios familiares, vizinhos, amigos e companheiros de trabalho. O grupo funciona como guarda-chuva do candidato. Outro conjunto diz respeito ao próprio candidato. A começar por sua história pessoal e profissional. As circunstâncias Por último, a onda das circunstâncias. Os bons candidatos sempre recebem uma ajudazinha do clima psicológico do momento, que é formado pelos ventos que sopram a seu favor, e que o projetam como a pessoa que melhor cristaliza os sentimentos gerais e mais empatia provoca junto aos diversos grupos sociais. Esse vento aparece geralmente para oxigenar o poluído ar das campanhas. É mais ou menos assim: candidatos estão se devorando pela mídia, cada um atirando mais forte. De repente, aparece um candidato, com um discurso maior, integrador e positivo, forte e objetivo. Esse candidato, mesmo que comece por baixo, no início da campanha, tem condições de subir, paulatinamente, até ser considerado como o elemento novo na pasmaceira de uma campanha. Valores O eleitor leva em consideração valores como honestidade/seriedade; simplicidade; competência/preparo; capacidade de comunicação; entendimento dos problemas; arrogância/prepotência e simpatia. Sob outra abordagem, o voto quer significar protesto, um castigo aos atuais governantes e a candidatos identificados com eles, vontade de mudar ou mesmo aprovação às idéias dos perfis situacionistas. Neste caso, os pesos da balança assumem o significado de satisfação e insatisfação; ou confiança e desconfiança. A questão seguinte é saber qual a ordem em que o eleitor coloca essas posições na cabeça e por onde começa o processo decisório. Não há uma ordem natural. O eleitor tanto pode começar a decidir por um valor representado pelo candidato - simpatia, preparo, capacidade de comunicação - como pelo cinturão social e econômico que o aperta: carestia, violência, desemprego, insatisfação com os serviços públicos precários etc. Esses apelos disparam os mecanismos de escolha. Fidelidade? O eleitor brasileiro é fiel? No sentido abrangente, mais coletivo, a resposta é não. Há grupamentos fiéis, particularmente entre estratos médios, formadores de opinião, segmentos engajados nos partidos, setores religiosos, imigrantes de sangue anglo-saxão e pequenos núcleos ideológicos. Os grandes contingentes são amorfos, alheios ao cotidiano político e capazes de mudar de posição, de acordo com as circunstâncias e as necessidades mais prementes. A sinuosidade, a desconfiança, a versatilidade, a capacidade de adaptação aos espaços são traços de nossa cultura, decorrentes das grandes lutas pela conquista do interior, no início da colonização. A luta pela sobrevivência, a pressão da natureza e o mundo de hostilidades formaram o cinturão mutante que aperta o estômago nacional, sujeitando-o às circunstâncias e ao meio ambiente. O pessimismo O pessimismo induz o eleitor a se afastar dos políticos, que, indistintamente, ganham a pecha de "ladrões e corruptos". Os perfis populistas e messiânicos é quem levam a melhor, ao sintonizarem a linguagem com a imprecação popular. Não por acaso, o chavão "bandido bom é bandido morto, lugar de bandido é na cadeia", toca forte no coração das massas. Uma vitória do Brasil na Copa do Mundo seria uma catarse. E a catarse, com suas vertentes de emoção, vibração, êxtase e felicidade, acaba purgando pecados acumulados. Trata-se de uma formidável estrutura de consolação da sociedade. A psicologia dos eleitores Como são os tipos de eleitores sob a vertente psicológica? A divisão feita por Hipócrates mostra os coléricos, em que a excitação prevalece sobre a faculdade de inibição; os equilibrados, que podem ter reações rápidas e uma excitação igual à inibição, e, neste caso, são considerados "sanguíneos", com reações ágeis; enquanto os indivíduos com reações lentas são considerados fleumáticos, serenos, impassíveis. Por último, os tipos fracos, os melancólicos, que exibem a preponderância da inibição sobre a excitação. Formam, segundo Tchakhotine, o grande número de indivíduos que constituem as multidões e as massas, mais facilmente influenciáveis ou violáveis. Em suma, o discurso político leva em conta o ânimo social - a natureza do estado coletivo - e a tipologia comportamental dos cidadãos, agindo, com maior ou menor intensidade, sobre os mecanismos sensoriais de cada um. O discurso político é um agente poderoso de poder. A equação BO+BA+CO+CA Tenho escrito bastante sobre o uso de instintos em campanhas eleitorais, com destaque para o instinto nutritivo. Até formei uma hipótese que tenho usado para explicar o processo de decisão de voto, que parte do cinturão econômico é ciclicamente usado por governos para afrouxar ou apertar a barriga do eleitor. O "xis" da questão resume-se na equação BO+BA+CO+CA: bolso (BO) cheio enche a geladeira, satisfaz a barriga (BA), emociona o coração (CO) e induz a cabeça (CA) dos bem alimentados a recompensar os patrocinadores do pão sobre a mesa. E o troco, a recompensa? O voto na urna. A recíproca é verdadeira. Bolso vazio é reviravolta eleitoral. O Imponderável O eleitor frequentemente recebe a visita do Senhor Imponderável. O único que pode mudar a direção do vento.
