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Porandubas Políticas

Por dentro da política.

Gaudêncio Torquato
quarta-feira, 6 de julho de 2022

Porandubas nº 767

A historinha engraçada de hoje está no final da coluna. Assim, forço um pouco amigas e amigos a passarem uma vista d'olhos nas notas. Rsrs Pleito está decidido? A maioria dos analistas políticos dá o pleito eleitoral de 2 de outubro como decidido. Ou Lula ou Bolsonaro. Ouso por uma pimentinha nesse caldo e dizer: se a política fosse regida só pela lógica, sim, o resultado seria contemplar um dos dois perfis com maiores índices de intenção de voto. Ocorre que política também é emoção. E com emoção, as coisas podem se tornar imprevisíveis. O Imponderável costuma nos visitar. Equação eleitoral Fatos + Barriga (cheia ou vazia) e outras Demandas Sociais + Circunstâncias +  Imponderável = Um elefante bem desenhado e/ou um elefante com a tromba no rabo. Quem estaria no jogo? Luiz Inácio, Jair Bolsonaro, Ciro Gomes e... Simone Tebet. Mesmo patinando na casa entre 1% a 3%, Simone não estaria fora do jogo. Teria, claro, desafios maiores a vencer. Trata-se do perfil que ganha grande visibilidade, mesmo com sua pequena margem de intenção de voto. Vê-se certa simpatia da mídia em relação a ela. O primeiro grande desafio é o da visibilidade. Precisa ser conhecida nos grandes, médios, pequenos centros de agregação de votos, e nos cafundós onde Judas perdeu as botas. As botas de Judas Se candidatos (as) passarem a ser bem identificados (as) nos cafundós de Judas, a probabilidade de ganhar um voto é de 50%, enquanto os (as) desconhecidos (as) se aproximam de zero. Rejeição Pesquisa deve ser lida como um instantâneo do momento. E o instantâneo flagra a paisagem ali adiante. Mas por trás da paisagem ou ao seu lado, há alguns elementos nem sempre observados pelos analistas de pesquisas. Refiro-me à rejeição, que mostra o desacordo do eleitor: não voto de jeito nenhum nessa pessoa. Esse fator é decisivo em um eventual segundo turno. Bolsonaro e Lula exibem altos índices de rejeição, beirando os 50%, na média. Equação da rejeição Rejeição = Desprezo + objeção ao nome + Distanciamento + Vingança + Passaporte de volta para casa. Percepção O eleitor precisa perceber a existência de Simone Tebet. Perceber é mais que saber seu nome, identificá-la pelas feições. Perceber é receber informações sobre ela e, a seguir, internalizar tais inputs. Internalizar é introduzir no sistema cognitivo um acervo de informações, imagens e conceitos sobre a pessoa, de modo que o eleitor possa aduzir: é com essa que vou às urnas. Se o eleitor considera que se trata da candidata a atender seus reclames e necessidades cotidianas, pode mudar de posição e inclinar-se em sua direção. A luz no fim do túnel é enxergada e passa a iluminar o corredor escuro. Mais que gênero Mulher, Simone Tebet canaliza a organicidade do gênero feminino, a ponto de poder fazer disso um armamento de competição. Mas deve evitar que seja conhecida como candidata das mulheres. Porque, assim o fazendo, criaria uma dualidade - candidato dos homens e candidata das mulheres. Candidatos e candidatas disputam o voto de todos, não apenas de gêneros, grupos, alas, categorias profissionais. Se as mulheres se sentem poderosas com a candidatura da Simone, ótimo. É um plus, um algo a mais. Mas não deve ser esse o único trampolim. Equação do gênero Decisão de votar = Identificação de propósitos (discurso) + Simpatia + Empatia + Proximidade + O fato de ser mulher (identificação de gênero -plus). Tasso, boa imagem Se incluir o senador tucano Tasso Jereissati na chapa como vice, Simone Tebet terá mais um fator de indiscutível peso. Tasso soma. Foi um bom governador do Ceará por dois mandatos, considerado reserva moral e política do PSDB, respeitado. Um perfil que expressa seriedade. A senadora Tebet deve anunciar isso nos próximos dias. Discurso programático Mais forte que gênero e raça, é o discurso programático. A identificação do (a) candidato (a) com um ideário tem mais força. Por exemplo, uma revolução na educação. Um plano de barateamento dos alimentos. Diminuir os índices de violência na sociedade. Defender o agronegócio e sua integração ao meio ambiente. Uma revolução no sistema de transportes no Brasil, com peso nos sistemas ferroviários de passageiros e carga. E assim por diante. A organicidade social A sociedade brasileira está de olho na política, ao contrário do que muitos duvidam. A descrença e indignação com a política funcionam como molas propulsoras de engajamento e participação. Mais ou menos assim: se os políticos tradicionais não dão respostas a nossas demandas, vamos eleger pessoas mais comprometidas com nosso grupo. A sociedade está organizada: núcleos, setores, categorias profissionais, alas, movimentos. Campanha bem feita é aquela que mobiliza um ou vários desses organismos e faz com que o discurso do candidato seja internalizado (conceito acima) por todos os participantes. A menor distância Tenho dito e repetido que Simone já ganhou imensa fatia do bolo com sua pré-candidatura. Se perder eleitoralmente, ganha politicamente. Fato incontestável. Ademais, atente-se para este princípio que tenho avocado: na geometria euclidiana, a menor distância entre dois pontos é uma reta; mas, na política, a menor distância pode ser uma curva. Fernando Henrique perdeu a prefeitura de São Paulo para Jânio Quadros e, mais adiante, ganhou a presidência da República. Na geometria euclidiana, A-------------Z= Menor distância entre dois pontos é uma reta. Na política, pode ser uma curva A...(curva).....Z. Devassa Pedro Guimarães, ex-presidente da CEF, acusado de assédio sexual e moral, fez, ontem, artigo na Folha de São Paulo, onde pede uma devassa completa em sua gestão no banco, desafiando autoridades e vítimas de mostrarem provas. Submete-se à transparência total. Aprofunda a desmoralização ante a bateria de depoimentos contra ele. Um caso a ser acompanhado com acuidade. A compra de voto A compra do voto está no tabuleiro do jogo. Essa PEC Kamikaze é uma bomba de efeitos mortíferos. Aliviará a barriga das bases que vivem na miséria, mas estourará as contas públicas, já sendo considerada a maior pedalada desses tempos turbulentos. Bolsonaro conta com esse pacote de "bondades e benefícios" para cooptar o voto da base da pirâmide. Por isso, não se pode dizer que Lula já ganhou a campanha. Essa projeção está mais para salto alto. E pode atropelar o petista. A burla eleitoral A burla está escancarada. Campanha não começou oficialmente. Mas, candidatos teimam em driblar a legislação. TSE, onde estás? Fecho a coluna com o golaço do Dirran. O goleador francês Dirran (com "biquinho" para parecer francês correto), meio sarará, entroncado e de pernas curtas, jogava no Clube Atlético Potengi, no Rio Grande do Norte. Um dia, disputava no Machadão uma partida contra o Potyguar de Currais Novos, pela 2ª divisão do campeonato potiguar. O jogador atleticano era o destaque. Fazia dribles desconcertantes e lançamentos perfeitos. Fechou as glórias com um golaço. O narrador da Rádio Poti gritava: "Dirran é um craque", "Dirran, grande aquisição do futebol norte-rio-grandense". Dirran prá cá, Dirran pra lá. No final do jogo, o Clube Atlético Potengi perdeu por 3 x 1. Mas o destaque foi Dirran. Vendo todo aquele sucesso, um jovem repórter da Rádio Poti correu para fazer uma entrevista com o craque na beira do gramado. Disparou uma bateria de perguntas: Você deixou seus pais na França? Qual a cidade onde nasceu, Monsieur? Já desfilou no Arco do Triunfo? Como veio parar no Brasil? Pode comparar o futebol europeu com o futebol brasileiro? Qual a origem de seu nome? Desconfiado, espantado, zonzo, o jogador respondeu ao incrédulo repórter: "Pera aí, meu sinhô, num é nada disso; meu apelido é Cú de Rã, mas como num pode falar isso na rádio. então, eles abreveia". (Historinha muito conhecida e contada no Jô Soares).
quarta-feira, 29 de junho de 2022

Porandubas nº 766

Abro com uma hilária historinha envolvendo o folclórico deputado Antônio Bilu, potiguar do meu querido RN. Hotel Zero Km O deputado do Rio Grande do Norte desceu no aeroporto Santos Dumont, no Rio, pegou um táxi: - Hotel Zero Quilômetro. - Zero Quilômetro? Não tem esse hotel, não. - Tem, sim. Em frente ao Hotel Ambassador. - Ah, Hotel OK Senador Dantas, não é? - Não, senhor, Deputado Antônio Bilu, de Natal. Pitadas filosóficas O luxo do funeral a) "O luxo do funeral e a suntuosidade do túmulo não melhoram as condições do morto; satisfazem apenas a vaidade dos vivos". (Dante Veoleci) b) Sabedoria popular Quando Confúcio visitou a montanha sagrada de Taishan, encontrou uma mulher cujos parentes haviam sido mortos por tigres. - Por que não se muda daqui, perguntou Confúcio. - Porque os governantes são mais ferozes que os tigres. Análise da conjuntura Braga Netto O general Braga Netto, filiado ao PL, foi escolhido pelo presidente Bolsonaro como candidato a vice em sua chapa. Primeira constatação: não agrega um voto. A ex-ministra da Agricultura, Tereza Cristina, seria um nome com mais apelo ao eleitorado feminino - onde Jair tem votação menor - ou mesmo a ex-ministra da Pasta da Mulher e da Família, Damares Alves. Passaporte O ex-ministro da Defesa, Braga Netto, poderia ser o passaporte que Bolsonaro pensa ter para se sentar novamente na cadeira presidencial no voo de um golpe? Digamos que a hipótese passa pela cabeça do capitão. Fiquemos, porém, no terreno de um improvável evento de ruptura. As Forças Armadas, em sua plenitude, não topariam entrar nessa aventura. Não há clima político para abrigar um golpe. Não haveria endosso social. A economia, a escassez, a fome seriam também grandes armas contra o golpismo. O Centrão reclama O Centrão não quer Braga Netto como candidato a vice. Vai chiar. Mas o general, se não será o passaporte para uma inclinação golpista, deve funcionar como bastião de defesa contra eventual prisão do capitão-comandante das FAs, em caso de sua derrota. E disso o Centrão será instado a acreditar. As democracias A paisagem mundial faria parte também do painel de contrariedades. As democracias ocidentais não fechariam os olhos a uma eventual ação golpista. O mundo é, hoje, interdependente. Vejam o caso de isolamento da Rússia por causa de sua empreitada de invadir a Ucrânia. Vladimir Putin está isolado, com exceção da posição da China e da dubiedade que paira sobre a conduta de algumas poucas Nações, entre as quais, o Brasil. Esquisitice Caem sobre as nossas cabeças essas esquisitices. A geopolítica, com seus interesses comerciais, faz com que países de ideologias opostas se unam em alianças pragmáticas. Ora, o Brasil de Bolsonaro faz virulenta "guerra de palavras" contra o comunismo, as ameaças vermelhas que ainda existem aqui e ali, condenando aqueles que se identificam com elas, como Cuba, Venezuela, China e, claro, Rússia. E qual o parceiro que Bolsonaro faz questão de glorificar a todo momento? Com quem falou segunda-feira última? Vladimir Putin. Que, por sua vez, tem interesse em formar uma cabeça de ponte por essas bandas do sul do continente. Não beberei Minha querida mãe sempre me dizia: "meu filho, nunca diga: desta água não beberei". Polarização e inquietude O artigo "Polarização e Inquietude", do padre João Medeiros Filho, na mídia potiguar, é oportuno, denso e merece profunda reflexão. "Diante de fundamentalismos ideológicos e religiosos, polêmicas jurídicas e políticas, importa meditar sobre as palavras de Cristo: 'Deixo-vos a Paz, dou-vos a minha vida, não como a dá o mundo'. (João, 14, 27). Um terço à deriva Se os dois candidatos somam, juntos, cerca de 70% das intenções de voto, vale inferir que 30% estão com um olho no norte, outro no sul. Olham para cima e para baixo. O eleitor brasileiro é mutante. Garantir que a eleição será decidida no primeiro turno é esquecer o histórico de campanhas eleitorais. O vento pode mudar de rumo. E se mudar, não haverá força a impedir sua trajetória. Lula cá Lula é um candidato partido ao meio. Vez ou outra, o discurso palanqueiro emerge e ele embarca nos velhos refrãos do passado. Mas, no geral, corre para o meio, onde espera atrair votos de segmentos refratários ao petismo. Aborto, controle da mídia, estatização, reforma trabalhista e outros temas polêmicos continuam integrando a velha pauta lulista. O Lula Lá e o Lula Cá deixam confusos muitos eleitores. Combustíveis Digamos que os preços dos combustíveis sejam contidos e segurados pela mão do novo comando da Petrobras. Vai adiantar e dar votos a Bolsonaro? Este analista tende a acreditar que não reverterão em votos para o presidente. A imagem da economia fraturada, inflação alta, juros subindo, alimentos distantes das mesas pobres - essa mistura quase venenosa acabará puxando a gasolina, o diesel, o gás de cozinha para o caldeirão da indignação. Reverter imagem negativa, com esse andar da carruagem, é tarefa para gigantes de estatura moral. A barriga ronca Sou recorrente com a minha hipótese: a barriga roncando de fome e panelas vazias definirão o voto em 2 de outubro. A fome se espalha. A estética dos polos urbanos está locupletada de pedintes, mendigos e sem teto. O bem contra o mal? Jung perguntou, certa vez, a um rei africano: - Qual é a diferença entre o bem e o mal? O rei meditou, meditou e respondeu às gargalhadas: - Quando roubo as mulheres do meu inimigo, isso é o bem. E quando ele rouba as minhas, isso é o mal. Bolsonaro disse que a campanha eleitoral desse ano será uma luta do bem contra o mal. Quem vai roubar? Entendamos que esse posicionamento vale para os dois lados. Pois Lula deve dizer a mesma coisa. Se Bolsonaro roubar os votos do petista, o bem estaria do lado dele? Assim como Lula, se conseguir roubar os votos do bolsonarismo? Ambos garantem que sim. Agregador de pesquisas Os Institutos de Pesquisa, em sua quase totalidade, atribuem ao candidato do PT uma margem entre 10 pontos a 19 pontos de maioria. O índice depende da metodologia usada. Pelo sistema de agregação de resultados de pesquisas, montado pelo Estadão, a média é de 15 pontos. A virtude está no meio? Vamos acompanhar esses números. Até quando? O novo presidente da Petrobras - a ser ainda referendado pelo Conselho - ficará no cargo até quando? Promete nova dinâmica de preços na estatal. Dinâmica de preços - eis o vocabulário da crise. Terceira via Foi para o beleléu, segundo muitos analistas. Este escriba ainda vê faíscas no fim do túnel. Ciro com 10 pontos Ciro Gomes deve entrar na faixa dos dois dígitos. Simone Tebet terá fôlego? É a candidata de contingentes médios. Pelo menos, nas expectativas. França baixando a crista Marcio França (PSB) até que suportou bem as pressões. Mas poderá abandonar o barco da pré-candidatura ao governo de São Paulo e se refugiar na canoa de candidato ao Senado com apoio de Fernando Haddad. O PT parece ter ganhado a parada. Lula teria costurado bem. Quando França fará o anúncio? No Rio de Janeiro Marcelo Freixo (PSB) deve escolher Cesar Maia (PSDB) em articulação feita por seu filho, Rodrigo Maia (PSDB) como vice em sua chapa ao governo do Rio de Janeiro. Pode ganhar do atual governador, Claudio Castro (PL), candidato de Bolsonaro, por enquanto na frente. O prefeito Eduardo Paes(PSD) apoia o ex-presidente da OAB, Felipe Santa Cruz (PSD). Mas pode desistir desse apoio por causa do baixo índice de intenção de voto de Santa Cruz. O véio Lunga Seu Lunga estava cortando uns limões, quando passa sua mulher e pergunta: - Esse limão é pra fazer suco? - Não, é pra eu usar de colírio! Prefiro um sabonete Entra um sujeito na sucata de seu Lunga, escolhe um relógio um pouco velho e pergunta: - Seu Lunga, esse relógio presta pra tomar banho? - Eu prefiro um sabonete - resmunga o velho. Amor próprio "Um maltrapilho dos arredores de Madrid pedia esmolas com grande dignidade. Um transeunte lhe disse: - "Não tem vergonha de exercer essa infame atividade quando pode trabalhar?" - "Senhor, respondeu o mendigo, peço-lhe esmola e não conselhos". E tendo dito isto, deu-lhe as costas com toda a empáfia castelhana. Era um mendigo orgulhoso esse; pouca coisa bastava para ferir sua vaidade. Por amor de si mesmo pedia esmola; e ainda por amor de si mesmo não permitia que lhe fizesse qualquer reprimenda". (Voltaire)
quarta-feira, 22 de junho de 2022

Porandubas nº 765

Abro a coluna com um caso hilário da velha Bahia. Grande prole... Da Bahia, vem a historinha. José de Almeida, contador do Banco do Brasil, fazia o cadastro da agência. Um dia, chega Heroíno Pita, fazendeiro, que responde na bucha o formulário: nome, idade, imóveis, renda anual, dívidas. Aí vem a pergunta: - Quantos filhos o sr. tem? - 8 filhos - Tudo isso? O senhor tem uma prole grande. Heroíno, entre sorridente e cabreiro, abre o gesto com as duas mãos: - Não, senhor. É normal. Normal. Agora, respire e leia minha análise da conjuntura. A crise I - O golpe A crise amplia seus contornos a cada semana. Olhemos para os lados de nosso amanhã. A ameaça sobre um golpe a ser desferido pelo presidente Bolsonaro, caso perca as eleições, vem ganhando volume. O receio se alastra nos estratos do meio da pirâmide para cima. O leit motiv, que faz o pano de fundo desse risco, é o processo de votação, sujeito a fraudes, na concepção do bolsonarismo. A crise II - As Forças Armadas As Forças Armadas, historicamente discretas e distantes do tiroteio eleitoral, entram na arena dispostas à briga. Dizem com todas as letras que farão o seu sistema, próprio e intransferível, de auditoria, politizando a questão e praticamente desafiando o TSE a um duelo. Na última reunião da Comissão de Transparência Virtual presidida pelo ministro Edson Fachin, o representante das Forças Armadas, o general Heber Portella manteve-se calado e com a câmera desligada. Sinal de que o clima está mais que tenso. A crise III - As urnas eletrônicas O presidente Bolsonaro, por sua vez, se esforça para adensar a tese de fraude nas urnas eletrônicas, alimentando a base bolsonarista e tentando influenciar segmentos de todos os espaços do eleitorado. A campanha já está mostrando que será uma corrida de brutos desembestados em direção ao pódio. As Forças Armadas podem, até, com sua disposição de questionar o processo eleitoral, despertar grupos militares contrários ao seu rompante. A crise IV - A Petrobras A fogueira da crise sobe com mais algumas estacas. No centro da fornalha, a Petrobras. O governo decidiu nomear o quarto presidente da estatal na atual administração. O valor de mercado da empresa caiu em mais de R$ 100 bilhões nos últimos dias. Grana pesada. A CPI da Petrobras jogará a crise no cume da montanha. A intenção de Bolsonaro: atribuir à estatal a alta no preço dos combustíveis. A mão do Estado quer ser mais forte na definição dos rumos. O fato é que o presidente atual e o ex-presidente Lula defendem o que chamam de "abrasileiramento" da política de preços dos combustíveis. A crise V - O intervencionismo Lula pula no ringue, tentando escapar do adversário, mas na questão da Petrobras é francamente contrário à privatização. Tem dificuldade em ficar calado. A voz do Estado, com Lula ou Bolsonaro, será mais alta. Intervencionismo. E essa tendência assusta os pilares dos edifícios da av. Faria Lima. Os investidores ficam com um olho na bocarra do Estado e outro olhando para os limites da economia de mercado. A crise VI - Os alimentos E haja lenha na fogueira. Os juros que, logo, logo, devem chegar aos 15% mensais, fazem disparar o preço dos alimentos. Nos supermercados e feiras livres, os preços sobem aos céus. O programa Auxílio Brasil não enche mais os carrinhos. A carne de porco substitui a carne de boi. Feijão e arroz, sob medida, são os componentes centrais das refeições. A guerra da Rússia x Ucrânia escasseia e encarece os grãos, a partir de trigo e soja. O mundo entra em um ciclo de intensa carência alimentar. A crise VII - O impacto Nesse ponto, acende-se o farol vermelho. Está chegando o Dia D. A hora da verdade. 2 de outubro. Eleições. A retração da economia, os juros, as indefinições na área política, Petrobras, a pandemia, o contexto nebuloso que cobre o planeta, todo esse cipoal impactará o sistema de decisões do eleitor, que tende a reagir de acordo com a equação que, há tempos, tento mostrar aos leitores: BO+BA+CO+CA= Bolso cheio, Barriga satisfeita, Coração agradecido, Cabeça votando em quem viabilizou esse fluxo. A recíproca é verdadeira. Se a barriga roncar, a raiva, a indignação, o troco do eleitor virão com juros e correção monetária. Porrada nos candidatos identificados com a fome. A crise VIII - Quem pagará o pato? A conta começa a multiplicar números. Qual será a estatística dos mortos e contaminados com o coronavírus? Quem diz que os pobres não serão influenciados por isso fala bobagem. Lembro, mais uma vez: os seres humanos agem e lutam para sobreviver e perpetuar a espécie, como ensina Pavlov. Nesse esforço, despertam quatro instintos, dois voltados para a conservação do indivíduo e dois voltados para a preservação da espécie: o impulso combativo contra ameaças à vida; e o de nutrição (satisfação da barriga); e os dois de preservação da espécie são o instinto sexual e o paternal. A crise IX - As associações Os instintos são acionados por todos. Não apenas por um estrato social. Pobres e ricos, feios e bonitos, gordos e magros, negros e brancos, todos comem do mesmo prato instintivo. Hoje, a tendência é associar Bolsonaro às coisas ruins - fome, doenças, ameaças ao indivíduo. Porém, ele também será acionado a fatores positivos por alguns núcleos: família, valores etc. Ou seja, instinto paternal. Pátria, acima de todos; Deus, acima de tudo. Lula, aos valores positivos da barriga (acesso ao crédito, alimentos-Bolsa Família) etc. E, também, haverá certa associação com medo - comunismo, Cuba, Venezuela, etc. A corrupção será jogada no colo de ambos. Paixões tristes I A individualização de desigualdades toma o lugar da coletivização das desigualdades. Esse é o fenômeno em foco nesses nossos tempos turbulentos. Essa é a tese central de François Dubet, um dos maiores sociólogos da França, exposta em seu livro O Tempo das Paixões Tristes. Dessa hipótese, emergem o ódio, as cóleras, as indignações - um pacote rancoroso que acaba aplainando os caminhos do populismo. Paixões tristes II Classes superiores, médias e inferiores, que formavam a modelagem da pirâmide social, agora dão lugar aos grupos singulares e às desigualdades específicas: mulheres contra as discriminações; aglomerações de categorias profissionais nas ruas; jovens descendentes de imigrantes; desocupados e os contingentes sem acesso à saúde, à educação, à cultura, e submetidos aos influenciadores, entre outros. Vivemos tempos de paixões tristes. As desigualdades mudam de natureza. Pente fino - Tereza Cristina, ex-ministra da Agricultura, pode entrar na chapa de Bolsonaro como candidata à vice-presidente. Mas, parece não querer se arriscar. - O general Hamilton Mourão tem condição de se eleger senador pelo RS. - Romeu Zema, de MG, deverá se reeleger. - Quem ganhar em MG poderá ser eleito presidente em outubro. Minas Gerais representa o universo brasileiro. - O Nordeste, hoje, mostra Lula ganhando de goleada. Porém, tende a diminuir sua vantagem. - Em São Paulo, Fernando Haddad encontrará um paredão de resistência ao lulopetismo. Trata-se do Estado mais contrário ao petismo. - Simone Tebet ainda não saiu do páreo. Pergunta que se faz nos segmentos médios: você vai votar em quem? Tebet surpreende. Muitos apontando para ela o seu voto. O que não aparece nas pesquisas. - Sérgio Moro, candidato a que no Paraná, senador, governador? A impressão é a de que está sendo boicotado por seu partido, o União Brasil. - Este partido patrocinou pesquisa mostrando que Sérgio Moro não tem chance de vencer as eleições ao governo do Paraná contra o governador Ratinho Júnior. Daí a ideia de lançar o ex-ministro da Justiça de Bolsonaro ao Senado. Blog do Metrópoles. - O Conselho da Petrobras vive o dilema: como sair do imbróglio - entre a cruz e a caldeirinha? - O TSE, a ser comandado pelo ministro Alexandre de Moraes, a partir de agosto, vai endurecer e punir desafiadores da lei. A conferir. - José Roberto Arruda, se conseguir viabilizar sua candidatura ao governo do DF, tem chances de voltar a dirigi-lo. - O PSD, de Gilberto Kassab, avançará bem no pleito, com chances de formar uma grande bancada. - A morte de Bruno e Dom joga a imagem internacional do Brasil no fundo do poço. - De meu artigo na Folha de São Paulo, no último domingo: "O beabá para combater a violência deve começar com o desfazimento da cosmética de miséria que se instalou no país. Os cinturões metropolitanos, já saturados de lixões que ofertam um banquete pantagruélico para urubus, crianças e mães famintas, são também palco para a exibição de corpos chacinados em decomposição, vítimas do ciclo de violência desses tempos horripilantes. O que se vê é a expansão dos contingentes das ruas, esmoleres e mendigos, que passam a noite embaixo de pontes e viadutos, cobertos por caixas de papelão.... Sem ânimo, emoções envenenadas, os cidadãos se veem acossados pela violência, entram em um limbo catatônico, assemelhando-se a dândis em passeio macabro e estonteante por um jardim de horrores. A violência suga a vitamina da vida, a alegria de viver. Ao fundo, a sombra do vírus da pandemia em sua quarta visita ao nosso habitat".
quarta-feira, 15 de junho de 2022

Porandubas nº 764

Começo com o Papa Francisco numa cadeira de rodas. O papa e a artrite O bêbado entrou no ônibus aos tombos. Malvestido, sujo, tossindo, tropeçando, tremendo, com um jornal na mão, sentou-se ao lado de um padre. A cada arranco do ônibus, tombava para o lado do padre, que, irritado, o empurrava sem piedade ou indulgência, e com nojo. O bêbado abriu o jornal, tentou ler, mas não conseguia porque tremia muito, bateu no braço do padre: - Padre, o que é artrite? - É uma doença muito ruim, muito triste, muito feia, muito nojenta, que dá nas pessoas que bebem muito. - E mata, padre? - Mata, sim, e mata rápido. Ou o doente para de beber ou morre logo. - Padre, o senhor jura que não está me enganando não? - Juro por essa cruz que está aqui no meu peito. Não estou enganando. E tem coisa pior. Quem morre de artrite, porque não parou de beber, não vai para o céu, nem mesmo para o purgatório. Vai direto para o fogo do inferno. - Coitadinho do argentino, padre. - Dele, quem? - Do Papa, padre. O jornal está dizendo aqui que o Papa Francisco está com artrite. O padre se levantou, trocou de lugar, e foi lá pra frente. (Historinha de Sebastião Nery, adaptada para a atualidade por este escriba). A imagem do Brasil No fundo do poço. O assassinato do indigenista Bruno Pereira e do jornalista inglês, Dom Philips, no Vale do Javari, Amazonas, devasta ainda mais a imagem do Brasil na paisagem internacional. Soma-se ao rol de coisas ruins que as Nações enxergam em nossas plagas, a partir do desmatamento da floresta, do garimpo ilegal, da exploração de minérios, enfim, do descaso ao qual foi relegada a região amazônica pelo governo. Infere-se que... O presidente Bolsonaro se depara com mais um obstáculo a ultrapassar em sua corrida para voltar a sentar na cadeira presidencial. A morte de Bruno e Dom abre mais espaço na mídia nacional (e internacional), com sobras de tiros em direção a um governo que acolhe bárbaros que devassam a região. Sob uma política complacente. Ou seja, esse episódio afasta muitos eleitores que poderiam votar em Bolsonaro. Recuam ante a escalada de violência e brutalidade que assolam o Brasil no atual ciclo político. A banalização do mal O mal está banalizado aqui e alhures na esteira das práticas que o alimentam. A famosa tese de Hannah Arendt sobre o tema, com foco no assassinato em massa, comandado pelo coronel nazista Adolf Eichmann ao jogar milhões de judeus nas câmaras de gás dos campos de concentração. O Álbum de Auschwitz mostra a chegada dos trens, o processo de seleção e o lugar para onde eram levados os pertences dos assassinados - conhecido como Canadá... "mulheres, crianças, idosos não sabiam o destino que os esperava; nós, porém, sabemos o que ia acontecer em minutos ou horas: seu destino eram as câmaras de gás... Entre a primavera e o início do verão de 1944, Auschwitz chegou ao limite de sua capacidade de extermínio e o superou no mais horrível e frenético período de assassinatos que o campo viveria". O criminoso cumpria ordens. Sem piedade. Um burocrata dando vazão ao sistema. A banalização do mal. A natureza do mal O mal tem origens. Nasce, por exemplo, da inação de governantes que fecham os olhos para práticas imorais, perversas, estúpidas, calamitosas. A semente do mal viceja na seara da ignorância. Massas sem acesso à educação ensejam a multiplicação de grupos, máfias, milícias. Em suma, a morte do indigenista e do jornalista inglês no Amazonas se ancora no desmando de uma administração que deixa a floresta ser devastada por "novos povoadores", os cultores do uso da bala, que emergem como "bandeirantes bárbaros" das reservas indígenas. Sob o olhar de um governo que considera a destruição do espaço amazônico um impulso ao desenvolvimento do país. Os três macaquinhos Parcela do eleitorado que votará em Lula deve fazer o gesto dos três macaquinhos - que fecham os olhos, os ouvidos e a boca. Não veem, não ouvem e não sentem o clima que envolverá sua decisão nas urnas. Votarão em Lula para evitar Bolsonaro. Hipótese que também vale para o mandatário-mor. A opção de votar nele é, para muitos, uma tentativa de deixar longe do poder o lulopetismo. Parcela ponderável do eleitorado tenta enxergar luz no fim do túnel. Quem vai segurar o farol? Programa petista Volto a lembrar. O programa de Luiz Inácio, vazado pela mídia na semana passada, mostra que o ex-metalúrgico não esquece temas que causam pesadelo junto a segmentos importantes: a revogação da reforma trabalhista, o aborto, a regulação da mídia (com cheiro de censura), a tributação dos endinheirados, entre outros itens. E, ainda, ele concorda com o uso da caneta para definir os rumos da Petrobras e, assim, abrir o ciclo de maior intervenção do Estado na economia. Lula no meio? Uma ficção O comandante petista tem se posicionado no meio do arco ideológico. É sua expressão junto aos setores produtivos. Mas, vez ou outra, o velho Lula reaparece em discursos inflamados. Geraldo Alckmin tem sido usado como colchão amortecedor junto aos setores produtivos. Um drible que poderá quebrar as pernas do jogador. O tempo provará essa hipótese. Esperemos. Em suma Jair tem apoio de 25% a 30% dos eleitores que consideram seu governo bom ou ótimo. Mesmo não sendo popular, Bolsonaro tem razoável apoio entre os padrões da América Latina. Com esse índice, ainda está na disputa. Já a rejeição a Lula tende a subir, o que tornaria a eleição competitiva. Se Bolsonaro conseguir recuperar popularidade, a eleição será apertada. Simone Tebet Toda a expectativa do grupo nem-nem se volta para Simone Tebet. Julho é seu deadline, o fim de linha. Passou o mês sem sinais de subida, será improvável permanecer no páreo. Este analista acha que haverá um pouco de pista para ela decolar. Doria, adeus João Doria diz adeus à vida pública. "A ser verdade", este analista registra algumas conclusões: 1. João fez bem à democracia brasileira; 2. O ex-governador paulista deixa marca forte no Estado mais poderoso da Federação; 3. Seu governo não ganhou o reconhecimento que merece; 4. Foi impossível ao ex-governador diminuir índices de rejeição; 5. A rejeição abriga componentes relacionados à índole de João (elite, autossuficiência, representação da cara do poderio paulista (elemento muito rejeitado pelo eleitor), imposição, pouco propenso ao diálogo, entre outros pontos. Verdade Este analista escreveu acima - "a ser verdade". A observação é para lembrar que há sempre um caminho de volta. Se as circunstâncias, no dia de amanhã, abrirem espaço para sua volta, quem garante que ele não montará no cavalo selado diante de sua porta? Minha querida e saudosa mãe sempre me dizia: "meu filho, nunca diga - desta água não beberei". Acrescento: aprendi com o filósofo Heráclito, de Éfeso, que a travessia do rio duas vezes no mesmo lugar por uma pessoa não se repete, pois as águas e a própria pessoa estarão modificadas; aprendi, também, que a pessoa pode atravessar o rio noutro momento, sob novas circunstâncias. O rio e a pessoa serão outros. A menor distância A propósito, a menor distância entre dois pontos, na geometria euclidiana, é uma reta. Tenho dito e repetido este bordão: Na política, porém, a menor distância entre dois pontos pode ser uma curva. Lembro: Fernando Henrique perdeu a eleição municipal para Jânio Quadros e, a seguir, ganhou a presidência da República. Queda da bolsa O mercado financeiro enfrenta momentos nervosos no mundo e por aqui. Bolsas fechando em baixa. O pessimismo é reflexo de preocupações generalizadas com a inflação, que está acelerando sobretudo nos EUA. Recessão mundial Anotem a inferência. O mundo deverá entrar, um pouco mais adiante, em um processo de refluxo nas economias. A partir da recessão que deve ocorrer nos Estados Unidos, a maior potência econômica. Senhoras e senhores investidores: refaçam seus prumos...e rumos. Paisagem que desenho a partir de minhas leituras. Um dos movimentos para a desvalorização do real é o estímulo à fuga de investidores do Brasil com a iminente nova elevação dos juros americanos. Os investidores retiram seus recursos da renda variável... Ucrânia Está perdendo a guerra. Rússia vitoriosa aumentará as tensões na Europa. A OTAN se dispõe a abrigar novos países. Putin irado. Sinais de paz se apagam. Os Gomes Quem deverá voltar à iniciativa privada, no próximo ano, é o presidenciável Ciro Gomes. Um perfil qualificado. Um grande conhecedor do nosso país. A propósito: os irmãos Ferreira Gomes deram um passo adiante no sistema educacional de Sobral, Ceará. Depoimento de uma figura mais que prestigiada....o homem mais rico do Brasil: Jorge Paulo Lemann. A propósito do Ceará... Junho é um mês histórico na minha trajetória. Nesse momento em que se fala da indicação de Tasso Jereissati para compor a chapa de Simone Tebet (MDB-MS) talvez seja interessante lembrar os tempos em que Tasso abriu sua jornada política. O início Há 36 anos, em 24 de junho de 1986, indicado por Fernando César Mesquita, assessor de imprensa do presidente José Sarney, cheguei à Fortaleza, Ceará, para ajudar na campanha de Tasso Jereissati ao governo do Estado. Do hotel Esplanada, onde me hospedei, fui a uma noite de São João. Tasso Jereissati, convidado por Barros Pinho, deputado estadual do MDB, dirige-se a um clube de bairro popular de Fortaleza. Primeira experiência no meio do povo. Candidato a governador do Ceará, sua missão: presidir um júri que vai julgar fantasias juninas de adolescentes. Peixe fora d'água... Estava ao seu lado como conselheiro e profissional de campanhas políticas (hoje chamados de marqueteiros). Tasso circula de mesa em mesa, apresentando-se. Encabulado. A seguir, preside o evento. Não sabe o que fazer. Ou dizer. Era muito conhecido no bairro de classe média alta, Aldeota, mas sem acesso às massas. Na época, tinha 2% de intenção de voto. "Tô fora"... Depois do evento, angustiado, ele, Sérgio Machado, na época braço direito, e este escriba, dirigem-se a um restaurante na praia para degustar uma lagosta. Logo no início da conversa, Tasso desabafa : "desisto, amigos; se política for isso, assistir a batizado, casamento, velório, festa junina, não contem comigo. Tô fora". Transtornado e disposto a abandonar a candidatura. No Hotel, dia seguinte, em uma pequena máquina de datilografia, Lettera 22, esbocei o planejamento de sua campanha. O moderno contra o arcaico O novo contra o velho. O moderno contra o arcaico. O lema que orientou a campanha. Fui à MPM, em Brasília, para que esta agência criasse o visual. Fizemos a apresentação. Mas a Propeg, de Fernando Barros, Salvador/Bahia, sob o mesmo lema, acabou sendo a agência escolhida. Fui coordenar a campanha de Freitas Neto (PFL-PI). Acompanhando o que ocorria no CE. Resumo: Tasso deu um banho nos três coronéis que comandavam a política cearense, Virgílio Távora, César Cals e Adauto Bezerra. Ganhou de Adauto Bezerra, obtendo quase 1,5 milhão de votos. Fez um governo mudancista. Hoje, senador do PSDB, é um quadro respeitado em todos os segmentos da política. Fecho com o Ceará. Com "SEU LUNGA", o famoso casca dura de Juazeiro do Norte, vendedor de sucatas, pai de 13 filhos, quase analfabeto, que ganhou fama pela língua solta e afiada. No copo? Seu Lunga descansava na rede. Manda o sobrinho trazer-lhe um pouco de leite. O garoto pergunta: - No copo? Ele responde: - Não. Bota no chão e vem empurrando com o rodo, imbecil. A promissória O funcionário do banco veio avisar: - Seu Lunga, a promissória venceu. - Meu filho, pra mim podia ter perdido ou empatado. Não torço por nenhuma promissória. Tá doente? Seu Lunga vai saindo da farmácia, quando alguém pergunta: - Tá doente? - Quer dizer que se eu fosse saindo do cemitério, eu tava morto?
quarta-feira, 8 de junho de 2022