quarta-feira, 6 de abril de 2022

Porandubas nº 754

Um final surpreendente. Freyre com y Abro a coluna com a lembrança de Gilberto Freyre (com Y), um nome que se eleva no panteão da sociologia brasileira. Final de 1963. Festa de Formatura da turma do 3º colegial do Colégio Americano Batista, na rua Dom Bosco. Paraninfo escolhido: Gilberto Freyre, que havia estudado no colégio durante seus primeiros anos. Este escriba foi escolhido orador da turma. Também era presidente do Diretório Estudantil, que tinha como secretário o amigo e grande escritor (falecido) Marcus Accioly. Fomos, em um pequeno grupo, até Apipucos (bairro longínquo), entregar a carta-convite. Subimos a bela escadaria. Um gostoso licor de pitanga nos foi servido, enquanto, ansiosos, esperávamos a chegada do mestre. Sentou-se numa espreguiçadeira e iniciamos a fala. Entreguei a carta por mim assinada. Olhou o envelope, abriu a carta e, para nossa imensa surpresa, disse: - Meus jovens, estou muito honrado com o convite. Até porque foi no Colégio Americano Batista que adquiri meus primeiros saberes. Mas vou devolver a carta. E esperarei que, na próxima semana, vocês a tragam, agora corrigida. Meu pai, Alfredo Freyre, quando recebia alguma correspondência como seu sobrenome grafado com I, ele a devolvia e pedia que os remetentes a corrigissem com o Y. Dessa forma, conservo a tradição. Surpresos e frustrados, saímos de fininho e nunca mais grafei um Freyre sem perguntar, antes, se o destinatário é com Y ou com I. Fiz o discurso de saudação. Recebi loas do paraninfo, que deixou o palco sob aplausos. É pena que não tenha mais esse discurso. P.S. A seguir, assistimos a um memorável show de Zé Vasconcelos e Lúcio Mauro, comediantes, que iniciavam sua trajetória profissional por Recife. Brevíssimas - Mais de 130 parlamentares, aproveitando a janela partidária, trocaram de siglas. - Lula promete demitir, caso seja eleito, cerca de oito mil militares. - Sergio Moro saiu arranhado do Podemos. - Eduardo Leite não descarta ser vice de Simone Tebet. - A reviravolta da Covid, na China, volta a causar medo no planeta. - Putin ganha a batalha, mas perde a Guerra de versões para a Ucrânia. - A jogada de João Doria, de ameaçar desistir, foi mais um tiro no pé. - O conservadorismo está levando a melhor nas candidaturas vitoriosas por alguns redutos. - Uma nova ordem mundial é o prenúncio de novos conflitos. - China é a pedra que pode desequilibrar o jogo. - Petrobras continuará a ser o calcanhar de Aquiles. - As eleições serão tumultuadas. Ante os cenários que se desenham. - A cada dia, fica mais difícil Lula levar no primeiro turno. Homo brasiliensis Nesse ano de eleições, não faltarão adjetivos para qualificar o homo brasiliensis, o nosso homem portador de vícios e costumes. A adjetivação para qualificar o homo brasiliensis é vasta e, frequentemente, dicotômica: cordial, alegre, trabalhador, preguiçoso, verdadeiro, desconfiado, improvisado. Afonso Celso, em seu Porque me Ufano do meu País, divide as características psicológicas do brasileiro entre positivas e negativas, dentre elas a independência, a hospitalidade, a afeição à paz, caridade, acessibilidade, tolerância, falta de iniciativa, falta de decisão, falta de firmeza, pouco diligente. Resumo de Freyre Nessa linha, Gilberto Freyre (com Y, conforme vocês leram na abertura) em Casa Grande & Senzala, pontifica: "Considerada de modo geral, a formação brasileira tem sido, na verdade, um processo de equilíbrio de antagonismos. Antagonismos de economia e de cultura. A cultura europeia e a indígena. A europeia e a africana. A africana e a indígena. A economia agrária e a pastoril. A agrária e a mineira. O católico e o herege. O jesuíta e o fazendeiro. O bandeirante e o senhor de engenho. O paulista e o emboaba. O pernambucano e o mascate. O grande proprietário e o pária. O bacharel e o analfabeto. Mas predominando sobre todos os antagonismos, o mais geral e o mais profundo: o senhor e o escravo". As mulheres na política A participação das mulheres na política vem de longe. Mais precisamente de 1928, quando a potiguar Alzira Soriano foi eleita prefeita do pequeno município de Lajes. Mas o sufrágio feminino só viria a ser promulgado por Getúlio Vargas em 1934. Portanto, foi uma pioneira. Bem como a primeira deputada eleita no Brasil e na América Latina, a paulistana Carlota Pereira de Queirós (São Paulo, 13 de fevereiro de 1892 - São Paulo, 14 de abril de 1982), médica, escritora, pedagoga e política. Madame Trudeau Uma curiosidade: a mãe do atual primeiro-ministro do Canadá, Justin Trudeau, também esteve da linha de frente da batalha da mulher pela emancipação política. Margareth Trudeau, então com 27 anos, calça jeans e uma t-shirt, por ocasião da visita do seu marido, o então primeiro ministro Pierre Trudeau à Cuba e Venezuela, dizia: "Não fiz nada de errado (pelo fato de ter voluntariamente se internado numa clínica para fazer psicoterapia). Se faço as coisas de modo autômato, sou considerada um robô. Não vou deixar que me distancie como acontecia no passado. Quero ser algo mais que uma rosa na lapela do meu marido". Outra mulher de político, Lady Bird Johnson, dizia: "o político deveria nascer enjeitado e permanecer solteiro". Uma pessoa "Não me considero uma mulher, e sim uma pessoa a exercer um ofício". (Indira Gandhi) O eleitorado feminino Na análise que faço sobre o eleitorado feminino, permito-me traçar algumas hipóteses, fruto das observações que venho fazendo ao longo de 40 anos de análise política. O pleito de outubro próximo será o mais racional para o eleitorado feminino, em outras palavras, será o pleito no qual a eleitora dará seu voto com maior convicção. Lembro que esse fenômeno advém do processo de organização da sociedade, em curso há alguns anos, e que tem na mulher um dos seus eixos. A mulher é quem mais sente o peso das carências nas áreas da saúde, educação, alimentos, transporte. Tende a buscar o perfil que mais se encaixe em sua moldura de necessidades. Escolherá o perfil independente do partido. A mulher lidera com 53% o voto no Brasil. O jovem Já o voto jovem, principalmente o do jovem com 16, 17 anos, será mais difícil de consegui-lo. O jovem descrê na política, a quem se refere como politicagem. Os políticos, regra geral, são ladrões. O desemprego que os afeta tem a ver com a irresponsabilidade dos governantes. Portanto, só mesmo um perfil que chame sua atenção poderá convencê-lo a ir às urnas. Nesse caso, vão buscar a figura que mais se identifique com os sinais de modernidade e inovação. Os cinturões