Porandubas nº 763

Abro a coluna com a Paraíba. Silêncio, silêncio Flávio Ribeiro, presidente da Assembleia (depois foi governador da Paraíba), estava irritado com as galerias, que aplaudiram e vaiaram durante um debate entre o deputado comunista Santa Cruz e o udenista Praxedes Pitanga. De repente, tocou a campainha, pediu silêncio e avisou, grave: - Se as galerias continuarem a se manifestar, eu evacuo. Felizmente, as galerias se calaram. Na corda bamba O governo anunciou, segunda, medidas para zerar impostos sobre combustíveis. A ideia é permitir que o imposto cobrado apenas sobre o óleo diesel e sobre o transporte público seja zerado até o final do ano. Promete zerar os impostos federais - PIS, Cofins e Cide - sobre a gasolina e o etanol. Mas isso só pode ser feito com redução de tributos estaduais. Improvisação... O objetivo é compensar parte da perda de arrecadação dos Estados com recursos federais. Os Estados olham enviesado para esta promessa. Quem vai garantir isso? Paulo Guedes promete verba de até R$ 50 bilhões (de R$ 25 a R$ 50 bilhões, prometeu o ministro....que parece não ter certeza). O anúncio das medidas tem certa semelhança com a explicação capenga e improvisada de Zélia Cardoso de Melo, por ocasião do confisco da poupança nos tempos tormentosos do governo Collor. Cidades pobres e a ostentação Um escárnio. É o que se pode dizer das cidades pobres do país, a imensa maioria dos 5.674 municípios, cujos mandatários tiram dos esvaziados cofres municipais, 700/800 mil e até mais de um 1 milhão de reais para levar cantores e shows de música. Os munícipes até aprovam essa conduta. Afinal, a festa, a descontração, a farra fazem parte da índole nacional. E não querem saber se esses shows acabam tirando dinheiro de programas em áreas vitais como saúde e educação. Nossa índole Nossos grandes antropólogos e sociólogos já escreveram sobre nossa índole festivo, hospitaleira, que aprecia o ócio, o lazer, a festa. Não somos um povo ordeiro, cumpridor de normas. As decisões contemplam mais o fator emotivo que a componente racional. Daí a propensão para comportamentos extravagantes no campo dos costumes. Veja-se essa gastança com o dinheiro público nessa quarta onda da Covid-19. Baixa convicção O brasileiro não tem a convicção de um anglo-saxão, para quem pau é pau, pedra é pedra. Dependendo do momento e das circunstâncias o pau pode ter a consistência de pedra a ponto de o homo brasiliensis jurar diante de um tronco de madeira que se deparou com uma dura rocha. Essa característica tem raízes no DNA do nosso povo, alegre e acolhedor, flexível e adaptável aos momentos. Somos um povo de paz, que procura harmonizar posições, tirando proveito das situações, piscando à direita e à esquerda. Não somos de pegar forte no trabalho, dizem. Já começou a perseguição Conta-se a historinha do brigadeiro Eduardo Gomes (UDN), em seu primeiro comício, no Largo da Carioca, no RJ, idos de 1945: "brasileiros, precisamos trabalhar". Do meio do povo, um ouvinte gritou: "vixe, já começou a perseguição". O comício quase acabou. O fato é que não cultivamos a semente das convicções. Somos afeitos às imprecisões. "Quantas horas o senhor trabalha por semana"? "Mais ou menos 36 horas". "O senhor é católico"? "Sou, mas não vou à missa". Petrolina não viu, até hoje, uma gota de petróleo de sua terra, nem Petrolândia ali perto. Quem leu Jorge Amado chega à conclusão de que a Bahia de Todos os Santos deveria ser apropriadamente chamada de Bahia de Todos os Pecados. Pernas pro ar... Já o gordo pernambucano Ascenso Ferreira, genial intérprete da nossa cultura, cantava: "Hora de comer - comer! Hora de dormir - dormir! Hora de vadiar - vadiar! Hora de trabalhar? - Pernas pro ar que ninguém é de ferro!" Água subirá a serra? Vejo com esperança a detonação de uma rocha no pé da serra de Luis Gomes, minha querida cidade potiguar, que faz fronteira com a Paraíba e com o Ceará. Explosão marcada para ontem, terça, e que dará início às obras de um túnel que propiciará a chegada da água no extremo oeste do RN e outras regiões cobertas pelo Ramal do Apodi. Ufa! Sonho de gerações. No dia em que a água chegar em cerca de 54 cidades do Nordeste, o Brasil dará um salto de progresso. Puxadores de votos Em toda eleição, emergem as figuras classificadas como puxadores de votos, ou seja, nomes de grande visibilidade, famosos, perfis polêmicos e mesmo pessoas bem qualificadas na esfera política, como a ex-senadora Marina Silva. A ex-ministra acreana deverá compor a chapa de nomes para deputado Federal em São Paulo pela Rede Solidariedade. Muito bem. Ocorre que essa prática se tornou um anzol torto para pescar eleitores. Torto? Sim. Os candidatos transferem seu domicílio eleitoral para praças mais densas de votos, forma de aumentar as bancadas partidárias. Desconhecimento Vejam o caso do deputado Federal Eduardo Bolsonaro. Não se vê tal figura circulando em São Paulo, onde obteve extraordinária votação em 2018, cerca de 1,84 milhão de votos, a maior do país. O PSL, que era o partido de Jair Bolsonaro naquele ano, foi o que teve as maiores votações em cinco Estados. Pergunte-se ao deputado se ele sabe onde é o Tatuapé ou a Capela do Socorro, na capital paulistana. Ou ainda: já foi, por exemplo, a Santa Rita do Passa Quatro, na região de Ribeirão Preto? Faça-se a mesma pergunta a Marina Silva. E mais: que ações foram feitas por Vossa Excelência para São Paulo, deputado Eduardo? Um drible? Será que essa prática continuará a integrar o nosso sistema eleitoral? Não é um drible em nossa democracia? Tiririca Briga entre famosos. O deputado Federal Francisco Everardo Oliveira Silva (PL-SP), o Tiririca, pode perder o seu número no Partido Liberal depois da chegada de Eduardo Bolsonaro à sigla. O humorista usa o 2222, que seria cobiçado pelo filho do atual presidente da República. P.S. Na eleição de 2010, Tiririca se elegeu como o deputado Federal mais bem votado do país, recebendo 1 milhão e 300 mil. Usava o jargão: "pior que tá não fica. Vote em Tiririca". Um absurdo É um absurdo vermos uma operadora de carga privilegiando a compra de trens importados de passageiros em detrimento dos nacionais. Uma vergonha. Emprego e renda ao estrangeiro e não a nós, brasileiros. O setor ferroviário de passageiros tem melhor capacidade de fabricar estes trens e mantê-los por três décadas de uso. Os equipamentos importados da China não são bons e os últimos tiveram que ser mantidos pela indústria nacional. Na hora de apoiar as renovações antecipadas foi a indústria nacional que esteve presente, que deu um passo à frente, financiando estudos e demonstrando sua viabilidade E agora, quando se apresenta o momento de participar do desenvolvimento nacional, o setor de passageiros se vê relegado ao esquecimento. Quarta onda O costume acaba aplainando o terreno das restrições. A primeira fase da Covid-19 trouxe muito medo. Com os tempos, as pessoas foram se acostumando e se adaptando ao clima da pandemia. Vivemos, hoje, a quarta onda. Tudo parece normal. Circulação nas ruas e nos escritórios. Contaminados em expansão. Mortes em fluxo decrescente. As piores mazelas entraram no espaço da banalização. Que tempos... Os generalistas Nos últimos anos, ganhou projeção a figura do generalista, o profissional que, possuindo conhecimentos específicos, reúne condições e potenciais para estabelecer abordagens abrangentes da sociedade. O generalista era considerado um profissional não muito respeitado pelo fato de "querer saber de tudo" e, no fim das contas, "não saber nada". Sua imagem, porém, ganhou consistência. A holística O conhecimento holístico, capaz de integrar as partes no todo, constitui uma exigência do mundo competitivo e globalizado. As análises simplistas começam a ser rejeitadas. Um dos mais imperiosos desafios dos profissionais de comunicação reside na capacidade de saber ler cenários e projetar situações. Discurso político 1. Slogan-repetição É bastante eficaz, nas campanhas políticas, a aplicação de um bordão ao final dos discursos, repetido todas as vezes em que o candidato discursa. Exemplo de fecho de discurso, que ficou famoso, é o do senador Catão, no Senado Romano, que terminava sua oração da mesma forma: "Ceterum censeo, Carthago delenda est" ("em outras palavras, Cartago deve ser destruída"). 2. Força mística Hoje, muitos se valem do escudo religioso. O eleitorado respeita e tem veneração pelo eixo místico. Candidatos de igrejas evangélicas costumam recitar salmos, do tipo: "Deus é o meu pastor e nada me faltará"... "se Deus está comigo, quem estará contra mim?". 3. Valores do ciclo eleitoral Valores que o candidato deve alinhar ao discurso: participação - a sociedade está querendo participar do processo político; cobrança - o eleitor quer fiscalizar a vida e as promessas; autonomia - a capacidade de um candidato de decidir sobre seus atos, seus fins, a capacidade de escolher os meios para atingir os fins; juventude - conciliar uma certa jovialidade com a experiência do adulto, não passar ideia de muito impetuoso nem muito velho; cidadania - é um conceito muito importante hoje. Cada vez mais o cidadão quer reforçar a sua cidadania. A cidadania se conquista com emprego, saúde, melhores condições de vida, segurança, liberdade e conquistas dos direitos individuais e sociais. É oportuno lembrar: os valores estão presentes dentro do contexto sócio-político: participação, fiscalização, cobrança, mudanças no sentido de inovação, simplicidade, mais ação menos palavras, autonomia, juventude, experiência, cidadania. 4. Eficácia do discurso O interesse pelo discurso se relaciona ao uso que o leitor/ouvinte poderá fazer da mensagem. Quanto mais benefício ela trouxer, mais possibilidade terá de ser selecionada. Esse benefício, por sua vez, está relacionado à proximidade psicológica/distância psicológica que ela apresenta. As modulações pessoais da linguagem oral, por exemplo, reduzem a distância do indivíduo. E o uso de apelos emocionais facilita o encaixe da mensagem na psique. A mensagem precisa ser inteligível, de forma a ser compreendida plenamente pelo receptor. Maquiavel Pinceladas do pensamento de Maquiavel: - A ofensa que se fizer a um homem deverá ser de tal ordem que não se tema a vingança. - Arruína-se quem é instrumento para que outro se torne poderoso. - Não há coisa mais difícil de se fazer, mais duvidosa de se alcançar, ou mais perigosa de se manejar do que ser o introdutor de uma nova ordem, porque quem o é tem por inimigos todos aqueles que se beneficiam com a antiga ordem, e como tímidos defensores todos aqueles a quem as novas instituições beneficiariam. Fecho a coluna com Pernambuco. "Só expectorante" Reunião de vereadores com o chefe político da região numa pequena cidade de Pernambuco. Cada um tinha de falar sobre os problemas do município, reivindicações, sugestões, etc.. Todos falaram alguma coisa, com exceção de um deles, meio acabrunhado no canto da sala. O chefe político cobrou dele a palavra: - E você, amigo, não tem nada a dizer? O vereador, tonto com a provocação, não teve saída. Respondeu: - Não, doutor, estou apenas expectorante. Abriu a gargalhada dos companheiros espectadores. ("Causo" do ex-governador de PE e ex-senador Maciel com relato de Geraldo Alckmin.)
quarta-feira, 1 de junho de 2022

Porandubas nº 762

Abro a coluna com uma historinha da lavra de Vítor Sérgio, de Manaus. Urgência na farmácia Com a palavra, Vitor: Tenho um amigo que mora em Canutama, município do Amazonas. Certa vez resolvi visitá-lo e fiquei contente porque ele prosperara e montara uma drogaria, que funcionava no térreo de sua casa. Num domingo de sol, bebíamos umas "geladas", comendo churrasco, quando começou a cair o maior "toró". A chuva já estava passando quando escutamos um barulho vindo do andar de baixo. Me debrucei e verifiquei que havia um cara bêbado, "chapado", batendo na porta da drogaria e dizendo: - Por favor, abra a porta, abra porta!!! Avisei ao amigo: Tem um cara querendo comprar algum medicamento. - Dia de domingo, eu não abro a drogaria nem pra minha mãe, além disso o cara tá cheio da "maldita". - Pro cara tá batendo debaixo de chuva deve ser alguma urgência... -Vou nada, hoje é meu dia de folga, não vou nem "amarrado". - O bebum vai ficar batendo e aperreando a gente, vai lá ver o que ele quer. Hoje é ele quem está precisando. Amanhã pode ser um de nós. Abra a drogaria, atenda esse homem, depois você volta. - Tá bom, só vou porque você tá pedindo. O colega desceu as escadas, acendeu as luzes, e abriu o portão de enrolar de ferro. Minutos depois escutei-o esbravejar: - Vai tomar no ..., bêbado filho de uma ...! Desci correndo as escadas, pensando se tratar de briga ou assalto. Encontrei meu amigo fechando o portão. - O que foi? perguntei - Qual remédio ele queria? - Ele não queria remédio não, queria que eu ligasse a balança eletrônica pra ele se pesar...... As mortes anunciadas Mais de 500 pessoas morreram no território nacional do fim do ano passado até hoje. Vítimas de tempestades e temporais. A natureza dá suas respostas aos desmandos, à irresponsabilidade de políticos e governantes que só olham para as catástrofes quando as mortes ganham altos índices. Descaso Muitos se contentam em observar as cenas e a produzir platitudes: "catástrofes infelizmente acontecem". O Brasil é um laboratório mundial da ausência de planejamento urbano e descaso com a anatomia das cidades. Todos os anos, centenas de famílias choram as mortes anunciadas nas inundações. Decalagem Um governo eficaz tem aptidão para prever problemas e antecipar soluções. Usa a técnica da "decalagem" (avanço), a capacidade do atirador, que calculando a distância e a trajetória do alvo móvel, acerta-o em cheio, disparando um pouco à frente do ponto escolhido. Mas a ausência de planejamento se faz ver em toda a parte. A estética das ruas O país vê se avolumar o número de pedintes, mendigos, moradores de rua, corpos estirados sob pontes e viadutos. A estética urbana é um desfile de pessoas enroladas em trapos e escondidas em caixas de papelão. Os espaços de concentração de consumidores e vendedores de drogas se expandem, como a cracolândia na capital paulista ganhando manchetes, repressão e choques com a polícia. O país da miséria se apresenta por inteiro. Mais da metade Mais da metade dos 5.574 municípios brasileiros está no universo da pobreza ou da extrema pobreza. A fila dos auxiliados pelas migalhas dos pacotes assistencialistas dobra quarteirões. Hoje, o total de famílias dentro do programa é de 18 milhões, mas a fila que está fora dá voltas pelo perímetro das principais cidades do país. Este é o pano de fundo que se desenha a um pouco mais de quatro meses das eleições. E é claro que a necessidade de abastecer a barriga se fará presente dia 2 de outubro. A negritude Este analista põe os seus sentidos no campo de observação do "pretagonismo", termo que toma emprestado da biblioteca da perspicaz jornalista Flávia Oliveira, cujos livros ao fundo na Globo deixam títulos bem visíveis. Há, ali, um livro sobre o protagonismo dos negros. Pois bem, feita a observação, minha inferência: os negros expandem, mesmo de maneira lenta, sua participação na vida social e política do país. Nos espaços midiáticos, a partir de anúncios publicitários, sua presença tem sido marcante, sobressaindo-se mensagens de cunho alegre e lindas imagens de mulheres e homens negros. Na política Não podemos dizer, ainda, que os negros tenham conseguido chegar ao patamar dos "brancos" (a cor nacional preponderante não é essa). A proporção de negros no Brasil é de 56%, mas sua participação nas eleições para deputado Federal, entre 2014 e 2018, foi de 40%. Defasagem de 16 pontos. O fato é que a defesa da diversidade, da inserção negra na esfera da política e de outros espaços da vida social, ganha tons mais altos nesses tempos de elevação do discurso sobre os direitos humanos. Artigos e análises sobre o tema inundam as searas midiáticas. Milton Gonçalves Cheguei a engatar bons papos com o excepcional ator Milton Gonçalves, como eu, um dos integrantes do Conselho de Desenvolvimento Econômico e Social, o Conselhão, por ocasião do governo Michel Temer. Participávamos do mesmo grupo de discussões. Um brasileiro com firme convicção política. Um cidadão que pensava bem o seu país. Um ator, cujos feitos, filmes e peças teatrais, orgulha o painel das artes e da cultura nacionais. Rejeição Sei que muitos eleitores e leitores não acreditam em pesquisa. Mas uma coisa parece certa. O índice de rejeição aos principais candidatos é alta. Segundo pesquisa do BTG Pactual/FSB, divulgada nesta segunda-feira, 59% dos entrevistados não votariam em Jair Bolsonaro de jeito nenhum. Ciro ganha a segunda posição com 49% dos entrevistados e Lula alcança o índice de 43%. Rejeição quer dizer: não votarei nessa pessoa nem que a vaca tussa. E agora? Há chance de O Imponderável nos visitar até 2 de outubro? Marcio França Segunda, no SEAC-SP, Marcio França, do PSB, em palestra para empresários de serviços, garantiu que irá até o fim em sua campanha ao governo de São Paulo. Está firme e confiante que tem "grande chance de ganhar". Rodrigo Garcia Usa bem os espaços publicitários do PSDB para se apresentar. Pode crescer. Principalmente, ante eventual polarização com Tarcísio de Freitas, candidato de Bolsonaro, e Fernando Haddad, do PT. Márcio França corre pelo meio. Simone Tebet Precisa usar melhor a mídia eleitoral do MDB. Uma grande barreira a impede de crescer: o desconhecimento por parte do eleitorado. É preparada e de boa fluência ideativa. Marqueteiros Precisam se convencer: o marketing antigo não mais funciona em tempos de eleitores que influenciam as redes sociais. Paulo Guedes De bicho papão, tornou-se camaleão. Adapta as falas para agradar à esfera política. Assume a cor do momento. Não mais contraria interesses da política. Flexível como um caniço ao vento. Lula Vez ou outra, esquece o meio e vira porta-voz da extrema esquerda ideológica. Nunca esquece os passeios pelo palanque. Bolsonaro Não tem jeito. Vai enfrentar as eleições com o discurso radical. Agrade ou não aos generais. Forças Armadas Avoluma-se o discurso de que "não haverá golpe". As quatro linhas da letra constitucional se transformam em slogan dos militares. O Nordeste Continua a ser o bastião avançado do lulopetismo. Muitos bolsonaristas atacam as pesquisas que dizem isso. O Sudeste No Sudeste, mais precisamente em São Paulo, Minas Gerais e Rio de Janeiro, está o Triângulo das Bermudas. Quem não afundar nas tormentas desse pedaço, ganhará a campanha. O Sul Já foi muito bolsonarista. Está amainando a imagem conservadora. Com 15% do eleitorado, mostra-se fugindo de Bolsonaro. O Centro-Oeste É a região bolsonarista por excelência. Mas o agro começa a arar o terreno das dúvidas. Será que o atual governante merece nossa confiança? Covid-19 Os hospitais do Sudeste acusam: a Covid-19 ganha novo impulso na região. O patamar móvel nas últimas semanas tem registrado crescente aumento de internações. Os mais jovens se afastaram dos postos de vacinação. Teremos de conviver com o vírus por um longo tempo. A máscara veio para ficar. Redes sociais Esta é a mais consequente ferramenta usada pelo bolsonarismo. Sob os domínios do vereador Carlos Bolsonaro, filho do presidente, que sabe manobrar a arma de ataque do bolsonarismo. Uma torrente de fake news nos aguarda. Petrobras O presidente continua a fazer trocas no comando da Petrobras. Antigamente, o Conselho da Petrobras escolhia o presidente da empresa. Hoje, o presidente da empresa, nomeado pelo presidente da República, é quem escolhe os componentes do Conselho. Que tempos.... Pacheco e Lira Os presidentes das casas congressuais mostram-se no espelho midiático como protagonistas da defesa da institucionalidade. Arthur Lira, da Câmara, com falas mais estreitas e voltadas para os componentes do Centrão; Rodrigo Pacheco, do Senado, com falas mais abertas em defesa da democracia. Ambos tentando alargar as veredas do amanhã. Sobre o bem, o mal e o canibalismo a) Jung Carl Jung perguntou a um rei africano qual a diferença entre o bem e o mal. Às gargalhadas, o soba respondeu: "Quando roubo as mulheres de meu inimigo, isso é bom. Quando me rouba ele as minhas, isso é ruim". b) Humboldt Sugestão feita a indígenas por Alexander von Humboldt, geógrafo, filósofo, historiador, explorador e naturalista alemão nascido em Berlim, que deu início, em fins do século, a memoráveis expedições naturalísticas, considerado o fundador da moderna geografia física. "Não comam os outros". Resposta dos índios: "O senhor tem razão. Não podemos compreender que mal há nisso, pois os homens que comemos não são nossos parentes". Esse duplo padrão ético é a luz que ilumina nossa representação política e nossos governantes. c) Um turco e um canibal Um turco se encontrou um dia com um canibal. "Sois muito cruéis, pois comeis os cativos que fazeis na guerra", disse o maometano. "E o que fazeis dos vossos?", indagou o canibal. "Ah, nós os matamos, mas depois que estão mortos não os comemos." Montesquieu arremata a passagem contada no livro Meus Pensamentos: "Parece-me que não há povo que não tenha sua crueldade particular."
quarta-feira, 25 de maio de 2022

Porandubas nº 761

Abro a coluna de hoje com uma deliciosa historinha do Brejo das Freiras, lá nos fundões da Paraíba, pertinho do meu torrão, Luis Gomes/RN. Lascou-se... Brejo das Freiras é uma Estância Termal nos confins da Paraíba, perto de Uiraúna e Souza. Trata-se de um lugar para relaxamento e repouso. O governo da Paraíba tinha (não sei se ainda tem) um hotel, com uma infraestrutura para banhos nas águas quentes. Década de 70. Apolônio, o garçom, velho conhecido dos fregueses da região, recebe, um dia, um hóspede de outras plagas. Pessoa desconhecida. Lá pelas tantas, quase terminando a refeição, o senhor levanta a mão, chama Apolônio e pede: - Meu caro, quero H2O. Susto e surpresa. Anos e anos de serviços ali no restaurante e ninguém, até aquele momento, havia pedido aquilo. Que diabo seria H2O? Apolônio, solícito: - Pois não, um instante! Aflito, correu na direção da única pessoa que, no hotel, poderia adivinhar o pedido do hóspede. Tratava-se de Luiz Edilson Estrela, apelidado de Boréu (por causa dos olhos grandes de caboré), empedernido boêmio, acostumado aos salamaleques da vida. - Boréu, tem um senhor ali pedindo H2O. O que é isso? Desconfiado, pego sem jeito, Boréu coça o queixo, olha pro alto, tenta se lembrar de algo parecido com a fonética e, desanimado, avisa: - Apolônio, sei não. Consulte o Freitas. Freitas era o diretor do Grupo Escolar, o intelectual da região. Localizado, o professor tirou a dúvida no ato: - H2O é água, seus imbecis. Quer dizer água. Água, água. Apressado, Apolônio socorreu o freguês com uma jarra do líquido. Depois, no corredor, glosando o feito, gritou em direção a Boréu: - Ah, ah, ah, esse sujeito achava que nós não sabia ingrês. Lascou-se! Panorama PSDB em chamas A renúncia de João Doria era algo previsível. Percebera há tempos que a prévia partidária, que ganhou, não tem a mesma força da convenção. A cúpula tucana o rifou. João ganhou prévias para a prefeitura e para o governo do Estado. E se submeteu à prévia para a candidatura à presidência. Ganhou, mas não levou. Coisas do Brasil. Fez uma excelente gestão no governo. O pai da vacina brasileira. O governante deixa um jardim na marginal do rio Pinheiros, que deixa de ser poluído. Reconhecimento? Mais tarde A história não lhe negará o reconhecimento. O torvelinho do momento e a dissonância criada na esteira do debate eleitoral abafam as análises lógicas, elevando as tensões emocionais. E a ambição de João, sua determinação em disputar cargos elevados o inserem na lista da desconfiança. O eleitorado se afasta, daí a rejeição ao nome. Mais adiante, poderá ser chamado pelo partido para um novo desafio. A conferir. E Tebet decola? A resposta requer um conjunto de situações: - boa visibilidade na mídia; - capacidade de aglutinar contingentes que integram o nem-nem (nem Lula nem Bolsonaro), principalmente setores médios e profissionais liberais; - aperto na economia, com baixo índice de Bolsonaro; - alta rejeição ao lulopetismo; - mobilidade - capacidade de visitar todas as regiões, a partir dos três maiores redutos eleitorais - São Paulo, Minas Gerais, Rio de Janeiro e Bahia; - apresentação de um projeto Brasil, que seja denso, consistente, com eixos que sejam simpáticos e tenham capacidade de laçar (loop) áreas e setores; - impregnar-se do conceito de "novidade", "renovação", "assepsia", "o espírito do tempo"; - Recursos para enfrentar uma campanha nacional. Uma bússola populista Jair Bolsonaro está desesperadamente à procura de uma bússola popular, algo que o amarre na árvore de atração das massas. A inflação e o pacote do auxílio Brasil, sob o encarecimento dos transportes e dos alimentos, corroem seu poder agregador. Pode isso lhe custar a eleição. Indignação das massas lá por setembro é uma ameaça ao esforço para recuperar votos perdidos. Os preços dos combustíveis serão contidos? A mudança no comando da Petrobras poderá se tornar insuficiente para alargar o caminho bolsonarista. Nordeste O governo conta com um grande trunfo no Nordeste: a transposição das águas do São Francisco. A água do velho Chico está chegando à região. As obras compõem a estética da zona rural, com máquinas trabalhando dia e noite. A água, para o nordestino, é um sonho acalentado desde sua tenra idade. A chuva é uma festa, mas depender de chuvas tem sido um exercício de expectativas revertidas. Choro e vela. E fome. A água As maiores alegrias para este escriba, em sua infância, vinham dos céus. Chuvas torrenciais, relâmpagos e trovões faziam a alegria da garotada, que, nas ruas, corria para as bicas formadas nos tetos das residências e prédios do comércio. E brincava de fazer "pequenos açudes", escavando no barro vermelho das ruas e juntando as águas das correntes. Que tempos bucólicos. Mas eram raras as chuvas. E a paisagem de caminhões-pipa e água buscada longe, nas lagoas, no lombo de jumentos, eram cenas constantes em nossas vidas. Sonho realizado Por isso, a água do São Francisco chegando às cidades, saindo das torneiras nas casas, é uma chave que poderá propiciar uma torrente de votos para Bolsonaro no Nordeste. O PT certamente vai dizer que na administração petista, ao longo de 12 anos, fez a maior parte das obras que estão realizando o sonho nordestino. Não sei. Debate aceso. Recheado de números e ideias. Cada qual vai querer tirar uma fatia deste apetitoso bolo. A discussão vai longe. O fato é que um "milagre" fará do Nordeste uma "terra prometida". Pero Vaz de Caminha, cutucando Pedro Álvares Cabral, deve estar alegre: "ali, se plantando, tudo dá". Bons risos. SP e NE São Paulo, sozinho, tem cerca de 36 milhões de votos; o Nordeste abarca cerca de 40 milhões. Quem levar a melhor votação nesses dois territórios deve se sentar na cadeira presidencial. Claro, garantindo também bons índices em outras regiões. Renovação A renovação nas casas congressuais - Câmara e Senado - deve ultrapassar os 50%. Pode chegar a 60%. A conferir. Biden e a fogueira Na Coréia do Sul, respondendo a uma pergunta, Joe Biden, presidente dos EUA e maior protagonista ocidental na esfera política, admitiu que usaria força para defender Taiwan. A China, pertinho, ouviu a resposta. E, assim, a Guerra Fria vai se tornando quente. Os Beatles? Que triste. No Reino Unido, 1 em cada três da geração Z - aqueles que nasceram entre a 2ª metade dos anos 90 até o ano de 2010 - não conhece os Beatles. Não sabem o que estão perdendo. Prova de fogo Já se especula que Lula não irá a debates. Bolsonaro também deve se recusar. Ora, um debate é a oportunidade de o eleitor tirar a limpo suas interrogações. E definir seus rumos. Sugiro dois debates com três candidatos. Um no início da campanha, outro em final de setembro. Lesmas e camaleões Quem sabe a semelhança entre a lesma e o camaleão? Aparentemente, quase nada, a não ser o fato de que ambos podem se arrastar pelo chão. Estudando atentamente as qualidades desses dois animais, identifica-se em ambos algo semelhante: a capacidade transformativa. O pequeno molusco, atingido por uma camada de sal, derrete e se transforma em água. O garboso lagarto, por sua vez, tem a capacidade de vestir as cores do ambiente em que se instala, saindo do verde das folhas para o marrom dos galhos secos com a maior facilidade. Símbolos Esses dois transformistas serão os principais símbolos da campanha eleitoral. Centenas de candidatos sairão líquidos das urnas, atingidos pelo sal grosso jogado pelo eleitor, enquanto outros, camaleões sabidos, ganharão solidez porque passarão a ter a cor do galho do momento, correndo atrás de um cidadão indignado. Mudarão o modo de agir, de se comportar, de dizer que nunca disseram isso e aquilo e até tentando se desvincular de atos do passado e de perfis rejeitados. Lembram-se de alguém? Alexandre Todo líder possui uma qualidade notável: a de antever possibilidades, quando os outros só veem restrições. Dois casos clássicos demonstram a capacidade estratégica de um líder. O primeiro envolve Alexandre Magno. Quem conseguisse desatar o nó que unia o jugo à lança do carro de Górdio, rei da Frígia, dominaria a Ásia. Muitos tentaram. Foram a Alexandre. Ele tinha duas opções: desatar o nó ou cortá-lo com a espada. Optou pela via mais rápida e certeira com um golpe forte. Sabia que perderia tempo tentando desatá-lo. Colombo O segundo caso é o ovo de Colombo. Levaram um ovo para o almirante e pediram que ele o equilibrasse. Com um pouco de força, Colombo colocou o ovo em posição vertical sobre a mesa. A questão que se coloca aos candidatos: descobrir se possuem a determinação férrea de Alexandre ou a matreirice de Colombo. Já sabemos que alguns perderão a Ásia, chegando a outubro próximo com o ovo rolando sobre a mesa. Quem é Giordano? Esperem minha reflexão de fim de semana.
quarta-feira, 18 de maio de 2022