do governo Avalia-se o desempenho de uma administração pela somatória de quatro campos de viabilidade: o político, o econômico, o social e o organizativo. O território social não passa de paisagem devastada pela improvisação. Medidas como as de combate à pandemia foram frouxas. Onde estão os pilares da política de saúde? Onde estão as políticas públicas para equacionar o déficit de seis milhões de unidades habitacionais para abrigar os 30 milhões de brasileiros sem teto? E o cinturão da gestão, da organização administrativa? Temos um ministério sem identidade. Colcha de retalhos Que eficiência se pode esperar de um ministério que é uma colcha de retalhos, com partes esburacadas, como as que abrigam ministros sob suspeita, envolvidos em escândalos, gente sem competência gerencial, quadros que vivem em torno de uma Torre de Babel? Como um país se dá ao luxo de ver 3% de sua safra perdida por causa da péssima condição das estradas? O cinturão econômico, esse também está mal ajustado. Trata-se de uma área que navega pelo piloto automático. O desemprego ultrapassa 15 milhões de brasileiros. O arrocho tributário alcança patamar nunca visto. A maldade é dos outros Certa feita, Carl Jung perguntou a um rei africano sobre a diferença entre o bem e o mal. Às gargalhadas, o soba respondeu: "Quando roubo as mulheres de meu inimigo, isso é bom. Quando me rouba ele as minhas, isso é ruim". Nessa mesma linha, Alexander von Humboldt indagou a índios da Amazônia a razão para não comerem os colegas. Os índios responderam: "O senhor tem razão. Não podemos compreender que mal há nisso, pois os homens que comemos não são nossos parentes. Quando pertencem a tribos inimigas, canibalismo neles". É o Brasil. Ainda sobre maldade Ainda sobre canibalismo. Um turco se encontrou um dia com um canibal. "Sois muito cruéis, pois comeis os cativos que fazeis na guerra", disse o maometano. "E o que fazeis dos vossos?", indagou o canibal. "Ah, nós os matamos, mas depois que estão mortos não os comemos". Montesquieu assim arremata a passagem contada no livro Meus Pensamentos: "Parece-me que não há povo que não tenha sua crueldade particular". P.S. Uma olhada nas cenas de guerra entre Rússia e Ucrânia atualiza a crença. Homem de papel No montinho de livros que esperam por minha leitura, o destaque vai para "Homem de Papel", de um dos mais celebrados autores da literatura brasileira, o potiguar e diplomata que honra Mossoró/RN, onde nasceu: João Almino. Ansioso para fruir a imaginação do João, que escolheu o conselheiro Aires, dos romances de Machado de Assis, como protagonista e narrador deste seu último romance. Apenas para lembrar, João Almino foi aclamado por suas obras, entre as quais, Ideias para onde passar o fim do mundo, Samba-enredo, As cinco estações do amor, O livro das emoções, Cidade Livre, Enigmas da Primavera e Entre facas, algodão. Seus livros foram publicados na Argentina, Espanha, EUA, França, Holanda, Itália e México, entre outros países. Desde 2017, João integra a Academia Brasileira de Letras. Editora Record. Orelha de Hélio Guimarães., prof. da USP, e posfácio de Abel Barros Baptista, da Universidade Nova de Lisboa.
quarta-feira, 30 de março de 2022

Porandubas nº 753

Abro a coluna com pequena aula de política. Aula de política Diálogo entre Colbert e Mazarino, durante o reinado de Luís XIV, na peça teatral Le Diable Rouge, de Antoine Rault: Colbert: Para arranjar dinheiro, há um momento em que enganar o contribuinte já não é possível. Eu gostaria, senhor superintendente, que me explicasse como é possível continuar a gastar quando já se está endividado até o pescoço. Mazarino: Um simples mortal, claro, quando está coberto de dívidas, vai parar à prisão. Mas o Estado é diferente! Não se pode mandar o Estado para a prisão. Então, ele continua a endividar-se. Todos os Estados o fazem! Colbert: Ah, sim? Mas como faremos isso, se já criamos todos os impostos imagináveis? Mazarino: Criando outros. Colbert: Mas já não podemos lançar mais impostos sobre os pobres. Mazarino: Sim, é impossível. Colbert: E sobre os ricos? Mazarino: Os ricos também não. Eles parariam de gastar. E um rico que gasta faz viver centenas de pobres. Colbert : Então como faremos? Mazarino: Colbert! Tu pensas como um queijo, um penico de doente! Há uma quantidade enorme de pessoas entre os ricos e os pobres: as que trabalham sonhando enriquecer e temendo empobrecer. É sobre essas que devemos lançar mais impostos. Cada vez mais, sempre mais! Quanto mais lhes tirarmos, mais elas trabalharão para compensar o que lhes tiramos. Formam um reservatório inesgotável. É a classe média! Parte I Panorama das candidaturas 1. A estrada aplainada Os tratores da política aplainam a estrada da política. Abrem os cursos mais estreitos, alargam as margens, limpam a terra no meio do caminho. O Centrão tem os maiores tratores. Mas todos os pré-candidatos usam seus meios e formas. Os mais endinheirados começam a compor suas equipes. E todos pensam em como avançar sem grandes empecilhos. Nenhum deles consegue. A desconfiança é generalizada na política e em seus protagonistas. Façamos uma análise das coisas inconvenientes. 2. Lula - PT Tem o percurso mais largo, nem por isso o mais fácil. O PT, mesmo com as vitórias de Luiz Inácio nas instâncias da Justiça, continua marcado com o sinal da desconfiança. Para começo de conversa, Lula não foi inocentado. Mas ganha a batalha da comunicação porque o julgamento das Cortes, principalmente, no STF, é que o processo contra ele foi mal conduzido, merecendo começar tudo do zero. Para efeito externo, ele foi inocentado. E mais: com os altos índices nas pesquisas, quem vai condenar Lula? Portanto, a primeira instância de Brasília vai esperar ad aeternum. 3. Costuras desajustadas As costuras feitas por Lula em torno de sua candidatura não são unanimidade no PT. Parte do petismo duro - as influências tradicionais - não aceitam algumas, nem mesmo a possibilidade de Geraldo Alckmin vir a compor a chama lulista. Marília Arraes, neta de Miguel Arraes, sai do PT para ingressar no partido de Paulinho da Força. E racha alguns partidos, mesmo que venha apoiar Lula. O mercado - o famoso corredor da avenida Faria Lima - ainda vira os olhos com medo do PT. E Lula promete o céu na terra, dizendo, entre outras coisas, que nem José Dirceu, José Genoíno e Dilma Rousseff serão aproveitados em seu eventual governo. 4. Bolsonaro - PL Recupera alguns pontos na avaliação do governo e no grau de confiança junto a setores que o viam, de modo desconfiado, mas continua o pré-candidato de um olho só: cheio de ódio, uso de termos ácidos, enaltecimento da ditadura, beneficiador de polícias e religiosos, luta do bem (ele mesmo) contra o mal (Lula). Acende todos os dias algumas luzes para o diabo. E acha que os eleitores que não votam nele são metade comunistas ou apaixonados pelo lulopetismo. Olhar completamente enviesado. Ainda por cima, cerca-se de militares sob a ameaça de que ele poderá ser o salvador da Pátria. 5. Moro - Podemos Sergio Moro entrou na vala comum dos políticos mortais, passando a conviver com as pressões e contrapressões da política. Passa a ser triturado pela máquina destruidora de reputações. Já não porta uma réstia de carisma, coisa que o beneficiava, antes de substituir os ossos do ofício. Não deverá alargar seu caminho, arrumando contingentes eleitorais ou formando frentes partidárias. Será massacrado pelo embate sangrento nas hostes políticas. 6. Ciro - PDT Ciro Gomes, mesmo com sua costumeira metralhadora giratória, tem dificuldades em se posicionar como alternativa. Atira livremente para todos os lados. E, ao invés de mostrar alto conhecimento do país, como é seu caso, prefere usar balas de canhão. Melhorou o discurso e a postura - obra de João Santana - mas não sai da linha de tiroteio. E o eleitor está saturado de tanto balaço. 7. Doria - PSDB João Doria faz um bom trabalho no comando do governo de São Paulo, é proativo, trabalhador, incansável. Mas faz o marketing de uma nota só. Até cunhei um nome para isso: egomarketing. O patrocinador número um das vacinas, grande articulador na área dos investimentos, cria rastilhos de pólvora por onde anda e também não é bem visto por alas tucanas. Ganhou as prévias de Eduardo Leite, governador do RS, que tem certo carisma. E poderia vir a ser candidato. Leite, se quiser, terá vida longa na política. Continua no PSDB, após renúncia ao governo do RS. 8. Simone - MDB Seria ótima opção se viesse a ser candidata de uma frente partidária. É desconhecida no país. Tem fluência ideativa, mas está muito longe das massas. 9. Luiz Felipe D'Ávila - Novo Desconhecido no país. Sem chances de empolgar as massas. 10. André Janones -Avante Sem condições - Aproveitamento de oportunidades. 11. Eymael - DC Sem condições- a musiquinha é antiga: um democrata cristão. 12. Luciano Bivar - União Brasil Sem condições - Poderá fazer uma grande bancada. 13. Vera Lúcia - PSTU Sem condições- Marcar presença. 14. Sofia Manzano - PCB Sem condições- Marcar presença. Parte II Lições do passado A morte de Sócrates Aos discípulos que o visitavam na prisão e o aconselhavam a fugir, Sócrates respondia: - "Uma das coisas em que acredito é no reinado da lei. Bom cidadão como tantas vezes vos tenho dito, é aquele que obedece às leis de sua cidade. As leis de Atenas condenaram-me à morte, e a inferência lógica é que, como bom cidadão, eu deva morrer." Narra Max Eastman, em ensaio sobre "O Mais Justo e o Mais Sábio dos Homens", que, ao se aproximar a hora fatal, rodeado de amigos, chega o carcereiro, a quem pergunta: - "Agora, você que entende dessas coisas, diga-me o que fazer." - "Beba a cicuta, depois levante-se e ande um pouco até sentir as pernas pesadas. Então, deite-se e o torpor subirá ao coração." Fez o que foi recomendado. Quando andava, lembrou-se de algo: - "Crito, devo um galo a Esculápio. Providencie para que a dívida seja paga." Deitou-se, fechou os olhos e quando Crito lhe perguntou se havia mais recomendações, ele já não respondia. Confúcio Quando Confúcio visitou a montanha sagrada de Taishan, encontrou uma mulher cujos parentes haviam sido mortos por tigres. Ele perguntou: - "Por que não se muda daqui?" - "Porque os governantes são mais ferozes que os tigres." Um pouco mais de Confúcio: "Se você quer ser sábio, aprenda a questionar razoavelmente, a escutar com atenção, a responder serenamente e a calar quando não tiver nada a dizer." O pensamento de Confúcio gira em torno da educação como fonte de virtudes. Ele prega três virtudes fundamentais: 1) A bondade, que gera alegria e paz interior; 2) A ciência, que permite dissipar as dúvidas, e; 3) A coragem, que afasta todas as formas de medo. Compartilharemos aqui algumas dessas frases de Confúcio que continuam válidas até hoje. Martin Luther King Em 28 de agosto de 1963, King discursou para um público de 250 mil pessoas em Washington. O discurso é uma das melhores peças de oratória contemporânea. Eu tenho um sonho "Estou feliz em me unir a vocês hoje naquela que ficará para a história como a maior manifestação pela liberdade na história de nossa nação. Cem anos atrás um grande americano, em cuja sombra simbólica nos encontramos hoje, assinou a proclamação da emancipação [dos escravos]. Este decreto momentoso chegou como grande farol de esperança para milhões de escravos negros queimados nas chamas da injustiça abrasadora. Chegou como o raiar de um dia de alegria, pondo fim à longa noite de cativeiro. Mas, cem anos mais tarde, o negro ainda não está livre. Cem anos mais tarde, a vida do negro ainda é duramente tolhida pelas algemas da segregação e os grilhões da discriminação. Cem anos mais tarde, o negro habita uma ilha solitária de pobreza, em meio ao vasto oceano de prosperidade material. Cem anos mais tarde, o negro continua a mofar nos cantos da sociedade americana, como exilado em sua própria terra. Então viemos aqui hoje para dramatizar uma situação hedionda. Digo a vocês hoje, meus amigos, que, apesar das dificuldades de hoje e de amanhã, ainda tenho um sonho". Fecho a coluna com pequenas lições de marketing. Primórdios do marketing político "Rastreie, vá ao encalço de homens de toda e qualquer região, passe a conhecê-los, cultive e fortaleça a amizade, cuide para que em suas respectivas localidades eles cabalem votos para você e defendam sua causa como se fossem eles os candidatos". (Quinto Túlio Cícero aconselhando o irmão Marco Cícero, o grande tribuno, em 64. A. C., quando este fazia campanha para o Consulado de Roma). O marketing de campanha O marketing político eleitoral abriga duas vertentes: o marketing massivo, voltado para atingir classes sociais e categorias profissionais, indistintamente; e o marketing vertical, segmentado ou diferenciado, voltado para atender agrupamentos especializados: profissionais liberais, donas de casa, formadores de opinião, núcleos religiosos, militares, funcionários públicos, etc. Nas campanhas, o marketing segmentado acaba assumindo tanta importância quanto o marketing massivo. E a razão está na intensa organicidade da sociedade brasileira. Ciclos da campanha Orientação