Porandubas nº 760

Abro a coluna com uma historinha do Ceará. Que mundo doido... - É o diabo, o mundo endoidou - exclamava Maneco Faustino nas ruas de Limoeiro/CE. E completava: - Veja vosmicê: tá se vendo estrela a mei dia; já hai galinha com chifre; cangaceiro dá esmola pra fazer igreja; já apareceu bode que dá leite; chove no Ceará em agosto. Muié já se senta em cadeira de barbeiro. Pedro Malagueta confirmava: - Tá mesmo, cumpade, o mundo endoidou. Tenho três filha, duas casada e uma solteira: as duas casada nunca tiveram menino; agora a solteira todos os ano me dá um neto... Panorama Vamos a nossa leitura sobre a paisagem político-institucional. Golpe A cúpula militar não aprova ideia de golpe. A caserna está comprometida com profissionalismo. E preocupada em manter sua boa imagem. Numa régua de 0 a 10, a hipótese de golpe é zero. Na visão deste analista, claro. Perna capenga A perna social do governo, o programa Auxílio Brasil, está mancando. Cerca de 1,3 milhão de pessoas estão na fila, aguardando cadastramento. E tome queixa dos desassistidos. Ruim para Bolsonaro e bom para Lula, relembrado como o pai do Bolsa Família. Se essa perna continuar a mancar, imenso contingente mostrará sua indignação nas urnas no dia 2 de outubro próximo. 62 milhões Falta grana no bolso de quase 62 milhões de brasileiros para pagar suas contas. A inadimplência aumentou 6% no mês passado, fazendo com que quatro em cada 10 brasileiros ficam com pendências junto aos birôs de crédito. Ruim para Bolsonaro. Baratear fica caro Brasduto - esta é a solução que os integrantes do Centrão estão maquinando para equacionar a falta de energia no país. Significa um aporte de R$ 100 bilhões para construir uma rede de termelétricas à gás perto de polos industriais, muitos longe dos consumidores. Uma ideia que vai encarecer muito o parque energético. Os recursos viriam do pré-sal. Regiões a serem contempladas: Norte, Nordeste e Centro-Oeste. A rede de gasodutos, comenta-se, atenderia aos interesses de Carlos Suarez, o S da construtora OAS, de onde saiu em 1996. E, claro, aos interesses do Centrão. Objeto: construção de um "centrãoduto". A inflação Bolsonaro minimiza os efeitos da inflação, que corrói a grana dos mais pobres. A inflação expande o custo dos alimentos, inflando o preço da cesta básica. O salário mínimo, hoje, tem um poder de compra bem menor do que no início da administração bolsonarista. Fala contundente Ouvi o discurso do presidente Bolsonaro no evento dos supermercados. Quase uma hora de fala aos gritos. Confesso que fiquei impressionado com sua exaltada expressão: abordou todos os temas, de improviso, usando exemplos e metáforas, ao lado de um desfile de palavras de baixo calão (tirar o meu da reta, porra, é foda e outras...). A impressão é a de que a fala aberta conquista ouvintes e é fator determinante para reforçar a cooptação de simpatizantes. Foi aplaudido diversas vezes. Um ataque duro ao lulopetismo e em defesa dos valores conservadores. Tucano se bicando... Os tucanos estão em alvoroço ante o incêndio que consome sua floresta. A cúpula tucana isolou o pré-candidato João Doria, que deixou o governo de São Paulo, submeteu-se ao filtro das prévias, ganhou a disputa e, agora, se vê "golpeado" por tucanos da cúpula. Há exceções, claro. Pegando fogo Fernando Henrique defende Doria por ter ganho as prévias. O próprio adversário, Aécio Neves, identifica um "golpe" contra João. Como se sabe, Doria e Aécio são desafetos e adversários políticos no xadrez do PSDB, mas a conjuntura colocou os dois no mesmo lado na reunião decisiva da Executiva Nacional tucana marcada para ontem, às 16h, na sede da legenda em Brasília. Como ficou o imbróglio? Até o fechamento desta nota, não havia informação de que Doria iria apelar para a Justiça para manter a decisão da prévia partidária. A direita dá um salto Surpreendente: 21% dos brasileiros simpatizam com ideias conservadoras, quase o dobro dos eleitores que se posicionam à esquerda, 11%. Este é o resultado de uma pesquisa feita pelo Senado junto a 5.850 pessoas entrevistadas. Trata-se de novidade. A impressão é a de que a esquerda havia tomado impulso nos últimos tempos. Mas, atenção: o grupo do nem-nem, nem esquerda, nem direita, nem centro, subiu de 50% para 55% de 2021 para cá. Em 2019, os centristas somavam 32%, em 2021, 11% e hoje somam apenas 9%. Na visão deste analista, deve haver um erro na metodologia. Como explicar a preferência do eleitorado para votar em perfis de esquerda? Lula terá votos conservadores? Essa é a dúvida que emerge. Será que o lulopetismo se alimenta de valores do conservadorismo? A hipótese parece não se sustentar. Pano de fundo: grande parcela dos entrevistados defende as urnas eletrônicas, diz ser contra a devastação ambiental e a expansão da população armada. Lavareda O cientista político, Antônio Lavareda, atesta: "essa tendência de uma guinada à direita vem ocorrendo desde 2012". Fenômenos da atualidade Nesta parte, passo a apresentar alguns fenômenos da atualidade. 1. O protagonismo evangélico Os evangélicos estão entrando de corpo e alma no território da política. Não apenas apoiando e lançando candidatos, mas lançando seus próprios nomes ao sufrágio universal. Evangélicos expandem suas bancadas e dão palpites em matérias diversas, a partir dos valores da família. E o Estado laico? A separação entre as coisas da religião e as coisas do Estado. Discurso ultrapassado. No MEC, faziam pressão, até com caravanas de pastores que frequentavam as antecâmaras do poder. "Dai a Deus o que é de Deus e a Cesar o que é de César?". Eis um princípio que já não entra nos ouvidos evangélicos. 2. O protagonismo militar Os militares também entram com mais vontade na seara da política, seja participando das máquinas administrativas nas áreas Federal, estaduais e municipais, seja como candidatos na esfera da participação eleitoral. Generais e coronéis tomam assento no Palácio do Planalto, têm remuneração aumentada com salários que se somam aos soldos e tomam decisões em setores estratégicos. Em suma, gostam desse tipo de participação. E parece desejarem continuidade nesse mister. 3. O protagonismo feminino As mulheres avançam no terreno da política e nos espaços midiáticos. Mesmo que esse protagonismo ainda não tenha conquistado maior número de parlamentares e governantes, são visíveis os sinais de empoderamento das mulheres, que agem de forma mais intensa e organizada nos painéis que discutem políticas de elevação da cidadania. 4. O protagonismo da LGBTQIA+ Lésbicas, gays, bissexuais, travestis, transexuais, queer, intersexuais, assexuais e outros grupos e variações de sexualidade e gênero, sob a bandeira da Associação Brasileira - LGBTQIA+ -, passaram a ter participação mais intensa nos foros nacionais do debate. Nas ruas e parques, sua presença se insere na estética dos novos tempos, de maneira desassombrada e consciente de seus direitos. 5. O protagonismo dos negros Os negros ganham respeito e espaço na vida institucional e política. Nos domínios midiáticos, integram programas jornalísticos, novelas e mídias publicitárias. Estão presentes em praticamente todos os meios, podendo-se inferir que avançam nos caminhos da elevação da cidadania. Mesmo que ainda sejam alvo de discriminação por parte de um ou outro indivíduo. 6. A ladroagem tecnológica Outro fenômeno da atualidade é a ladroagem que se expande pelas malhas da tecnologia. Hackers agem como ladrões tecnológicos, roubando cartões de crédito e senhas de usuários para surrupiar seus recursos. Os sistemas de segurança de bancos e lojas não garantem plena proteção aos consumidores, deixando janelas abertas ao crime. É a tecnologia usada pela criminalidade, que tende a ser uma mazela dos tempos modernos, aqui e alhures. A defesa da cultura Grupos de intelectuais se juntam para defender padrões culturais, tradições e costumes. Essa fortaleza de defesa é a esperança de que nossa cultura resista aos efeitos deletérios da globalização, que tende a apagar nossa memória. Partes de nossa história, parcelas de seus personagens, enredos e produção literária são frequentemente esquecidas ou jogadas no baú das coisas inúteis. Um desprezo ao passado. Felizmente, pessoas e grupos comprometidos com a cultura e as artes se unem em um cordão de proteção, buscando resgatar a semântica e a estética do ontem e trazendo à tona livros, poesias, imagens, quadros, crônicas, enfim, relatos que emolduram as páginas de nossa cultura. Um exemplo Querem um exemplo? Um grupo de acadêmicos - poetas, romancistas, cronistas - que integram a Academia Norte-rio-grandense de Letras. Quase diariamente, participantes do grupo nos brindam com a divulgação de acervos -, histórias, romances, crônicas, pinturas -, que pinçam dos recantos da memória. Nomeio alguns deles: Lívio Oliveira, prof. Ivan Maciel, Ivan Lira, Carlos Gomes, Iaperi Araújo, Prof. Benedito Vasconcelos Mendes, Leide Câmara, Humberto Hermenegildo, Edilson Nobre, Roberto Lima, Marcelo Alves, Armando Negreiros, Sonia Faustino, Diva Cunha, Marcelo Navarro, entre outros. Grupos assemelhados se espalham pelas unidades da Federação. Balões de oxigênio vitalizam a cultura brasileira. Um viva a esse Grupo! Casamento Lula casa, hoje, com a socióloga Rosângela da Silva, 55, Janja (Janjinha, como a chama). A noiva usará um vestido coberto de bordados feitos por moradoras de Timbaúba dos Batistas, cidade da região do Seridó, do Rio Grande do Norte. O evento é muito disputado. Terá cerca de 200 convidados. E mais de 500 esperando uma brecha. Malha ferroviária de passageiros A indústria ferroviária acaba de lançar um manifesto em que solicita ao governo investimentos para alavancar o desenvolvimento do sistema ferroviário regional de passageiros. Clama pelo marco regulatório do setor com vistas a maior segurança jurídica, garantindo que dispositivos já existentes, como o das autorizações ferroviárias, possam ser aplicados à área de passageiros, aumentando o rol de investimentos em infraestrutura nacional. O manifesto O manifesto, assinado por empresas e entidades, explica que, nos últimos 10 anos, a participação privada no setor metroferroviário urbano de passageiros aumentou mais de 300%. "A inexistência de um marco regulatório específico para o transporte regional de passageiros, segmento totalmente diferente do ferroviário de carga, em especial no que tange à operação, segurança, interface com os clientes e serviços ofertados, gera insegurança jurídica e instabilidade regulatória, que contribuem sobremaneira para o afastamento do mercado e o desinteresse pelo investimento privado", argumentam os manifestantes. EUA: cinco questões Na campanha entre Bill Clinton e Bob Dole, em 1996, cinco questões básicas relacionadas a valores permitiam prever se alguém votaria num ou noutro. Os que deram respostas predominantemente conservadoras votaram em Dole. Aqueles cujas respostas revelaram que estavam menos comprometidos com os valores tradicionais votaram em Clinton. As perguntas eram as seguintes: "1. Acredita que sexo antes do casamento seja moralmente errado? 2. A religião é importante na sua vida? 3. Já se interessou por ver pornografia? 4. Tem opinião mais desfavorável sobre alguém que engana o cônjuge? 5. O homossexualismo é imoral?" (Dick Morris em Jogos de Poder)
quarta-feira, 11 de maio de 2022

Porandubas nº 759

Recebi uma saraivada de protestos por não ter inserido a historinha que abre Porandubas. Volto ao modelo. E, como brinde, mais uma historinha no final. Então, aqui vai. Está "distituído" O major José Ferreira, cearense dos bons, amigo do padre Cícero, é quem relata: "Há muito matuto inteligente e sagaz, mas também há muito sujeito burro que se a gente amarrar as mãos dele pra trás das costas, ele não sabe mais qual é o braço direito nem o esquerdo... Eu também conheço matuto que, abrindo a boca, já sabe: ou entra mosca, ou sai besteira". O major continua a conversa: "Quando foi criado o município de Missão Velha, a escolha do primeiro intendente recaiu num velho honrado, benquisto e prestigioso, mas muitíssimo ignorante. Cabia-lhe o encargo de declarar instituído o município. Um dos "língua" do lugar seria o orador oficial. Ele, o chefe do executivo municipal, deveria dizer simplesmente: "Está instituído o município de Missão Velha!". Levou quinze dias decorando a frase, e, na ocasião da solenidade, exclamou: "Está DISTITUÍDO o município de Missão Veia". (Historinha captada pelo bom Leonardo Mota em Sertão Alegre - poesia e linguagem do sertão nordestino). A conjuntura Vamos iniciar a coluna com uma análise sobre o tema mais polêmico da atualidade. O golpe Analistas e articulistas de todos os calibres passaram a comentar, nas últimas semanas, sobre eventual golpe a ser desfechado pelo presidente Jair Bolsonaro caso venha a perder o pleito de outubro. Seria possível? Quais as condições objetivas para que isso ocorra? Que forças e recursos estariam ao lado do presidente? Faremos algumas observações. O argumento O argumento central de Jair Bolsonaro é a fraude no sistema eletrônico de voto. Nos últimos tempos, uma Comissão Especial do TSE, inclusive, com o apoio das Forças Armadas, tem tomado providências para ampliar a transparência do processo, de forma a sanar quaisquer dúvidas e questionamentos. Mas, pasmem, alguns militares defendem que o sistema de apuração tenha dois dutos: um, do próprio TSE, enquanto o outro correria diretamente para os quartéis. Ou seja, uma apuração paralela pelas FFAAs. P.S. O ministro da Defesa, em ofício, já pediu para ficar com ele a vaga na Comissão que cuida da transparência das eleições. Pediu para retirar daquela Comissão o nome do general Heber Portella. O TSE alega que não há "sala escura" no sistema de apuração de votos. Termo usado pelo presidente Bolsonaro. Sinais E onde estão os sinais de golpismo? A insistente peroração do presidente contra o sistema eletrônico de votação, contra o TSE e até contra o STF; o protagonismo assumido pelos militares na frente da apuração eleitoral; as manifestações da base bolsonarista em apoio ao chefe; expressões de uns e outros apoiadores do presidente na esfera política, entre outras sinalizações. Apoio social Emerge a questão: Bolsonaro contará com a força das ruas? A essa altura, é possível garantir que a maioria da comunidade nacional não daria endosso a uma escalada autoritária com a ocorrência de um golpe. Sem apoio, qualquer iniciativa golpista tende a ser repudiada. Não é possível fazer comparação com 1964 e muito menos traçar cenários de um Brasil ameaçado pelo comunismo. O mundo é outro, o Brasil é outro, o pensamento nacional mudou muito. Imagem do país No planeta globalizado, os países se alinham de acordo com interesses comuns, visões ideológicas, a índole. E a teia de interesses do nosso país abriga, hoje, potências econômicas e comerciais, identidade de propósitos políticos, na esteira de uma interpenetração ideológica. A imagem do Brasil iria ao fundo do poço, ocasionando pressões e contrapressões do mundo civilizado, se houvesse golpe. Não há regime que tenha forte sustentação caso se isole na paisagem internacional. Alas radicais É possível afirmar que Bolsonaro, sob o argumento de urnas eletrônicas fraudadas, possa contar com o apoio das alas mais radicais do bolsonarismo. Mas nem todos os grupos bolsonaristas aceitam tal hipótese. Falemos, então, em torno de 15% a 20%, uma minoria. Com a polarização acentuada, é previsível a tensão entre os contingentes que ocupariam as ruas. Não se descarta a hipótese de acidentes/incidentes, inclusive com a ocorrência de vítimas fatais. Ampla mobilização social funcionaria como um paredão de defesa da ordem democrática. Forças Armadas O presidente conta com o apoio de uma boa parcela da cúpula militar para realizar seu intento. Sabemos que o esforço de profissionalização das Forças Armadas tem ocorrido de forma gradual, desde o começo da redemocratização, sob a letra da Constituição de 88. Os militares se recolheram à caserna, deixando aos políticos e aos técnicos a missão de administrar a política e a burocracia estatal. Portanto, seria uma forte ingerência a ocupação da seara política pelos militares. Essa inclusão militar na área da política corrói a imagem das Forças. Ingresso na Administração Ocorre que o governo bolsonarista encheu os espaços da máquina administrativa com militares de escalões superiores, que deixaram a ativa para receber salários da administração Federal. Tal aproximação produziu uma leva de simpatizantes da continuidade administrativa. Muitos querem continuar com suas tarefas, enquanto outros procuram a própria caminhada eleitoral, tornando-se candidatos em praticamente todos os Estados da Federação. Esse núcleo, que tem assento nas proximidades do presidente no Palácio do Planalto, estará ao lado de Bolsonaro, apoiando suas estratégias. Cisão na área Nem todos os membros da cúpula militar topam a aventura golpista. Daí a inferência: haveria uma cisão na caserna. Parte das Forças estaria respaldando o Estado Democrático de Direito. Faltariam, então, condições objetivas para um salto autoritário. Generais e coronéis, aposentados ou na ativa, se alinhariam à ordem social, tentando demover o outro grupo, disposto a uma escalada dura no regime. A moldura política Os políticos terão um olho no novo governante e outro, nas ruas. Seguirão os passos da comunidade política. Agirão sob a bússola do pragmatismo. Por isso, se a derrota de Bolsonaro for por larga margem, tomarão posição bem antes da primeira semana de outubro. Entrarão em campo festejando o vitorioso, seja Lula ou outro. Importa saber que ventos do momento sinalizarão o lado em que se postarão os políticos. Diferenças Rodrigo Pacheco, presidente do Senado, mostra um discurso menos engajado que o de Arthur Lira, presidente da Câmara. Olha mais para o futuro, sob o compromisso de defesa do Estado Democrático de Direito. Lira olha para o presente, sob o comando de um grupo do Centrão, que caminha conforme sua orientação. Economia, o pêndulo Tenho lembrado e relembrado: a política navega nas águas das circunstâncias. E estas, nos meados do próximo semestre, serão balizadas pelos ventos da economia. Dinheiro no bolso, suficiente para alimentar as barrigas, será determinante na medição da temperatura social. Repito a equação BO+BA+CO+CA? (Bolso, Barriga, Coração, Cabeça). Brevíssimas... - O PSD deve liberar as bancadas, não fechando posição no primeiro turno. Em Minas Gerais, o candidato do PSD ao governo, Alexandre Kalil, apoia Lula. Outros líderes do partido, inclusive o presidente da sigla no Estado, senador Alexandre Silveira, dão apoio a Bolsonaro. - Tarcísio de Freitas (PR), candidato bolsonarista ao governo de SP, transferiu título eleitoral para o Estado há pouco tempo. Cumpre maratona de visitas ao Estado. - Marcio França (PSB) e Fernando Haddad (PT) tendem a ser candidatos por seus partidos ao governo de SP, impossibilitando uma aliança. - Os rachas regionais propiciarão palanques múltiplos a Lula e a Bolsonaro. O apoio a Jair deverá ocorrer em Mato Grosso, Mato Grosso do Sul, Amazonas e Rondônia. Há movimentos de aproximação no Ceará e na Paraíba. Lula teria palanque múltiplo em mais Estados. - O papa Francisco numa cadeira de rodas integrará a estética do Vaticano nos próximos tempos. Artrose no joelho. -Putin não se cansa. Espera a hora de apertar o botão de seu arsenal balístico. Faz ameaças quase diárias aos países da OTAN. Mas, na comemoração da Guerra Cívica, segunda, 9, conteve-se. O desfile militar nas muralhas do Kremlin foi pomposo. E o mundo ouviu um discurso tradicional. - Putin parece mais pesado e menos vigoroso. - Suécia e Finlândia estão sendo empurrados por Putin para a OTAN. - O presidente da Ucrânia, V. Zelensky, tomou gosto pelo degrau da fama. Quase todos os dias dá boas-vindas a celebridades. Essa guerra vai longe. - Os regimes autoritários ganham força no planeta. - O mundo se prepara para implantar uma Nova Ordem. O realinhamento ideológico de países fará lembrar os anos nervosos da Guerra Fria. A essa altura, é possível enxergar a China e a Rússia liderando uma das bandas do planeta. Fechando a coluna. "Você tá morto, cara" O caso deu-se São Bento do Una/PE, nos idos de 60. O caminhão, entupido de gente, voltava de um jogo de futebol, corria muito, virou na curva da estrada. Foram todos para o hospital. Uma dúzia de mortos. Lívio Valença, médico e na época, deputado estadual do MDB, foi chamado às pressas. Pegou a carona de um cabo eleitoral, entrou na sala de emergência do hospital e foi examinando os corpos: - Este está morto. Examinava outro: - Este também está morto. O cabo eleitoral se empolgava: - Já está até frio. De um em um, passaram de 10. Lá para o fim, Dr. Lívio examinou, reexaminou, decretou: - Mais um morto. O morto gritou: - Não estou morto não, doutor, estou só arrebentado. O cabo eleitoral, servindo como paramédico, foi taxativo: - Você está morto, cabra, quer saber mais que o médico?
quarta-feira, 4 de maio de 2022

Porandubas nº 758

Brevíssimas... Por aqui...  - O presidente Jair continua apostando em intensa polarização da campanha eleitoral. Ele será responsável pela expressão radical de um lado. Vai dominar as redes sociais, onde Lula não é muito requisitado. - Artigo de Élio Gaspari na FSP, com muita repercussão, diz que o presidente ensaia um golpe, sendo a noite do dia 2 de outubro, uma espécie de prazo fatal para um movimento golpista, caso Bolsonaro perca as eleições. - Tenho dito e repetido, o fator determinante para a vitória ou derrota do presidente será a equação BO+BA+CO+CA= Bolso, Barriga, Coração, Cabeça. Dinheiro no bolso significa geladeira cheia, barriga satisfeita, coração (agradecido ou enfurecido), cabeça disposta a eleger ou a mandar o governante para casa. - Lula terá palanques múltiplos em alguns Estados. Mais do que terá Bolsonaro. - Alckmin, pasmem, está tentando se localizar na esquerda. Teve, até, de cantar o hino da Internacional Socialista no evento do PSB que emplacou seu nome como vice de Lula. - A propósito, respondendo a uma consulta da Coluna, Gilberto Kassab ouve os presidentes do PSD nos Estados, mas adianta que a tendência é a de liberar as bancadas. Eis o que levantou Kassab até o momento: RJ: candidatura própria (se não tiver, liberar). BA: coligação com Lula. AP: candidatura própria (se não tiver, liberar). PR: candidatura própria (se não tiver, liberar). RS: candidatura própria (se não tiver, liberar). AM: coligação com Lula. PA: candidatura própria (se não tiver, liberar) - O Instituto Paraná Pesquisas acaba de fazer sua pesquisa periódica em SP. Murilo Hidalgo manda para a coluna: Fernando Haddad, PT; 29,7%; Márcio França, PSB, 18,6% e Tarcísio de Freitas, Republicanos, 15,2%; nenhum, branco/nulo, 19,3%. Muito difícil para o ex-ministro de Bolsonaro ganhar em São Paulo. Já Marcio França tem chances se for ao 2º turno. - PSDB é um partido que terá de renascer das cinzas de seus rachas internos. -  Tendência de renovação da Câmara, na eleição de outubro, sinaliza mais de 50% do atual corpo parlamentar. - As manifestações de 1º de maio estiveram bem abaixo das expectativas. Para os dois lados: de Bolsonaro e Lula. - Lula, em um evento em Brasília, disse que Bolsonaro "não gosta de gente, só gosta de polícia". Cometeu a gafe e se desculpou junto aos policiais, acrescentando que queria dizer "só gosta de milícia". E de gafe em gafe, os governantes vão pavimentando sua estrada. - O pêndulo eleitoral vai ser alvo de especulação até as margens do pleito. Dados e relatos verdadeiros e falsos confundirão o sistema cognitivo nacional. - Interessante nessa campanha: grupos familiares repartindo-se para os dois lados, situação e oposição. - Bolsonaro usa bem a mídia: faz manchetes com suas tiradas radicais. - A última: o presidente brasileiro, que não foi convidado mais uma vez ( 3ª vez) a participar do G7, sugeriu ao embaixador da Turquia uma comitiva de chanceleres de alguns países, Brasil na frente, para visitar Putin, em Moscou, e articular com ele o final da guerra na Ucrânia.( O Itamaraty ficou calado ante tal disparate.) - Por que Elon Musk comprou o Twitter? Resposta: para encher mais ainda o bolso. Não tem compromisso com ética e moral. - Mesmo que tenha perdido dinheiro com a baixa nas ações da Tesla, por causa da compra do Twitter, Musk olha para o império do amanhã, as tecnologias avançando, 5G chegando, sob a certeza de que o domínio e o poder dependerão, cada vez mais, do mando sobre as telecomunicações. - O interessante em Musk é que ele já tirou a máscara: vai permitir que a mentira se faça presente em sua rede tecnológica, ao lado de fatos. Basta que os dólares entrem em seus cofres. - A guerra na Ucrânia trará necessariamente uma nova ordem internacional. Com o ressurgimento de sinais dos tempos da guerra fria. - Jornalistas amigos de Vladimir Putin, que conhecem sua alma, dizem com todas as letras: o ex-agente da KGB não sairá derrotado. É capaz, para amaciar seu ego, de utilizar o arsenal nuclear da Rússia. E apertar um botão para destruir Berlim, Viena, Paris, enfim, para acionar os mecanismos de uma 3ª guerra mundial. - Este analista, em 50 anos de atividade, considera que avançamos, de maneira açodada, em direção ao caos. - A China sinaliza que fecha posição com a Rússia. E ataca o Ocidente. - A China voltou a ver a Covid-19 baixar nas grandes cidades, como Xangai e Pequim, com muita força. - Putin estuda com seus generais a melhor alternativa para conter o envio de armas para a Ucrânia pelos países da OTAN. Nada mais óbvio: por meio do ataque balístico. Não se trata de exagero. -  Os bilionários russos começam a sofrer grandes perdas. E acusam Putin. Que está lhes dando uma banana. - O chanceler russo, Lavrov, com sua bola fora: Hitler tinha sangue judeu. Israel protesta. E o mundo, em pasmo, indaga: não há mais vergonha, dever, direito à verdade nessa Torre de Babel? (P.S. Zelensky, o presidente ucraniano, é judeu). - Joe Biden começa a impor seu estilo de enfrentamento. Já mandou montanhas de dinheiro e armas para a Ucrânia. E sempre disposto a mandar mais. Pediu ao Congresso a aprovação de mais 30 bilhões de dólares para mandar aos ucranianos. - Trump no olho do furacão: em um livro que acaba de sair, seu ex-secretário de Defesa, diz que ele sugeriu aos policiais atirar na perna dos participantes de um evento antirracista. - O ex-presidente continua mantendo estreita articulação com os republicanos. Poderá voltar à Casa Branca em 2024. -  A Alemanha e seu dilema: mandou armas para a Ucrânia. Mas continua a comprar o gás da Rússia. Que, agora, paga em rublos. Outros países da OTAN enfrentam o mesmo dilema. - A França de Macron se prepara para um novo período, sob a égide de um governante mais experiente e com vontade de endurecer em algumas áreas. - A Venezuela saiu do mapa mundi? Ou mesmo do mapa latino-americano? Maduro passou a ser verde em matéria de afastamento midiático. - Amigos que chegam da Europa estão assombrados com o mal conceito do Brasil nos últimos tempos. - Em Lisboa, brasileiros invadem praças, museus e restaurantes. Portugal fica ali na esquina. Vai e vem. E na esfera das ideias?  Tratemos, na coluna, de um tema muito sensível aos candidatos: rejeição. - Rejeição a candidato é coisa séria. Não se apaga um índice de rejeição da noite para o dia. O maior adversário de certos candidatos é uma rejeição em torno de 30% a 40% dos eleitores. - Os nossos dois principais candidatos estão com altos índices de rejeição, na margem dos 50%. Um perigo. - Em um colégio eleitoral de 35 milhões de eleitores, como é o caso do estado de São Paulo, uma rejeição maior que 30% é uma montanha difícil de escalar. Trata-se de uma barreira que pode derrubar qualquer candidato, principalmente se este for ao segundo turno de uma campanha majoritária. - Quando um candidato registra um índice de rejeição maior que a taxa de intenção de voto, é bom começar a providenciar a ambulância para entrar na UTI eleitoral. Caso contrário, morrerá logo nas primeiras semanas do segundo turno. - A rejeição deve ser convenientemente analisada. Trata-se de uma predisposição negativa que o eleitor adquire e conserva em relação a determinados perfis. Para compreendê-la melhor, há de se verificar a intensidade da rejeição dentro da fisiologia de consciência do eleitorado. - O processo de conscientização leva em consideração um estado de vigília do córtex cerebral, comandado pelo centro regulador da base do cérebro e, ainda, a presença de um conjunto de lembranças (engramas) ligadas à sensibilidade e integradas à imagem do nosso corpo (imagem do Eu) e lembranças perpetuamente evocadas por nossas sensações atuais. Ou seja, a equação aceitação/rejeição se fundamenta na reação emotiva de interesse/desinteresse, simpatia/antipatia. Pavlov se referia a isso como reflexo de orientação. - A intensidade da rejeição varia de candidato para candidato. Paulo Maluf era (e ainda é) um perfil  que sempre teve altos índices de rejeição. Passou a administrar o fenômeno depois de muito esforço. Mudou comportamentos e atitudes. Tornou-se menos arrogante, o nariz levemente arrebitado desceu para uma posição de humildade e começou a conversar humildemente com todos, apesar de não ter conseguido alterar aquela antipática entonação de voz anasalada. - Orestes Quércia era outro. Que tinha a rejeição inscrita na testa. - Os erros e as rejeições dos adversários também contribuíram para atenuar a predisposição negativa contra ele. Purgou-se, também, pelos pecados mortais dos outros. Maluf aprendeu bem a arte de engolir sapos. - Em regiões administradas pela velha política, a rejeição a determinados candidatos se soma à antipatia ao familismo e ao grupismo. O eleitor quer se libertar das candidaturas impostas ou hereditárias. Mas não se pense que o caciquismo se restringe a grupos familiares. Certos perfis, mesmo não integrantes de grandes famílias políticas, passam a imagem de antipatia, seja pela arrogância pessoal, seja pelo estilo de fazer política ou pelo oportunismo que sua candidatura sugere. Em quase todas as regiões do país, há altos índices de rejeição, comprovando que os eleitores, cada vez mais racionais e críticos, querem passar uma borracha nos domínios perpetuados. - A rejeição pode ser diminuída quando o candidato, indo a fundo nas causas profundas que maltratam a candidatura, enfrenta o problema sem tergiversação nem firulas. Pesquisas qualitativas, com representantes de todas as classes sociais, indicam as causas. Aparecerão questões de variados tipos: atitudes pessoais, jeito de encarar o eleitor, oportunismo, egomarketing. mandonismo familiar, valores como orgulho, vaidade, arrogância, desleixo nas conversas, cooptação pelo poder econômico, história política negativa, envolvimento em escândalos, ausência de boas propostas, descompromisso com as demandas da sociedade. - Para enfrentar alguns desses problemas, o candidato há de comer muita grama. Não se equaciona a rejeição de modo abrupto. Ao contrário, quando o candidato demonstra muita pressa para diminuir a rejeição, essa atitude é percebida pelo conjunto de eleitores mais críticos, que é exatamente o grupamento mais afeito à rejeição. E aí ocorre um bumerangue, ou seja, a ação se volta contra o próprio candidato, aumentando ainda mais a predisposição negativa contra ele. - Trabalhar com a verdade, eis aí um ponto-chave para começar a administrar a taxa de rejeição. O eleitor distingue factoides de fatos políticos, boas intenções de más intenções, propostas sérias de ideias enganosas. O candidato há de montar no cavalo de sua identidade, melhorando as habilidades e procurando atenuar os pontos negativos. É errado querer mudar de imagem por completo, passar uma borracha no passado e cosmetizar em demasia o presente. Mas é também grave erro persistir nos velhos hábitos. Mudar na medida do equilíbrio. Mudar sem riscos. - Todo cuidado com mudanças constantes e bruscas, de acordo com a sabedoria da velha lição: não ganha força a planta frequentemente transplantada.
quarta-feira, 27 de abril de 2022

Porandubas nº 757

Abro a coluna com uma historinha do comandante Idôneo. Idôneo, o comandante Em uma cidade fluminense, o chefe local era um monumento de ignorância. A política era feita de batalhas diárias. Um dia, o chefe político recebeu um telegrama de Feliciano Sodré, que presidia o Estado: - Conforme seu pedido, segue força comandada por oficial idôneo. O coronelão relaxou e gritou para a galera que o ouvia: - Agora, sim, quero ver a oposição não pagar imposto: a força que eu pedi vem aí. E quem vem com ela é o comandante Idôneo. (Historinha contada por Leonardo Mota, em seu livro Sertão Alegre) A crise - Breves comentários (Ideias para um papo entre amigos e adjacências....) - A quadra pós-carnavalesca não consegue esconder o temor que a crise político-institucional, com o perdão concedido ao deputado Daniel Silveira, chegue ao cume da montanha. Para piorar há outras fontes que alimentam a crise. - O Ministério da Defesa, comandado pelo general Paulo Sérgio Nogueira, em nota, repudiou a fala do ministro do STF, Luis Roberto Barroso, de que as Forças Armadas estariam orientadas a desacreditar nas eleições, por causa de fraudes na urna eletrônica. Fato que se soma ao episódio do indulto. - A Alta Corte do Judiciário e a Alta Corte governista estão com a expressão prestes a explodir. Mas o Supremo quer adiar qualquer decisão sobre o indulto, e não responder de imediato às demandas partidárias que chegaram à Casa da Justiça. - Os generais do Palácio do Planalto, a partir do general Luiz Eduardo Ramos, fizeram coro à nota do ministro da Defesa. Ou seja, a cúpula militar se faz presente à mesa de discussão. E teria se alinhado em bloco ao presidente. - O presidente Bolsonaro, em fala na Agrishow, em Ribeirão Preto/SP, referindo-se à demarcação de terras indígenas (marco temporal, que está em julgamento), disse que se o ministro Edson Fachin não atender o que o governo defende, teria duas alternativas: a) entregar as chaves do Executivo ao STF e b) não cumprir o que o Supremo determinar. Claro, sugerindo que seria esta sua alternativa. - O quadro da expressão litigiosa se agrava. - Não é ficção projetar um cenário de endurecimento, mais cedo ou mais tarde. - O pano de fundo é nossa própria trajetória. Ao longo de sua história contemporânea, o país tem atravessado ciclos sucessivos de democracia e autoritarismo. - Na área partidária, desde a Independência, o país já teve sete diferentes regimes partidários. - Um golpe militar criou o Estado republicano, em 1889, surgindo, em 1891, a primeira Constituição. Tivemos um período democrático até a revolução de 30, quando se constituiu o governo provisório de Vargas. -Depois, tivemos novos atos de força, que geraram o Estado Novo e a Constituição de 1937. Abrimos mais um ciclo democrático com a Constituição de 1946, interrompido pelo golpe militar de 1964 e o regime ditatorial. - Em 1985, instaura-se a 4ª República, consolidada pela Constituição de 1988, que passou exprimir a emergência dos grupamentos sociais na composição do poder. - A ciclotimia que tem balizado o sistema político nacional tem muito a ver com a situação de deterioração do país e o consequente estado de ânimo das elites e das massas. - O regime militar só pegou, porque o ambiente social, conturbado, abria condições para sua implantação. As classes médias acorreram às ruas em passeatas. - E o que tem isso com a atual situação do país? Hum, tristes lembranças. Não se pode deixar de ver um certo movimento embrionário, recheado de indignação, que agita bases bolsonaristas. - Tem um razoável contingente que clama pelo endurecimento do regime. - Brutamontes capazes de fazer falta, ameaçar juízes, blindar amigos e parceiros, cooptar a classe política com recursos do orçamento, enfim, fazer gols violentos podem ser ovacionados pela torcida. - As forças democráticas estão de soslaio e com muito receio de que as coisas abram um espaço de caos. Um herói? - O Brasil está à procura de um herói. Mas o herói procurado não é aquele capaz de operar milagres, um São Jorge de espadas determinado a matar os dragões da maldade. Quem vestiu esse manto, como um ex-presidente alagoano, acabou sendo eleito presidente da República, mas foi tragado pelo tufão social, que forçou seu impeachment, a partir da maré de denúncias e escândalos vazados pela mídia. - Até outubro, o eleitor estará à procura de um herói. Será que já o encontrou? Se não encontrou, ainda, o eleitor tem cerca de cinco meses para achá-lo. - Ele não precisa apostar em heróis com a aura dos santos. Basta escolher um protagonista comprometido com os valores da democracia. O eleitor deve examinar os perfis, avaliar o passado, examinar suas propostas para o presente, compará-los entre si e escolher aquele que mais se afina ao ideal pelo qual luta. - Cuidado, eleitor: não compre gato por lebre. Há muito lobo querendo se passar por cordeiro. E há muito canalha desejando parecer santo. Ligeiros sinais dos tempos - A vitória de Emmanuel Macron, na França, permite aos franceses viver mais uma temporada sob a bandeira da democracia. Mas, aqui pra nós, a direita avançou. Marine Le Pen teve desempenho um pouco melhor que no pleito passado. Ficou menos radical. - O socialista Jean-Luc Mélenchon tem condição de ser o primeiro-ministro? Se fizer maioria nas eleições legislativas que ocorrerão em 12 de julho... A tendência é que seja escolhida por Macron a ministra do Trabalho, uma mulher, Élisabeth Borne. Macron e seu primeiro-ministro, Édouard Philippe, estão verificando os registros tributários e potenciais conflitos de interesse entre os cotados para o ministério. - A direita cresce aqui, ali e acolá. Um pesado sinal dos tempos. A democracia não tem dado respostas suficientes às demandas sociais. - Trump foi condenado a pagar 10 mil dólares por dia se não entregar documentos autorizados a vir a público pela Justiça. - Os generais russos, quando vão despachar com Putin, levam as falas por escrito. Temem errar. Ou gaguejar? - Quem sai com a imagem arranhada nesses tempos turbulentos e de guerra é ele mesmo, Vladimir Putin, que calculou mal os custos para a Rússia. E recebeu péssima consultoria de seus generais. - Putin pode tomar uma decisão tresloucada por ver os EUA ajudando a Ucrânia com armas e dinheiro. A conferir. - Por aqui, com exceção do PT, partidos lançaram candidatos oficialmente. Lula não se pronunciou a respeito do indulto de Bolsonaro e ainda não disse que é candidato do PT à presidência da República. Parece, até, que espera por algo. O que seria? - Este analista tem ligeira desconfiança (incerteza?) sobre a candidatura de Lula. Um mistério cerca seu aviso, ainda não dado, de que será o candidato. - Bolsonaro, por sua vez, quer esticar a corda até vê-la esgarçada e prestes a se romper. Sua situação vai depender da economia. - P.S. Paulo Guedes testou positivo no Covid-19. Era muito prevenido. - O Centrão irá dar apoio ao presidente Jair até quando? - João Doria irá até o fim? É determinado, mas tem bom senso. O clima no PSDB está mais para um calor intenso. - João levou um "bolo" de Luciano Bivar e Simone Tebet. Havia um jantar dos três nessa segunda. Mas o presidente do União Brasil e a senadora do Mato Grosso do Sul não toparam jogar os holofotes ao ex-governador de SP e candidato (por enquanto) do PSDB à presidência da República. Mas sabe-se de um almoço apenas com os presidentes de partidos. - Eduardo Leite dá mostras de que recuou, deixando o terreno livre para João avançar. Mas se este não sair do lugar? - O general e ex-ministro Carlos Alberto dos Santos Cruz pôs seu nome à disposição do Podemos, partido ao qual se filiou. - Sérgio Moro sinaliza que não será candidato a nenhum cargo. Nem a deputado. Foi engolido pelas circunstâncias. - Simone Tebet tem conversado muito sobre economia e meio ambiente com grandes economistas e ambientalistas. É determinada. Mas irá até o fim? O tempo dirá... - A vida voltou ao normal? O Brasil voltou à velha rotina. E se tivermos novos surtos? A vida passou a valer menos? Na visão de muitos contingentes, sim. - Anita é o furacão brasileiro nas paradas musicais do planeta. A moça tem muita sensibilidade para o marketing. - O cara fez uma oferta: 41 bilhões de dólares. Os donos do Twitter não aceitaram. "Peraí, é assim? Vocês gostam de dinheiro?" Então, coçou os bolsos e mandou: "aqui estão mais 3 bilhões de dólares". Dobrou os donos e comprou o Twitter. Elon Musk, o homem mais rico do mundo, faz o que quer. Até inventou uma viagem espacial. - O novo dono do Twitter preside quatro empresas das quais ele é o cofundador. São elas a Tesla (montadora), SpaceX (sistemas aeroespaciais), Neuralink (chips cerebrais) e a The Boring Company (infraestrutura). - O principal negócio do bilionário é a fabricante de carros elétricos Tesla, que tem como missão acelerar a transição mundial para o uso de energias sustentáveis. Já a firma aeroespacial Space X se tornou a primeira empresa privada a enviar astronautas para a órbita terrestre em maio, numa parceria com a Nasa. - Uma excentricidade. "Desafio Vladimir Putin para um combate individual. A aposta é a Ucrânia", tuitou Musk. O empresário usou o alfabeto cirílico, utilizado pelos russos, para escrever o nome de Putin e alguns trechos da mensagem. - Até onde Elon Musk irá?
quarta-feira, 20 de abril de 2022