para candidatos e assessores: estabelecer adequado cronograma dos ciclos da campanha, que, como se sabe, possui cinco ciclos: lançamento, por ocasião da Convenção; crescimento, entre quatro e cinco semanas após a Convenção; maturidade/consolidação, quando a campanha se firma no sistema cognitivo do eleitor, após ampla visibilidade; clímax, momento em que o candidato alcança seu maior índice de intenção de votos; e declínio, quando o candidato tende a cair nas pesquisas de opinião. Todo esforço se faz necessário para o clímax ocorrer na semana das eleições. A dosagem dos ciclos há de obedecer ao funil da comunicação - jogando-se mais água (volume de comunicação/visibilidade) na segunda quinzena de setembro. Candidato que começa a decair antes do tempo corre o perigo de morrer na praia. Planejamento de campanhas Este consultor, ancorado em sua vivência, chama a atenção para o planejamento do marketing das campanhas, que abriga estas metas: 1) priorizar questões regionalizadas, localizadas, na esteira de um bairro a bairro, ou seja, fazer a micropolítica; 2) procurar cria um diferencial de imagem, elemento que será a espinha dorsal da candidatura, facilmente captável pelo sistema cognitivo do eleitor; 3) desenvolver uma agenda que seja capaz de proporcionar "onipresença" ao candidato (presença em todos os locais); 4) organizar uma agenda contemplando as áreas de maior densidade e, concentricamente, chegando às áreas de menor densidade eleitoral; 5) entender que eventos menores e multiplicados são mais decisivos que eventos gigantescos e escassos; 6) atentar para despojamento, simplicidade, agilidade, foco para o essencial, mobilidade, propostas fáceis de compreensão e factíveis. Esse um resumido escopo de planejamento. Marketing: os cinco eixos Resgato, aqui, os cinco eixos do marketing eleitoral: pesquisa, formação do discurso (propostas), comunicação (bateria de meios impressos - jornalísticos e publicitários - e eletrônicos), articulação política e social e mobilização (encontros, reuniões, passeatas, carreatas, etc.). A mobilização dá vida às campanhas. Energiza os espaços e ambientes. A articulação com as entidades organizadas e com os candidatos a vereador manterá os exércitos na vanguarda. A comunicação é a moldura da visibilidade. Principalmente em cidades médias e grandes. Sem ideias, programas, projetos, os eleitores rejeitarão a verborragia. E, para mapear as expectativas, anseios e vontade, urge pesquisar o sistema cognitivo do eleitorado.
quarta-feira, 23 de março de 2022

Porandubas nº 752

Abro a coluna com historinhas do grande Câmara Cascudo, descritas pelo acadêmico e professor Diógenes da Cunha Lima, em sua magnífica coletânea Câmara Cascudo, um Brasileiro Feliz (Lidador, 3ª ed.) O poeta João Cabral de Melo Neto insiste em ver Cascudo. Dona Dália adia várias vezes a visita, preocupada com a saúde do marido. Zila Mamede interfere, lembrando que o poeta e embaixador vai dar muitas alegrias a Cascudo. Pontualmente, às 3 da tarde, chega o poeta. Cascudo não se contém. Fica de pé, gesticula, conta casos, relembra fatos durante mais de duas horas. Enquanto recita poesia galega Cascudo desmaia. João Cabral e Zila Mamede evitam a queda. Instala-se o nervosismo, procura-se um cardiologista, telefones que não atendem, João Cabral toma tranquilizantes, Cascudo foi abrindo os olhos, direcionou-os para João Cabral, falou com voz muito triste: - Estou preocupado..... com ele... E apontou para o poeta. No Rio de Janeiro, uma senhora da alta sociedade, que não gostava de Cascudo, encontra-se com ele num elevador. Cascudo lhe fez as devidas vênias. Ela, imperiosa: - Sabe que eu nunca li um livro seu? E Cascudo incisivo: - Nem eu Cascudo deixou o curso da Faculdade de Medicina, que havia iniciado na Bahia, para se formar em Direito, em 1928. Perguntado porque tinha abandonado o curso médico, ele disse, sem hesitar: - A pedido dos doentes. Panorama visto de perto Um vice O ministro Walter Braga Netto, ministro da Defesa, deverá ser o vice na chapa de Bolsonaro. O general Mourão, o atual vice, se conforma com a eleição para senador pelo RS ou mesmo a vice-governador numa chapa sulista. Bolsonaro disse, este fim de semana, que seu escolhido para a vaga "é de Belo Horizonte e fez escola militar", perfil ao qual o ministro se encaixa. O movimento é visto como uma tentativa do presidente de se blindar contra processos de impeachment. As credenciais que levaram o general Braga Netto ao governo de Bolsonaro eram a de um militar experiente que executou a árdua missão de ser o interventor da segurança pública no Rio, em 2018, por designação de Michel Temer. Procura-se um nome Gilberto Kassab está à procura de um nome para ser o candidato a presidente pelo PSD. Era Rodrigo Pacheco. Passou a ser Eduardo Leite, mas as forças do PSDB pressionam para que o governador tucano do RS não saia do partido. Ventila-se, agora, com o nome do ex-governador do ES, Paulo Hartung. A dúvida persiste, Kassab não quer aderir logo ao Lula. A saída de Marília Arraes A eventual saída da deputada Marília Arraes, do PT, é um golpe para as pretensões do lulismo no Nordeste. A deputada não dialoga bem com a ala do senador Humberto Costa, do PT pernambucano. Mas Marília estará com Lula. Rejeição Há um Senhor Eleitor que está sendo desdenhado, menosprezado. É o Senhor Eleitor chamado Rejeição. Com mais de 30 de rejeição, um candidato fica na beira do precipício, e tem uns com mais de 50% de rejeição, que significa: "eu não voto nessa pessoa de jeito nenhum". Tanto Bolsonaro quanto Lula registram mais de 50% de rejeição. Jacques Wagner Foi um bom governador da Bahia. Recusa-se a entrar outra vez no páreo. Quem faz objeção forte é a ex-primeira dama, dona Fátima Mendonça, que conhece o sacrifício de ser político, ainda mais para um cargo no Executivo em tempos de vacas magras, Estados sem recursos. Faz bem. Rodrigo Garcia O vice-governador de São Paulo, Rodrigo Garcia, está bem atrás nas pesquisas. Fernando Haddad lidera a corrida com muitos pontos na frente. Este analista lembra o alto índice de rejeição do petismo em São Paulo. E ainda acredita nas chances de Garcia. Máscaras As máscaras têm sido abolidas do território nacional. Na China, a covid-19 voltou com força. Temo uma nova onda. Sugiro a linha do bom senso. A onda petista O PT tem condições de fazer a maior bancada de deputados Federais e estaduais. Posição que já foi do MDB. O PT virou um partidão de centro. O assistencialismo Outro grande eleitor de outubro próximo será o assistencialismo populista. Anotem e cobrem. "O que faz os atores medíocres é a extrema sensibilidade... e é a ausência absoluta de sensibilidade que prepara os atores sublimes. As lágrimas do comediante escorrem de seu cérebro; as lágrimas do homem sensível descem de seu coração. Diz-se que o orador é sempre melhor quando se inflama, quando irritado. Nada disso. É quando se finge de encolerizado. Os comediantes impressionam o público, não quando estão furiosos e sim quando representam bem o furor". (Denis Diderot in Paradoxe sur le comédien) Panorama visto de longe Tirando a camada de exageros do bolo expressivo, o armagedom, como lembra o sábio professor Ivan Maciel, deixa de ser uma quimera, algo difícil a acontecer. Basta que um dos Senhores da Guerra aperte um botãozinho. Este fim de semana, o presidente da Ucrânia, Volodymyr Zelensky, chegou a alertar: se não formos capazes de acertar nossa conversa, a III Guerra Mundial torna-se um cenário à vista. O Centro É uma repetição impressionante. Por que a Ucrânia, um país de médio porte de 40 milhões de pessoas no extremo leste da Europa, esteve no epicentro da guerra não uma, não duas, mas três vezes? Respostas Parte da resposta tem a ver com geografia. Situada entre a Rússia e a Alemanha, há muito tempo é vista como o local da luta pela dominação do continente. Mas as razões mais profundas são de natureza histórica. A Ucrânia, com sua origem comum com a Rússia, desenvolveu-se de maneira diferente ao longo dos séculos, divergindo de maneira crucial de seu vizinho do leste. Um só país O presidente Vladimir Putin gosta de afirmar que a Ucrânia e a Rússia são de fato um país. O que é errado. Mas ele está certo em pensar que a história contém uma chave para entender o presente. Em 1904, um geógrafo inglês chamado Halford John Mackinder fez uma previsão ousada. Em um artigo intitulado "O pivô geográfico da história", ele sugeriu que quem controlasse o Leste Europeu controlaria o mundo. Em ambos os lados dessa vasta região estavam a Rússia e a Alemanha, prontas para a batalha. E no meio estava a Ucrânia, com seus ricos recursos de grãos, carvão e petróleo. Ponto de confluência Não há necessidade de entrar em detalhes. Mas a Ucrânia provou ser extremamente influente após a Primeira Guerra Mundial, sendo o centro dos conflitos. Graças ao geopolítico nazista Karl Haushofer, o conceito migrou para o "Minha Luta" de Hitler. A Ucrânia era a ponte que levaria a Revolução Russa para o oeste até a Alemanha, tornando-a uma revolução mundial. O caminho para o conflito novamente passa pela Ucrânia. A guerra, quando ocorreu, foi catastrófica: na Ucrânia, cerca de sete milhões pereceram. Na sequência, a Ucrânia foi anexada à União Soviética por um tempo. Com o colapso do comunismo, muitos acreditavam que as profecias do geógrafo Mackinder estavam ultrapassadas e o futuro pertencia a Estados independentes e soberanos, livres das ambições de vizinhos maiores. Hoje, a posição da Ucrânia no mapa mundial é crucial para os desdobramentos dos conflitos na Europa e no mundo. De História Historinha de Sócrates Quando ouvia alguém falando, perguntava se realmente sabia o que estava dizendo. Certa vez, ouviu um eminente estadista, aproximou-se dele e indagou: - "Perdoe-me a intromissão, mas o que vem a ser para o senhor a coragem?" - "Coragem é permanecermos no nosso posto em perigo", respondeu o orador. - "Mas suponhamos que a boa estratégia exigisse a retirada?", replicou Sócrates. - "Bem, isso é diferente. Está claro que, nesse caso, não haveria necessidade de permanecer no posto." - "Então coragem não é permanecer no nosso posto, nem retirar, não é verdade? Pergunto, então, o que é coragem?" - "Confesso o meu embaraço. Creio que realmente não sei." - "Eu tampouco", arrematou Sócrates, "mas será que se trata de algo que difere do uso da cabeça, pura e simplesmente. Isto é, fazer o que seja razoável, independente do perigo?" - "Isso parece mais acertado", observou alguém entre o grupo. Sócrates finalizou: - "Concordaremos, então, apenas para argumentar, é claro, pois é uma questão difícil, que a coragem se resume em sólido bom senso? A coragem é presença de espírito. E o oposto, nesse caso, seria a presença de em tal intensidade que perturbaria a mente?" Winston Churchill, o humor Há célebres passagens de humor de autoria de Churchill. Aqui, uma pequena seleção: Abanando minha cabeça Winston Churchill fazia um discurso mordaz quando um aparteador, saltando do lugar para protestar, só conseguiu emitir sons abafados. Churchill observou: - "Vossa Excelência devia deixar crescer uma indignação maior do que a que pode suportar." Em outra ocasião, estava sentado, sacudindo a cabeça de maneira tão vigorosa e perturbadora, que o orador gritou, afinal, exasperado: - "Quero lembrar ao nobre colega que estou apenas exprimindo minha própria opinião." Ao que Churchill respondeu: - "E eu quero lembrar ao nobre orador que estou apenas abanando a minha própria cabeça." Sou o chefe O General Montgomery estava sendo homenageado, pois vencera Rommel na batalha da África, na 2ª Guerra Mundial. Discurso do General Montgomery: - "Não fumo, não bebo, não prevarico e sou herói". Churchill ouviu o discurso e com ciúme, retrucou: - "Eu fumo, bebo, prevarico e sou chefe dele." Se houver... Telegramas trocados entre o dramaturgo Bernard Shaw e Churchill, seu desafeto. Convite de Bernard Shaw para Churchill: - "Tenho o prazer e a honra de convidar o digno primeiro-ministro para primeira apresentação de minha peça Pigmaleão. Venha e traga um amigo, se tiver." Resposta de Churchill: - "Agradeço ilustre escritor honroso convite. Infelizmente não poderei comparecer à primeira apresentação. Irei à segunda, se houver." Por que não? Quando Churchill fez 80 anos, um repórter de menos de 30 foi fotografá-lo e disse: - "Sir Winston, espero fotografá-lo novamente nos seus 90 anos." Resposta de Churchill: - "Por que não? Você me parece bastante saudável." Veneno no seu chá Bate-boca no Parlamento inglês. Aconteceu num dos discursos de Churchill em que estava uma deputada oposicionista, Lady Astor, conhecida pela chatice, que pediu um aparte (Sabia-se que Churchill não gostava que interrompessem os seus discursos, mas concedeu a palavra à deputada). E ela disse em alto e bom tom: - "Sr. Ministro, se Vossa Excelência fosse o meu marido, eu colocava veneno em seu chá!" Churchill, lentamente, tirou os óculos, seu olhar astuto percorreu toda a plateia e, naquele silêncio em que todos aguardavam, mandou: - "Nancy, se eu fosse o seu marido, eu tomaria esse chá com prazer!"