Porandubas nº 756

Abro a coluna com uma historinha do Piauí. Mão Cheinha era louco e muito querido no Ceará, conta Sebastião Nery. Um dia, levaram-no para o Sanatório Meduna, no Piauí. Mão Cheinha, muito vivo, acabou virando louco-chefe. Tomava conta dos outros e era respeitado por isso. No sanatório, havia um pé de mangueira que nunca dava fruta. Mão Cheinha achava que a mangueira tinha de produzir manga. Chamou oito loucos: - Olha, minha gente, vocês todos são mangas maduras. Vão lá para cima. Quando eu gritar, as mangas vão caindo, porque manga madura cai. Manga madura sempre cai. Uma a uma. E chispem. Subam. Os oito subiram. Mão Cheinha, de baixo do pé de mangueira, gritou: - Manga um! Pluf! O primeiro louco se esborrachou no chão aos gritos de "ai, ai, ai". - Manga dois! Manga três! Manga quatro! Iam se largando lá de cima e arrebentando-se cá embaixo. Gritos e mais gritos. O louco-chefe mandou: - Manga sete! Nada. - Manga sete! Nada. - Manga sete, seu p...! O sete respondeu: - Mão Cheinha, chama manga oito, pois eu ainda estou verde! Brevíssimas Observações para iniciar uma conversação. -PSDB, seja qual for o desfecho, será um partido fragmentado, desunido, desestruturado. - Bolsonaro ganha uns pontinhos na intenção de voto por causa do programa de auxílio e ainda porque a vida está voltando ao normal - a pandemia começa a ficar para trás. - Lula passou a amedrontar por causa de suas recentes falas que lembram o velho Lula de palanque: a classe média é escravista, vai revogar a reforma trabalhista e as bases sindicais deveriam fazer mobilização diante das casas dos parlamentares em vez de gastarem fortunas indo à Brasília. - Campanha de São Paulo, com Haddad na frente, é um retrato do momento. Rejeição ao petismo em São Paulo é recorde no país. É difícil que o PT eleja Fernando Haddad para governador de SP. - Federação de partidos é uma alternativa sem futuro. Poucas federações e muita desconfiança. Quatro anos juntos? Para o país, é uma grande temporada. - Motociatas de Bolsonaro são mais uma opção de passear de moto. Engajamento ideológico é pequeno. - Estão fazendo comício, aqui, ali e alhures. Não pode haver comício agora. TSE faz de conta que não vê. - Marcio França, se for ao 2º turno com Haddad, levará a melhor. O mesmo pode ser dito em relação a Rodrigo Garcia, o vice que assumiu no lugar de João Doria. - Campanhas gastarão a maior grana que já se viu em verbas partidárias. Fundão chega a R$ 5 bilhões. - PT poderá fazer a maior bancada de deputados Federais. - MDB, que liderou a lista de maior partido desde a eleição de 1986, perde o trono. Sai fragmentado. - Baleia Rossi é bem articulado e tem conseguido segurar o partido. Mas as velhas raposas do MDB já tomaram seu rumo. - As mulheres terão boa votação na campanha. Este analista projeta aumento da bancada feminina. - As bancadas especializadas - agronegócio, profissionais liberais, policiais, mulheres, negros etc. - tendem a adensar sua representação em função da maior organicidade social. - São Paulo, Minas Gerais e Rio de Janeiro formam o chamado Triângulo das Bermudas e decidirão o pleito. São Paulo, sozinho, tem 35 milhões de votos. - Alguns nomes são considerados puxadores de votos: Boulos em São Paulo; Dalagnol no Paraná; Datena em São Paulo; Roseana Sarney (MA); José Serra, em SP; José de Abreu (ator) (será candidato?); cantor Netinho, na Bahia; ex-governador Fernando Pimentel, em MG; Eduardo Bolsonaro (?) em SP, entre outros. Observação: é possível haver muita decepção. -Tem, ainda, a bancada bolsonarista de raiz: Zé Trovão (líder dos caminhoneiros); Mayra Pinheiro, ex-secretária da Pasta da Saúde, conhecida como capitã Cloroquina; Nise Yamaguchi, que integrava o gabinete paralelo no Ministério da Saúde; Queiroz, o operador da rachadinha. Interrogação: o ex-deputado Eduardo Cunha voltará? Dizem que sua filha ocupará o lugar do pai como candidata no RJ. - Eleição muito provável é a do ACM Neto ao governo da Bahia. O baixinho está bem situado. Breves Neste bloco, vamos tentar desenhar as paisagens que começam a se desenhar nos horizontes: 1. O fim de um ciclo - O país ainda não se libertou do ciclo autoritário. Bolsonaro consegue reviver problemas antigos. Tanto que os vídeos vazados do Supremo Tribunal Militar levantam as feridas e mortes da tortura. O tema tem passaporte para trilhar o discurso eleitoral. Campanha polarizada pegará fogo. 2. A família Bolsonaro - Fincou-se como uma forte estaca eleitoral. O mais radical, o deputado Federal Eduardo Bolsonaro, acaba de colocar Brilhante Ustra na galeria de seus heróis. Muita gente acredita nessa hipótese. Um torturador acabará ajudando ao deputado Bolsonaro se eleger mais uma vez com uma grande votação? Coisas da política brasileira. 3. Desconhecimento - Quanto a situações negativas envolvendo outros filhos, o presidente aprendeu com os caciques da velha política: faz tempo que não converso com o Renan (o número 4). Não sei o que faz. Foi mais ou menos esse o sentido de sua expressão sobre o filho, que mora com a mãe. Ora, isso até pode ser verdade. O que significa em outros termos: não controlo a vida de nenhum filho. Só faltaria dizer: que Renan, Renan? O Calheiros? 4. Joyce e Janaína - Ninguém atravessa um rio no mesmo lugar. Tanto Joyce Hasselmann quanto Janaína Paschoal não terão as mesmas votações extraordinárias da eleição de 2018. As águas do rio são outras. 5. A caciquia - Os caciques do MDB e de outros partidos não terão o poder de mando de outros tempos. Não elegerão facilmente seus apadrinhados. Mesmo o maior deles, o ex-presidente José Sarney, está debilitado. Renan Calheiros vai apoiar Lula em Alagoas. O voto de Lula no Estado já é dele, de Luiz Inácio, há muito tempo. Renan Filho é candidato ao Senado. 6. Sinais de renovação - Vai haver certa renovação, sim, nas casas legislativas. Mas não devemos esperar por uma grande mudança. O eleitor brasileiro é, no final das contas, mais conservador do que renovador. 7. Requião - O ex-senador Roberto Requião quer voltar ao governo do PR, governado por Ratinho Júnior. Este aposta em Bolsonaro. Requião, até que enfim, encontrou o partido onde sua linguagem é bem aceita. 8. O PT no RN - Fátima Bezerra, governadora, pode se reeleger pelo PT por ter liderado bem a política no Estado e porque os eventuais opositores estão com receio de enfrentar o poder da máquina. Fátima não tem adversários à altura. Ou tem? Apareceu um corajoso. 9. Fábio Dantas, do Solidariedade, ex-vice governador, será o candidato das oposições ao governo do RN. Na chapa ao Senado, estará o ex-ministro e ex-deputado Rogério Marinho. Fábio se convenceu de que o cavalo está passando na sua frente, pronto para uma corrida. Tem boa estampa e fluidez de pensamento. Impregna-se do "novo". Comenta-se que tem boas chances. A conferir. 10. O PT deverá fazer a maior bancada de deputados Federais. E fará uma bancada que dominará a política nos Estados. Será seu reencontro com a história. Será o último ciclo de importância no partido? Vai depender da saúde de Lula. 11. Luciano Bivar, do União Brasil, fechou uma Federação de Partidos. O problema que enfrentará: capital político para administrar todas as demandas que chegarem à sua mesa. A Federação que o PT fechou com o PV e o PC do B (Brasil da Esperança) já foi registrada em cartório. 12. O vice Mourão - Hamilton Mourão, o vice-presidente da República, será candidato a senador pelo RS. Terá de aprender discurso de palanque. E expressar o desejo de ser eleito. Mourão parece um ser superior. E ultrapassou os limites do bom senso, ao gracejar com a tortura. (Ver os áudios vazados do STM). 13. Kassab - Gilberto Kassab, presidente do PSD, deverá ter maior influência na política. Sabe articular, ouvir e administrar bem as pressões. Seja quem for o eleito, estará bem na próxima administração. 14. João Doria sempre foi determinado. Mas, nos últimos tempos, deixou a ponderação de lado. Se não se eleger, tchau. A política não perdoa. Recuperar um partido cindido é tarefa para um gigante, mas João ainda não tem esse corpo. Deixaria de ser candidato dando lugar a outro? Hipótese descartada... mas em política, o impossível acontece. 15. O melhor e mais competente consultor de João Doria é o ex-prefeito de Salvador e ex-governador da Bahia, Antônio Imbassahy, que tem feito o que pode. Um grande praça e um ótimo cabo eleitoral. Sério. 16. Fernando Haddad, voz corrente, está a um passo do Palácio dos Bandeirantes. Este analista, porém, ainda não acredita nesta hipótese. Vamos ver mais adiante. 17. Milton Leite é presidente da Câmara Municipal de São Paulo. Tem votos distritais, regionalizados. Qualquer boa aliança em São Paulo, capital, passa por suas decisões. 18. Simone Tebet não aceitará a posição de vice numa chapa presidencial, seja com Eduardo Leite ou outros. Simone é determinada. Tem um sonho. E é firme no seu ideário com o pai, Ramez Tebet. 19. Geraldo Alckmin cometeu a maior dissonância cognitiva de sua vida. Aos gritos, aos gritos (repito), fez elogios ao maior líder popular do Brasil - Lula. É um fato. Mas Alckmin gritando no microfone não combina com a imagem apaziguadora do ex-governador. Este analista de Porandubas, que tem em Alckmin um dos seus leitores semanais, teve de se beliscar para constatar que não era um sonho. 20. Onde está José Dirceu? Trata-se do quadro mais preparado do PT, sem querer entrar na polêmica de problemas na Justiça. Zé Dirceu foi o maior responsável pelo amadurecimento do PT. Domina muito bem a moldura política. Deve estar articulando por aí... 21. O Triângulo das Bermudas - Conhecida como a área que produz ciclones e derruba aviões, na região do Caribe, o Triângulo das Bermudas é o território que elegerá o próximo presidente. Juntos, SP, MG, RJ e ES tem mais de 50% dos votos do país. Só SP tem cerca de 35 milhões de votos, seguido de MG, com quase 20. Anotem. 22. Tempos de Odorico Paraguaçu, em Sucupira: compras de viagra e próteses penianas para o Exército. Este analista pensou que era uma pegadinha. Dias Gomes, o saudoso novelista, está gargalhando no túmulo. 23. FMI revisa para cima estimativa de crescimento do Brasil e corta previsão global. Tirano Maquiavel conta no Livro III dos Discursos sobre os primeiros 10 livros de Tito Lívio a história de um rico romano que deu comida aos pobres durante uma epidemia de fome e que foi por isso executado por seus concidadãos. Argumentaram que ele pretendia fazer seguidores para tornar-se um tirano. Essa reação ilustra a tensão entre moral e política. Mostra que os romanos se preocupavam mais com a liberdade do que com o bem-estar social.
quarta-feira, 13 de abril de 2022

Porandubas nº 755

Abro com uma historinha de Zé Abelha. As três pessoas No confessionário, Monsenhor era rápido. Não gostava de ouvir muita lengalenga. Ia logo perguntando o suficiente e sapecava a penitência que, sempre, era rezar umas ave-marias em louvor de N. S. do Rosário. Fugindo ao seu estilo, certa feita ele resolve perguntar ao confessando quantos eram os mandamentos da lei de Deus. - São 10, Monsenhor. - E quantos são os sacramentos da Santa Madre Igreja? - São 7, Monsenhor. - E as pessoas da Santíssima Trindade, quantas são? - São 3, Monsenhor. Monsenhor, notando que o confessando só sabia a quantidade, pergunta rápido: - E quais são essas pessoas? A resposta encerrou a confissão: - As três pessoas são o senhor, o dr. Didico e o dr. Zé Augusto. (Historinha contada por José Abelha em A Mineirice). Hoje, dedicarei o maior espaço da coluna para entrar na mente do eleitor. Afinal, quem e por que um candidato merece seu voto? O que se passa com seu sistema cognitivo? Adiante, algumas observações. Antes, um rápido painel. Brevíssimas - A terceira via terá imensas dificuldades para viabilizar um nome. - Lula estaria passando por problemas de saúde. - Geraldo Alckmin começa a não ter tanto apoio no PSB. - O STF será alvo de tiroteio na campanha. Tiros mais fortes. - Lula fala muito e começa a incomodar seus aliados. - Bolsonaro tem um índice de rejeição difícil de administrar. - Não seria surpresa para este analista se na hora H, Lula desistir. - Rodrigo Garcia tem melhores condições para ganhar o pleito de SP. - A União Brasil não terá coragem de indicar Luciano Bivar como seu candidato. - Candidatos importantes poderão ser objeto de intenso tiroteio pelos artilheiros que elegeram o discurso de corrupção no governo Bolsonaro. - Eduardo Leite pode arrumar um jeito de sair como candidato. - Ciro Gomes está demonstrando ser o mais preparado entre os candidatos. - Se Marine Le Pen levar a melhor no 2º turno da França, a UE entra em caos. - Macron deixa de ser franco favorito. Tem pequeno índice à frente. - Putin espera destruição total da Ucrânia. Questão de autoestima. Uma batalha em 5 rounds Uma campanha política é uma guerra com cinco batalhas. A primeira é a da viabilização dos nomes na convenção dos partidos. Depois, vem a batalha do crescimento, travada na campanha de rua. Em agosto, inicia-se o terceiro estágio, com o embate da programação eleitoral gratuita na televisão e no rádio. O quarto desafio é alcançar o clímax e a quinta frente de luta é contra o declínio, que geralmente atinge alguns candidatos antes do dia D. Para cada uma delas, são precisos munição, bala, investimentos em comunicação, mobilização e articulação de entidades sociais. Todas essas armas precisam ser compradas e, quem tem mais dinheiro, evidentemente, possui maiores condições de ganhar. Mas, às vezes, só a munição não garante a vitória e é preciso unir habilidade, tática e estratégia. Pobre ganha campanha? Sim, quando tem o apoio de entidades, movimentos sociais ou quando possui uma grande folha de serviços prestados à comunidade. Candidato não é sabonete O eleitor quer um candidato honesto e com experiência administrativa, mas que seja banhado pelo conceito da assepsia, da higienização política. O ideário da inovação e da renovação ganha espaço em meio a nomes carimbados do quadro nacional. Também quer votar em pessoas que passem a ideia de bons controladores do orçamento municipal. Nesse aspecto, as candidatas levam vantagem - a mulher sempre controlou o orçamento doméstico e transmite maior confiança. Chega ao fim o "candidato sabonete", apresentado como um verdadeiro produto para o consumo de massa e cuja imagem era construída via efeitos cosméticos e publicitários. Mostrar a cara A influência da Internet será maior do que nas eleições passadas, mas ela não constitui, ainda, um veículo fundamental. Os candidatos deverão receber muitas visitas nos sites. Nada substitui o contato pessoal do candidato com seu eleitorado. Diante da crise social, da desconfiança e da descrença, as pessoas sentem necessidade de ver seus candidatos de perto. Os políticos devem sair às ruas e andar pelas casas e pelos bairros. Mais importante do que os grandes comícios serão os pequenos encontros, como cafés da manhã, visitas, mutirões e carreatas. Cuidado com os dribles Que limites devem se impor àqueles que lidam com imagem de políticos e campanhas eleitorais? Primeiro há de se atentar para a significação da política, enquanto instrumento para satisfação dos interesses da sociedade e alavanca de mudanças. Os candidatos devem se amparar em um código de conduta, com espaço para valores como ética, verdade, franqueza, objetividade, transparência, todos inseridos no campo maior da dignidade humana. Tal escopo, porém, acaba corroído pela instrumentalização da política, que tem se tornado um empreendimento a serviço de indivíduos e grupos. A esperteza, o vale-tudo, a dramatização, os recursos artificiais, a hipocrisia e a insinceridade têm sido a tônica da cultura política, no ciclo da sociedade pós-industrial. A política e seus meios inspiram a personalização do poder, propiciando intensa competição utilitarista entre atores. Candidatos como sabonete estão sendo afastados. Dissimulação Os 150 milhões de eleitores brasileiros deverão ser envolvidos pela "feitiçaria" que a publicização política haverá de construir, nos próximos meses. Como podemos evitar a embrulhada engendrada pela atmosfera criada pela ditadura da propaganda eleitoral, já em pleno curso, apesar de proibida nesse momento pré-eleitoral? Primeiramente, identificando os pontos de saturação, que podem estar na cosmética exagerada sobre os perfis, operação que apresenta geralmente três graus de dissimulação: quando o perfil desaparece sem ser notado ou quando se impede que o tomem como tal qual é; quando o candidato exibe sinais e argumentos de que não é o que é; e quando ele, de forma hipócrita, finge e pretende ser o que não é. Ora, "nenhum homem, por maior esforço que faça, pode acrescentar um palmo à sua altura", diz a Bíblia, e alterar o pequeno modelo que é o corpo humano. Mesmo usando a engenharia de artimanhas do marketing. Há, de fato, cerca de 30 milhões de brasileiros que vivem em estado deplorável. O país mostra sinais de anomia e degeneração de valores. Mas tem uma base sobre a qual se pode navegar com segurança. Usar o acervo de mazelas, sob o artifício de emoções falsas, costuradas na colcha de diagnósticos por demais conhecidos, sem apontar caminhos e soluções para os avanços, é querer instrumentalizar a catarse coletiva, tirando dela proveito próprio. O bolso Eis a pergunta: "o que faz um eleitor preferir um candidato a outro"? Não há uma resposta fechada para a questão. Mas alguns elementos podem ser alinhados e, de sua combinação, pode-se chegar próximo a uma resposta razoável. Dependendo do candidato e da região, certos fatores pesam mais que outros. O primeiro apelo é o do bolso. Relaciona-se à luta pela sobrevivência e à necessidade de se garantir o alimento. É um dos impulsos básicos do ser humano, que age principalmente em épocas de contenção, crise e desemprego. Quaisquer propostas para garantir o sustento de pessoas e famílias, quando feitas de maneira crível e objetiva, laçam o interesse das pessoas. Um bom emprego ou a perspectiva de melhorar de vida simbolizam o eixo desse discurso. O segundo fator de interesse liga-se à região, ao município, ao bairro, à rua. Trata-se do fator proximidade, que, nos últimos tempos, tem despertado a intenção dos eleitores. O voto está ficando, cada vez mais, distritalizado, regionalizado. As pessoas querem ver melhoramentos nos espaços que as abrigam. Esses são fatores de natureza racional. Proximidade O terceiro elemento está voltado para a proximidade psicológica entre eleitor e candidato. Trata-se, no caso, do conhecimento que o eleitor tem do candidato, aí incluídos os contatos, a aproximação, a tradição familiar, o grau de intimidade. É como o eleitor estivesse votando em alguém da família. Outro tipo de apelo, próximo ao anterior, relaciona-se às indicações feitas pelo grupo de referência do eleitor - seus próprios familiares, vizinhos, amigos e companheiros de trabalho. O grupo funciona como guarda-chuva do candidato. Outro conjunto diz respeito ao próprio candidato. A começar por sua história pessoal e profissional. As circunstâncias Por último, a onda das circunstâncias. Os bons candidatos sempre recebem uma ajudazinha do clima psicológico do momento, que é formado pelos ventos que sopram a seu favor, e que o projetam como a pessoa que melhor cristaliza os sentimentos gerais e mais empatia provoca junto aos diversos grupos sociais. Esse vento aparece geralmente para oxigenar o poluído ar das campanhas. É mais ou menos assim: candidatos estão se devorando pela mídia, cada um atirando mais forte. De repente, aparece um candidato, com um discurso maior, integrador e positivo, forte e objetivo. Esse candidato, mesmo que comece por baixo, no início da campanha, tem condições de subir, paulatinamente, até ser considerado como o elemento novo na pasmaceira de uma campanha. Valores O eleitor leva em consideração valores como honestidade/seriedade; simplicidade; competência/preparo; capacidade de comunicação; entendimento dos problemas; arrogância/prepotência e simpatia. Sob outra abordagem, o voto quer significar protesto, um castigo aos atuais governantes e a candidatos identificados com eles, vontade de mudar ou mesmo aprovação às idéias dos perfis situacionistas. Neste caso, os pesos da balança assumem o significado de satisfação e insatisfação; ou confiança e desconfiança. A questão seguinte é saber qual a ordem em que o eleitor coloca essas posições na cabeça e por onde começa o processo decisório. Não há uma ordem natural. O eleitor tanto pode começar a decidir por um valor representado pelo candidato - simpatia, preparo, capacidade de comunicação - como pelo cinturão social e econômico que o aperta: carestia, violência, desemprego, insatisfação com os serviços públicos precários etc. Esses apelos disparam os mecanismos de escolha. Fidelidade? O eleitor brasileiro é fiel? No sentido abrangente, mais coletivo, a resposta é não. Há grupamentos fiéis, particularmente entre estratos médios, formadores de opinião, segmentos engajados nos partidos, setores religiosos, imigrantes de sangue anglo-saxão e pequenos núcleos ideológicos. Os grandes contingentes são amorfos, alheios ao cotidiano político e capazes de mudar de posição, de acordo com as circunstâncias e as necessidades mais prementes. A sinuosidade, a desconfiança, a versatilidade, a capacidade de adaptação aos espaços são traços de nossa cultura, decorrentes das grandes lutas pela conquista do interior, no início da colonização. A luta pela sobrevivência, a pressão da natureza e o mundo de hostilidades formaram o cinturão mutante que aperta o estômago nacional, sujeitando-o às circunstâncias e ao meio ambiente. O pessimismo O pessimismo induz o eleitor a se afastar dos políticos, que, indistintamente, ganham a pecha de "ladrões e corruptos". Os perfis populistas e messiânicos é quem levam a melhor, ao sintonizarem a linguagem com a imprecação popular. Não por acaso, o chavão "bandido bom é bandido morto, lugar de bandido é na cadeia", toca forte no coração das massas. Uma vitória do Brasil na Copa do Mundo seria uma catarse. E a catarse, com suas vertentes de emoção, vibração, êxtase e felicidade, acaba purgando pecados acumulados. Trata-se de uma formidável estrutura de consolação da sociedade. A psicologia dos eleitores Como são os tipos de eleitores sob a vertente psicológica? A divisão feita por Hipócrates mostra os coléricos, em que a excitação prevalece sobre a faculdade de inibição; os equilibrados, que podem ter reações rápidas e uma excitação igual à inibição, e, neste caso, são considerados "sanguíneos", com reações ágeis; enquanto os indivíduos com reações lentas são considerados fleumáticos, serenos, impassíveis. Por último, os tipos fracos, os melancólicos, que exibem a preponderância da inibição sobre a excitação. Formam, segundo Tchakhotine, o grande número de indivíduos que constituem as multidões e as massas, mais facilmente influenciáveis ou violáveis. Em suma, o discurso político leva em conta o ânimo social - a natureza do estado coletivo - e a tipologia comportamental dos cidadãos, agindo, com maior ou menor intensidade, sobre os mecanismos sensoriais de cada um. O discurso político é um agente poderoso de poder. A equação BO+BA+CO+CA Tenho escrito bastante sobre o uso de instintos em campanhas eleitorais, com destaque para o instinto nutritivo. Até formei uma hipótese que tenho usado para explicar o processo de decisão de voto, que parte do cinturão econômico é ciclicamente usado por governos para afrouxar ou apertar a barriga do eleitor. O "xis" da questão resume-se na equação BO+BA+CO+CA: bolso (BO) cheio enche a geladeira, satisfaz a barriga (BA), emociona o coração (CO) e induz a cabeça (CA) dos bem alimentados a recompensar os patrocinadores do pão sobre a mesa. E o troco, a recompensa? O voto na urna. A recíproca é verdadeira. Bolso vazio é reviravolta eleitoral. O Imponderável O eleitor frequentemente recebe a visita do Senhor Imponderável. O único que pode mudar a direção do vento.
quarta-feira, 6 de abril de 2022

Porandubas nº 754

Um final surpreendente. Freyre com y Abro a coluna com a lembrança de Gilberto Freyre (com Y), um nome que se eleva no panteão da sociologia brasileira. Final de 1963. Festa de Formatura da turma do 3º colegial do Colégio Americano Batista, na rua Dom Bosco. Paraninfo escolhido: Gilberto Freyre, que havia estudado no colégio durante seus primeiros anos. Este escriba foi escolhido orador da turma. Também era presidente do Diretório Estudantil, que tinha como secretário o amigo e grande escritor (falecido) Marcus Accioly. Fomos, em um pequeno grupo, até Apipucos (bairro longínquo), entregar a carta-convite. Subimos a bela escadaria. Um gostoso licor de pitanga nos foi servido, enquanto, ansiosos, esperávamos a chegada do mestre. Sentou-se numa espreguiçadeira e iniciamos a fala. Entreguei a carta por mim assinada. Olhou o envelope, abriu a carta e, para nossa imensa surpresa, disse: - Meus jovens, estou muito honrado com o convite. Até porque foi no Colégio Americano Batista que adquiri meus primeiros saberes. Mas vou devolver a carta. E esperarei que, na próxima semana, vocês a tragam, agora corrigida. Meu pai, Alfredo Freyre, quando recebia alguma correspondência como seu sobrenome grafado com I, ele a devolvia e pedia que os remetentes a corrigissem com o Y. Dessa forma, conservo a tradição. Surpresos e frustrados, saímos de fininho e nunca mais grafei um Freyre sem perguntar, antes, se o destinatário é com Y ou com I. Fiz o discurso de saudação. Recebi loas do paraninfo, que deixou o palco sob aplausos. É pena que não tenha mais esse discurso. P.S. A seguir, assistimos a um memorável show de Zé Vasconcelos e Lúcio Mauro, comediantes, que iniciavam sua trajetória profissional por Recife. Brevíssimas - Mais de 130 parlamentares, aproveitando a janela partidária, trocaram de siglas. - Lula promete demitir, caso seja eleito, cerca de oito mil militares. - Sergio Moro saiu arranhado do Podemos. - Eduardo Leite não descarta ser vice de Simone Tebet. - A reviravolta da Covid, na China, volta a causar medo no planeta. - Putin ganha a batalha, mas perde a Guerra de versões para a Ucrânia. - A jogada de João Doria, de ameaçar desistir, foi mais um tiro no pé. - O conservadorismo está levando a melhor nas candidaturas vitoriosas por alguns redutos. - Uma nova ordem mundial é o prenúncio de novos conflitos. - China é a pedra que pode desequilibrar o jogo. - Petrobras continuará a ser o calcanhar de Aquiles. - As eleições serão tumultuadas. Ante os cenários que se desenham. - A cada dia, fica mais difícil Lula levar no primeiro turno. Homo brasiliensis Nesse ano de eleições, não faltarão adjetivos para qualificar o homo brasiliensis, o nosso homem portador de vícios e costumes. A adjetivação para qualificar o homo brasiliensis é vasta e, frequentemente, dicotômica: cordial, alegre, trabalhador, preguiçoso, verdadeiro, desconfiado, improvisado. Afonso Celso, em seu Porque me Ufano do meu País, divide as características psicológicas do brasileiro entre positivas e negativas, dentre elas a independência, a hospitalidade, a afeição à paz, caridade, acessibilidade, tolerância, falta de iniciativa, falta de decisão, falta de firmeza, pouco diligente. Resumo de Freyre Nessa linha, Gilberto Freyre (com Y, conforme vocês leram na abertura) em Casa Grande & Senzala, pontifica: "Considerada de modo geral, a formação brasileira tem sido, na verdade, um processo de equilíbrio de antagonismos. Antagonismos de economia e de cultura. A cultura europeia e a indígena. A europeia e a africana. A africana e a indígena. A economia agrária e a pastoril. A agrária e a mineira. O católico e o herege. O jesuíta e o fazendeiro. O bandeirante e o senhor de engenho. O paulista e o emboaba. O pernambucano e o mascate. O grande proprietário e o pária. O bacharel e o analfabeto. Mas predominando sobre todos os antagonismos, o mais geral e o mais profundo: o senhor e o escravo". As mulheres na política A participação das mulheres na política vem de longe. Mais precisamente de 1928, quando a potiguar Alzira Soriano foi eleita prefeita do pequeno município de Lajes. Mas o sufrágio feminino só viria a ser promulgado por Getúlio Vargas em 1934. Portanto, foi uma pioneira. Bem como a primeira deputada eleita no Brasil e na América Latina, a paulistana Carlota Pereira de Queirós (São Paulo, 13 de fevereiro de 1892 - São Paulo, 14 de abril de 1982), médica, escritora, pedagoga e política. Madame Trudeau Uma curiosidade: a mãe do atual primeiro-ministro do Canadá, Justin Trudeau, também esteve da linha de frente da batalha da mulher pela emancipação política. Margareth Trudeau, então com 27 anos, calça jeans e uma t-shirt, por ocasião da visita do seu marido, o então primeiro ministro Pierre Trudeau à Cuba e Venezuela, dizia: "Não fiz nada de errado (pelo fato de ter voluntariamente se internado numa clínica para fazer psicoterapia). Se faço as coisas de modo autômato, sou considerada um robô. Não vou deixar que me distancie como acontecia no passado. Quero ser algo mais que uma rosa na lapela do meu marido". Outra mulher de político, Lady Bird Johnson, dizia: "o político deveria nascer enjeitado e permanecer solteiro". Uma pessoa "Não me considero uma mulher, e sim uma pessoa a exercer um ofício". (Indira Gandhi) O eleitorado feminino Na análise que faço sobre o eleitorado feminino, permito-me traçar algumas hipóteses, fruto das observações que venho fazendo ao longo de 40 anos de análise política. O pleito de outubro próximo será o mais racional para o eleitorado feminino, em outras palavras, será o pleito no qual a eleitora dará seu voto com maior convicção. Lembro que esse fenômeno advém do processo de organização da sociedade, em curso há alguns anos, e que tem na mulher um dos seus eixos. A mulher é quem mais sente o peso das carências nas áreas da saúde, educação, alimentos, transporte. Tende a buscar o perfil que mais se encaixe em sua moldura de necessidades. Escolherá o perfil independente do partido. A mulher lidera com 53% o voto no Brasil. O jovem Já o voto jovem, principalmente o do jovem com 16, 17 anos, será mais difícil de consegui-lo. O jovem descrê na política, a quem se refere como politicagem. Os políticos, regra geral, são ladrões. O desemprego que os afeta tem a ver com a irresponsabilidade dos governantes. Portanto, só mesmo um perfil que chame sua atenção poderá convencê-lo a ir às urnas. Nesse caso, vão buscar a figura que mais se identifique com os sinais de modernidade e inovação. Os cinturões do governo Avalia-se o desempenho de uma administração pela somatória de quatro campos de viabilidade: o político, o econômico, o social e o organizativo. O território social não passa de paisagem devastada pela improvisação. Medidas como as de combate à pandemia foram frouxas. Onde estão os pilares da política de saúde? Onde estão as políticas públicas para equacionar o déficit de seis milhões de unidades habitacionais para abrigar os 30 milhões de brasileiros sem teto? E o cinturão da gestão, da organização administrativa? Temos um ministério sem identidade. Colcha de retalhos Que eficiência se pode esperar de um ministério que é uma colcha de retalhos, com partes esburacadas, como as que abrigam ministros sob suspeita, envolvidos em escândalos, gente sem competência gerencial, quadros que vivem em torno de uma Torre de Babel? Como um país se dá ao luxo de ver 3% de sua safra perdida por causa da péssima condição das estradas? O cinturão econômico, esse também está mal ajustado. Trata-se de uma área que navega pelo piloto automático. O desemprego ultrapassa 15 milhões de brasileiros. O arrocho tributário alcança patamar nunca visto. A maldade é dos outros Certa feita, Carl Jung perguntou a um rei africano sobre a diferença entre o bem e o mal. Às gargalhadas, o soba respondeu: "Quando roubo as mulheres de meu inimigo, isso é bom. Quando me rouba ele as minhas, isso é ruim". Nessa mesma linha, Alexander von Humboldt indagou a índios da Amazônia a razão para não comerem os colegas. Os índios responderam: "O senhor tem razão. Não podemos compreender que mal há nisso, pois os homens que comemos não são nossos parentes. Quando pertencem a tribos inimigas, canibalismo neles". É o Brasil. Ainda sobre maldade Ainda sobre canibalismo. Um turco se encontrou um dia com um canibal. "Sois muito cruéis, pois comeis os cativos que fazeis na guerra", disse o maometano. "E o que fazeis dos vossos?", indagou o canibal. "Ah, nós os matamos, mas depois que estão mortos não os comemos". Montesquieu assim arremata a passagem contada no livro Meus Pensamentos: "Parece-me que não há povo que não tenha sua crueldade particular". P.S. Uma olhada nas cenas de guerra entre Rússia e Ucrânia atualiza a crença. Homem de papel No montinho de livros que esperam por minha leitura, o destaque vai para "Homem de Papel", de um dos mais celebrados autores da literatura brasileira, o potiguar e diplomata que honra Mossoró/RN, onde nasceu: João Almino. Ansioso para fruir a imaginação do João, que escolheu o conselheiro Aires, dos romances de Machado de Assis, como protagonista e narrador deste seu último romance. Apenas para lembrar, João Almino foi aclamado por suas obras, entre as quais, Ideias para onde passar o fim do mundo, Samba-enredo, As cinco estações do amor, O livro das emoções, Cidade Livre, Enigmas da Primavera e Entre facas, algodão. Seus livros foram publicados na Argentina, Espanha, EUA, França, Holanda, Itália e México, entre outros países. Desde 2017, João integra a Academia Brasileira de Letras. Editora Record. Orelha de Hélio Guimarães., prof. da USP, e posfácio de Abel Barros Baptista, da Universidade Nova de Lisboa.
quarta-feira, 30 de março de 2022