quarta-feira, 16 de março de 2022

Porandubas nº 751

Abro a coluna com Albert Einstein. Certa vez, Einstein recebeu uma carta da Miss New Orleans (EUA) onde ela dizia: "Prof. Einstein, gostaria de ter um filho com o senhor. A minha justificativa se baseia no fato de que eu, como modelo de beleza, teria um filho com o senhor e, certamente, o garoto teria a minha beleza e a sua inteligência". Einstein respondeu: "Querida miss New Orleans, o meu receio é que o nosso filho tenha a sua inteligência e a minha beleza". Panorama A III Guerra Não parece quimera. Basta Putin atacar um país integrado à OTAN para ter uma reação da instituição. Para não ficar desmoralizado, poderia acionar o seu arsenal atômico. E uma reação em cadeia seria a consequência. Claro, essa configuração depende de muitos fatores. Coisa complexa. O fato é que o autocrata Vladimir Putin não esperava reação tão forte da Ucrânia. Censura os meios de comunicação. Os russos imaginam que a "operação especial" na Ucrânia é para livrar aquele país do nazismo. A mentira se propaga. Ora, vejam bem: Zelensky é o único judeu que governa um país da Europa. Desnazificar a Ucrânia....é risível. Conselheiros Há um grupo de conselheiros de Putin que caiu no poço da descrença, incluindo o todo poderoso ministro da Defesa, o general Serguei Choigu, que faz muita articulação política, mas não tem experiência no campo de batalha. Os conselheiros do czar diziam que tudo se resolveria rapidamente e de acordo com o planejado. Os russos estão sofrendo e enfrentando muita resistência. Ganharão a guerra porque têm efetivos militares bem superiores aos da Ucrânia. Mas o planejado não está saindo nos conformes. Noutros tempos, esses conselheiros acabariam tremendo de frio na Sibéria. A cadeia de efeitos Exportações de fertilizantes sustadas. Brasil sofrerá para suprir as demandas internas. Setembro, mês de plantação, vem aí. A alta do petróleo - podendo chegar aos U$ 120 o barril (brent) - dispara a subida dos preços de alimentos. O exagerado aumento da gasolina pela Petrobras atinge produtores e consumidores de alimentos, impacta a mobilidade urbana e rural, diminui a grana no bolso, produz bolhas de contrariedade. P.S. Os generais da ativa fazem um escudo de proteção ao presidente da Petrobras, general Joaquim Silva e Luna, que, segundo se sabe, apenas endossa a posição do Conselho e cumpre o ajuste da tabela internacional. Milagre? É possível Ganhar uma eleição sob esse teto nas alturas é um milagre. O Bolsa Auxílio pagará menos do que aquele adjutório no início da pandemia. As massas pensarão que o governo as engana com o alto preço da gasolina, do diesel e do gás de cozinha. Mas os subsídios virão. Lula em dúvida? Luiz Inácio é cauteloso. Todos sabem que será candidato, mas ele mesmo nunca disse isso. E se perceber que o quadro político se complicará para o PT, com a ausência de grandes coligações e apoios, Lula pode até desistir. Ele precisa ganhar no primeiro turno. Ganhar no segundo turno será difícil. Muito mais. Sua trajetória está em jogo. Se perder, adeus à política. Eduardo Leite Segundo diz o próprio Gilberto Kassab a este analista, está tudo certo para que o governador do RS, Eduardo Leite, venha para o PSD, deixando o PSDB. E na mira dele, a candidatura à presidência da Republica. Chapa dos sonhos de Kassab: Eduardo Leite para presidente e Simone Tebet, do MDB, para vice. Simone, no entanto, quer a cabeça de chapa. Mais um problema: os senadores do PSD já estão alinhados à Lula e Bolsonaro. Poder360 O *Poder360* bateu mais uma vez um recorde de audiência em janeiro de 2022. Os dados são da Comscore (o "padrão ouro" na medição de tráfego na internet). No primeiro mês do ano, a audiência do *Poder* superou a de vários sites de veículos respeitados da mídia tradicional. Segundo Fernando Rodrigues, o competente jornalista que chefia a equipe, "tudo é resultado do bom jornalismo profissional praticado diariamente por uma equipe de aproximadamente 80 profissionais que trabalham no *Poder*". Sem máscara Os Estados estão amainando o uso de máscaras. Alguns permitem tirar a máscara em ambientes abertos e fechados, outros apenas em ambientes abertos. Brasil, Brasil. Não se surpreendam se, daqui a pouco, voltarem a subir os índices da pandemia do coronavírus. Na China, os casos estão aumentando. Olaf Scholz O novo chanceler da Alemanha, Olaf Scholz, não tem o carisma de Angela Merkel, mas é um bom articulador. Tem estado na linha de frente das articulações Rússia/Ucrânia. Scholz é um advogado que já exerceu o cargo de ministro das Finanças, prefeito de Hamburgo, de 2011 a 2018, e vice-líder do seu partido, Partido Social Democrata da Alemanha, de 2009 a 2019. E a energia, hein? São Pedro abriu as torneiras e as chuvas torrenciais caem em todo o país. A crise energética não deve ocorrer, pelo menos com a gravidade anunciada em princípios do ano. Os reservatórios estão com índices razoáveis. E o PL, hein? Com a última operação da PF nos terrenos do PL, um grupo de deputados dispostos a entrar no partido de Valdemar da Costa Neto já não exibe tanto entusiasmo para nele ingressar. Valdemar está com receio de perder o mando em sua sigla, que fez história nos tempos do embaixador Álvaro Vale. A abertura do programa do PL com o "Coro dos Escravos Hebreus", do terceiro ato da ópera Nabucco (1842) de Giuseppe Verdi, era um show. O troca-troca A mudança de partido levará em conta os recursos destinados a cada ente. O fundão de quase R$ 5 bilhões é o alvo de todos. Golpe? O Brasil é outro Um golpe militar em tempos atuais é algo praticamente impossível. Não haveria apoio militar. O mundo mudou. É mais interdependente. As Forças Armadas, em seu conjunto, estão profissionalizadas. Fariam continência a Lula, se este ganhasse. Mas a ignorância teima em aparecer na desinformação. Dá conta de um eventual golpe de Bolsonaro, com apoio militar, caso perca a eleição. Os tempos são outros. E as urnas eletrônicas, como ferramenta da ilegalidade, só mesmo na cabeça de incréus e radicais apaixonados. Um pouco de história: Sócrates De corpo franzino e tido como muito feio, Sócrates aceitou de bom humor participar da simulação de um concurso de beleza com seu amigo Critóbulus; era uma brincadeira, com um júri falso. Sócrates tinha certeza de que, por meio da argumentação, conseguiria vencer o amigo: - Sócrates: "O que é beleza?" - Critóbulus: "São as coisas boas e belas que são bem-feitas para cumprir respectivas funções para as quais nós as obtemos ou as coisas bem constituídas para servir às nossas necessidades." Sócrates jogou o anzol e pegou o amigo com a técnica de deixar que o interlocutor discorra para extrair as consequências. - Sócrates: "Tu sabes a razão por que necessitamos de olhos?" - Critóbulus: "Ora, obviamente para ver." - Sócrates: "Nesse caso, parece que meus olhos, sem qualquer esforço de argumentação, são melhores do que os teus." - Critóbulus: "Como assim?" - Sócrates: "Porque enquanto os teus só veem o que está na frente, os meus, esbugalhados como são, veem também o que está dos lados." - Critóbulus: "Quer dizer que um caranguejo está muito bem equipado visualmente, mais do que qualquer outra criatura?" - Sócrates: Exatamente. - Critóbulus: "Bem que seja assim, mas de quem é o melhor nariz, o teu ou o meu?" - Sócrates: "O meu, acho, considerando-se que a Providência fez nossos narizes para cheirar. Pois tuas narinas olham em direção ao chão, enquanto as minhas estão bem abertas e voltadas para fora, de modo que posso captar aromas de todos os lados." - Critóbulus: "Mas como tu achas possível que um nariz achatado como o teu seja mais bonito que o meu, que é reto?" - Sócrates: "Pelo fato de não produzir nenhuma barreira entre os olhos, permitindo a eles uma visão desobstruída para que vejam o que querem, enquanto teu nariz reto e afilado, como que para compensar, separa, como uma barreira, um olho do outro." - Critóbulus: "Já no que diz respeito à boca, até faço uma concessão. Pois se ela foi criada para morder os alimentos, então a tua pode abocanhar muito mais do que a minha pode. E tu não achas que o teu beijo é também mais doce porque os teus lábios são grossos?" - Sócrates: "Pois não é? Mas, de acordo com os argumentos, parece que minha boca é mais feia do que a de um asno." - Critóbulus: "É impossível continuar argumentando contigo. Vamos aos votos." Mesmo com a lógica de Sócrates, os jurados de mentirinha, com pena de Critóbulus, concederam-lhe a vitória. Política e teatro O discurso estético tem muito a ver com os recursos teatrais. Com efeito, a teatralização é imanente à política. Os atores políticos contemporâneos procuram aperfeiçoar sua performance com recursos técnicos da mídia eletrônica e do teatro. O ex-ditador de Uganda, o cabo Idi Amin Dada, dizia conversar com Deus tantas vezes quanto necessário. Hitler treinava a voz e os gestos. Mussolini, com sua voz de bronze e máscara imperial, espelhava-se em D'Annunzio, guerreiro-tribuno. A história antiga é cheia de exemplos que mostram os governantes posando de ator, alguns com feições de comediantes, outros encarnando o perfil de estadistas. Luis XIV fazia exibição de danças. O marechal Pétain tomava aulas de dicção para diminuir a timidez. O próprio De Gaulle dizia que "os maiores medem cuidadosamente as suas intervenções, fazendo delas uma arte". Valéry Giscard d'Estaing, o chefe de Estado francês, tocava acordeon nas praças de Paris. Fernando Collor usou um traje de piloto para fazer uma viagem à Amazônia. O vedetismo O vedetismo do poder pode ser explicado pela psicologia. As pessoas percebem no ator político estados e situações afetivas que lhe são próprias. Identificam-se com ele. E se satisfazem. Trata-se do fenômeno de autovalorização por meio de um herói interposto. Freud também explica: "a maioria das pessoas experimenta a imperiosa necessidade de admirar uma autoridade, perante a qual possa inclinar-se e pela qual seja dominada e por vezes maltratada". Os três maiores oradores Os três maiores oradores da Antiguidade foram: o general Péricles; o tribuno Cícero, mais conhecido pelas Catilinárias; e aquele que é considerado o maior de todos, Demóstenes. Uma figura curiosa. Gago e com muita vontade de superar deficiências. Construiu um lugar para estudo numa caverna, onde ia diariamente treinar oratória e exercitar a voz. Lá permanecia, por vezes por dois ou três meses sem interrupção, raspando o cabelo de metade da cabeça, para que, por vergonha, não conseguisse aparecer em público e se afastar da caverna. Um determinado. Fecho a coluna com mais uma história de padre. O bom senso Uma historinha de Zé Abelha, o nosso contador de causos de Minas. No auge da discussão nacional sobre a lei do divórcio, o então bispo auxiliar de Belo Horizonte, D. Serafim Fernandes de Araújo, reitor da Universidade Católica de Minas Gerais, democrata, liberal, torcedor roxo do Galo, o Clube Atlético Mineiro, foi entrevistado: - O senhor não acha que o bom senso evitaria muitos divórcios? - Acho sim, meu filho, e muitos casamentos também.