Porandubas nº 753

Abro a coluna com pequena aula de política. Aula de política Diálogo entre Colbert e Mazarino, durante o reinado de Luís XIV, na peça teatral Le Diable Rouge, de Antoine Rault: Colbert: Para arranjar dinheiro, há um momento em que enganar o contribuinte já não é possível. Eu gostaria, senhor superintendente, que me explicasse como é possível continuar a gastar quando já se está endividado até o pescoço. Mazarino: Um simples mortal, claro, quando está coberto de dívidas, vai parar à prisão. Mas o Estado é diferente! Não se pode mandar o Estado para a prisão. Então, ele continua a endividar-se. Todos os Estados o fazem! Colbert: Ah, sim? Mas como faremos isso, se já criamos todos os impostos imagináveis? Mazarino: Criando outros. Colbert: Mas já não podemos lançar mais impostos sobre os pobres. Mazarino: Sim, é impossível. Colbert: E sobre os ricos? Mazarino: Os ricos também não. Eles parariam de gastar. E um rico que gasta faz viver centenas de pobres. Colbert : Então como faremos? Mazarino: Colbert! Tu pensas como um queijo, um penico de doente! Há uma quantidade enorme de pessoas entre os ricos e os pobres: as que trabalham sonhando enriquecer e temendo empobrecer. É sobre essas que devemos lançar mais impostos. Cada vez mais, sempre mais! Quanto mais lhes tirarmos, mais elas trabalharão para compensar o que lhes tiramos. Formam um reservatório inesgotável. É a classe média! Parte I Panorama das candidaturas 1. A estrada aplainada Os tratores da política aplainam a estrada da política. Abrem os cursos mais estreitos, alargam as margens, limpam a terra no meio do caminho. O Centrão tem os maiores tratores. Mas todos os pré-candidatos usam seus meios e formas. Os mais endinheirados começam a compor suas equipes. E todos pensam em como avançar sem grandes empecilhos. Nenhum deles consegue. A desconfiança é generalizada na política e em seus protagonistas. Façamos uma análise das coisas inconvenientes. 2. Lula - PT Tem o percurso mais largo, nem por isso o mais fácil. O PT, mesmo com as vitórias de Luiz Inácio nas instâncias da Justiça, continua marcado com o sinal da desconfiança. Para começo de conversa, Lula não foi inocentado. Mas ganha a batalha da comunicação porque o julgamento das Cortes, principalmente, no STF, é que o processo contra ele foi mal conduzido, merecendo começar tudo do zero. Para efeito externo, ele foi inocentado. E mais: com os altos índices nas pesquisas, quem vai condenar Lula? Portanto, a primeira instância de Brasília vai esperar ad aeternum. 3. Costuras desajustadas As costuras feitas por Lula em torno de sua candidatura não são unanimidade no PT. Parte do petismo duro - as influências tradicionais - não aceitam algumas, nem mesmo a possibilidade de Geraldo Alckmin vir a compor a chama lulista. Marília Arraes, neta de Miguel Arraes, sai do PT para ingressar no partido de Paulinho da Força. E racha alguns partidos, mesmo que venha apoiar Lula. O mercado - o famoso corredor da avenida Faria Lima - ainda vira os olhos com medo do PT. E Lula promete o céu na terra, dizendo, entre outras coisas, que nem José Dirceu, José Genoíno e Dilma Rousseff serão aproveitados em seu eventual governo. 4. Bolsonaro - PL Recupera alguns pontos na avaliação do governo e no grau de confiança junto a setores que o viam, de modo desconfiado, mas continua o pré-candidato de um olho só: cheio de ódio, uso de termos ácidos, enaltecimento da ditadura, beneficiador de polícias e religiosos, luta do bem (ele mesmo) contra o mal (Lula). Acende todos os dias algumas luzes para o diabo. E acha que os eleitores que não votam nele são metade comunistas ou apaixonados pelo lulopetismo. Olhar completamente enviesado. Ainda por cima, cerca-se de militares sob a ameaça de que ele poderá ser o salvador da Pátria. 5. Moro - Podemos Sergio Moro entrou na vala comum dos políticos mortais, passando a conviver com as pressões e contrapressões da política. Passa a ser triturado pela máquina destruidora de reputações. Já não porta uma réstia de carisma, coisa que o beneficiava, antes de substituir os ossos do ofício. Não deverá alargar seu caminho, arrumando contingentes eleitorais ou formando frentes partidárias. Será massacrado pelo embate sangrento nas hostes políticas. 6. Ciro - PDT Ciro Gomes, mesmo com sua costumeira metralhadora giratória, tem dificuldades em se posicionar como alternativa. Atira livremente para todos os lados. E, ao invés de mostrar alto conhecimento do país, como é seu caso, prefere usar balas de canhão. Melhorou o discurso e a postura - obra de João Santana - mas não sai da linha de tiroteio. E o eleitor está saturado de tanto balaço. 7. Doria - PSDB João Doria faz um bom trabalho no comando do governo de São Paulo, é proativo, trabalhador, incansável. Mas faz o marketing de uma nota só. Até cunhei um nome para isso: egomarketing. O patrocinador número um das vacinas, grande articulador na área dos investimentos, cria rastilhos de pólvora por onde anda e também não é bem visto por alas tucanas. Ganhou as prévias de Eduardo Leite, governador do RS, que tem certo carisma. E poderia vir a ser candidato. Leite, se quiser, terá vida longa na política. Continua no PSDB, após renúncia ao governo do RS. 8. Simone - MDB Seria ótima opção se viesse a ser candidata de uma frente partidária. É desconhecida no país. Tem fluência ideativa, mas está muito longe das massas. 9. Luiz Felipe D'Ávila - Novo Desconhecido no país. Sem chances de empolgar as massas. 10. André Janones -Avante Sem condições - Aproveitamento de oportunidades. 11. Eymael - DC Sem condições- a musiquinha é antiga: um democrata cristão. 12. Luciano Bivar - União Brasil Sem condições - Poderá fazer uma grande bancada. 13. Vera Lúcia - PSTU Sem condições- Marcar presença. 14. Sofia Manzano - PCB Sem condições- Marcar presença. Parte II Lições do passado A morte de Sócrates Aos discípulos que o visitavam na prisão e o aconselhavam a fugir, Sócrates respondia: - "Uma das coisas em que acredito é no reinado da lei. Bom cidadão como tantas vezes vos tenho dito, é aquele que obedece às leis de sua cidade. As leis de Atenas condenaram-me à morte, e a inferência lógica é que, como bom cidadão, eu deva morrer." Narra Max Eastman, em ensaio sobre "O Mais Justo e o Mais Sábio dos Homens", que, ao se aproximar a hora fatal, rodeado de amigos, chega o carcereiro, a quem pergunta: - "Agora, você que entende dessas coisas, diga-me o que fazer." - "Beba a cicuta, depois levante-se e ande um pouco até sentir as pernas pesadas. Então, deite-se e o torpor subirá ao coração." Fez o que foi recomendado. Quando andava, lembrou-se de algo: - "Crito, devo um galo a Esculápio. Providencie para que a dívida seja paga." Deitou-se, fechou os olhos e quando Crito lhe perguntou se havia mais recomendações, ele já não respondia. Confúcio Quando Confúcio visitou a montanha sagrada de Taishan, encontrou uma mulher cujos parentes haviam sido mortos por tigres. Ele perguntou: - "Por que não se muda daqui?" - "Porque os governantes são mais ferozes que os tigres." Um pouco mais de Confúcio: "Se você quer ser sábio, aprenda a questionar razoavelmente, a escutar com atenção, a responder serenamente e a calar quando não tiver nada a dizer." O pensamento de Confúcio gira em torno da educação como fonte de virtudes. Ele prega três virtudes fundamentais: 1) A bondade, que gera alegria e paz interior; 2) A ciência, que permite dissipar as dúvidas, e; 3) A coragem, que afasta todas as formas de medo. Compartilharemos aqui algumas dessas frases de Confúcio que continuam válidas até hoje. Martin Luther King Em 28 de agosto de 1963, King discursou para um público de 250 mil pessoas em Washington. O discurso é uma das melhores peças de oratória contemporânea. Eu tenho um sonho "Estou feliz em me unir a vocês hoje naquela que ficará para a história como a maior manifestação pela liberdade na história de nossa nação. Cem anos atrás um grande americano, em cuja sombra simbólica nos encontramos hoje, assinou a proclamação da emancipação [dos escravos]. Este decreto momentoso chegou como grande farol de esperança para milhões de escravos negros queimados nas chamas da injustiça abrasadora. Chegou como o raiar de um dia de alegria, pondo fim à longa noite de cativeiro. Mas, cem anos mais tarde, o negro ainda não está livre. Cem anos mais tarde, a vida do negro ainda é duramente tolhida pelas algemas da segregação e os grilhões da discriminação. Cem anos mais tarde, o negro habita uma ilha solitária de pobreza, em meio ao vasto oceano de prosperidade material. Cem anos mais tarde, o negro continua a mofar nos cantos da sociedade americana, como exilado em sua própria terra. Então viemos aqui hoje para dramatizar uma situação hedionda. Digo a vocês hoje, meus amigos, que, apesar das dificuldades de hoje e de amanhã, ainda tenho um sonho". Fecho a coluna com pequenas lições de marketing. Primórdios do marketing político "Rastreie, vá ao encalço de homens de toda e qualquer região, passe a conhecê-los, cultive e fortaleça a amizade, cuide para que em suas respectivas localidades eles cabalem votos para você e defendam sua causa como se fossem eles os candidatos". (Quinto Túlio Cícero aconselhando o irmão Marco Cícero, o grande tribuno, em 64. A. C., quando este fazia campanha para o Consulado de Roma). O marketing de campanha O marketing político eleitoral abriga duas vertentes: o marketing massivo, voltado para atingir classes sociais e categorias profissionais, indistintamente; e o marketing vertical, segmentado ou diferenciado, voltado para atender agrupamentos especializados: profissionais liberais, donas de casa, formadores de opinião, núcleos religiosos, militares, funcionários públicos, etc. Nas campanhas, o marketing segmentado acaba assumindo tanta importância quanto o marketing massivo. E a razão está na intensa organicidade da sociedade brasileira. Ciclos da campanha Orientação para candidatos e assessores: estabelecer adequado cronograma dos ciclos da campanha, que, como se sabe, possui cinco ciclos: lançamento, por ocasião da Convenção; crescimento, entre quatro e cinco semanas após a Convenção; maturidade/consolidação, quando a campanha se firma no sistema cognitivo do eleitor, após ampla visibilidade; clímax, momento em que o candidato alcança seu maior índice de intenção de votos; e declínio, quando o candidato tende a cair nas pesquisas de opinião. Todo esforço se faz necessário para o clímax ocorrer na semana das eleições. A dosagem dos ciclos há de obedecer ao funil da comunicação - jogando-se mais água (volume de comunicação/visibilidade) na segunda quinzena de setembro. Candidato que começa a decair antes do tempo corre o perigo de morrer na praia. Planejamento de campanhas Este consultor, ancorado em sua vivência, chama a atenção para o planejamento do marketing das campanhas, que abriga estas metas: 1) priorizar questões regionalizadas, localizadas, na esteira de um bairro a bairro, ou seja, fazer a micropolítica; 2) procurar cria um diferencial de imagem, elemento que será a espinha dorsal da candidatura, facilmente captável pelo sistema cognitivo do eleitor; 3) desenvolver uma agenda que seja capaz de proporcionar "onipresença" ao candidato (presença em todos os locais); 4) organizar uma agenda contemplando as áreas de maior densidade e, concentricamente, chegando às áreas de menor densidade eleitoral; 5) entender que eventos menores e multiplicados são mais decisivos que eventos gigantescos e escassos; 6) atentar para despojamento, simplicidade, agilidade, foco para o essencial, mobilidade, propostas fáceis de compreensão e factíveis. Esse um resumido escopo de planejamento. Marketing: os cinco eixos Resgato, aqui, os cinco eixos do marketing eleitoral: pesquisa, formação do discurso (propostas), comunicação (bateria de meios impressos - jornalísticos e publicitários - e eletrônicos), articulação política e social e mobilização (encontros, reuniões, passeatas, carreatas, etc.). A mobilização dá vida às campanhas. Energiza os espaços e ambientes. A articulação com as entidades organizadas e com os candidatos a vereador manterá os exércitos na vanguarda. A comunicação é a moldura da visibilidade. Principalmente em cidades médias e grandes. Sem ideias, programas, projetos, os eleitores rejeitarão a verborragia. E, para mapear as expectativas, anseios e vontade, urge pesquisar o sistema cognitivo do eleitorado.
quarta-feira, 23 de março de 2022

Porandubas nº 752

Abro a coluna com historinhas do grande Câmara Cascudo, descritas pelo acadêmico e professor Diógenes da Cunha Lima, em sua magnífica coletânea Câmara Cascudo, um Brasileiro Feliz (Lidador, 3ª ed.) O poeta João Cabral de Melo Neto insiste em ver Cascudo. Dona Dália adia várias vezes a visita, preocupada com a saúde do marido. Zila Mamede interfere, lembrando que o poeta e embaixador vai dar muitas alegrias a Cascudo. Pontualmente, às 3 da tarde, chega o poeta. Cascudo não se contém. Fica de pé, gesticula, conta casos, relembra fatos durante mais de duas horas. Enquanto recita poesia galega Cascudo desmaia. João Cabral e Zila Mamede evitam a queda. Instala-se o nervosismo, procura-se um cardiologista, telefones que não atendem, João Cabral toma tranquilizantes, Cascudo foi abrindo os olhos, direcionou-os para João Cabral, falou com voz muito triste: - Estou preocupado..... com ele... E apontou para o poeta. No Rio de Janeiro, uma senhora da alta sociedade, que não gostava de Cascudo, encontra-se com ele num elevador. Cascudo lhe fez as devidas vênias. Ela, imperiosa: - Sabe que eu nunca li um livro seu? E Cascudo incisivo: - Nem eu Cascudo deixou o curso da Faculdade de Medicina, que havia iniciado na Bahia, para se formar em Direito, em 1928. Perguntado porque tinha abandonado o curso médico, ele disse, sem hesitar: - A pedido dos doentes. Panorama visto de perto Um vice O ministro Walter Braga Netto, ministro da Defesa, deverá ser o vice na chapa de Bolsonaro. O general Mourão, o atual vice, se conforma com a eleição para senador pelo RS ou mesmo a vice-governador numa chapa sulista. Bolsonaro disse, este fim de semana, que seu escolhido para a vaga "é de Belo Horizonte e fez escola militar", perfil ao qual o ministro se encaixa. O movimento é visto como uma tentativa do presidente de se blindar contra processos de impeachment. As credenciais que levaram o general Braga Netto ao governo de Bolsonaro eram a de um militar experiente que executou a árdua missão de ser o interventor da segurança pública no Rio, em 2018, por designação de Michel Temer. Procura-se um nome Gilberto Kassab está à procura de um nome para ser o candidato a presidente pelo PSD. Era Rodrigo Pacheco. Passou a ser Eduardo Leite, mas as forças do PSDB pressionam para que o governador tucano do RS não saia do partido. Ventila-se, agora, com o nome do ex-governador do ES, Paulo Hartung. A dúvida persiste, Kassab não quer aderir logo ao Lula. A saída de Marília Arraes A eventual saída da deputada Marília Arraes, do PT, é um golpe para as pretensões do lulismo no Nordeste. A deputada não dialoga bem com a ala do senador Humberto Costa, do PT pernambucano. Mas Marília estará com Lula. Rejeição Há um Senhor Eleitor que está sendo desdenhado, menosprezado. É o Senhor Eleitor chamado Rejeição. Com mais de 30 de rejeição, um candidato fica na beira do precipício, e tem uns com mais de 50% de rejeição, que significa: "eu não voto nessa pessoa de jeito nenhum". Tanto Bolsonaro quanto Lula registram mais de 50% de rejeição. Jacques Wagner Foi um bom governador da Bahia. Recusa-se a entrar outra vez no páreo. Quem faz objeção forte é a ex-primeira dama, dona Fátima Mendonça, que conhece o sacrifício de ser político, ainda mais para um cargo no Executivo em tempos de vacas magras, Estados sem recursos. Faz bem. Rodrigo Garcia O vice-governador de São Paulo, Rodrigo Garcia, está bem atrás nas pesquisas. Fernando Haddad lidera a corrida com muitos pontos na frente. Este analista lembra o alto índice de rejeição do petismo em São Paulo. E ainda acredita nas chances de Garcia. Máscaras As máscaras têm sido abolidas do território nacional. Na China, a covid-19 voltou com força. Temo uma nova onda. Sugiro a linha do bom senso. A onda petista O PT tem condições de fazer a maior bancada de deputados Federais e estaduais. Posição que já foi do MDB. O PT virou um partidão de centro. O assistencialismo Outro grande eleitor de outubro próximo será o assistencialismo populista. Anotem e cobrem. "O que faz os atores medíocres é a extrema sensibilidade... e é a ausência absoluta de sensibilidade que prepara os atores sublimes. As lágrimas do comediante escorrem de seu cérebro; as lágrimas do homem sensível descem de seu coração. Diz-se que o orador é sempre melhor quando se inflama, quando irritado. Nada disso. É quando se finge de encolerizado. Os comediantes impressionam o público, não quando estão furiosos e sim quando representam bem o furor". (Denis Diderot in Paradoxe sur le comédien) Panorama visto de longe Tirando a camada de exageros do bolo expressivo, o armagedom, como lembra o sábio professor Ivan Maciel, deixa de ser uma quimera, algo difícil a acontecer. Basta que um dos Senhores da Guerra aperte um botãozinho. Este fim de semana, o presidente da Ucrânia, Volodymyr Zelensky, chegou a alertar: se não formos capazes de acertar nossa conversa, a III Guerra Mundial torna-se um cenário à vista. O Centro É uma repetição impressionante. Por que a Ucrânia, um país de médio porte de 40 milhões de pessoas no extremo leste da Europa, esteve no epicentro da guerra não uma, não duas, mas três vezes? Respostas Parte da resposta tem a ver com geografia. Situada entre a Rússia e a Alemanha, há muito tempo é vista como o local da luta pela dominação do continente. Mas as razões mais profundas são de natureza histórica. A Ucrânia, com sua origem comum com a Rússia, desenvolveu-se de maneira diferente ao longo dos séculos, divergindo de maneira crucial de seu vizinho do leste. Um só país O presidente Vladimir Putin gosta de afirmar que a Ucrânia e a Rússia são de fato um país. O que é errado. Mas ele está certo em pensar que a história contém uma chave para entender o presente. Em 1904, um geógrafo inglês chamado Halford John Mackinder fez uma previsão ousada. Em um artigo intitulado "O pivô geográfico da história", ele sugeriu que quem controlasse o Leste Europeu controlaria o mundo. Em ambos os lados dessa vasta região estavam a Rússia e a Alemanha, prontas para a batalha. E no meio estava a Ucrânia, com seus ricos recursos de grãos, carvão e petróleo. Ponto de confluência Não há necessidade de entrar em detalhes. Mas a Ucrânia provou ser extremamente influente após a Primeira Guerra Mundial, sendo o centro dos conflitos. Graças ao geopolítico nazista Karl Haushofer, o conceito migrou para o "Minha Luta" de Hitler. A Ucrânia era a ponte que levaria a Revolução Russa para o oeste até a Alemanha, tornando-a uma revolução mundial. O caminho para o conflito novamente passa pela Ucrânia. A guerra, quando ocorreu, foi catastrófica: na Ucrânia, cerca de sete milhões pereceram. Na sequência, a Ucrânia foi anexada à União Soviética por um tempo. Com o colapso do comunismo, muitos acreditavam que as profecias do geógrafo Mackinder estavam ultrapassadas e o futuro pertencia a Estados independentes e soberanos, livres das ambições de vizinhos maiores. Hoje, a posição da Ucrânia no mapa mundial é crucial para os desdobramentos dos conflitos na Europa e no mundo. De História Historinha de Sócrates Quando ouvia alguém falando, perguntava se realmente sabia o que estava dizendo. Certa vez, ouviu um eminente estadista, aproximou-se dele e indagou: - "Perdoe-me a intromissão, mas o que vem a ser para o senhor a coragem?" - "Coragem é permanecermos no nosso posto em perigo", respondeu o orador. - "Mas suponhamos que a boa estratégia exigisse a retirada?", replicou Sócrates. - "Bem, isso é diferente. Está claro que, nesse caso, não haveria necessidade de permanecer no posto." - "Então coragem não é permanecer no nosso posto, nem retirar, não é verdade? Pergunto, então, o que é coragem?" - "Confesso o meu embaraço. Creio que realmente não sei." - "Eu tampouco", arrematou Sócrates, "mas será que se trata de algo que difere do uso da cabeça, pura e simplesmente. Isto é, fazer o que seja razoável, independente do perigo?" - "Isso parece mais acertado", observou alguém entre o grupo. Sócrates finalizou: - "Concordaremos, então, apenas para argumentar, é claro, pois é uma questão difícil, que a coragem se resume em sólido bom senso? A coragem é presença de espírito. E o oposto, nesse caso, seria a presença de em tal intensidade que perturbaria a mente?" Winston Churchill, o humor Há célebres passagens de humor de autoria de Churchill. Aqui, uma pequena seleção: Abanando minha cabeça Winston Churchill fazia um discurso mordaz quando um aparteador, saltando do lugar para protestar, só conseguiu emitir sons abafados. Churchill observou: - "Vossa Excelência devia deixar crescer uma indignação maior do que a que pode suportar." Em outra ocasião, estava sentado, sacudindo a cabeça de maneira tão vigorosa e perturbadora, que o orador gritou, afinal, exasperado: - "Quero lembrar ao nobre colega que estou apenas exprimindo minha própria opinião." Ao que Churchill respondeu: - "E eu quero lembrar ao nobre orador que estou apenas abanando a minha própria cabeça." Sou o chefe O General Montgomery estava sendo homenageado, pois vencera Rommel na batalha da África, na 2ª Guerra Mundial. Discurso do General Montgomery: - "Não fumo, não bebo, não prevarico e sou herói". Churchill ouviu o discurso e com ciúme, retrucou: - "Eu fumo, bebo, prevarico e sou chefe dele." Se houver... Telegramas trocados entre o dramaturgo Bernard Shaw e Churchill, seu desafeto. Convite de Bernard Shaw para Churchill: - "Tenho o prazer e a honra de convidar o digno primeiro-ministro para primeira apresentação de minha peça Pigmaleão. Venha e traga um amigo, se tiver." Resposta de Churchill: - "Agradeço ilustre escritor honroso convite. Infelizmente não poderei comparecer à primeira apresentação. Irei à segunda, se houver." Por que não? Quando Churchill fez 80 anos, um repórter de menos de 30 foi fotografá-lo e disse: - "Sir Winston, espero fotografá-lo novamente nos seus 90 anos." Resposta de Churchill: - "Por que não? Você me parece bastante saudável." Veneno no seu chá Bate-boca no Parlamento inglês. Aconteceu num dos discursos de Churchill em que estava uma deputada oposicionista, Lady Astor, conhecida pela chatice, que pediu um aparte (Sabia-se que Churchill não gostava que interrompessem os seus discursos, mas concedeu a palavra à deputada). E ela disse em alto e bom tom: - "Sr. Ministro, se Vossa Excelência fosse o meu marido, eu colocava veneno em seu chá!" Churchill, lentamente, tirou os óculos, seu olhar astuto percorreu toda a plateia e, naquele silêncio em que todos aguardavam, mandou: - "Nancy, se eu fosse o seu marido, eu tomaria esse chá com prazer!"
quarta-feira, 16 de março de 2022

Porandubas nº 751

Abro a coluna com Albert Einstein. Certa vez, Einstein recebeu uma carta da Miss New Orleans (EUA) onde ela dizia: "Prof. Einstein, gostaria de ter um filho com o senhor. A minha justificativa se baseia no fato de que eu, como modelo de beleza, teria um filho com o senhor e, certamente, o garoto teria a minha beleza e a sua inteligência". Einstein respondeu: "Querida miss New Orleans, o meu receio é que o nosso filho tenha a sua inteligência e a minha beleza". Panorama A III Guerra Não parece quimera. Basta Putin atacar um país integrado à OTAN para ter uma reação da instituição. Para não ficar desmoralizado, poderia acionar o seu arsenal atômico. E uma reação em cadeia seria a consequência. Claro, essa configuração depende de muitos fatores. Coisa complexa. O fato é que o autocrata Vladimir Putin não esperava reação tão forte da Ucrânia. Censura os meios de comunicação. Os russos imaginam que a "operação especial" na Ucrânia é para livrar aquele país do nazismo. A mentira se propaga. Ora, vejam bem: Zelensky é o único judeu que governa um país da Europa. Desnazificar a Ucrânia....é risível. Conselheiros Há um grupo de conselheiros de Putin que caiu no poço da descrença, incluindo o todo poderoso ministro da Defesa, o general Serguei Choigu, que faz muita articulação política, mas não tem experiência no campo de batalha. Os conselheiros do czar diziam que tudo se resolveria rapidamente e de acordo com o planejado. Os russos estão sofrendo e enfrentando muita resistência. Ganharão a guerra porque têm efetivos militares bem superiores aos da Ucrânia. Mas o planejado não está saindo nos conformes. Noutros tempos, esses conselheiros acabariam tremendo de frio na Sibéria. A cadeia de efeitos Exportações de fertilizantes sustadas. Brasil sofrerá para suprir as demandas internas. Setembro, mês de plantação, vem aí. A alta do petróleo - podendo chegar aos U$ 120 o barril (brent) - dispara a subida dos preços de alimentos. O exagerado aumento da gasolina pela Petrobras atinge produtores e consumidores de alimentos, impacta a mobilidade urbana e rural, diminui a grana no bolso, produz bolhas de contrariedade. P.S. Os generais da ativa fazem um escudo de proteção ao presidente da Petrobras, general Joaquim Silva e Luna, que, segundo se sabe, apenas endossa a posição do Conselho e cumpre o ajuste da tabela internacional. Milagre? É possível Ganhar uma eleição sob esse teto nas alturas é um milagre. O Bolsa Auxílio pagará menos do que aquele adjutório no início da pandemia. As massas pensarão que o governo as engana com o alto preço da gasolina, do diesel e do gás de cozinha. Mas os subsídios virão. Lula em dúvida? Luiz Inácio é cauteloso. Todos sabem que será candidato, mas ele mesmo nunca disse isso. E se perceber que o quadro político se complicará para o PT, com a ausência de grandes coligações e apoios, Lula pode até desistir. Ele precisa ganhar no primeiro turno. Ganhar no segundo turno será difícil. Muito mais. Sua trajetória está em jogo. Se perder, adeus à política. Eduardo Leite Segundo diz o próprio Gilberto Kassab a este analista, está tudo certo para que o governador do RS, Eduardo Leite, venha para o PSD, deixando o PSDB. E na mira dele, a candidatura à presidência da Republica. Chapa dos sonhos de Kassab: Eduardo Leite para presidente e Simone Tebet, do MDB, para vice. Simone, no entanto, quer a cabeça de chapa. Mais um problema: os senadores do PSD já estão alinhados à Lula e Bolsonaro. Poder360 O *Poder360* bateu mais uma vez um recorde de audiência em janeiro de 2022. Os dados são da Comscore (o "padrão ouro" na medição de tráfego na internet). No primeiro mês do ano, a audiência do *Poder* superou a de vários sites de veículos respeitados da mídia tradicional. Segundo Fernando Rodrigues, o competente jornalista que chefia a equipe, "tudo é resultado do bom jornalismo profissional praticado diariamente por uma equipe de aproximadamente 80 profissionais que trabalham no *Poder*". Sem máscara Os Estados estão amainando o uso de máscaras. Alguns permitem tirar a máscara em ambientes abertos e fechados, outros apenas em ambientes abertos. Brasil, Brasil. Não se surpreendam se, daqui a pouco, voltarem a subir os índices da pandemia do coronavírus. Na China, os casos estão aumentando. Olaf Scholz O novo chanceler da Alemanha, Olaf Scholz, não tem o carisma de Angela Merkel, mas é um bom articulador. Tem estado na linha de frente das articulações Rússia/Ucrânia. Scholz é um advogado que já exerceu o cargo de ministro das Finanças, prefeito de Hamburgo, de 2011 a 2018, e vice-líder do seu partido, Partido Social Democrata da Alemanha, de 2009 a 2019. E a energia, hein? São Pedro abriu as torneiras e as chuvas torrenciais caem em todo o país. A crise energética não deve ocorrer, pelo menos com a gravidade anunciada em princípios do ano. Os reservatórios estão com índices razoáveis. E o PL, hein? Com a última operação da PF nos terrenos do PL, um grupo de deputados dispostos a entrar no partido de Valdemar da Costa Neto já não exibe tanto entusiasmo para nele ingressar. Valdemar está com receio de perder o mando em sua sigla, que fez história nos tempos do embaixador Álvaro Vale. A abertura do programa do PL com o "Coro dos Escravos Hebreus", do terceiro ato da ópera Nabucco (1842) de Giuseppe Verdi, era um show. O troca-troca A mudança de partido levará em conta os recursos destinados a cada ente. O fundão de quase R$ 5 bilhões é o alvo de todos. Golpe? O Brasil é outro Um golpe militar em tempos atuais é algo praticamente impossível. Não haveria apoio militar. O mundo mudou. É mais interdependente. As Forças Armadas, em seu conjunto, estão profissionalizadas. Fariam continência a Lula, se este ganhasse. Mas a ignorância teima em aparecer na desinformação. Dá conta de um eventual golpe de Bolsonaro, com apoio militar, caso perca a eleição. Os tempos são outros. E as urnas eletrônicas, como ferramenta da ilegalidade, só mesmo na cabeça de incréus e radicais apaixonados. Um pouco de história: Sócrates De corpo franzino e tido como muito feio, Sócrates aceitou de bom humor participar da simulação de um concurso de beleza com seu amigo Critóbulus; era uma brincadeira, com um júri falso. Sócrates tinha certeza de que, por meio da argumentação, conseguiria vencer o amigo: - Sócrates: "O que é beleza?" - Critóbulus: "São as coisas boas e belas que são bem-feitas para cumprir respectivas funções para as quais nós as obtemos ou as coisas bem constituídas para servir às nossas necessidades." Sócrates jogou o anzol e pegou o amigo com a técnica de deixar que o interlocutor discorra para extrair as consequências. - Sócrates: "Tu sabes a razão por que necessitamos de olhos?" - Critóbulus: "Ora, obviamente para ver." - Sócrates: "Nesse caso, parece que meus olhos, sem qualquer esforço de argumentação, são melhores do que os teus." - Critóbulus: "Como assim?" - Sócrates: "Porque enquanto os teus só veem o que está na frente, os meus, esbugalhados como são, veem também o que está dos lados." - Critóbulus: "Quer dizer que um caranguejo está muito bem equipado visualmente, mais do que qualquer outra criatura?" - Sócrates: Exatamente. - Critóbulus: "Bem que seja assim, mas de quem é o melhor nariz, o teu ou o meu?" - Sócrates: "O meu, acho, considerando-se que a Providência fez nossos narizes para cheirar. Pois tuas narinas olham em direção ao chão, enquanto as minhas estão bem abertas e voltadas para fora, de modo que posso captar aromas de todos os lados." - Critóbulus: "Mas como tu achas possível que um nariz achatado como o teu seja mais bonito que o meu, que é reto?" - Sócrates: "Pelo fato de não produzir nenhuma barreira entre os olhos, permitindo a eles uma visão desobstruída para que vejam o que querem, enquanto teu nariz reto e afilado, como que para compensar, separa, como uma barreira, um olho do outro." - Critóbulus: "Já no que diz respeito à boca, até faço uma concessão. Pois se ela foi criada para morder os alimentos, então a tua pode abocanhar muito mais do que a minha pode. E tu não achas que o teu beijo é também mais doce porque os teus lábios são grossos?" - Sócrates: "Pois não é? Mas, de acordo com os argumentos, parece que minha boca é mais feia do que a de um asno." - Critóbulus: "É impossível continuar argumentando contigo. Vamos aos votos." Mesmo com a lógica de Sócrates, os jurados de mentirinha, com pena de Critóbulus, concederam-lhe a vitória. Política e teatro O discurso estético tem muito a ver com os recursos teatrais. Com efeito, a teatralização é imanente à política. Os atores políticos contemporâneos procuram aperfeiçoar sua performance com recursos técnicos da mídia eletrônica e do teatro. O ex-ditador de Uganda, o cabo Idi Amin Dada, dizia conversar com Deus tantas vezes quanto necessário. Hitler treinava a voz e os gestos. Mussolini, com sua voz de bronze e máscara imperial, espelhava-se em D'Annunzio, guerreiro-tribuno. A história antiga é cheia de exemplos que mostram os governantes posando de ator, alguns com feições de comediantes, outros encarnando o perfil de estadistas. Luis XIV fazia exibição de danças. O marechal Pétain tomava aulas de dicção para diminuir a timidez. O próprio De Gaulle dizia que "os maiores medem cuidadosamente as suas intervenções, fazendo delas uma arte". Valéry Giscard d'Estaing, o chefe de Estado francês, tocava acordeon nas praças de Paris. Fernando Collor usou um traje de piloto para fazer uma viagem à Amazônia. O vedetismo O vedetismo do poder pode ser explicado pela psicologia. As pessoas percebem no ator político estados e situações afetivas que lhe são próprias. Identificam-se com ele. E se satisfazem. Trata-se do fenômeno de autovalorização por meio de um herói interposto. Freud também explica: "a maioria das pessoas experimenta a imperiosa necessidade de admirar uma autoridade, perante a qual possa inclinar-se e pela qual seja dominada e por vezes maltratada". Os três maiores oradores Os três maiores oradores da Antiguidade foram: o general Péricles; o tribuno Cícero, mais conhecido pelas Catilinárias; e aquele que é considerado o maior de todos, Demóstenes. Uma figura curiosa. Gago e com muita vontade de superar deficiências. Construiu um lugar para estudo numa caverna, onde ia diariamente treinar oratória e exercitar a voz. Lá permanecia, por vezes por dois ou três meses sem interrupção, raspando o cabelo de metade da cabeça, para que, por vergonha, não conseguisse aparecer em público e se afastar da caverna. Um determinado. Fecho a coluna com mais uma história de padre. O bom senso Uma historinha de Zé Abelha, o nosso contador de causos de Minas. No auge da discussão nacional sobre a lei do divórcio, o então bispo auxiliar de Belo Horizonte, D. Serafim Fernandes de Araújo, reitor da Universidade Católica de Minas Gerais, democrata, liberal, torcedor roxo do Galo, o Clube Atlético Mineiro, foi entrevistado: - O senhor não acha que o bom senso evitaria muitos divórcios? - Acho sim, meu filho, e muitos casamentos também.
quarta-feira, 9 de março de 2022

Porandubas nº 750

Abro a coluna com o Mato Grosso do Sul. Residência médica Em Dourados/MS, foi eleito um prefeito semianalfabeto. Prometia na campanha: "prometo manter os postos de saúde abertos 24 horas, inclusive à noite". Em outra ocasião, a UFGD (Universidade Federal da Grande Dourados) implantou o curso de medicina. Por conta das dificuldades de encontrar hospitais para a residência médica, travou-se grande discussão, na época da campanha, sobre a questão. Em um acirrado debate, perguntaram ao candidato como poderia contribuir para resolver o problema da residência médica. De pronto, respondeu: - "Eu não pretendo dar casa para médico; eles já ganham muito e podem comprar casa. Só vou construir casa para pobre". ("Causo" enviado por Elizabeth Dias Rode) Visão geral I A par da vivência com a pandemia, o planeta se reparte em sentimentos sobre a guerra Rússia versus Ucrânia. Este país, administrado por um ex-comediante de TV, Volodymyr Zelensky, ganha a batalha da Opinião Pública, mas Vladimir Putin tende a impor sua força sobre um país que fez parte da União Soviética. Seu poderio bélico é algumas vezes superior ao da Ucrânia. Visão geral II O que pode se extrair de consequências para o cotidiano das pessoas, afinal, o que sobra do farto conjunto de informações, versões, interpretações, vieses que, todos os dias, leitores e ouvintes das mídias recebem? Entre dúvidas e certezas, o mais certo é por fé no dito de Fernando Pessoa: "noite e dia me trazem murmúrios novos. E dia e noite levam murmúrios velhos" ( Sonnet, Alexander Search, in O Livro das Citações, de José Paulo Cavalcanti Filho). Velha clivagem Em um primeiro momento, floresce o sentimento de que o planeta, a cada grande episódio - conflitos, guerras, pandemias, crise entre países - é jogado no terreno das antigas clivagens, com origem nas ideologias e doutrinas, a luta de classes, por exemplo. De fato, muitos dos torcedores dos lados da guerra Rússia x Ucrânia, ainda se respaldam no discurso da asfixia do imperialismo/burguesia capitalista, sob a égide do neoliberalismo, ante a vitória do proletariado. Uma luta que banirá todas as classes sociais. Em nossas plagas, torcidas ainda levantam essas bandeiras. O outro lado Na presente disputa de narrativas, há muitas denúncias contra a exuberante onda de apoios obtida pela Ucrânia, por meio de seu "estadista" Zelensky. Entre as denúncias, uma se apresenta sob o solene aviso: "você precisa ouvir o outro lado". A respeito de minha coluna da semana passada, tentando descrever a índole de Vladimir Putin, recebi, até, um puxão de orelhas de um intelectual, amigo e presente na cena institucional do país, que registro: "Falta um parágrafo (nas suas análises): cada país, ao entrar na OTAN recebe uma base de foguetes nucleares americanos, Cruise e Persing II, apontados para a Rússia. A uma distância que, uma vez lançados, não dá para interceptar. Em 1962, os russos iam fazer o mesmo em Cuba. E a VI (frota) interceptou navios mercantes, com ordem para afundar, acaso não voltassem. E ninguém criticou. Fazia sentido. Faltou esse dado. Bastaria que os EUA retirassem os seus foguetes e não haveria invasão. Claro que isso não justifica. Mas faltou o outro lado". Ao amigo, minha homenagem. O outro lado está exposto. O desmantelamento cultural Para um grande grupo de cientistas sociais, o que está ocorrendo no planeta é um processo de desmantelamento cultural, feito sob alguns fenômenos em curso - a personalização da política, os modelos e padrões desempenhados pelos governantes que influenciam imitações e usos do público, enfim, um processo de colonização que desmantela as estruturas e a cultura dos grupos. As normas de conduta se desvanecem. Os indivíduos já não sabem como pautar suas condutas. Emerge a crise dos costumes e das convicções, dando vazão ao conceito de Durkheim sobre anomia: o estado no qual as normas não existem. A emergência do poder absoluto Escreve o sociólogo Bertrand de Jouvenel: "os fenômenos de desarmonia social e moral favorecem o aparecimento do poder absoluto - incoerência social, condutas anti-harmônicas, más condutas, fenômenos de desnorteamento e desregramento. Homens desrraigados, recém chegados a uma nova condição, não encontram imagens de comportamentos que governem seu novo personagem". Nessa moldura, transparece a figura do líder carismático, do líder autoritário, do mito, do "salvador da pátria". Puxem a imagem e coloquem na cara de alguns líderes contemporâneos. Além de murmúrios Pois bem, além de murmúrios que vão e que vêm, que comportamentos poderão impregnar o espírito de nosso tempo face ao clima de ódio e medo que se instalou no leste europeu? Primeiro, o da resignação. Milhões de famílias se dobram ante a inevitabilidade das tensões que se multiplicam naquela região. Depois, a banalização do terror, marcada pelos canhões e mísseis mortíferos, que impermeabiliza a morte, de tão intensa e constante como se apresenta. A polaridade Sob esse zunido aterrador, emergem o ódio, a vontade de vingar o ente querido, as tensões, a polaridade. Daí o círculo de adoradores dos protagonistas, de um lado, e os adversários, de outro, a se fustigarem com expressões de ódio e a esquecerem as identidades de povos irmãos, muitos falando a mesma língua. E o bom senso O bom senso dá adeus às ilusões da paz e da harmonia, razão pela qual o planeta se encontra destrambelhado, abandonando as faculdades mentais de seus humanos habitantes. E isso, vale frisar, explica a necessidade de resgatarmos os valores do humanismo e da solidariedade, nos termos em que minha amiga de redes sociais, Marisa Cruz, defende. Sua preocupação é com a escalada de niilismo que assola a Humanidade, o que nos torna gente com DNA contaminado pela maldade e pela barbárie. Sinais de uma guerra nuclear estão nos ares e radares, bastando que um protagonista abilolado pressione o botão de destruição de seu arsenal nuclear. Zelensky e Putin O cenário é previsto: Vladimir Putin ganhará as batalhas, mas perderá a guerra, eis que o manto da autocracia que o cobre está sujo de sangue. O espaço sangrento que se abre para que ele caminhe em direção aos louros da vitória será alargado pela perspectiva de vir a aumentar o seu anseio por anexações de territórios ao mundo russo. E, para não esconder o outro lado, urge que os EUA e os países europeus que integram a OTAN se convençam de que precisam deixar de fazer ameaças a países que não fazem parte de seu grupamento. Se quisermos resgatar a paz no planeta, é hora de um desarme geral do espírito de ódio e conflito que paira sobre as Nações. Flashes e pílulas - Arthur do Val, o famoso Mamãe Falei, merece o repúdio dos seres humanos que respiram ares da ética e da moral. Sua expressão estapafúrdia sobre as mulheres "pobres" ucranianas é um acinte à Humanidade. - O MBL está desgastado e pronto para se tornar um ente sem força e prestígio. - Sergio Moro já esteve melhor. Será queimado por Mamãe Falei. - O final do prazo para viabilização da Terceira Via é o mês de julho. - Bolsonaro cresceu uns 4 a 5 pontos no último mês. Lula perdeu 8. Mas continua liderando bem. - A campanha vai ao segundo turno. Anote. - Na régua de 0 a 10, a possibilidade de protagonistas baixarem seus índices de rejeição aponta: - acima de 60% de rejeição - nota 2 - acima de 50% de rejeição - nota 3 - acima de 30% de rejeição - nota 4 - em torno de 20% de rejeição - nota 5 - em torno de 10% de rejeição - nota 7 - Se Lula for ao segundo turno com um candidato da terceira via, será difícil levar a melhor. - Se Bolsonaro for ao segundo turno com Lula, teria chances de ganhar, a depender do estado da economia. - O futuro do bolsonarismo estará garantido pelas alas do conservadorismo e de segmentos do pequeno e médio empresariado, além de parcelas das margens. - O país vive uma das maiores crises de lideranças de seus ciclos históricos. Quem são os protagonistas com um pé no amanhã? - Parcela importante do eleitorado está se vacinando contra as fake news. - A razão, mesmo perdendo bem para a emoção nesse momento obscuro, está subindo alguns degraus. Fecho a coluna com pequeno roteiro de planejamento de campanha eleitoral. Este consultor, ancorado em sua vivência, chama a atenção para o planejamento das campanhas, que abriga estas metas: 1) priorizar questões regionalizadas, localizadas, na esteira da micropolítica; 2) procurar cria um diferencial de imagem, elemento que será a espinha dorsal da candidatura, facilmente captável pelo sistema cognitivo do eleitor; 3) desenvolver uma agenda que seja capaz de proporcionar "onipresença" ao candidato (presença em todos os locais); 4) organizar uma agenda contemplando as áreas de maior densidade e, concentricamente, chegando às áreas de menor densidade eleitoral; 5) entender que eventos menores e multiplicados são mais decisivos que eventos gigantescos e escassos; 6) atentar para despojamento, simplicidade, agilidade, foco para o essencial, mobilidade, propostas fáceis de compreensão e factíveis.
quarta-feira, 23 de fevereiro de 2022

Porandubas nº 749

Abro a coluna com uma historinha das Minas Gerais. Da burrice e da engenharia Viajando pelo interior de Minas, o arquiteto Marcos Vasconcelos encontrou um grupo de trabalhadores abrindo uma estrada: - Esta estrada vai até onde? - Muito longe, muito longe, doutor. Atravessa o vale, retorce na beirada da serra, quebra pela esquerda, retoma pela direita, desemboca em frente, e vai indo, vai indo, até chegar a Ponte Nova, passando pelos baixios e cabeceiras. - Vocês têm engenheiro, arquiteto, teodolito, instrumentos de medição? - Num tem não, doutor. Nós tem um burro, que nós manda ir andando, andando. Por onde ele for, aí é o melhor caminho. Nós vai picando, picando. - E quando não tem burro? - Aí não tem jeito, doutor; nós chama um engenheiro mesmo. O arquiteto seguiu adiante filosofando sobre as artes da burrice e da engenharia. Registro Abro a análise da moldura institucional, registrando a posse no Tribunal Superior do Trabalho (TST) do ministro Emmanoel Pereira, potiguar, um dos mais experientes e articulados quadros do Judiciário brasileiro. Trata-se de um conhecedor profundo de nossa legislação trabalhista e, para o bem do país, estará no comando da Alta Corte por ocasião de eventuais debates sobre reformulações no setor. Este analista se associa às homenagens prestadas ao grande juiz. A campanha eleitoral A campanha eleitoral deste ano obedecerá a alguns ciclos: a pré-campanha, tempo de articulações, formação de blocos e federações; a campanha na fase I, que será dedicada à apresentação formal dos candidatos e discursos, a se iniciar em junho/julho; a campanha na fase II, que é de enfrentamentos, tensões, querelas, acusações recíprocas, a ocupar o mês de agosto; a consolidação dos nomes em setembro e o clímax, na última semana de setembro e primeira de outubro. A campanha terá duas estacas a sustentá-la: a emoção e a razão. A emoção A emoção carrega sentimentos, alegrias e rancores, muita adjetivação valorativa, que cobrirão os candidatos com véus emotivos. É a campanha do choro, vela, festa, folguedos e foguetões. Eleição é, sobretudo, emoção, daí porque este analista projeta um cenário de intensa polarização, traduzindo o ciclo emotivo que embala o país. O discurso da emoção mobilizará facções e alas. A razão Já a razão emergirá nas propostas programáticas, nos conteúdos de fundo ideológico-doutrinário, captados apenas por grupamentos do meio da pirâmide para cima. A razão é o discurso lógico, analítico e até didático. Os candidatos se esforçam para atrair a adesão do eleitor com argumentos, números, ideias que possam parecer críveis. Os fundões não serão tão atraídos por esses blocos expressivos racionais. A régua Infere-se que a régua apontando para a estatística da emoção e da razão mostrará a seguinte tendência no pleito de outubro: Emoção - 75%; Razão - 25%. Que pontuação alcançam os candidatos nessa régua? Pelo estilo, comportamento e linguajar, é possível apontar as percentagens de emoção e razão que cobrem os perfis de nossa política. Trata-se, claro, de mero exercício de interpretação desses fenômenos, imanentes aos perfis. - Lula - Emoção - 80%; Razão- 20% - Bolsonaro - Emoção - 85% - Razão - 15% - Sérgio Moro - Emoção - 10% - Razão - 90% - Ciro Gomes - Emoção - 40% - Razão - 60% - João Dória - Emoção - 10% - Razão - 90% - Simone Tebet - Emoção - 50% - Razão - 50% - Rodrigo Pacheco ( se for candidato) - Emoção - 5% - Razão - 95% - Eduardo Leite( se for candidato) - Emoção - 20% - Razão - 80% Brasil de ontem Régua da Emoção e da Razão. - Getúlio Vargas - Emoção - 70% - Razão - 30% - Juscelino Kubistchek - Emoção - 60%- Razão - 40% - Jânio Quadros - Emoção - 80% - Razão - 20% - Ciclo Militar - Emoção - 90% - Razão - 10% - Jose Sarney - Emoção - 30% - Razão - 70% - Fernando Collor - Emoção - 70% - Razão - 30% - Itamar Franco - Emoção - 10% - Razão - 90% - Fernando Henrique Cardoso - Emoção -10% - Razão - 90% - Lula - Emoção - 90% - Razão - 10% - Dilma - Emoção - 20% - Razão - 80% - Michel Temer - Emoção - 10% - Razão - 90% Outros eixos Outros eixos estarão por trás do discurso e das estratégias dos candidatos, tais como o populismo, o assistencialismo, o dandismo, o estrelismo, o espetáculo. E quanto mais intensos sejam os atributos puxados do circo e do teatro, maiores as chances de candidatos atraírem as massas. Para melhor compreensão desses fenômenos, permito-me a falar um pouco sobre eles. O personalismo na política A cada dia, multiplicam-se os perfis personalistas: figurantes que encenam no teatro da política suas peças, sob seus nomes e seus traços pessoais. Nada de ideias ou programas doutrinários. Quando aparece um ou outro termo que pode lembrar compromisso nas áreas da educação, saúde, transporte ou segurança, com certeza trata-se de um bordão guardado no fundo do baú - "vamos construir escolas, vamos melhorar a segurança nas estradas, combater os criminosos, fazer hospitais". Mas o nome dos fulanos, sicranos e beltranos estará adornado de substantivos e adjetivos: o fazedor, o pai dos pobres, o maior de todos etc. Em suma, haverá muita linguagem tatibitate. O dandismo No passado, os atores passavam a usar adornos, indumentárias que chamavam atenção, como o uso de cores berrantes, braceletes, correntes, enfim, uma parafernália estilosa. Luis XIV foi um dos primeiros dândis da política. Desfilava nos jardins do palácio de Versalhes em um cavalo adornado de diamantes. O Rei Sol gostava de se exibir. Naqueles tempos e até em ciclos mais recentes, políticos viram dândis, fazendo-se notar pela forma espalhafatosa de se apresentar, implicando ainda o uso de expressões esportivas, provocativas, ferinas. Baudelaire, o poeta, já dizia: "o dandismo é o prazer de espantar". E, sob esse padrão, desafia os costumes e as práticas, prega a desordem e a desunião, não o sistema político. Hoje, sabemos quem faz isso por nossas plagas. O estrelismo No Estado-Espetáculo, a meta é ser a estrela principal no palco. Os candidatos a cargos eletivos, regra geral, se esforçam para ser os mais visíveis. Para tanto, apoiam-se nas estacas do populismo, buscando por meio de ações espetaculosas - carreatas, passeatas, motociatas e outras atas (?) - surgir como o sol brilhante de manhãs esplendorosas. O populismo assume formas variadas, seja por meio de uma adjetivação impactante, seja por meio de programas populistas, de efeitos sonantes no bolso (distribuição de dinheiro) e fartos na barriga (distribuição de alimentos). O heroísmo Daí para se transformarem em heróis, é um pequeno passo. Passam a levantar criancinhas no meio da multidão, a beijá-las, a tocar suas mãos às mãos estendidas das galeras berrantes, tomando café em padarias, fazendo selfies. Os "heróis" da política querem mostrar que são também humanos, concedendo aos integrantes das massas o acesso à sua natureza "divina". Os "heróis" procuram ainda mostrar certo charme, usando símbolos com as mãos ou forma de cumprimentar. Os salões repletos, ao som de festa, são ambientes preferidos. Suscitam admiração e urros ferozes. O entretenimento Nesse ponto, emerge o entretenimento, a ferramenta mágica usada pelos "heróis" e mitos para conquistar o coração das massas. O povo, desde eras remotas, tem apreciado os divertimentos, formas que propiciam catarses coletivas. Os clubes de futebol têm em suas torcidas organizadas a cola da catarse coletiva. Imensos contingentes elevam em hosanas as glórias de seus times. Coisas que vêm da Antiguidade. Vejam o que o imperador Vespasiano escreveu para seu filho, Tito, antes de morrer. O Colosseum "Tito, meu filho, estou morrendo. Logo eu serei pó e tu, imperador. Espero que os deuses te ajudem nesta árdua tarefa, afastando as tempestades e os inimigos, acalmando os vulcões e os opositores. De minha parte, só o que posso fazer é dar-te um conselho: não pare a construção do "Colosseum". Em menos de um ano ele ficará pronto, dando-te muitas alegrias e infinita memória. Alguns senadores o criticarão, dizendo que deveríamos investir em esgotos e escolas. Não dê ouvidos a esses poucos. Pensa: onde o povo prefere pousar seu "clonais" numa privada, num banco de escola ou num estádio? Num estádio, é claro". Panem et circensis (pão e circo) "Será uma imensa propaganda para ti. Ele ficará no coração de Roma per "omnia saecula saeculorum", e sempre que o olharem dirão: 'Estás vendo este colosso? Foi Vespasiano quem o começou e Tito quem o inaugurou'. Outra vantagem do "Colosseum": ao erguê-lo, teremos repassado dinheiro público aos nossos amigos construtores, que tanto nos ajudam nos momentos de precisão. Moralistas e loucos dirão, que mais certo seria reformar as velhas arenas. Mas todos sabem que é melhor usar roupas novas que remendadas. "Vel caeco appareat" (Até um cego vê isso). Portanto, deves construir esse estádio em Roma. Enfim, meu filho, desejo-te sorte e deixo-te uma frase: Ad captandum vulgus, panem et circenses (Para seduzir o povo, pão e circo). Esperarei por ti ao lado de "Júpiter"." Escreveu esta carta um dia antes de morrer. 100 dias de festa E assim foi feito. O Coliseu, o enorme anfiteatro, símbolo do Império Romano, foi iniciado por ordem do imperador Vespasiano em 72 d.C., que decidiu erguê-lo no local de um antigo palácio de Nero, seu antecessor no comando do império. As obras levaram oito anos para serem concluídas e, quando tudo ficou pronto, Roma já era governada por Tito. Roma comemorou a inauguração durante 100 dias, com festas, centenas de gladiadores, cinco mil animais ferozes e muito sangue. Antes dos espetáculos os gladiadores saudavam o imperador: "Ave, Caesar, morituri te salutant". "Salve, César! Aqueles que vão morrer te saúdam". E assim, a política foi incorporando traços e matizes do espetáculo. Hoje, a espetacularização da política faz a pauta diária das mídias massivas (jornais, revistas, rádio e TV) e tecnológicas (redes sociais da Internet).
quarta-feira, 16 de fevereiro de 2022

Porandubas nº 748

Abro a coluna com o passarinho. O passarinho Inflamado, o candidato eleva a fala no palanque. Argumentava que o povo livre sabe escolher seus governantes. Para entusiasmar a multidão, levou um passarinho numa gaiola, que deveria ser solto no clímax do discurso. No momento certo, tirou o pássaro e com ele, na mão direita, bradou: "a liberdade do homem é o sonho, o desejo de construir seu espaço, sua vida, com orgulho, sem subserviência. Deus (citar Deus é sempre oportuno) nos deu a liberdade para fazermos dela o instrumento de nossa dignidade; quero que todos, hoje, aqui e agora, comprometam-se com o ideal da liberdade. Para simbolizar esse compromisso, vamos aplaudir a soltura desse passarinho, que vai ganhar os céus". Ao abrir a mão, viu que esmagara o passarinho. Apertara o bichinho. A frustração por ter matado o bichinho foi um anticlímax. Vaias substituíram os aplausos. Foi um desastre. Assim é o fim de candidatos que não controlam a emoção. Visão da conjuntura 1. Nada decidido Quem disser que fulano, beltrano ou sicrano ganhará o pleito de outubro próximo estará dando um chute. Não tem nada decidido. Vou tentar explicar as razões. Todas elas consideradas no conjunto das ideias-forças que movem uma campanha. Tenho dito e repetido: Somos frequentemente visitados pelo Senhor Imponderável dos Anjos. E este ano é especialmente um ciclo de excepcionalidades. Pandemia, gripes, desobediência às leis, cavalo sem arreios. 2. O caráter do ano O ano de 2022 será muito diferente dos anos anteriores. Transição de um ciclo, não apenas de um governo. Se persistir o governo, o ciclo não se repetirá. Explico. A esfera política não se mantém no atual prumo. Um remelexo geral mexerá as pedras do tabuleiro. Um maremoto na política tem condições de repaginar o que desenhamos. Se o Brasil for de Bolsonaro, a direita se fixará no poder. A bússola entorta. Se o Brasil for de Lula, a incerteza continuará ante as curvas e retas do petismo. Lula não controlará suas bases. 3. O fim de um ciclo Seja qual for a vereda a seguir, à direita ou à esquerda, o Brasil fechará um ciclo. Haverá interesse de se manter a atual estrutura de poder, com a concentração de postos e cargos no Centrão. Mas é viável pensar em uma onda centrípeta - das margens para os centros - que poderá destronar os atuais mandatários do poder do Executivo. Essa onda aparece no meio do oceano turbulento das relações internacionais, com lideranças dispersas e líderes sem legitimidade. 4. O fracasso dos grandes Veremos, um pouco mais adiante, os atuais condutores da política mundial em declínio. Joe Biden não garantirá a supremacia norte-americana. O novo primeiro ministro alemão, Olaf Scholz, não tem o carisma de Angela Merkel. Do Reino Unido, não esperemos decisões de impacto, mas apenas a estética voante dos cabelos de Boris Johnson. Macron tem limitações, Erdogan é um direitista isolado. E a Itália não terá envergadura para enfrentar os rolos compressores da Europa. Ou você, amigo Wálter Maierovitch, discorda? 5. A alma do tempo Para não repetir meu refrão, passo a adotar o termo a "alma do tempo". Todo tempo tem o seu clima, a sua alma, o seu espírito, as suas circunstâncias. E o que explica os cenários descritos? A alma do tempo. Um misto de silêncio e grito, a imbricação de demandas reprimidas com promessas não cumpridas, uma revolta interior que queima os nossos neurônios, uma vontade louca de dormir e acordar em outro espaço, que não seja esse carcomido por impurezas. 6. Um mundo em avanços Seremos pacientes e alguns, parceiros, de um mundo em avanços. A inteligência artificial estará cada vez mais abraçada à tecnologia da informação, suprindo-nos com os alimentos da modernidade, ferramentas que transformarão nosso modo de operar, nossa maneira de pensar, alterando costumes e tradições. Uma grande mudança. 7. Eis, então, a grande ameaça Os avanços civilizatórios esbarrarão nas fronteiras do passado, onde os exércitos com sangue em dinastias históricas persistirão em suas lutas pela manutenção do poder. O mundo muçulmano fará arrebentar suas ondas nas plagas ocidentais, devastando pedaços de tempo e monumentos de cultura. O paradigma do caos tende a ficar sobre nossas cabeças. 8. E por aqui? Somos um pequeno pedaço de terra integrada à civilização ocidental. Vamos influir? Até poderíamos, caso usássemos nossos potenciais para fazer valer nossa condição de seres livres e armados com as ferramentas da liberdade. Nossa visão turva, porém, encurta nosso ciclo. Não enxergamos um palmo à frente do nariz. E caímos na precária luta entre grupos que se opõem: uma direita, que não sabe distinguir um valor do passado tradicional e uma esquerda, que ainda sonha com os teares da revolução industrial. 9. Os novos sinais O mundo exibe uma monumental engenharia de mudanças. Os polos da Guerra Fria, mesmo abrigando arsenais superiores aos da década de 50, já não agem à moda antiga. Essa querela envolvendo a OTAN, a Ucrânia e a Rússia, não será o estopim de uma terceira Guerra Mundial. O bom senso, sob a égide da diplomacia, dará os ditames. Mas a tensão subirá aos píncaros. A Humanidade não mais aceita ser governada por déspotas. O mundo recebe sinais de que a temperança cobrirá as nuvens dos novos tempos. 10. O Brasil, um país acidental Isso mesmo. Um país integrado aos trópicos acidentais. Uma região rica de nosso planeta, farta de riquezas minerais, porém povoada de pequenos e grandes acidentes que maltratam a condição de seu povo. Todos os anos, ouvimos a crônica das mortes anunciadas nos desastres provocados pelas chuvas. Em algumas regiões, elas são escassas, noutras, inundam. Mas os tropeços e acidentes no território da política, estes, sim, são devastadores para o nosso corpo pátrio. Por corroerem a alma da política, por atrasarem o fluxo civilizatório. 11. O que pode nos acontecer? Estamos em plena selva eleitoral. Usando armas da mentira, das acusações, das denúncias, das falsas versões. Não há justiceiro nessa guerra. Nem heróis. Há, e muito, gente desonesta, que elege o dinheiro, o poder, a força monetária como motor da guerra. Este escriba não acredita que os exércitos em disputa possam estabelecer a paz, sob a égide da liberdade e da justiça. Hoje é aniversário de um ente querido, que pensa bem. A quem desejo felicidades. Muita saúde. Prosperidade. Fecho a coluna com o absolutismo. O ditador O ditador vai ao médico: - E a pressão, doutor? - O senhor sabe o que faz, meu general. Neste momento, ela é imprescindível para manter a ordem. O nome de Deus em vão Deus é sempre a referência de homens que carregam em sua alma a pretensão da onipotência. Franco usava a Providência Divina para se afirmar: "Deus colocou em nossas mãos a vida de nossa Pátria para que a governemos". Não satisfeito, mandou cunhar nas moedas: "Caudilho da Espanha pela graça de Deus". Idi Amin Dada, o cabo que se tornou marechal de Uganda, ditador sanguinário, dizia ao povo que falava com Deus nos sonhos. Um dia, um jornalista fez uma inquietante pergunta: "o senhor tem com frequência esses sonhos? Conversa muito com Deus?". Lacônico, o cara de pau respondeu: "Só quando necessário".
quarta-feira, 9 de fevereiro de 2022

Porandubas nº 747

Abro a coluna com uma deliciosa historinha da Bahia. Se deixou, não há crime Cosme de Farias foi um grande advogado dos pobres da Bahia. Enveredou também pela política. Vereador e deputado estadual por muito tempo. A historinha. Um ladrão entrou na Igreja do Senhor do Bonfim e roubou as esmolas. Cosme de Farias foi para o júri: - Senhores jurados, não houve crime. Houve foi um milagre. Senhor do Bonfim, que não precisa de dinheiro, é que ficou com pena da miséria dele, com mulher e filhos em casa com fome e lhe deu o dinheiro, dizendo assim: - Meu filho, este dinheiro não é meu. Eu não preciso de dinheiro. Este dinheiro foi o povo que trouxe. É do povo com fome. Pode levar o dinheiro. E ele levou. Que crime ele cometeu? Se houve um criminoso, o criminoso é o Senhor do Bonfim, que distribuiu o dinheiro da Igreja. Então vão buscá-lo agora lá e o ponham aqui no banco dos réus. E ainda tem mais. Senhor do Bonfim é Deus, não é? Deus pode tudo. Se ele não quisesse que o acusado levasse o dinheiro, tinha impedido. Se não impediu, é porque deixou. Se deixou, não há crime. Cosme de Farias ganhou no verbo. O réu foi absolvido. Panorama visto do alto As melhores visões são do alto. Quando os olhos estão próximos aos objetos, certas partes serão bem focadas, mas os contextos podem ficar de fora. É oportuno um enquadramento que flagre o conjunto. Ver do alto é melhor. Vamos tentar enxergar os fenômenos sob essa perspectiva. 1. A cereja As esquerdas tentam compor uma ampla frente sob a liderança de Luiz Inácio. A cereja para atrair fatias do centro e até da direita tem o nome de Geraldo Alckmin. É um chamariz que impacta no primeiro momento, mas, com o tempo, tende a perder a vitalidade e cair na mesmice da velha política. Truque de Lula, que, ao fim e ao cabo, se for o vitorioso, fará o governo do PT, com o PT e para o PT. Compromisso histórico. Pano de fundo: os dois governos Lula. Não, os de Dilma. 2. O bolo da esquerda Como é sabido, o PT virou uma igreja. Mais acolhedora a seus fiéis. O núcleo duro está saindo dos buracos em que se escondeu e mostra sua velha cara: Gleisi, Mercadante, Mantega, Franklin Martins, os laboratórios da Fundação Perseu Abramo etc. O bolo seria uma federação de partidos de esquerda, liderada pelo PT e pelo PSB. Difícil de agradar ao paladar dos partidos por causa das conveniências eleitorais. O PT vai acabar indo pra guerra com seus exércitos. 3. O bolo da direita À direita, a novidade teria o nome de União Brasil, fusão do PSL, com 55 deputados, e o DEM, com 26. Seria o maior bolo do Parlamento. Seria. Mas como as conveniências partidárias nos Estados são bem diferentes, a debandada está bem assinalada. Até o fechamento da janela partidária, em abril, espera-se uma debandada de pelo menos 20 deputados da bancada bolsonarista do PSL. Bivar pode ir aposentando sua ideia de compor uma chapa como vice. 4. O voo baixo de Sergio Moro A escalada do ex-juiz Sergio Moro está muito devagar, quase parando. É verdade que, nas últimas semanas, Moro mergulhou fundo nas águas da política, correndo regiões, conversando com uns e outros, até posando junto à imagem do padre Cícero, de Juazeiro/CE. Mas não tem agregado apoios substantivos. A galera parlamentar espera vê-lo alçar voos mais altos, subindo nas pesquisas. Oscila entre 8% e 12%. 5. Mulher na chapa Além de Alckmin, há outra cereja no bolo eleitoral. Uma mulher para compor a chapa. Mulher está na onda eleitoral, envolvida em um manto de grandes valores - honestidade, sinceridade, maior assepsia política, ou seja, se posiciona melhor como contraponto à velha política. Fosse mais conhecida, Simone Tebet estaria bem posicionada nas pesquisas eleitorais. É considerada, ainda, como um forte potencial na condição de vice em outras chapas, como a tucana liderada por João Doria. Mas o MDB decidiu bancar sua candidatura que conta com a simpatia de tucanos de plumagem densa, como Tasso Jereissati e José Aníbal. 6. Os ciclos da campanha É evidente que a campanha ainda está morna. Vivemos o primeiro ciclo - o das articulações, fusões, noivados e casamentos. Entraremos no segundo ciclo em abril, quando o quadro geral se firmar na parede. Maio/junho e julho serão meses de consolidação e fechamento de articulações. O terceiro ciclo, como se vê, será dedicado aos lançamentos oficiais. Agosto, o quarto ciclo, é o mês dos grandes embates. Setembro, o pico da montanha e a corrida pelo país. O Senhor Imponderável poderá nos visitar a qualquer momento. O quinto ciclo será o mês das grandes decisões. Na primeira semana de outubro, teremos festas e velórios. 7. Os círculos do presidente Pergunta recorrente: Bolsonaro crescerá? Irá ao segundo turno? Respostas: a) a depender das circunstâncias - economia, adjutórios sociais, intensa polarização, clima de guerra - ou eu ou ele; b) mudança de postura, tentativa de ser mais equilibrado; c) apoio centrífugo - mais engajamento dos contingentes do centro; d) divisão extremada da esquerda, que pode dividir os votos do arco ideológico. Em suma, Jair precisa engrossar, avolumar os círculos de apoio e engajamento. 8. As lembranças dos dutos A imagem do duto que joga dinheiro - aquela massificada imagem de corrupção, divulgada diariamente por meses pela TV Globo por ocasião da Lava Jato deverá aparecer. A não ser que a Globo, a essa altura, já tenha decidido caminhar junto com Lula, o que já faz parte das conversas. A banalização da imagem negativa acabou repartindo seus efeitos por toda a classe política. 9. Ciro, sempre o mesmo Não será desta vez que o marqueteiro João Santana alavancará a imagem de Ciro Gomes. Mudança ligeira de linguagem passará despercebida pelas correntes das margens sociais. Ciro é Ciro e não haverá argamassa capaz de mudar sua fachada. É bom de debate e conhece o Brasil. Mas o pouco debate não deixa emergir tais qualidades. 10. João Doria, o vacinador O governador de São Paulo será embalado no manto das vacinas, como o homem público que abriu as gavetas da vacinação em massa. Mas o jeito João Doria de ser - sofisticação e paulista no corpo e mente - será uma barreira de difícil travessia. Faz um bom governo. Mas o governo gira em torno de si. Parece não ter equipe. Suas mensagens não chegam às massas. 11. Simone, a surpresa Simone Tebet, a senadora do MDB do Mato Grosso do Sul, se conseguir ter boa visibilidade, poderá alçar voo. Tem estofo e postura de inovação. 12. Bolsonaro na Rússia Imprudência, inoportunidade, falta de bom senso. São os termos que cobrem a marcada visita de Bolsonaro à Rússia, nesse momento de tensão com a Ucrânia. Uma bela foto de Putin e Bolsonaro no Kremlin será vista pelo mundo. Mas o isolamento do Brasil será mais intenso. Bolsonaro sonha com a foto., que não o fará um estadista. 13. Haddad versus Garcia Em São Paulo, é muito provável que Fernando Haddad, o ex-prefeito da capital, seja o candidato do PT a enfrentar Rodrigo Garcia, que foi eleito pelo DEM, mas virou tucano. É este vice-governador que João Doria quer eleger governador. Face à polarização, Garcia terá mais chance que Haddad. São Paulo, capital, abriga os maiores núcleos antipetistas do país. A conferir. 14. Ezequiel no RN O presidente da Assembleia Legislativa do RN, Ezequiel Ferreira de Souza (PSDB), está articulando uma ampla frente para derrotar a atual governadora, Fátima Bezerra. Ele tem condições, mesmo considerando que a máquina governamental que administra é uma forte alavanca da governadora. Mas a máquina legislativa é também poderosa. 15. Disputa ferrenha O deputado José Dias (PSDB) explica: "A primeira etapa é a definição da candidatura a senador. Quanto a isso, não há decisão alguma. Mas, o meu desejo e a minha expectativa é de que Rogério Marinho e Fábio Faria entrem em entendimento e decidam essa questão até o final dessa semana, pois não temos muito tempo. Essa conversa é apenas entre os dois ministros e as lideranças do governo do presidente Jair Bolsonaro. Nós não temos a menor interferência nesse diálogo. Acreditamos que o melhor nome da oposição para o governo é o de Ezequiel, que conta com o apoio político de, pelo menos, 18 deputados estaduais e 130 prefeitos espalhados pelo Estado". Fátima lidera a intenção de votos. Se Lula estiver bem folgado nas pesquisas, será difícil remover a governadora. O carro se atolou-se Nesses tempos de chuvarada, fecho a coluna com atoleiro. Walfredo Paulino de Siqueira foi um típico coronel da política pernambucana. Escrivão de polícia, comerciante, deputado, industrial, presidente da Assembleia, vice-governador de PE. Era uma figura folclórica, como conta Ivanildo Sampaio, ex-diretor de redação do Jornal do Commercio, de Pernambuco, e meu contemporâneo na faculdade. Um dia, dois eleitores discutiam sobre o uso da partícula "se". O exemplo era com um automóvel que ficara preso em meio a um atoleiro. O primeiro afirmava que a forma correta de se expressar era falar que "o carro atolou-se"; o outro insistia que não; o correto era "o carro se atolou". Consultado, Walfredo deu a sentença salomônica: - Escutem aqui. Se os pneus que ficaram presos foram os dois da frente, o correto é dizer que "o carro se atolou". Se foram os pneus traseiros, a gente fala assim: "o carro atolou-se". Mas, acontecendo de ficarem presos os quatro pneus, os da frente e os de trás, então, meus filhos, a forma correta mesmo é "o carro se atolou-se"...
quarta-feira, 2 de fevereiro de 2022

Porandubas nº 746

Começo a coluna pinçando historinhas do ex-governador de MG, o folclórico Newton Cardoso. Pasteurizar Preocupado com as notícias de que o leite estava contaminado, Newton pegou um pastel e começou a mexer dentro da xícara. Um assessor perguntou: - "Por que você está fazendo isso?" Respondeu: - "Para pasteurizar o leite." Porquinos Newton no palanque: "Minas sempre se preocupou mais com a criação de bovinos e equinos. Agora, eu vou cuidar também da criação de porquinos". Uso o M Newton, numa entrevista: "Precisamos acabar com a fila do IMPS." O assessor cochicha: - "Não é IMPS, é INPS." - "Nada disso. Desde lá de Brumado que eu aprendi que antes de P se usa M." Raposa e leão "Um príncipe precisa usar bem a natureza do animal; deve escolher a raposa e o leão, porque o leão não tem defesa contra os laços, nem a raposa contra os lobos. Precisa, portanto, ser raposa para conhecer os laços e leão para aterrorizar os lobos." Conselho de Maquiavel, que arremata: "não é necessário ter todas as qualidades, mas é indispensável parecer tê-las." Breve leitura Fevereiro começa com a temperatura eleitoral um pouco mais elevada. A corrida eleitoral ganha volume, os protagonistas se movimentam, o eleitorado começa a tomar pé nas ondas que se formam nos Estados, onde os partidos focam nas composições e alas. Na linha de frente da política, o ator Luiz Inácio continua a ter o maior desempenho no palco, recebendo a maior atenção midiática. O arco de Lula É evidente que seu favoritismo chama a atenção dos próceres da política, eis que a ideia que os move é a conquista do poder, custe o que custar. O Centrão não tem tanta certeza de que perfilará ao lado de Jair Bolsonaro até o fim da corrida. Agirá sob os impulsos do pragmatismo, o que abre grandes dúvidas em seus líderes. Isso significa a alternativa de poder se bandear para o lado vencedor, lá mais adiante. Haverá, claro, a correia partidária que segurará os indecisos, mas sempre aparecerá uma saidinha à brasileira, que é a de piscar um olho para a direita, outro para a esquerda. Lula se aproveita dessa tendência para fechar um arco de alianças com os centristas. A nova carta aos brasileiros Esta é a nova carta de Lula aos brasileiros: alianças aqui e acolá, diluindo o vinagre petista, que parte considerável do eleitorado se recusa a provar. Com o aceno ao centro e à direita, Lula espera quebrar as barreiras que ainda restam como oposição ao petismo. As massas não estão preocupadas com ideologia, indo ao encontro do perfil que restaure para elas a esperança. Mas os setores médios, integrados por fortes correntes de profissionais liberais, pequenos e médios proprietários, setores da intelligentzia, núcleos da educação e da mídia, executivos da iniciativa privada, entre outros, ainda exibem rejeição ao lulopetismo. O Busílis O problema do PT ainda se concentra no território da confiabilidade. Escrevo há tempos sobre o refrão: primeiro, eu, segundo eu, terceiro, eu. Assim raciocina o PT. Tornou-se uma religião fechada. Quem não é petista, é inimigo que merece o fogo do inferno. Os outros é que roubam, praticam ilegalidades. Por quatro décadas, temos visto este manto sagrado cobrindo o PT. Como confiar no fato de que não mais prega a luta rancorosa de classes, a velha clivagem ideológica, a defesa intransigente do regime cubano, o elogio à "democracia" venezuelana? Para efeito eleitoral, o PT é mutante. Porém, e depois? Lula se esforça para retocar as paredes do petismo. Conservadorismo radical Já o contraponto é o presidente Jair Bolsonaro, que deseja ressuscitar a polarização de 2018. Sim, teremos uma campanha muito polarizada, em alguns aspectos até mais contundente que a de 2018. É a alternativa que sobra a Bolsonaro: ele e o outro, o outro, representando a maldade e ele, representando o dragão montado no cavalo de São Jorge. Radicalizar, para ele, significa ganhar visibilidade, apresentar-se como o guerreiro que luta contra o comunismo, combate a ciência e defende obscurantismo. O paradoxo Eis o paradoxo de nossos tempos: nunca a ciência avançou tanto no campo das descobertas das vacinas, nunca os laboratórios se dedicaram com tanto afinco às pesquisas científicas. Nunca os conhecimentos foram tão repartidos pelos habitantes do planeta. A Sociedade da Informação nos acolhe. No entanto, mesmo vivenciando esse Novo Iluminismo, propagam-se a mentira, as falsas versões, as inverdades, a desinformação. A ignorância se alastra formando camadas de estupidez aqui e alhures. Populistas se aproveitam da incerteza das massas para jogar iscas e atrair os incautos. Esse é o paradoxo desse novo mundo que se descortina. A construção da racionalidade Tempo de eleição é tempo de emoção. O engajamento de um eleitor se dá, inicialmente, pelo coração. O eleitor descobre em seu candidato preferido elementos que os torna próximos, designados pela psicologia como identificação e projeção. Os candidatos escolhidos são aqueles que mais se identificam com as demandas dos eleitores, aqueles que são os mais aptos a suprir as carências dos conjuntos sociais. Esse processo tem muito a ver com emoção. Mas também há uma dose de racionalidade, que serve para efeito de comparação entre perfis e decisão de voto. A construção da racionalidade emerge, não com tanto ímpeto, mas começa a brotar nas searas sociais. A terceira via Diante dessa moldura, pode ocorrer uma decisão coletiva que tenha como foco uma via que se afaste do único corredor do pleito. Essa via dependerá das circunstâncias, entre elas, o esgotamento dos palanques radicais, a exaustão de discursos polarizados, a fragilidade da economia, menos dinheiro no bolso das massas, a estética da miséria aumentando seus pontos de visibilidade. Miséria A moldura da miséria se apresenta na paisagem destroçada que se torna mais nítida nesses tempos de pandemia e chuvas torrenciais que matam famílias e destroem seu habitat. A pandemia continua subindo ao teto, com a variante ômicron massificando a contaminação. Mas o cidadão já não tem tanto medo como na primeira onda da variante delta. Já a paisagem de desolação e destruição por causa das chuvas é a estética que toma conta dos meios de comunicação. O problema será jogado no colo dos governantes, que mostram suas caras nos espaços destruídos, mas não foram capazes de implantar programas de prevenção. A economia Já a economia aparece com dados que sinalizam soerguimento, recuperação. As contas públicas reagem com um saldo positivo de mais de R$ 64 bilhões. Os dados do PIB tendem a subir um pouco. O emprego começa a reagir, quadro mostrado pelo aumento no número de carteiras de trabalho assinadas. O tal auxílio Brasil acalma os ânimos das populações mais carentes. Ou seja, a economia se mostra reagindo bem às intempéries. Segundo turno Esse é o desenho que anima Bolsonaro e suas bases. Daí sua confiança em entrar no segundo turno. Lula sabe que se for para uma segunda rodada, com a economia em recuperação, será difícil levar a melhor. As pesquisas, hoje, o apresentam como favorito. Hoje, repito. Tendências eleitorais são como nuvens. Mostram figuras diferentes de minuto a minuto. Mas este analista acredita que se um novo figurante entrar em um segundo turno, com ele estarão as chances de vitória. Fecho a coluna com uma observação sobre o marketing de campanha. Marketing não ganha campanha Marketing não ganha campanha. Quem ganha campanha é o candidato. Marketing ajuda um candidato a ganhar a campanha, ao procurar maximizar seus pontos fortes e atenuar seus pontos fracos. O profissional de marketing é importante, na medida em que funciona como um estrategista a definir linhas de ação, orientando a escolha do discurso, ajustando a linguagem, definindo padrões de qualidade técnica, sugerindo iniciativas e ponderando sobre o programa do candidato, os compromissos e ações a serem empreendidas. Esse figurante precisa, sobretudo, ser um profissional com visão sistêmica abarcando todos os eixos do marketing. Que não entenda uma campanha apenas como apelo publicitário, proposta de programa televisivo. Que seja capaz de visualizar os novos nichos de interesse de uma sociedade exigente, crítica e sensível aos mandos e desmandos. O protagonismo capenga Não adianta um bom marketing se o candidato é um boneco sem alma. Candidato não é sabonete. Tem vida, sentimentos, emoção, tristeza e alegria. Muita coisa depende dele, de sua alma, de seu fervor, de suas crenças, enfim, de sua identidade. Protagonistas da política não são produtos de gôndolas de supermercado. As inserções publicitárias na mídia até podem exibir um candidato de forma genérica, por falta de tempo para expor conteúdo. Mas o eleitor não se conformará com meros apelos emotivos e chavões antigos, como aqueles que embalam perfis saturados - candidatos beijando crianças e apertando a mão de pessoas, tomadas em câmera lenta mostrando o candidato no meio do povo.
quarta-feira, 26 de janeiro de 2022

Porandubas nº 745

Abro Porandubas com o espetacular Ariano Suassuna, o famoso autor de Auto da Compadecida e grandes aulas sobre o conhecimento humano. Antes, um parêntesis. Este escriba tem o maior respeito por suas leitoras e leitores. A historinha de hoje não sinaliza desrespeito, tão somente um exemplo dos "causos" hilários protagonizados por Ariano, que incluo na categoria tão celebrada por Vergílio na Eneida: "poetis et pictoribus omnia licet" ("Aos poetas e pintores, tudo é permitido"). Dito isto, vamos à historinha. O escritor pernambucano Ariano Suassuna (1927-2014) estava terminando a aula quando certo estudante, tatuado, jeitão de hippie, óculos redondos, bolsa com franjas e chinelo de couro, faz a pergunta respondida de pronto: - O senhor não acha que o rock é um som universal? - Meu filho, som universal só conheço três: arroto, espirro e peido. A estrela do bolsonarismo Olavo de Carvalho, a estrela que brilha nas mentes bolsonaristas, desaparece aos 74 anos de idade. Era um descrente da Covid e das vacinas. Perdeu para o vírus, que deve ter se aproveitado do conjunto de comorbidades do guru. Foi embora do Brasil por descrédito na política e esperançoso de que, longe, poderia fazer "uma igreja" com seus crentes. Nunca polemizei com o "filósofo", que massacrava todos aqueles de quem discordava. Certa vez Certa vez, deparei-me com um artigo de Olavo disparando flechadas contra esse escriba. Não entendi a razão. Fiz, ao longo de minhas análises políticas, severas críticas ao lulismo. Nunca li na cartilha de Lula. Mas sempre reconheci seu valor e sua persistência na política. Olavo foi duro, considerando-me um lulista. Risos. Leu errado. Era de sua índole questionar tudo e todos. Não respondi. Morreu sem minha resposta. Descanse em paz. E agora? Pergunto-me: e agora, o que poderá ocorrer com a leva de crentes que liam nas páginas do guru? Continuar a desacreditar na Covid? Dizer que morreu de causas naturais? E os fiéis ex-ministros Abraham Weintraub, da Educação, e Ernesto Araújo, das Relações Exteriores? Aliás, o que fará Weintraub? Candidato a que? Deputado Federal por São Paulo, talvez esta seja sua melhor opção. Viabilidade Só para lembrar os fatores que explicam a viabilidade de um governo, segundo Carlos Matus, ideólogo chileno: a) a viabilidade política; b) a viabilidade econômica; c) a viabilidade cognitiva e d) a viabilidade organizativa. Bolsonaro acertou os ponteiros da viabilidade política, com o apoio do Centrão. Está perdido na questão da organização de seu governo, com ministros o desajudando. Está carente na viabilidade econômica, com o PIB sendo rebaixado pelo FMI. E quanto à viabilidade cognitiva, também fica a dever, com a montanha de dúvidas que persistem e obscurecem a identidade do governo. Afinal, o que quer e para onde pretende levar o país? O que espera Bolsonaro? Afinal de contas, quais os trunfos que se escondem na cabeça do Bolsonaro? O programa Auxílio Brasil? Recuperação da economia? Capacidade de Carlos Bolsonaro fazer milagres nas redes sociais? Ora, o filho Eduardo, o deputado Federal, está sendo isolado da campanha por seu radicalismo? Em política, tudo é possível. Mas, mesmo como reconhece a Bíblia, será difícil passar um elefante no buraco de uma agulha. Lula E Luiz Inácio, hein? Da esquerda do "vira a mesa", dos velhos tempos da luta de classes, Lula agora vira um perfil que quer atrair os integrantes do centro e até da direita. E até, tu, Geraldo Brutus? O que te impressionou a ponto de apagar tudo que disseste de Lula e fazer de conta que ambos são amigos desde os tempos dos primeiros passos? O que a política não faz, hein? Matreirice Lula transformou-se em renomada raposa da política. Matreiro como jamais foi. Uma espécie de José Maria Alkmin dos tempos de outrora. Conhecem esta? O milagre de Fátima José Maria Alkmin, a raposa mineira, mestre da arte política, chegava da Europa com cinco garrafas enroladas na pasta. A Alfândega quis saber o que era. - Água milagrosa de Fátima. - Mas tudo isso? - Lá em Minas o pessoal acredita muito nos milagres da água de Fátima. Não dá para quem quer. - O senhor pode desenrolar? - Pois não, meu filho. - Mas, deputado, isso é uísque. - Ué, não é que já se deu o milagre? Pico da contaminação O pico da contaminação está à vista. Teremos novamente a avassaladora onda de contaminação que persistiu por ocasião da variante Delta no ano passado. Espera-se que tudo volte ao normal? Sonho. O desespero está nos estabelecimentos hospitalares, onde faltam insumos e mão de obra para enfrentar a onda da Ômicron. Quem entrou em hospital ou conversa com profissionais da saúde sabe o tamanho da encrenca. Tasso e Simone Tasso Jereissati está sendo procurado por Lula para papear sobre sua adesão ao candidato petista. Esse analista não acredita que Tasso embarque nessa. E Simone Tebet, Tasso? Quem sabe ela não dá um salto? Quem sabe, cai a ficha de milhões de brasileiros que desejam aposentar o radicalismo? Fui amigo de Ramez Tebet. Um dos perfis mais dignos que este escriba conheceu em sua vida profissional de comunicação política. Simone é uma política de respeito. Já provou ser uma grande administradora. Foi prefeita de Três Lagoas, no Mato Grosso do Sul, onde deixou um rastro forte de sucesso. E se o bicho for longe... E se o vírus Ômicron não sair da paisagem e continuar no pano de fundo da campanha eleitoral? A radicalização tende a se intensificar. A conferir. Federações As federações partidárias constituem uma solução para clarear a política. Partidos com um mesmo tronco identitário tendem a se unir, ficando mais fácil ao eleitor compreender os espaços do arco ideológico, direita, centro-direita, centro, centro-esquerda, esquerda. Os partidos se comprometem a passar quatro anos juntos. Distribuição correspondente aos espaços midiáticos e recursos partidários. Se um quiser sair, as federações precisam contar com pelo menos três protagonistas. A política mais clara permitirá escolher por conteúdos e programas ideológicos. SP e MG Olhem o que pode acontecer com Minas Gerais, que é uma síntese do Brasil, uma banda virada para o Nordeste, outra banda virada para o Sudeste. E o carro-chefe da Federação, São Paulo? O interiorzão Este analista costuma conversar com eleitores do fundão do país, em sua maioria, eleitores fanáticos de Bolsonaro, que não se cansam de conclamar: "aqui, Lula já era. Bozo ganha de lavada". Podem até acertar suas previsões. Mas nos centros médios e avançados, o voto em Bolsonaro se esvai, diminui, seca a olhos vistos. A não que ser que nossos olhos não consigam mais enxergar bem. Estou há 40 anos olhando para a paisagem. Fecho a coluna com a fama dos políticos. Ninguém tem provas Numa festa, a dona de casa recebe um político famoso. - Muito prazer! - diz ele. - O prazer é meu! Saiba que já ouvi muito falar do senhor! - É possível, minha senhora, mas ninguém tem provas!
quarta-feira, 19 de janeiro de 2022

Porandubas nº 744

Abro a coluna com uma historinha do querido Rio Grande do Norte. Estar com Deus não ofende Noé, conta Sebastião Nery, era uma figura folclórica do Rio Grande do Norte. Tinha o hábito de cortejar todos os governos. No levante comunista de 1935, quando o deputado pela Bahia e secretário-Geral do PC, Giocondo Dias, tomou o poder ocupando o Palácio Potengi, enquanto Dinarte Mariz marchava de Caicó para Natal subindo a Serra do Doutor, a multidão enfurecida invadiu o jornal A República, de propriedade do governo. Na sala da direção, encontram Noé. Agarram-no pela gravata: - Com quem você está? - Estou com Deus. Isso ofende? Não ofendia. Salvou-se. Panorama Vamos aos nossos pequenos retratos. Pandemia e democracia O que aconteceu com as democracias sob a teia sombria da pandemia? Perderam força. Os governos, particularmente os dirigidos por perfis autoritários, reforçaram seus espaços de mando e poder. Agregaram forças. Passaram a ter voz mais ativa nos territórios, ganharam visibilidade, arregimentaram apoios. No caso do Brasil, defendendo o negacionismo, indo contra a ciência e desfechando tiros contra a vacina, o presidente da República, ao contrário de muitos dirigentes, nada em maré baixa. P.S. Extinguiu muitas instituições e órgãos de controle. A participação social no processo decisório encolheu. Agitando as bases Bolsonaro aposta na hipótese de que, apesar dos pesares, ele é a principal fortaleza de defesa do país contra as ameaças do "comunismo", sistema que costuma jogar no colo de Luiz Inácio. Por isso, seu principal objetivo é animar as bases de simpatizantes e alas radicais, esperando que elas lhe dêem os votos para entrar no segundo turno. Espera repetir 2018, quando encarnou o papel de São Jorge empunhando a espada contra o dragão da maldade. 20 a 25 pontos Se obtiver entre 20 e 25 pontos, terá condições de entrar no turno seguinte da campanha. O nome da terceira via mais provável no momento é o do juiz Sergio Moro, que ainda não empolga os segmentos do meio da pirâmide. As classes médias tendem a ser o pêndulo do pleito. Para onde se inclinarem, definirão o favorito do pleito. Ainda não fecharam por completo suas preferências. São Paulo O Estado de São Paulo abriga cerca de 40 milhões de pessoas. Unidade mais populosa da Nação, o Estado será centro de uma batalha contundente. É mais populoso do que 178 países, colocando-se abaixo de apenas 29 em termos de habitantes. Na América do Sul, somente a Colômbia abriga um número maior de pessoas que São Paulo. Abriga 35 milhões de eleitores, sendo o maior colégio eleitoral brasileiro. A capital de São Paulo representa também o maior município em número de eleitores, com cerca de nove milhões do total. O Triângulo das Bermudas Costumo lembrar que o Triângulo das Bermudas será o decisor da campanha. Constituído por São Paulo, Minas Gerais e Rio de Janeiro. MG possui cerca de 16 milhões de eleitores, concentrando quase 11% do eleitorado do país, que, neste ano, deve ultrapassar 150 milhões de pessoas. Terceiro maior colégio eleitoral do país, o estado do Rio de Janeiro tem mais de 12 milhões de eleitores, mais de um terço na capital fluminense, com cerca de cinco milhões. Os maiores polos Em SP, MG e RJ estão os maiores grupos de pressão e opinião: os maiores conglomerados empresariais; as mais fortes organizações não governamentais; os maiores contingentes das classes médias; os maiores grupos de profissionais liberais; os maiores núcleos estudantis; enfim, os maiores polos de poder social. Passam, portanto, por aqui os clamores e gritos que embasam o discurso nacional. As estatísticas Dito isto, resta aduzir com outras estatísticas: a região Sudeste é a maior em número de eleitores, com cerca de 65 milhões de eleitores, 43% dos aptos a votar. Em seguida vem a região Nordeste, onde há mais de 40 milhões de eleitores ou 27,01% do total. O Sul conta com 14,47% dos eleitores, contabilizando 22 milhões brasileiros. A região Norte tem 12 milhões, ou 7,91% de votantes. A região Centro-Oeste concentra o menor número de eleitores: 10.943.887, ou 7,27% do total. Há 509.988 (0,33%) brasileiros aptos a votar no exterior. A maioria do eleitorado brasileiro é formada por mulheres, que representam 52,49% do total, somando 77.649.569 eleitores. Os homens totalizam 70.228.457 eleitores, correspondendo a 47,48% do total. O discurso tatibitate Infelizmente, no ano eleitoral seremos vítimas do blá blá blá das campanhas. Do tipo: - o Brasil tem jeito, basta saber governar. - Fulano de tal é o "pai dos pobres". - Sicrano é o patrono dos trabalhadores. - Beltrano é o benfeitor da saúde. - Hora de reconstruir o país. - Vamos combater a corrupção. - Nossas crianças precisam de melhor educação. - Vamos baratear a comida no prato. - Com fulano de tal, éramos felizes e não sabíamos. É o chamado discurso tatibitate O discurso substantivo O contraponto será o discurso substantivo, que abrigará densidade, argumentos, propostas concretas e como serão aplicadas. Algo como: - O salário-mínimo será reajustado um pouco acima dos índices da inflação. - Um projeto para o país, contemplando as prioridades e demandas regionais. Com coordenação centralizada e operação descentralizada. -Transparência, melhoria dos serviços públicos (qualificar e quantificar metas). - Algo como criação de centrais de abastecimento em todas as regiões para suprir demandas nas áreas de: - alimentos - remédios/equipamentos de saúde - educação - livros didáticos Enfim, setores que sejam altas prioridades. Densidade e explicação das formas de operação. O Brasil na retomada A pandemia continua acusando índices alarmantes. A Ômicron, a nova variante do Coronavírus, pode ser menos mortal, mas a propagação é maior que o primeiro ciclo da Delta. A indicar que as filas de contaminados são e serão imensas. No meio dessa tempestade, o Brasil parece sair do caos e começar a movimentar suas estruturas, escancarando as portas da normalidade. Para onde se olha, veem-se traços e paisagens cheias de gente e de ações. A retomada das atividades produtivas é fato. Superação A sensação é de que o pior já passou. Os incautos, que relaxam condutas de prevenção, enchem planilhas de dados e hospitalizações. Mas as conversas e as rotinas cotidianas atestam que o brasileiro passa a confiar na superação de tempos sombrios. Muitos reiniciam a volta ao labor sob a crença de que as coisas não serão como antes. Algo se insere nos passos profissionais e pessoais. Lula e Alckmin Parte do PT é contra o nome de Geraldo Alckmin como vice o na chapa de Lula. Rui Falcão, ex-presidente da sigla, em entrevista à Folha, segunda, foi duro: Lula não precisa de muleta eleitoral. E Alckmin, segundo uma ala do petismo, representa tudo que o petismo rejeita. A essa altura, o ex-governador de SP fica com a imagem borrada. Se Lula impuser o nome, vai encontrar resistências. Ou seja, nesse início de jornada eleitoral, contenda e acusações não ajudam a alavancar nomes. Alckmin fica numa sinuca de bico. Os tiros contra o ex-governador surgem a cada instante. A volta Se Lula ganhar a disputa, veremos uma luta engalfinhada de petistas para voltar ao Planalto Central. Os quadros da velha guarda contra os novos perfis. O Brasil do Eterno Retorno. Mantega, Mercadante, Rui Falcão, para onde serão deslocados? E para onde iria a ex-presidente Dilma Rousseff? 18 Estados O PT terá candidatos próprios em 18 Estados. Domina o ranking de candidaturas. Pode fazer a maioria e grande bancada de deputados. PSL e PT Serão os dois partidos com os maiores cofres de campanha. Com o fundão eleitoral turbinado, os partidos terão um total de R$ 5,96 bilhões nas eleições. O valor corresponde à soma de R$ 4,9 bilhões para campanhas eleitorais com R$ 1,06 bilhão para o Fundo Partidário. PSL e PT, que têm as maiores bancadas, levarão 10,14% e 9,97% do total cada, respectivamente. Os evangélicos O PT se esforça para pescar o apoio dos evangélicos, que nunca foram tão disputados. As chances Quais as chances dos pré-candidatos hoje (repito, hoje) de entrarem no segundo turno? Mais uma vez, a resposta é complexa. Vai depender das circunstâncias e do Senhor Imponderável. Hoje, medidas em números de 0 a 10, o palpite sugere essa pontuação: - Lula, 9 - Bolsonaro, 6 - Sergio Moro, 4 - João Doria, 3 - Luiz Mandetta (?), 1 - Simone Tebet, 1 - Ciro Gomes, 2 - Rodrigo Pacheco(?), 1 Terceira via Eleitorado vai fechar posição na última hora. E a terceira via só dará as caras lá para maio/junho. A depender da polarização. E mais: a terceira via só tem possibilidades se o Senhor Imponderável nos visitar e afastar do páreo um dos dois principais corredores: Lula ou Bolsonaro. O fato é que este Senhor faz visitas ao Brasil sem aviso prévio. O Imponderável O clima eleitoral pode ser afetado pela visita do Senhor Imponderável. Na forma de: - uma denúncia bombástica - um escândalo nos bastidores do governo - uma renúncia no meio da campanha - eventos extremados que puxem o povo para as ruas/ um acidente/incidente de proporções calamitosas - caos, com desorganização da economia e furos no cobertor de proteção social Mais ação, menos discurso O eleitor quer mais ação e menos discurso.
quarta-feira, 12 de janeiro de 2022

Porandubas nº 743

Ante essa temporada de chuvas, que fazem cair pedaços de cânion, como o que se viu em Capitólio, nas Minas Gerais, cai bem essa historinha contada por Zé Abelha em seu livro A Mineirice. Lei da Gravidade A Lei da Gravidade, de vez em quando, dá dor de cabeça aos mineiros. E a lei da gravidez, essa, nem se fala. Na Câmara Municipal de Caeté, terra da família Pinheiro, de onde saíram dois governadores, discutia-se o abastecimento de água para a cidade. O engenheiro enviado pelo governador Israel Pinheiro deu as explicações técnicas aos vereadores, buscando justificar a dificuldade da captação: a água lá embaixo e a cidade, lá em cima. Seria necessário um bombeamento que custaria milhões e, sinceramente, achava o problema de difícil solução a curto prazo, conforme desejavam: - Mas, doutor - pergunta o líder do prefeito - qual é o problema mesmo? - O problema mesmo - responde o engenheiro - está ligado à Lei da Gravidade. - Isso não é problema - diz o líder - nós vamos ao doutor Israel e ele, com uma penada só, revoga essa danada de lei que, no mínimo, deve ter sido votada pela oposição para perseguir o PSD. O líder da oposição, em aparte, contesta o líder do prefeito e informa à edilidade, em tom de deboche: "Ah, ah, ah! O governador Israel nada pode fazer, visto ser a Lei da Gravidade de âmbito Federal". E está encerrada a sessão. Tragédias anunciadas O ciclo de chuvas é, em nossas plagas, um tempo de dor e desespero. A chuvarada traz deslizamentos de morros e encostas, inundações, desabrigo de famílias, mortes. Tem sido assim ao longo dos anos. Os sistemas preventivos, quando existem, são descontrolados. E nem se pode dizer, nesses casos, que o Senhor Imponderável acaba de nos fazer mais uma visita. A crônica anunciando tragédias é uma velha senhora conhecida. Carimbo da irresponsabilidade A cada estação do ano, o Brasil ganha um carimbo. As intempéries de um ciclo de chuvas, crateras, devastação e mortes, típicos do início do ano na região Sudeste, cedem lugar à descontração, por ocasião do período carnavalesco, na cabal demonstração de que o slogan pátrio nunca foi ordem e progresso, mas o eterno recomeço que a ampulheta do tempo, vira e mexe, impõe como o nosso conceito de devir. O Brasil não leva jeito. Assistimos em pleno ciclo de chuvas, o definhamento de milhares de famílias por falta de alimento adequado. A devastação A mãe natureza, porém, não tem culpa. A obra de devastação a cargo do homem, em sua incessante obstinação para apressar o fim do planeta, é a principal responsável por catástrofes. Os homens públicos deveriam ir ao paredão da vergonha por não construírem barreiras preventivas nos espaços que administram. Deixando-se levar por um obreirismo que confere visibilidade e votos, incrementam o Custo Brasil, quando se esforçam para apagar rastros de antecessores e motivar comparações que os favoreçam. Eterno recomeço Inexiste coordenação para ajustar as demandas do federalismo cooperativo. Um governo eficaz tem aptidão para prever problemas e antecipar soluções. Deveria usar a técnica da "decalagem" (avanço), a capacidade do atirador, que calculando a distância e a trajetória do alvo móvel, acerta-o em cheio, disparando um pouco à frente do ponto escolhido. Mas a ausência de planejamento se faz ver em toda a parte. Os fatos de hoje se repetiram no passado e se multiplicarão no amanhã. Um eterno retorno, ou, se preferirem, um eterno recomeço. Jesus, Jesus E na hora do aperto, resta clamar aos céus. A lancha que abrigava 10 turistas tinha o nome de Jesus. Os incréus parecem dizer: "viu como temos razão"? Esse escriba cristão só pode replicar: eles não sabem o que dizem. Coincidências A vida abriga um continuum de coincidências. O desmoronamento de um bloco de rochas nas águas de Capitólio, cidade turística de Minas Gerais, ocorre no aniversário de um ano no capitólio dos EUA, em Washington, por trumpistas, os fanáticos de Donald Trump. Para relembrar: centenas de apoiadores de Trump irromperam pelas portas e janelas do Congresso Nacional, em 6 de janeiro de 2021, que certificava a vitória presidencial do democrata Joe Biden. Presos Mais de 725 pessoas foram presas e indiciadas por crimes como invasão e destruição de propriedade pública e lesão corporal a policiais. Cerca de 70 já foram julgadas e 31 delas - entre as quais Jacob Chansley, que ficou conhecido mundialmente pelos adornos de chifre que usava enquanto desfilava pelas salas congressuais - cumprem pena em cadeias pelo país. Acenos à esquerda? A gangorra mostra seu movimento, o sobe e desce, o desce e sobe. Na América Latina, acenos à esquerda são os sinais últimos. O Chile é o mais novo país latino-americano a ter um governo de esquerda. O deputado Gabriel Boric Font, do partido de esquerda Convergência Social (CS), derrotou o conservador José Antonio Kast, da Frente Social Cristã, no segundo turno da eleição presidencial. Aos 35 anos e com uma trajetória de sete anos como deputado Federal, Boric terá como missão governar o país entre 2022 e 2026. Terá de negociar com um Congresso fragmentado e manter aliados do centro para fazer avançar seu programa de governo. Favoritos O ciclo eleitoral da América Latina, que começou em 2020, exibe a volta ao poder partidos de esquerda. Nas últimas semanas de 2021, Chile e Honduras elegeram presidentes esquerdistas para substituir líderes conservadores. Este ano, três eleições apresentam favoritos à esquerda: Brasil, Colômbia e Costa Rica. Os novos líderes esquerdistas enfrentarão restrições econômicas e oposição legislativa, que podem frear suas ambições, além de terem de lidar com eleitores inquietos e dispostos a punir quem não cumprir as promessas de campanha. Vitórias serão balizadas por raiva contra governos em final de mandato, e não foram resultado de uma adesão a ideias socialistas. O almirante O presidente da ANVISA, almirante Antônio Barra Torres, deu um xeque que imobilizou o rei faceiro no tabuleiro: uma resposta dura contra as insinuações de Bolsonaro sobre "interesses de tarados por vacinas", uma acusação contra diretores da Agência, que decidiu vacinar crianças de 5 a 11 anos. Deixou o capitão no tamanho de sua identidade. Colocou o presidente na esfera da difamação e do ultraje. Defendeu os subordinados, desafiando Bolsonaro: prove o que disse. Barra Torres, indemissível, tem mandato até 2025. Estado laico As igrejas pentecostais estão atuando forte na frente política. E formam barreiras contra a ciência, propagando o negacionismo. O pastor Silas Malafaia é uma fonte de desinformação. Igrejas evangélicas adentram a esfera do Estado, em clara intromissão inconstitucional. Um post de Malafaia atribuiu à vacinação de crianças "um infanticídio". O Twitter o removeu. A atitude da plataforma ocorreu após usuários levarem a hashtag "DerrubaMalafaia" para o primeiro lugar entre os assuntos mais comentados na rede. Dizia a mensagem: "Vacinar crianças é um verdadeiro infanticídio". A ANVISA concluiu, após análise de estudos, a vacina é segura também para esse público. No barbeiro Conversa ouvida no cabeleireiro entre três pessoas: - Ora, só tomei uma vacina e estou com medo. - Não me vacinei; essa vacina tem alguns metais, a pessoa acaba morrendo do coração três anos depois de tomar a danada. - Eu só tomei uma e foi por insistência de minha mulher. Confio mais na palavra de Bolsonaro, que até hoje não se vacinou. Estupidez A ignorância é a mãe da estupidez. O velho-novo Lula Luis Inácio não se contém. Ensaia uma visita ao centro do arco ideológico, namora com Geraldo Alckmin, com a intenção de puxar o voto de parte da direita, mas o velho Lula palanqueiro fala mais alto: quer derrubar a reforma trabalhista, aprovada no Governo Temer, e, com isso, mostra sua intenção de fazer valer a cartilha petista, que prega uma modelagem inspirada no passado da luta de classes. Dialoga com os espanhóis sobre a contrarreforma que estão fazendo no território do trabalho. Lula promete rever, também, as privatizações. Abre uma discussão nos partidos que abraçariam sua candidatura, entre os quais o MDB e o PSD. Lula, o favorito, começa a queimar as margens do conforto em que, hoje, se abriga. Uma carta assinada por petistas de alto coturno pede que Lula não aceite Alckmin como vice em sua chapa. Haddad Fernando Haddad começa a viver seu recomeço. Tem chances de se eleger governador de São Paulo. Se o PT levar a melhor no páreo paulista, implantará as estacas em chão profundo e fará do Estado mais forte da Federação uma fortaleza para resgatar a velha identidade petista, rota e despedaçada. Até onde irá Bolsonaro? A continuar sua rede de impropérios, devaneios e acusações sem fundamento, o estoque de adesistas e simpatizantes do capitão tende a se esvaziar. Deu a louca no capitão. Nem os generais conseguem conter seu ímpeto. Moro e seus namoros O ex-juiz Sergio Moro mostra apetite político. Corre o Brasil à cata de apoios e ideias. Esteve até com o ex-presidente do STF, Joaquim Barbosa. A pauta foi substantiva: reforma do Judiciário. Foi ao Nordeste e correrá em outras regiões. Vai se fixando como um pré-candidato forte. Poderia haver acordo com João Doria? Difícil. O governador paulista é um perfil com muita determinação. Este analista acredita que ele irá até o fim. Fecho a coluna com as alavancas do discurso político. Há alguns símbolos detonadores e indutores do entusiasmo das massas em, pelo menos, quatro categorias. Ei-las: 1. Alavancas de adesão - Discurso voltado para fazer com que a população aceite os programas, associando-se a valores considerados bons. Nesse caso, o candidato precisa demonstrar a relação custo-benefício da proposta ou da promessa. 2. Alavancas de rejeição - Discurso voltado para o combate à coisas ruins (administrações passadas, por exemplo). Aqui, o candidato passa a combater as mazelas de seus adversários, os pontos fracos das administrações, utilizando, para tanto, as denúncias dos meios de comunicação que funcionam como elemento de comprovação do discurso. 3. Alavancas de autoridade - Abordagem em que o candidato usa a voz da experiência, do conhecimento, da autoridade, para procurar convencer. Sob essa abordagem, entram em questão os valores inerentes à personalidade do ator, suas qualidades pessoais. Quando se trata de figura de alta respeitabilidade, o discurso consegue muita eficácia. 4. Alavancas de conformização - Abordagem orientada para ganhar as massas e que usa, basicamente, os símbolos da unidade, do ideal coletivo, do apelo à solidariedade. É quando o político apela para o sentimento de integração das massas, a solidariedade grupal, o companheirismo, as demandas sociais homogêneas.
quarta-feira, 5 de janeiro de 2022

Porandubas nº 742

Bom Brasil novo para as leitoras e os leitores. Quem não se lembra do seu Lunga, hein? Pois iniciemos com as tacadas do sábio cearense. Tá com defeito? Seu Lunga leva o aparelho eletrônico para a manutenção. O técnico pergunta: - Tá com defeito? - Não, é que ele estava cansado de ficar em casa e eu o trouxe para passear. Na próxima Cai um toró em Juazeiro do Norte. Seu Lunga não se incomoda e se prepara para sair de casa. A mulher pergunta: - Vai sair nessa chuva? - Não, vou sair na próxima. Panorama Abro a primeira coluna do ano com otimismo. Fé. Que não costuma "faiá", como canta Gil. Depois de tanta tormenta, precisamos nos encontrar com a bonança. Os próximos tempos serão bons para aqueles que conseguem juntar forças para subir a montanha. "Somente aqueles que se arriscam a ir longe, sabem até onde podem chegar", já alertava T.S. Eliot. Viveremos momentos tensos e intensos. O ano promete emoções. É um ano eleitoral. É claro que ainda veremos baixarias, mentiras e disse-que-disse. O país clama por temperança e bom senso. Polarização Conviveremos, infelizmente, com esse modelo de fazer política na arena do tiroteio. Aliás, a polarização tende a ser mais forte, aqui e alhures. Trata-se de um fenômeno-gangorra, que sobe e desce, ao correr dos sopapos de alas engajadas com seus candidatos. Aqui, um deles correrá o páreo pela extrema direita do campo, outro pela esquerda, indo até as margens centrais, enquanto um grupo maior tentará puxar o anzol para ver se alcançam os peixes no centro do lago. Hoje, poucos acreditam que algum candidato do centro viabilize a chamada terceira via. Ainda ponho fé. Lembro: este Senhor chamado de O Imponderável costuma nos visitar. O desgaste O copo está transbordando. O excesso de baixeza e vitupério começa a saturar a paciência de tantos quantos divisam dias melhores para o país. Pela lógica, o azedume que nutre os grupos adversários moveria o eleitorado na direção de perfis identificados com o discurso adequado. Mas a política, a velha política, feita na base de chumbo grosso, continua a dar suas cartas no jogo. Se até abril/maio não houver sinalização do bom senso, poderemos dar o jogo quase vencido por um dos dois protagonistas principais. Mas...volto a citar aquele Senhor. O Imponderável Que olha o Brasil com muita sede. Quem? Lula, hoje, é o preferido. Ganharia bem. Repito: hoje. Há, porém, uma escaramuça entre os núcleos petistas sobre o discurso a ser desenvolvido por Luis Inácio. Um discurso de esquerda, identificado pela cor vermelha do petismo, ou um discurso mais centrado na união de todos, na luta por um programa compartilhado que funcione como polo agregador. Uma ala, que tem perfis históricos do petismo, como José Genoíno, quer Lula na defesa da bandeira socialista, outra, defende o nome de Geraldo Alckmin como vice na chapa do líder petista. Que Lula o Brasil quer? Que outro poderia ameaçar suas chances? Foco no conteúdo Seja qual for o discurso, acertarão os protagonistas que elegerem como foco o conteúdo: o que dizer, qual a proposta para o país nos mais diversos campos, e exprimir esse ideário com clareza, objetividade, concisão. Promessas mirabolantes deverão passar ao largo dos ouvidos. Não descerão ao sistema cognitivo dos eleitores, a não ser a cognição da corte de bajuladores e fiéis simpatizantes. Os radicais. Essa tendência de caprichar no ideário ganha espaço no planeta. Não se trata de uma situação restrita ao nosso cotidiano. A conferir. O populismo A linha populista é, para alguns pré-candidatos, a cereja do bolo. Acham que dourando a pílula, com dribles discursivos, conseguirão atrair as massas. Pois bem, até o programa Auxílio Brasil, o anzol com que Jair Bolsonaro tentará pescar o eleitorado nordestino, poderá não puxar eleitores como nos tempos de ontem. Tudo está em mudança. Quem recebe auxílio até se acostumou e muitos retribuirão o doce recebido com o voto. Mas o eleitor, inclusive o da base da pirâmide social, está mais atento. E, como já frisei antes, cansado de tanta maquiagem. A campanha A campanha não será um reflexo do que vimos em 2018. Nenhum ser humano consegue atravessar o rio no mesmo lugar, achando que repete os passos e a direção. As águas são outras. E as circunstâncias, idem. O Brasil é um arquipélago de crises. A seca que rebaixa o nível dos reservatórios inunda e deixa centenas de famílias ao desabrigo. As perdas são incontáveis. A crise econômica puxa o crescimento para baixo, nas margens do zero. A campanha abarcará todas essas crises. Afora, a insatisfação de categorias do serviço público Federal, que ameaçam com uma corrente de greves e operações-padrão, rolo compressor sobre o Executivo. Emoção Os atores do palco político tentarão puxar o discurso eleitoral para o lado do coração. Teremos uma campanha mais emotiva do que racional. Sinal dos tempos. Mas podemos acreditar que se a racionalidade anda a passos de tartaruga e a emoção corre como lebre, o fato é que o meio da base está aumentando. Devagar, sim, mas se movimenta. E isso importa. A facada Portanto, a lembrança da facada continuará a azeitar o menu discursivo de Bolsonaro, enquanto seu adversário procurará puxar o discurso do pão sobre a mesa, que, em seu governo, alargou os horizontes da base da pirâmide. Mas será retrucado com a moldura suja, que abriga o mensalão e o petrolão. A conferir. A flurona Influenza e Ômicron (gripe e covid), juntas, ganham o nome de flurona. Segundo os especialistas, será a onda que se alastrará pelo território. Mas a mortalidade tem diminuído. A vacinação se expande. O negacionismo é chutado para escanteio. O Executivo perde mais uma frente de batalha, a vacinação de crianças, que tem o endosso da sociedade. A arte da política Atenção, candidatos. A política é a arte do possível. E nunca um político deve marchar com uma única alternativa. Vale, aqui, a lição de Napoleão: "faire son thème em deux façons" ("fazer as coisas de dois modos"). Ou, ainda, o conselho do general Sherman, usando a fraseologia texana para o mesmo conceito: "pôr o inimigo nos cornos de um dilema". (P.S. William Tecumseh Sherman foi general no Exército da União durante a Guerra de Secessão nos Estados Unidos.). Significa que a estratégia militar pode dispersar as forças do adversário e lhe quebrar o moral, produzir incapacidade de ação e falta de motivação; antecipar e prever o modo de conseguir o resultado favorável no confronto; e impedir movimentos subsequentes do adversário. A flexibilidade Na política, a decisão leva em conta os partidos e suas forças, a natureza dos cargos, a possibilidade de alianças, o clima do meio ambiente, as circunstâncias de uma campanha eleitoral etc. Um candidato a presidente da República, por exemplo, há de trabalhar com diversas alternativas, e não apenas com a posição isolada de colar à candidatura exclusivamente em seu partido, exprimir um único discurso e escolher uma única estratégia de campanha. Flexibilidade, essa é a chave. O micropoder "Em geopolítica, pequenos atores - países menores ou entidades não estatais - ganharam novas oportunidades de vetar, interferir, redirecionar e causar entraves graves aos esforços conjuntos de grandes potências." "Esses novos atores representam a ascensão de um novo tipo de poder - vamos chamá-lo de micropoder - que antes tinha pouca chance de sucesso". (Ideias do sociólogo francês Roger-Gérard Scwartzenberg). Naim Moisés Naim, que escreveu O Fim do Poder, faz esta observação: "O debilitamento das barreiras que defendem os poderosos está abrindo as portas a novos atores, os micropoderes, cujo poder não é mais o poder massivo, esmagador e com frequência coercitivo das organizações, mas sim o poder de vetar, contrapor, combater e limitar a margem de manobra dos grandes atores." Saúde para todos em 2022.
quarta-feira, 22 de dezembro de 2021

Porandubas nº 741

Abro a última coluna do ano com duas historinhas. José Maria Alkmin, um dos maiores sábios mineiros, nunca perdia a tirada. O eleitor chegou aflito: - Doutor Alkmin, meu filho nasceu, eu estava desprevenido, não tenho dinheiro para pagar o hospital. A matreira raposa tascou: - Meu caro, se você que sabe há nove meses, estava desprevenido, calcule eu que soube agora. Armado de admiração Tenório Cavalcanti, udenista e adversário político de Vargas, foi ao Catete numa comissão de deputados. Andava nas manchetes dos jornais por causa de suas estripulias em Caxias, na base da "Lourdinha" (metralhadora) e da capa preta. Getúlio o cumprimentou, olhou bem para o volume do revólver embaixo do braço esquerdo, sob o paletó: - Deputado, o senhor está armado? Tenório ficou vermelho, mas não perdeu o bote: - Armado de admiração por Vossa Excelência. Esta coluna tentará fazer uma rápida leitura de 2021 sob o olhar de quem ainda acredita que o amanhã será melhor do que o hoje. Boa leitura. Critérios O primeiro desafio que se apresenta a quem pretende fazer um balanço do ano é tentar responder à pergunta: que critérios usar nessa análise? Não sei. Vou usar apenas os eixos que se apresentarem no momento da escrita. "Pensar sem corrimão", como ensinava Hannah Arendt. De maneira instintiva. Dessa forma, começo pelo usual: o ano foi ruim para milhões de pessoas, inclusive este que aqui está, e também valeu para outros milhões (em menor número), o que significa, foi positivo para muitos, inclusive eu. Explicarei. Um sentimento de perda No nosso interior, espraia-se um sentimento de perda. Algo foi embora. Fugiu. Escorregou de nossas vidas. Pequenas tochas de depressão, ondas de tristeza, um recolhimento forçado pelas circunstâncias. Um coração que deixou de bater no ritmo. Saiu de sua órbita. Uma perda civilizatória. Uma defasagem sem possibilidade de resgatar a parte da vida que se foi. Passos atrás Milhões estagnaram, perderam empregos e negócios, ou até deram passos para trás, nas ondas da pandemia, do fechar de portas, da limitação de atividades profissionais, exigência que se fez como estratégia para conter o novo vírus. Vidas em atraso. Vidas saindo de um território de certo equilíbrio - até porque sabíamos jogar o jogo do mercado - para adentrar em um espaço nebuloso ou em um terreno pantanoso. Sob essa ótica, houve uma parada na roda civilizatória. Uma sensação de patinação no gelo, porém sem sair do mesmo lugar. Efeitos Os efeitos apareceram em diversas direções. Para as crianças e os jovens, um refluxo grave em suas vidas, eis que o vácuo educacional ultrapassou o tamanho da idade lançando-os no fim da fila civilizatória. Será complicado retomar o tempo perdido, mesmo para aqueles que contam com ferramentas tecnológicas para enfrentar os efeitos. Para os profissionais, de modo geral, criou-se um tumulto inicial, com perda parcial da visão central e até a visão lateral. "O que fazer e como?" Para os servidores da saúde, uma intensa mobilização tomou conta de suas tarefas. Uma curva fora do ponto no planeta. Um ano perdido Dividem-se as visões nesse final de ano. Perdeu-se o ano? A velha lei de Lavoisier é tirada da gaveta: na natureza, nada se perde, nada se cria, tudo se transforma. E assim estamos combinados. Uns aceitam mais a lei, outros, menos. O fato é que nossas vidas mudaram. Quem disser, a minha vida não mudou, está tergiversando, forma de driblar a verdade. E agora, com a iminência de uma nova onda (quarta, quinta?) da pandemia, com a variante ômicron, a ideia de que o planeta está tumultuando os passos rotineiros de seus habitantes emerge com força. Quem perdeu? Alguns atores na passarela mundial perderam: aqueles que vaticinaram (isso mesmo, não confundir com vacinaram) contra as vacinas, incluindo o ex-presidente dos EUA, Donald Trump, o brasileiro Jair Bolsonaro e outros com jeitinho de ditador. Perderam os grupos fanáticos, os torcedores da pandemia, aqueles que desacreditam nos postulados da ciência, os incréus, os doidivanas, os malucos, os que usam o sabão dos sistemas autoritários para limpar sua pele e sujar a dos outros. Quem ganhou Ganharam com a pandemia as farmacêuticas, que enchem seus cofres, os cientistas - infectologistas, epidemiologistas, estudiosos do fenômeno -, os profissionais da saúde, principalmente os grupos de vanguarda e da retaguarda que enfrentam o coronavírus 19, as autoridades governamentais que autorizam(ram) medidas de combate à pandemia, organizações planetárias de enfrentamento à doença, como a OMS, líderes e entidades da sociedade civil. O mundo dividido O mundo se dividiu. Países tomaram medidas restritivas, recuaram e agora voltam a reativá-las, outros demoraram a fazer o que tinham de fazer, enquanto os países pobres estão ameaçados de conviver com a mortandade por muito tempo. Olhando o território devastado no norte da África, do alto de um morro, o comandante do Afrika Korps, na II Guerra Mundial, o general Erwin von Rommel, não se conteve: "os pobres nunca deveriam fazer guerras". Hoje, vemos os africanos sendo submetidos à guerra contra a pobreza, sem condições de conter o avanço da pandemia. Os ricos continuam se refestelando. No Brasil, perde e ganha Perdem no Brasil com a guerra contra a pandemia: - o governo Bolsonaro, comandado pelo capitão presidente. Com destaque para os maiores perdedores: - o próprio presidente - o ex-ministro da Saúde, Eduardo Pazuello - o atual ministro da Saúde, Marcelo Queiroga - os políticos, de modo geral, fazendo-se ressalva para os representantes das oposições - os governantes de alguns Estados que relaxaram nas providências a serem tomadas; - os grupos simpáticos aos detratores da ciência Ganham na esteira da pandemia - os membros da CPI da covid-19 - os políticos de oposição, principalmente aqueles que ganharam destaque no palanque da visibilidade - os porta-vozes da luta contra a pandemia, especialistas, consultores, comunicadores e intérpretes na mídia - os governantes que lideraram o processo de vacinação em massa - os servidores da saúde, com destaque para os grupos de combate à pandemia - as classes médias, conscientes, com destaque para os profissionais liberais - a categoria artística, que expressou forte opinião em defesa da ciência - a Anvisa e seus quadros, a partir de seu presidente Lula e Alckmin Não se mata uma identidade da noite para o dia. Identidade, do latim, idem, igual, semelhante. A identidade de um protagonista da política é igual à soma de sua história, com discurso, ações realizadas, maneira de pensar, maneira de dizer, maneira de ser. A identidade de Lula inclui toda o seu tempo de sindicalista, vida no PT e frases que pronunciou. A identidade de Geraldo Alckmin também agrega todos os minutos de sua trajetória. Vemos essas duas identidades, hoje, querendo apagar suas histórias ou mudar de feição. Falso. Água e óleo. Não se misturam. O tempo dirá ou desdirá esse axioma. Apesar de... Há uma regra na política: fazer possível o impossível. Se esta for a hipótese dominante, podemos aduzir: anjos e demônios sabem conviver na política, cada qual procurando ocultar para o outro as veredas de seu passado e de seu inferno... No mais... Tomo emprestado de Nietzsche a lição do seu profeta em "Assim Falou Zaratustra", desejando a todos formas novas de caminhar em 2022: "Novos caminhos sigo, uma nova fala me empolga. Como todos os criadores, cansei-me das velhas línguas. Não quer o meu espírito caminhar com solas gastas."
quarta-feira, 15 de dezembro de 2021

Porandubas nº 740

Abro a coluna com um "causo" contado por Geraldo Alckmin. "Me ajude, governador, me ajude" Geraldo Alckmin é um colecionador de "causos". Todas as vezes em que encontra este consultor, saca logo a pergunta: "E as Porandubas?". O ex-governador de São Paulo não é apenas um leitor assíduo da coluna como um de seus colaboradores. "Causos" engraçados saíram da verve de Alckmin. Leiam este: Um prefeito de São Paulo (omite-se o nome para evitar constrangimento) chega ao governador, e, sem mais delongas, expressa sua desolação: - Governador, pelo amor de Deus, me ajude, me ajude, me socorra! Estou perdido! - Por quê tanta aflição, prefeito, afinal você está apenas no meio do mandato. Há dois anos, ainda, pela frente. O prefeito, cochichando no ouvido do governador, em tom de confessionário, conta o motivo do desespero: - Governador, eu exagerei. Prometi demais, governador. Muito mais do que podia cumprir. E hoje, estou apertado por todos os lados. Não tenho condição de pleitear um novo mandato. Me ajude, governador, me socorra! Alckmin abriu os braços, balançou a cabeça em sinal de dúvida, mas não teve coragem para dizer: "quem pariu Mateus que o embale". Preferiu abrir uma boa gargalhada. (Prefeitos, cuidado com os exageros). Natal Saúde, saúde, saúde, saúde. Saúde. É o que este consultor deseja a todo o universo de leitoras e leitores. Paz e Bem. Impunidade Os trabalhos da CPI da Covid foram encerrados há quase dois meses. O relatório aprovado foi encaminhado às autoridades, principalmente à Procuradoria Geral da República, a quem caberia seguir adiante com os inquéritos sobre os nomes envolvidos. Mas o que se vê é a procrastinação das medidas, uma espécie de cobertor de amortecimento. Como havíamos previsto, a impunidade acabará vencendo. Que adiantam as leis? A Sólon, o legislador grego, foi perguntado se as leis que outorgara aos atenienses eram as melhores. Respondeu: "Dei-lhes as melhores que eles podiam suportar". É o caso de indagar: e no Brasil? Os nossos legisladores dirão que as leis até são boas, mas difíceis de aplicar. Generaliza-se a sensação de que o país navega nas ondas da impunidade. Sanguessugas e trânsfugas de todas as espécies, flagrados com a mão na massa, continuam leves e soltos, a confirmar a tese de que o Brasil é, por excelência, o território da desobediência explícita. Nada mais surpreende. Passarela do crime Não é de assustar se parcela significativa da população começar a aplaudir a bandidagem da quadra de baixo contra a turma que faz zoeira no andar de cima. Afinal de contas, a passarela da criminalidade nas ruas e o desfile de impunidade nas antecâmaras do Poder assumem dimensões grandiosas e formas escandalosas. Corruptos e facínoras, se condenados, ganham o mesmo status perante a lei. Não é de estranhar a anomia que toma conta do país. Herança imperial A impunidade vem de longe. Desde os idos da colônia e do Império, fomos afeitos ao regime de permissividade, apesar da rigidez dos códigos. Tomé de Souza, primeiro governador-Geral, chegou botando banca. Os crimes proliferavam. Avocou a si a imposição da lei, tirando o poder das capitanias. Um índio que assassinara um colono foi amarrado na boca de um canhão. Ordenou o tiro para tupinambás e colonos entrarem nos eixos. Mas em 1553 uma borracha foi passada na criminalidade, com exceção dos crimes de heresia, sodomia, traição e moeda falsa. Depois chegaram as Ordenações do Reino (Afonsinas, Manuelinas e Filipinas), que vigoraram até 1830. Há ainda gente viva? De tão severas, a ponto de estabelecerem a pena de morte para a maioria das infrações, Frederico, o Grande, da Prússia, ao ler Livro das Ordenações 23, chegou a indagar: "Há ainda gente viva em Portugal?" Os castigos, porém, eram frequentemente perdoados. A regra era impor uma dialética do terror e do perdão para fazer do rei um homem justiceiro e bondoso. A esperança se extingue O velho Tomé de Souza não poderia alegar ao rei o motivo para não punir os criminosos: "Não os mandei enforcar porque tenho necessidade de gente que não me custe dinheiro". Coitado, morreria de susto ao saber que o custo da violência no Brasil é, hoje, de cerca de R$ 500 milhões por dia, no cálculo de especialistas. Fosse esse o único saldo negativo, o país poderia comemorar. Mas o custo emocional é impagável. Vejam-se as mais de 600 mil mortes da pandemia. Morremos um pouco a cada dia. A esperança se extingue, a fé se enterra, o sonho se esvai no espaço das amarguras cotidianas. Só faltava essa Para lapidar a pedra bruta da imagem, basta o PCC mobilizar seus "exércitos nas ruas e forças de ocupação nos cárceres" em movimentos cívicos pela punição aos "criminosos do Parlamento". Não é de assustar se parcela significativa da população começar a aplaudir a bandidagem da quadra de baixo contra a turma que faz zoeira no andar de cima. Afinal de contas, a passarela da criminalidade nas ruas e o desfile de impunidade nas antecâmaras do Poder assumem dimensões grandiosas e formas escandalosas. O poder invisível Sob esse tecido costurado com os fios da ilegalidade nasce o poder invisível, cancro das democracias contemporâneas. No nosso meio, protegido pelo manto protetor da impunidade, o poder invisível sai do esconderijo e sobe à superfície. Os latinos diziam que a impunidade estimula a delinquência (impunitas peccandi illecebra). Bobbio lembrava: entre as promessas feitas pela democracia, uma é esta: a fragilidade no combate ao poder invisível. Castas, grupelhos, núcleos se formam nos intestinos do poder e passam a sugar as tetas do Estado, formando a aliança da tecnoburocracia: políticos, funcionários (burocracia) e círculos de negócios. A reeleição Outro cancro é a reeleição, que deveria ser um passaporte para os bons administradores voltarem à gestão pública. Tornou-se um passaporte para o território da lambança administrativa. FHC, que patrocinou a reeleição, hoje reconhece seus efeitos danosos. Os novos tempos sugerem um fim ao processo corrompido que leva à reeleição. Também poderíamos ter o recall legislativo, que permitiria que a população eleitoral decidisse, em meio ao mandato, suspender as atividades de quem não cumpre as promessas eleitorais. Como nos EUA. Racionalidade O fato é que corrupção, ilegalidade, impunidade, farra com o dinheiro público formam o pacote que atormenta a sociedade. A água está transbordando do copo. Pelo que se infere, o voto, a cada pleito, sobe do coração para a cabeça. Desse modo, importa acreditar na racionalidade, que implicará em eleição dos melhores e mais compromissados com as demandas sociais. Quando veremos isso? Já começamos a perceber que uma razoável parcela das casas congressuais é composta de quadros sérios e chegados à mudança de costumes. Rejeição Leitoras e leitores: atentem para o índice de rejeição de alguns pré-candidatos à presidência da República. O Datafolha aponta os campeões de rejeição: Jair Bolsonaro, com 59%, e Luís Inácio, com 38%. Eles poderão baixar esses altos índices? Sim, mas estarão engolfados pelas circunstâncias. E quem aposta em um céu de brigadeiro no próximo ano? Juros altos, inflação crescente, pandemia não controlada por completo. Haverá dinheiro no bolso das margens? O auxílio Brasil conseguirá aliviar o azedume social em 2022? O Ártico O planeta está esquentando muito. Quem já viu o filme Duna vai compreender. Um calorzão de 60ºC. O ártico chegou ao novo recorde: 38ºC. É o que alerta a ONU. Estamos vendo o planeta morrer aos poucos. Por aqui, com a aprovação legal à caça de animais, poderemos inferir que nossas florestas deverão antecipar a vida no inferno.
quarta-feira, 8 de dezembro de 2021

Porandubas nº 739

Abro com "causo" narrado pelo mestre Leonardo Mota. Quem entra no "Hotel Roma" de Alagoinhas, na Bahia, vai com os olhos a uma tabuleta agressiva em que peremptoriamente se adverte: Pagamento adiantado, hóspedes sem bagagens e conferencistas Já em Pernambuco, o proprietário do hotelzinho de Timbaúba é, com carradas de razão, um espírito prevenido contra conferencistas que correm terras. Notei que se tornou carrancudo comigo quando lhe disseram que eu era conferencista, a pior nação de gente que ele contava em meio à sua freguesia. Supunha o hoteleiro de Timbaúba que eu fosse doutor de doença ou doutor de questão. Por falar em Timbaúba, há ali um sobrado, em cuja parte térrea funciona uma loja de modas, liricamente denominada "A Noiva". O andar superior foi adaptado para residência de uma família. Eu não sabia de nada disso quando tendo indagado do Major Ulpiano Ventura onde residia o dr. Agrício Silva, juiz de Direito da comarca, recebi esta informação chocante: - O doutô Agriço? O doutô Agriço está morando em riba d' "A Noiva"... Paradinha no "animus animandi" Parlamentares voltando para seus Estados, famílias se preparando para o Natal, movimentos mais intensos nas ruas e corredores de vendas, como a 25 de março, em São Paulo, evangélicos em euforia com a entrada de André Mendonça, "terrivelmente evangélico" no STF, pandemia com a variante Delta em declínio e a variante ômicron em expansão, bolsa sentindo uma imensa queda no último mês, CVM abrindo inquérito contra Bolsonaro para averiguar informação "vazada" de diminuição do preço dos combustíveis e a descrença geral de que isso não resultará em nada. O "animus animandi" da sociedade está em refluxo. Recuo até do STF A ministra Rosa Weber, que havia paralisado a execução/liberação de recursos do Orçamento secreto, em despacho manda a ação prosseguir sob o alerta de que, mais adiante, quer ver os nomes dos autores das emendas (????), e tudo fica como d'antes no quartel D'Abrantes. O fato é que o corpo parlamentar acha que o Supremo está "jurisdicionando" muito a pauta política. Para o bem-estar da Nação e harmonia natalina, por enquanto fica tudo como está. Glossolalia Falar muitas línguas sob transe religioso é um fenômeno chamado glossolalia, explicado pela psiquiatria e estudos da linguagem. Trata-se de situações de fervor religioso, em que a pessoa crê expressar-se em uma língua desconhecida, por ela atribuída à origem divina. Foi o que teria ocorrido com a primeira-dama Michele Bolsonaro, quando viu que seu amigo André Mendonça havia sido aprovado pelo plenário do Senado para ingressar na Corte Suprema. Não entrarei no mérito desta questão. Em assuntos de religião e futebol, prefiro estender a eles a máxima latina: poetis et pictoribus, omnia licet. Ou seja, aos poetas e pintores, tudo é permitido. E aos profundamente crentes, também. Endurô lenim lenam aiê A glossolalia, por mais que os crentes a entendam como a língua dos anjos, contém uma dose de coisa engraçada. Se eu estivesse por perto de alguém que falasse de maneira tatibitate, confesso que abriria o sorriso, quem sabe, uma gargalhada. No início dos anos 70, o cartão de Natal da PROAL, nossa empresa de jornalismo empresarial, que chegou a fazer 40 jornais e revistas, continha uma mensagem que pesquei em algum manual sobre cultura africana: endurô lenim lenam aiê - que, na língua de algumas tribos da África, significava: "abram as porteiras que vou entrar com tudo". Embaixo: "nesse ano que se inicia, a Proal quer ajudar sua empresa a abrir as porteiras da comunicação". Um desenho de um africano fumando um cachimbo arrematava a mensagem. Um sucesso. O cartão marcou uma era. Até hoje, gargalho com essa frase, que mais parece coisa de glossolalia. Decalagem Nesses tempos de termos estranhos, lembro outro: decalagem, isso mesmo. Não confundir com decolagem. Significa a distância entre o cano da arma do caçador e a ave. O caçador, medindo a distância, atira um pouco mais para cima ou para baixo, levando em consideração a força do vento e o tempo que o tiro leva até o alvo. Pois bem, os atuais pré-candidatos, visando ao alvo de outubro de 2022, estão atirando sem calcular a decalagem. Falam de coisas que não deviam falar, miram o alvo errado, atiram a torto e a direito, desperdiçando munição. Quem pode ser parceiro de outro? Quando começar a correr o Brasil? Quem são os alvos preferenciais nesse momento? Vazamento O vazamento de autoria do presidente, ao anunciar que nos próximos dias, a Petrobras iria baixar o preço dos combustíveis, mereceu uma resposta da petrolífera fazendo um desmentido e a abertura de um inquérito pela Comissão de Valores Mobiliários, CVM. Anotem: coisa pra inglês ver. Dará em nada. E Bolsonaro, se quisermos um comentário do senador Flávio Bolsonaro, deve ter reagido às providências tomadas com uma sonora gargalhada: rah, rah, rah...! PL no RJ Pois é, por falar no senador Flávio Bolsonaro, o presidente do Valdemar da Costa Neto, do PL, teve de aceitar a exigência: quem vai mandar no partido, no RJ, é o senador. E assim, devagar, mas sob constante pressão, a família Bolsonaro espera controlar o partido criado pelo deputado Álvaro Vale, de saudosa memória. O canto dos escravos hebreus, música que ancorava os programas eleitorais do PL, deve ser substituído por um "samba do crioulo doido". O triplex Prescreveu a ação do triplex do Guarujá. Dessa, o ex-presidente Luis Inácio tomou distância. Manifestação da Procuradoria da República no Distrito Federal ocorre após STF ter considerado o ex-juiz Sergio Moro suspeito no caso e anular condenação de Lula. Reforma Tributária A PEC 110 está morta? Sobreviverá? A economia brasileira estará salva ou não? O Brasil continuará com seu manicômio judiciário? O ex-deputado Luiz Carlos Hauly já fez mais de 420 palestras sobre o tema. É persistente. Merece o Prêmio da Persistência de 2021. Mega-Sena Vem aí a mega-sena. Resultado em 31 de dezembro. R$ 350.000.000. Sonho de milhões de brasileiros. Gente de fé. Quem ganhar sozinho vai passar o resto da vida num hospício. Antes, dia 22, será sorteado o prêmio El Gordo, na loteria de Natal na Espanha. Prêmio de R$ 15 bilhões. Com direito a ataque fulminante ao ganhador exclusivo. Felizmente, o prêmio terá muitos ganhadores. Com direito a comemorações menos traumáticas. Corrupção Continua livre e se expandindo o vírus da corrupção. PF investiga suposto superfaturamento de R$ 130 milhões em impressão de provas do Enem. Contratos foram firmados entre 2010 e 2019 com RR Donnelley e Valid. Investigação aponta enriquecimento ilícito de servidores do Inep. Nosso vocabulário político Nosso vocabulário político tem origem nos gregos - democracia, tirania, polícia, a própria política -, e nosso vocabulário cívico nos romanos - civilidade, cidadão, civilização. Roma se apresentava como exemplo de uma política conduzida por homens com funções que definiam o exercício do poder, que se repartia entre dois conceitos: potentia, significando poder físico, e potestas, direito legal, poder inerente ao cargo. A tais modalidades de poder se colocava outro conceito dos romanos para a política - auctoritas -, a união da política com a religião. O poder Estou concluindo meu 13º livro - Política, Poder e Retórica - Da Antiguidade aos Nossos Dias. Sobre Poder, resgato o pensamento de grandes filósofos e cientistas sociais, dentre eles, Thomas Hobbes, Baruch de Espinosa, Max Weber, Karl Marx, Friedrich Engels , Jean-Jacques Rousseau, Karl Deutsch, Friedrich Nietzsche , Immanuel Kant, Norberto Bobbio, Hannah Arendt, John Kenneth Galbraith, Elias Canetti e Amitai Etzioni. O poder nas organizações Etzioni, autor de Análise Comparativa de Organizações Complexas: Sobre o Poder, o Engajamento e Seus Correlatos, faço um destaque. Em minha tese de livre-docência defendida em 1983, na Universidade de São Paulo, tomei como base sua abordagem sobre os três poderes utilizados pelas organizações complexas para legitimar suas políticas junto à comunidade trabalhadora: o poder remunerativo - a capacidade de cooptar a base funcional por meio da remuneração; o poder coercitivo - condição usada pela organização para demitir aqueles que não se engajam no trabalho, e; o poder normativo - usado para o cumprimento da ordem imposta pela norma. Adicionei a este triângulo de poder uma quarta vertente: O poder expressivo. O poder expressivo A comunicação é poder expressivo. Se poder é a capacidade de uma pessoa em influenciar uma outra, esta aceita as razões da primeira pela força da argumentação. Do uso da retórica. A comunicação desenvolve, pois, uma relação de poder. Nas organizações, a comunicação é usada de diversas formas. Desenvolve-se, de um lado, um conjunto de comunicações técnicas, instrumentais, burocráticas, normativas. Em paralelo, ocorrem situações de comunicação emotiva, centrada nas capacidades das fontes, em suas habilidades, comportamentos e posturas. A "comunicação humanizada" propicia empatia, concordância, engajamento, participação.
quarta-feira, 1 de dezembro de 2021

Porandubas nº 738

Abro com uma historinha dos quatro "freis". "Quatro freis" Historinha em homenagem ao Frei Damião, sob as bênçãos de quem os nordestinos viveram parte de sua história. E lá vinha o carro desembestado pelas estradas poeirentas, entre Patos e Cajazeiras, na Paraíba. Dentro, dois frades: Frei Fernando e Frei Damião, cuja expressão religiosa é tão enaltecida quanto a do "padim" Ciço (Padre Cícero Romão Batista). O guarda do posto divisou, de longe, aquele automóvel em louca disparada. E foi logo fechando a cancela do posto. O motorista teve de se conformar com a freada brusca. O guarda foi duro: - Esse carro disimbestado não tem frei? Expliquemos que a fonética na região é essa mesmo: disimbestado e frei (em vez de freio). Resposta lacônica na ponta da língua: - Tem, sim, seu guarda. Tem logo quatro: frei de pé, frei de mão, Frei Fernando e Frei Damião. Surpreso e curioso, o guarda olhou e viu os "freis". Pediu a bênção ao Frei Damião, pediu desculpas, liberou o carro e abriu a cancela. As águas vão rolando Dezembro se abre sob o signo de reversão de expectativas. O comércio não ganhou o que esperava no Black Friday. Muito menos. O Natal se apresenta acanhado. Sem os signos, os papais Noéis, sem as árvores e cores vermelhas que marcam o evento. A avenida Paulista está escura à noite. Tudo parece triste. Claro, veem-se bares cheios e ouvem-se barulhos. Mas o sentimento é de pasmaceira. Dolência. A política tensa O Congresso Nacional desafia o STF e continua a esconder os nomes dos parlamentares com emendas no Orçamento Secreto. O ambiente não respira ares de normalidade. Uma PEC mudando a antiga PEC da bengala, aprovada anos antes, agora reduzindo a idade de aposentadoria para 70 anos, ameaça acirrar os ânimos. A ministra Rosa Weber é o alvo. Moro dá o tom Quem deu um tom mais elevado na orquestração política foi o ex-juiz Sergio Moro, lançado candidato pelo Podemos. Fez um discurso plural. Agitou a cena. Já larga com 12 pontos. Pode recortar a banda da direita que apoia Bolsonaro, principalmente os arrependidos. E abriu conversa com as Forças Armadas. O general Hamilton Mourão, o vice de Bolsonaro, recebeu o aviso do próprio: arrume um paraquedas auxiliar. Santos Cruz O general Santos Cruz é ligeiro no gatilho. Dissera, semana atrás, a este consultor: "voto em Moro. Saúde". Ora, uma porta aberta para fazer ponte com as Forças Armadas. Cruz é respeitado e Mourão já presidiu o Clube dos Militares. Mourão está tecendo o seu paraquedas. Pode vir a ser candidato pelo Podemos a senador pelo RJ ou DF. O general tem se comportado com muita destreza no campo da articulação. Santos Cruz e Mourão são respeitados. A chuva de pré-candidatos Começou a chover forte na seara dos pré-candidatos. Vejam: Lula, Bolsonaro, Ciro Gomes, João Doria, Luiz Henrique Mandetta, Rodrigo Pacheco, Sergio Moro, Alessandro Vieira, Simone Tebet, Luiz Felipe D'Ávila e André Jonanes. Claro, alguns querem apenas visibilidade para articular e ganhar espaço e força na parceria. Haverá um afunilamento. Pacheco e Tebet Dois nomes podem crescer com maior visibilidade. Rodrigo Pacheco, candidato do PSD de Kassab e presidente do Senado. Moderado, fluente, não usa linguagem tatibitate. E Simone Tebet, filha do ex-senador Ramez Tebet, querido amigo falecido. Simone teve bom desempenho na CPI da Covid-19, fala bem e tem o apelo simbólico da mulher. É papo furado dizer que mulher não vota em mulher. Os tempos são outros. O voto está subindo do coração para a cabeça. Doria e sua meta João Doria ganhou as prévias do PSDB, mas terá de unir as bandas divididas do partido. Não será fácil. João dá a ideia de um trator que passa por cima de quem não se alinhar com ele. É um governante determinado. E voluntarioso. O PSDB vive uma crise ideológica que vem lá de trás. Perdeu sua identidade nos corredores lamacentos da pasteurização política. Eduardo Leite O governador do RS, Eduardo Leite, teve um bom desempenho nas entrevistas que deu durante as prévias do PSDB. Surpreendeu pela fluência e ponderação. Ruy Ohtake Esta coluna presta suas homenagens a um dos maiores arquitetos do Brasil: Ruy Ohtake. São-paulino de coração, como este escriba, tem marca registrada e conhecida aqui e alhures: Hotel Unique e complexo de Cultura em Barueri, entre outros. Filho da artista plástica Tomie Ohtake e irmão do também arquiteto Ricardo, Ruy nasceu em São Paulo, em 27 de janeiro de 1938, e cursou arquitetura na FAU-USP. Formando-se em 1960, teve seu trabalho reconhecido com inúmeros prêmios, como o Colar de Ouro do Instituto de Arquitetos do Brasil - IAB (2007). Amor próprio Um maltrapilho dos arredores de Madrid pedia esmolas com grande dignidade. Um transeunte lhe disse: "Não tem vergonha de exercer essa infame atividade quando pode trabalhar?" - "Senhor, respondeu o mendigo, peço-lhe esmola e não conselhos"; e tendo dito isto, deu-lhe as costas, com toda a empáfia castelhana. Era um mendigo orgulhoso esse; pouca coisa bastava para ferir sua vaidade. Por amor de si mesmo pedia esmola; e ainda por amor de si mesmo não permitia que lhe fizessem qualquer reprimenda. (Voltaire) Caindo de fome A manchete de um grande jornal, esta semana, causou comoção: pessoas na fila de postos de saúde desmaiam de fome. Um choque. A morte à espreita dos que têm fome. E tem gente dizendo que tudo está a mil maravilhas. A economia como locomotiva Este analista da política não se cansa de lembrar sua equação: BO+BA+CO+CA. Quem vai puxar o trem das eleições é bolso cheio, barriga satisfeita, coração agradecido e cabeça votando a favor de quem proporcionou o bem-estar. A recíproca é verdadeira. O PIB da Felicidade terá de subir muito para Bolsonaro ganhar. Paulo Guedes é a peça-chave. Suas ferramentas poderão abrir ou fechar as portas da reeleição. PL arrisca O PL de Valdemar da Costa Neto, o boy, é agora o PL de Bolsonaro. E de um montão de gente que vai se filiar ao partido. Um risco. A eleição de 2022 não será a mesma de 2018. E se as coisas derem para trás? Bolsonaro quer levar junto com ele os ministros Fábio Faria, Onyx Lorenzoni, Rogério Marinho, entre outros. E terá candidatos novos em alguns Estados. A política é uma nau sujeita a borrascas. A bonança nem sempre aparece no momento desejado. Fecho com uma historinha de Zé Abelha. As três pessoas No confessionário, Monsenhor era rápido. Não gostava de ouvir muita lengalenga. Ia logo perguntando o suficiente e sapecava a penitência que, sempre, era rezar umas ave-marias em louvor de N. S. do Rosário. Fugindo ao seu estilo, certa feita ele resolve perguntar ao confessando quantos eram os mandamentos da lei de Deus. - São 10, Monsenhor. - E quantos são os sacramentos da Santa Madre Igreja? - São 7, Monsenhor. - E as pessoas da Santíssima Trindade, quantas são? - São 3, Monsenhor. Monsenhor, notando que o confessando só sabia a quantidade, pergunta rápido: - E quais são essas pessoas? A resposta encerrou a confissão: - As três pessoas são o senhor, o Dr. Didico e o Dr. Zé Augusto. (Historinha contada por José Abelha em A Mineirice).